sexta-feira, 14 de novembro de 2025

A direta piscou, o ‘pato-manco’ bateu asas e decolou, por Andrea Jubé

Valor Econômico

Num cenário em que a maioria dos brasileiros aplaude a ação no Rio contra o crime, mesmo sob suspeita de excessos, é preciso prestar atenção em Cláudio Castro

Algumas máximas do poder de tão reiteradas, viram chavões, como a de que a política é como nuvem, cada hora está de um jeito. Ora atribuem a lição a Ulysses Guimarães, ora a uma raposa mineira, o ex-governador Magalhães Pinto. Outro clichê é de que não existe lugar vazio na política, logo uma raposa felpuda fareja o abate e ocupa o território. A autoria é desconhecida, mas a inteligência artificial sugere que a origem remonte a trecho de um dos “Sermões” do Padre Antônio Vieira: “A natureza não admite vácuo, nem a política o deve admitir”.

Raposa é outro chavão, usado para políticos sagazes e com faro para o poder. Condenado pelo envolvimento na tentativa de deslegitimar a eleição presidencial de 2022, em que saiu derrotado, o ex-presidente Jair Bolsonaro exibe um repertório de erros inclusive anteriores à trama golpista, como a conduta temerária na pandemia, e as agressões às instituições democráticas. Equívocos admitidos até mesmo por seus aliados, e que não autorizam considerá-lo uma “raposa”.

Mas não se pode negar a habilidade dele para captar e capturar o sentimento do eleitor. Farejar toda aquela insatisfação o alçou à vitória em 2018. Esse mesmo faro levou o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, a permitir que Bolsonaro testasse seu então ex-ministro dos Transportes para o governo de São Paulo em 2022. Três anos depois, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) é o presidenciável mais cobiçado pelas lideranças de direita, embora visto com desconfiança pelo bolsonarismo-raiz.

É em razão deste faro aguçado para o poder que chama a atenção o pedido de Bolsonaro, formulado ao Supremo Tribunal Federal (STF), para que se designe uma data para que o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, lhe possa fazer uma visita “o mais breve possível”. Em prisão domiciliar desde agosto, as visitas ao ex-mandatário dependem de aval do ministro Alexandre de Moraes.

A afirmação de que não existe vácuo na política tornou-se um clichê, mas, igualmente, um fato. Se Bolsonaro sentiu que o governador fluminense voltou a exalar “cheiro de poder”, e pediu para conversar com ele, é porque notou que o aliado ocupou um lugar até então vago na política, disse à coluna um observador experiente da cena política.

Este observador ressaltou a nova fase de Cláudio Castro, após a megaoperação policial nos morros da Penha e do Alemão, no dia 28 de outubro, que culminou na morte de 121 pessoas, e mesmo face a tanto sangue derramado, catapultou sua aprovação no Estado. Pesquisa Quaest divulgada no dia 2, após a ofensiva policial contra o Comando Vermelho (CV), mostrou que a aprovação de Castro aumentou 10 pontos percentuais em dois meses, subindo de 43% em agosto para 53% em outubro, cinco dias após a ação policial. A mesma Quaest verificou que 67% dos brasileiros aplaudiram a ação policial, enquanto apenas 29% avaliam que houve exagero, diante do número de mortos, cujos corpos foram deixados para trás, resgatados pelos moradores no dia seguinte.

“Nasceu um candidato a presidente”, arriscou este analista. Questionado se essa percepção não seria exagerada ou prematura, ele insistiu que se o crescimento de Castro não se revelar artificial, o político fluminense não poderia ser descartado para a corrida presidencial, porque representa o terceiro maior colégio eleitoral do país, é conservador conforme a maioria da população, e hasteia a bandeira da segurança pública, um dos pilares do bolsonarismo.

O problema é o viés do punitivismo, a aposta eleitoral com a violência em resposta pura à violência, sem abertura, até o momento, ao aprofundamento do debate. Na visão deste analista, Castro avançou sobre o vácuo deixado pela direita, diante da impossibilidade de Bolsonaro se candidatar, da hesitação de Tarcísio de Freitas, e dos desempenhos ainda tímidos de outros presidenciáveis, como os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União) e do Paraná, Ratinho Júnior (PSD).

Entre auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, contudo, a percepção é de que o salto na aprovação de Castro está inflado, e tende a refluir com o tempo, quando avançar a investigação comandada pelo STF sobre possíveis excessos na operação. Já se identificou, até agora, exemplos de tiros a curta distância, e até mesmo a decapitação de um jovem de 19 anos. A expectativa de aliados de Lula é de que a poeira assente, e uma parcela da população assimile com o tempo que a “demagogia do sangue”, ou o “populismo da morte”, nas palavras de adversários de Castro, não seja a solução para os problemas de segurança pública, que são graves, e demandam ações urgentes e responsáveis, que somem inteligência e integração das forças. Foi com base nessa avaliação que após uma primeira manifestação contida sobre a ação policial, dias depois, Lula classificou o episódio como uma “matança”.

Porém, num cenário em que a maioria dos brasileiros aplaude a ação no Rio contra o crime, mesmo sob suspeita de excessos, é preciso prestar atenção em Castro, que até meados de outubro, era considerado um “pato-manco” na política fluminense, sem capital para fazer o sucessor, e assistindo inerte ao flerte do pré-candidato de centro, o prefeito Eduardo Paes (PSD), com PT e PL. Bolsonaro abriu os olhos para ele. O “pato-manco” bateu asas e voou. É cuidar para não se espatifar.

 

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