O Globo
Soma de destempero e desinteligência complicaram ex-ministro no julgamento do golpe
O Supremo mandou para o xadrez mais três
militares de alta patente que traíram a farda e a Constituição. A estrela da
companhia é o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança
Institucional. Nos tempos de glória, Jair Bolsonaro o chamava de “nosso
decano”.
Heleno tem currículo. Em 1977, era ajudante de ordens do ministro do Exército que tentou dar um golpe dentro do golpe para impedir a redemocratização. Sylvio Frota foi demitido, mas seu auxiliar continuou a subir na carreira. Chefiou tropas no Haiti e na Amazônia. Só não comandou a força terrestre porque quebrou a hierarquia ao atacar o governo pela demarcação de terras indígenas.
O general nunca escondeu as convicções
autoritárias. Ao passar para a reserva, discursou em defesa do golpe de 1964 e
do regime que lhe sucedeu. Mesmo assim, continuou a ser tratado como uma figura
apta a opinar sobre os rumos do país.
Até a eleição de 2018, Heleno era mais um
general de pijama com saudade da ditadura. A partir da vitória de Bolsonaro,
passou a ser um risco real à democracia. O ministro chegou a ser vendido como
uma voz de moderação no governo. Puro delírio, como ele próprio fez questão de
demonstrar.
No sexto mês de governo, Heleno interrompeu
aos gritos um café do presidente com jornalistas. Esmurrou a mesa e xingou
Lula, que estava preso em Curitiba. Sem freios na língua, o general conseguiu
fabricar crises até com o papa. Descreveu o Sínodo da Amazônia, convocado antes
da vitória de Bolsonaro, como uma “interferência” da Santa Sé no Brasil.
Encarregado da inteligência do Planalto, o
general deu demonstrações claras de inaptidão para o cargo. Numa passagem
folclórica, divulgou seus dados pessoais por engano na internet. Acabou
cadastrado no PT, no PSOL e na União da Juventude Socialista.
A soma de destempero com desinteligência
complicou o ex-ministro no julgamento do estado-maior do golpe. Poucos réus
produziram tantas provas contra si mesmos. Além de defender uma “virada de
mesa” em reunião gravada, Heleno deixou uma caderneta recheada de planos golpistas.
Às vésperas de ser condenado, o general ainda
tentou se descolar de Bolsonaro. Faltou combinar com o capitão. No dia em que o
então ministro fez 73 anos, o presidente deixou claro que seguia suas ordens
desde os tempos da Academia Militar. “Obrigado, general Heleno, por ser a nossa
inspiração em tudo, em quase tudo, que fazemos lá na Presidência”, derramou-se.

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