O Estado de S. Paulo
Em busca de uma reeleição no próximo ano, o presidente deve ser o mais interessado em uma política de juros mais favorável ao crescimento econômico e à expansão do emprego
Como figura internacional, o presidente Lula teve mais um bom momento na COP-30, em Belém, ao mobilizar 53 países para a defesa das florestas tropicais e do clima. Aberta a conferência e batidas as fotos, voltou a Brasília, de onde planejava partir no dia seguinte para uma reunião, na Colômbia, de autoridades latino-americanas e caribenhas com representantes da União Europeia. Longe do Palácio do Planalto, o presidente pode ter se desligado um pouco dos desafios brasileiros nesta fase pré-eleitoral. Com mais trancos do que barrancos, a economia brasileira continua a avançar lentamente, com crescimento estimado em pouco mais de 2% neste ano e desempenho mais fraco no próximo, segundo as contas do mercado. No governo, as projeções ficam na casa dos 3%.
Se as bolas de cristal tiverem alguma
precisão, o Brasil deve manter a combinação de crescimento medíocre e inflação
longe do alvo. Segundo as estimativas, os preços ao consumidor devem subir
4,55% neste ano, 4,20% em 2026 e 3,60% em 2027. A meta central é 3%. O teto,
4,5%. Se as contas da União permanecerem no vermelho, a dívida pública seguirá
aumentando e os financiadores do governo continuarão cobrando juros elevados. O
crédito permanecerá muito caro, limitando a atividade e os planos empresariais
e dificultando a vida e os planos das famílias. Juros muito altos poderão
continuar atraindo capital especulativo, com pouco benefício para quem precisa
de recursos para investir em produção.
Nenhum presidente de Banco Central (BC) se
torna popular mantendo juros altos, nem preserva um bom relacionamento com o
Executivo. O atual chefe do BC, Gabriel Galípolo, já desagradou ao ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, e depois foi criticado pela ministra de Relações
Institucionais, Gleisi Hoffmann. Galípolo “deixou a desejar”, disse a ministra
em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast. Ao manter os juros básicos em
15%, ele desconsiderou, segundo ela, indicadores econômicos compatíveis com uma
taxa mais baixa.
Ele poderia responder mencionando,
simplesmente, suas obrigações como responsável principal pela política
monetária. Mas a argumentação a respeito dos juros já havia aparecido, de forma
rotineira, no informe do BC sobre a decisão de prolongar a taxa em vigor. Nesse
comunicado, o Comitê de Política Monetária (Copom) enfatiza a insegurança em
relação a vários fatores determinantes da inflação. Ganham destaque a política
econômica do governo americano, o quadro geopolítico, as pressões no mercado de
trabalho brasileiro, a incerteza fiscal, o desequilíbrio do setor de serviços e
as expectativas “desancoradas”, uma expressão familiar aos leitores de informes
do Copom.
Nenhum desses detalhes foi contestado
tecnicamente, pelo menos em suas declarações públicas, pelos ministros Haddad e
Hoffmann. Mas os membros do comitê foram além de simplesmente manter os juros
atuais. Indicaram, em seu comunicado, a intenção de sustentar “uma política
monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante
prolongado”. Em busca de uma reeleição no próximo ano, o presidente da
República deve ser o mais interessado em uma política de juros mais favorável
ao crescimento econômico e à expansão do emprego. Mas ele mesmo foi mais
discreto do que seus ministros.
A política monetária poderá ser afrouxada no
próximo ano, mas o mercado ainda prevê para o final de 2026 juros básicos de
12,25%. A inflação estimada para 2026 ainda é elevada, 4,20%, e muito próxima
do teto da meta (4,50%). Mantidos os padrões da política monetária, o comitê
deverá ser muito cauteloso na redução do custo do crédito. Essa expectativa
parece compatível com a projeção de um crescimento econômico modesto,
provavelmente inferior ao estimado, atualmente, para este ano. Se os juros
altos prejudicarem seriamente, como se prevê, a atividade econômica, restará ao
presidente, em sua busca pela reeleição, apelar mais fortemente para a gastança
governamental. Mas tudo isso está no campo das possibilidades, por enquanto, e
qualquer comentário só pode ser especulativo.
Não está claro, ainda, como a oposição poderá
batalhar pela Presidência da República na próxima eleição. Há especulações
sobre algumas figuras consideradas mais fortes, como os governadores de São
Paulo e de Goiás, mas o quadro permanece indefinido. Também se discute como o
ex-presidente Jair Bolsonaro, por enquanto inelegível e condenado a uma pena de
27 anos e três meses de prisão, participará do jogo. Não está claro, neste
momento, quem poderá ser seu candidato e como se manterá em destaque o nome da
família. Temse falado na possível candidatura de um filho do ex-presidente, mas
também sobre isso há muita dúvida.
Por enquanto, a busca da reeleição pelo
presidente Lula é o componente mais provável do próximo quadro eleitoral. Tendo
completado 80 anos em 27 de outubro, ele se declara saudável e em condições de
enfrentar uma nova disputa pelo voto e um novo período como chefe da
administração federal. Hoje, essa declaração pode parecer um tanto supérflua.
Mas talvez haja tempo, ainda, de surgir alguma surpresa.

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