O Globo
Puxando uma pena, o Supremo encontrou uma
galinha de ovos dourados
‘Te amo.’ “Sou teu fã.” “Saudade de falar
contigo, tá?” Parecem mensagens de namorados — ou, vá lá, de amigos de
infância. Mas são diálogos do presidente da Assembleia Legislativa do Rio com
um desembargador do Tribunal Regional Federal.
O deputado Rodrigo Bacellar foi recolhido ao xadrez há duas semanas, em inquérito que apura a infiltração de facções criminosas na política fluminense. Ontem foi a vez do desembargador Macário Ramos Júdice Neto, também preso por ordem do Supremo.
Para a Polícia Federal, as “declarações
efusivas de carinho” denunciam a intimidade entre o parlamentar e o magistrado.
Os dois jantavam juntos quando Bacellar avisou ao colega TH Joias, acusado de
negociar armas para o Comando Vermelho, que ele seria alvo de operação
policial. A ação havia sido autorizada por Júdice Neto, que depois tentou
culpar a Polícia Civil pelo vazamento.
Em outro momento, o desembargador recorreu ao
presidente da Alerj em busca de ingressos para o Maracanã. “Sempre que precisar
to aqui pra qq parada em especial na hora ruim”, respondeu um solícito Bacellar,
ofendendo o decoro e o idioma na mesma frase.
A PF acusou Júdice Neto de quatro crimes:
obstrução de investigação, violação de sigilo funcional, favorecimento pessoal
e promoção de organização criminosa. A defesa reclamou da “medida extrema” e alegou
que o ministro Alexandre de Moraes teria sido “induzido a erro” ao prendê-lo.
O magistrado já havia sido afastado da
magistratura por 18 anos, sob suspeita de integrar um esquema de venda de
sentenças. Absolvido, ele voltou ao cargo e foi promovido por antiguidade ao
TRF. Sua mulher estava pendurada na Alerj pelo amigo Bacellar. Na semana
passada, o deputado voltou para casa graças ao corporativismo dos colegas, que
votaram para tirá-lo da cadeia.
O deputado e o desembargador foram em cana em
desdobramento da ADPF das Favelas, ajuizada para apurar abusos em operações
policiais. Puxando uma pena, o Supremo encontrou uma galinha de ovos dourados.
O grupo que domina a política do Rio ensaiou um levante contra a ação, acusando
seus autores de proteger bandidos. Agora fica mais claro que a grita tinha
outros motivos.

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