Valor Econômico
Grupo político mais renhido do entorno de
Bolsonaro parece ter visto uma senha para a resistência
A perspectiva de que viesse a perder a possibilidade de uma prisão domiciliar, pelo indício de fuga, é suficiente para o ex-presidente ter mudado a versão sobre sua motivação para a violação da tornozeleira de “curiosidade” para “alucinação”. Se a mudança de versão não lhe devolverá, tão cedo, a chance de ficar preso em casa, tampouco será suficiente para arrefecer a resistência do bolsonarismo a uma candidatura única do campo da direita.
Por mais desmoralizante que a história da tornozeleira possa parecer, e o silêncio dos advogados sobre a violação é reveladora, a “paranoia” da qual Jair Bolsonaro se diz possuído reforça a vitimização como narrativa. Um dos poucos a se pronunciar sobre o tema, a partir do depoimento do ex-presidente na audiência de custódia, foi o influenciador Paulo Figueiredo.
Dos EUA, onde está foragido e, em parceria
com o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), arrancou o tarifaço contra o Brasil,
disse que ali estava a evidência da “tortura psicológica” a que Bolsonaro
estava sendo submetido. Da apologia da tortura na ditadura a “vítima” dela, o
ex-presidente é um personagem desnorteado sobre os rumos a tomar na preservação
do seu legado.
O que tenderia a acontecer, com o apoio do
ex-presidente a um nome do Centrão, é a diluição do seu grupo político com a
absorção do 22 pelo candidato a presidente da República à direita que vier a
representá-lo. O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, não cansa de oferecer a
legenda ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Diluído na legenda, o
bolsonarismo terá dificuldade de manter a identidade de sua bancada na Câmara e
no Senado e as bandeiras que a têm motivado, como a anistia.
A prisão preventiva é mais uma provação no
martírio que está passando”
— Ciro Nogueira
A volta à cena do pastor Silas Malafaia, um
dos nomes mais resistentes à liderança do bolsonarismo por um nome do Centrão,
é uma demonstração de que o grupo político mais renhido do seu entorno viu, no
episódio, uma senha para a resistência. Malafaia, que andava afastado de
Bolsonaro desde que virou alvo da ação que apura a obstrução de justiça no
processo da tentativa de golpe, veio a público no fim de semana para defender a
vigília com o escudo da “liberdade religiosa”.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que
conclamou a vigília e foi o primeiro a esboçar esta tese, pode até virar alvo
do ministro Alexandre de Moraes se comprovada a hipótese de que a pretendida
aglomeração visava a facilitar uma fuga. Neste caso, porém, ainda sobraria a
ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que veio a público no dia da prisão, a
partir de Fortaleza, onde participaria de um evento do PL Mulher, para defender
o marido.
Com uma camiseta cor de rosa estampada com a
sigla do seu partido, Michelle gravou um vídeo sereno em que chegou a dizer que
Alexandre de Moraes e sua família mereciam sua bênção. Neste vídeo, chamou
Bolsonaro de líder do “exército do bem” e disse que travaria a “guerra do bem
contra o mal” em sua defesa.
O Centrão continua a investir no apoio do
bolsonarismo a um candidato do seu campo com o argumento de que, unidos,
derrotariam a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma vez no
poder, um candidato eleito deste campo concederia, de bate-pronto, um indulto.
É isso que justifica a profusão de depoimentos de lideranças do Centrão em
defesa de Bolsonaro e críticos à prisão, todos devidamente rebatidos pela
militância bolsonarista com a cobrança sobre a contribuição de sua inação para
aquele desfecho.
“A prisão preventiva é mais uma provação no
martírio que está passando. Toda nossa solidariedade a ele e a seus familiares.
Mitos não sucumbem a violências. São eternizados por elas”, escreveu o senador
Ciro Nogueira (PP-PI) em suas redes sociais.
Com o avanço das investigações da Polícia
Federal sobre a lavagem de dinheiro do crime organizado que vão da operação
Carbono Oculto ao banco Master, a necessidade de blindagem do Centrão é quase
tão robusta quanto aquela que acomete o bolsonarismo. Se o bloco tem no apoio
de Bolsonaro a única chance de rivalizar com Lula, o avanço das investigações
tornou a necessidade deste apoio ainda mais imperiosa.
Tome-se, por exemplo, o alerta da violação da
tornozeleira eletrônica. Foi emitido pela diretora-adjunta da Secretaria de
Administração Penintenciária do Distrito Federal, Rita de Cássia Siqueira, sem
nenhuma interferência do governador Ibaneis Rocha. No 8 de janeiro de 2023,
Rita de Cássia também tentou cumprir seu dever, e foi até condecorada por isso,
mas, naquela ocasião, a atuação de alguns policiais no cumprimento do seu dever
não foi capaz de reverter a omissão do governador e de sua Polícia Militar,
cujo ex-comandante está preso, que facilitou a invasão dos Poderes.
Alvo potencial da operação do Master, pela
tentativa de compra deste banco pelo BRB, Ibaneis, desta vez, está recolhido. O
Centro Integrado de Monitoração Eletrônica da Secretaria de Administração
Penitenciária fez seu trabalho sem óbices. Não dá para negar que as
instituições estão funcionando. E não apenas porque Jair Bolsonaro está para
começar a cumprir os 27 anos de prisão a que foi condenado.

Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.