domingo, 23 de novembro de 2025

Prisão não anula Bolsonaro na escolha do candidato de oposição a Lula, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O presidente do PL Valdemar Costa Neto não esconde o desejo de que Michelle seja a candidata. Os filhos preferem o irmão mais velho, o senador Flávio Bolsonaro

A prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), decretada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, após a convocação de uma vigília por Flávio Bolsonaro (PL-RJ), não sela o destino do bolsonarismo nem esvazia seu impacto no pleito de 2026. O movimento político criado por Bolsonaro é maior que sua condição jurídica e, embora enfraquecido, permanece vivo entre milhões de seguidores.

Bolsonaro está sob custódia do Estado, inelegível e condenado a 27 anos e três meses de prisão por tentativa de golpe de Estado, mas continua sendo a principal referência política da direita brasileira, à qual hegemonizou. A prisão reduz seu raio de ação e aumenta sua vulnerabilidade, mas não dispersa de imediato a base eleitoral que construiu nos últimos 10 anos. A “sombra de futuro” do “Mito” contingenciará os candidatos de oposição.

Formulado pelo cientista político Robert Axelrod na Teoria dos Jogos, o conceito de “sombra de futuro” foi adotado pelo darwinista Richard Dawkins em “O Gene Egoísta” (Companhia das Letras), para entender a cooperação entre os seres humanos. Resumidamente, é a percepção que cada jogador tem sobre a duração da cooperação e necessidade de retaliação para sobrevivência.

Axelrod fez simulações matemáticas sobre o sistema “viver e deixar viver”, que se desenvolveu espontaneamente nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, quando os soldados ingleses e alemães, por muito tempo frente a frente, criavam acordos tácitos de não agressão; quando a rotação mudava ou o comando endurecia, o pacto se rompia para se restabelecer logo depois. Dawkins utiliza essa ideia para demonstrar como estratégias de cooperação entre adversários podem evoluir em razão da “sombra de futuro”.

Até ontem, a oposição vivia um cenário “viver e deixar viver” ao redor de Bolsonaro. Ele estava inelegível, mas em casa; condenado, mas ativo politicamente; acuado judicialmente, mas ainda comandante da oposição. Havia um equilíbrio político instável: o STF, sobretudo na figura de Moraes, impunha limites e sanções; Bolsonaro testava essas linhas com discursos, postagens indiretas, mobilização de aliados e ameaças veladas; o Congresso manejava pautas de segurança pública e anistia; governadores de direita se projetavam nacionalmente surfando na agenda da ordem.

À sombra de Bolsonaro

Dono do maior ativo eleitoral da oposição, Bolsonaro segue capaz de arbitrar candidaturas, de transferir votos e de, eventualmente, caso um aliado chegue ao poder, ser beneficiado por uma anistia aprovada por um Congresso conservador ou por um futuro indulto presidencial.

Essa hipótese — de que o líder permanece no jogo, ainda que em posição defensiva — funciona como um estabilizador da própria direita: ninguém rompe com Bolsonaro, ninguém se proclamava herdeiro sem sua bênção, todos esperam um gesto do líder.

Ronaldo Caiado (União), governador de Goiás; Romeu Zema (Novo), de Minas; Ratinho Junior (PSD), do Paraná; e Eduardo Leite (PSD), Rio Grande do Sul, aguardam uma definição de Bolsonaro. Corre por fora, Ciro Gomes (PSDB). Único potencialmente capaz de unificar toda a oposição, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), é uma esfinge: “decifra-me ou te devoro!”.

Sem apoio formal de Bolsonaro, o governador paulista não será candidato à Presidência; sua “sombra de futuro” é muito maior. Pode se reeleger ao Palácio dos Bandeirantes e aguardar 2030 à frente do poderoso governo paulista para disputar a Presidência.

A prisão preventiva de Bolsonaro encurta tudo. Na lógica de Axelrod, quando a duração é menor, o tempo torna mais difícil sustentar a cooperação. Governadores, parlamentares, lideranças evangélicas e empresários aliados passam a se perguntar se vale a pena seguir postergando decisões estratégicas.

É nesse contexto que a figura de Tarcísio de Freitas ganha centralidade. Entretanto, a “sombra de futuro” de Tarcísio, caso eventualmente chegue ao poder, frustraria as ambições do clã Bolsonaro, possivelmente, até 2034.

Esse tempo é suficiente para que o capital eleitoral do ex-presidente se disperse entre as demais lideranças de oposição. Por essa razão, o presidente do PL Valdemar Costa Neto não esconde o desejo de que a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro seja candidata. Os filhos Eduardo Bolsonaro (PL-SP), deputado federal que se autoexilou nos Estados Unidos; e Carlos Bolsonaro, que deve se candidatar ao Senado em Santa Catarina, preferem o nome do irmão mais velho, o senador Flávio.

Colateralmente, a eventual candidatura de Tarcísio à Presidência embaralha o cenário eleitoral em São Paulo: primeiro, o vice-presidente Geraldo Alckmin reaparece como favorito na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes; segundo, instala-se uma disputa pelo espólio bolsonarista entre o influenciador Pablo Marçal; o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB); e o deputado Guilherme Derrite (Progressistas), que reassumiu a secretaria de Segurança de São Paulo. Tarcísio é prisioneiro da “sombra de futuro” de Bolsonaro: uma coisa é ser apresentado como sucessor; outra é parecer alguém que aproveita a fragilidade do chefe para atalhar o poder.

 

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