sábado, 20 de dezembro de 2025

A opção de Flávio pelo establishment. Por Thaís Oyama

O Globo

O senador não pretende tentar conciliar a retórica do candidato pragmático com o bolsonarismo

O senador Flávio Bolsonaro deu a largada em sua campanha à Presidência anunciando ser “o Bolsonaro que todo mundo quer”. Em encontros com empresários, tratou de listar seus pretensos atributos: “moderado”, “equilibrado” e, como disse num vídeo, alguém que até tomou vacina — sugerindo, assim, ter em comum com o pai só o sobrenome. Suas falas iniciais deixam claro que ele não pretende tentar conciliar a retórica do candidato pragmático com o bolsonarismo antissistema — investirá na primeira e desprezará a segunda. Isso porque, para Flávio e aliados, os eleitores de Jair estarão com ele haja o que houver e diga ele o que disser.

O passado recente atesta que, ao primogênito do ex-presidente, o bolsonarismo tudo perdoa. Para além do escândalo das rachadinhas, da compra da mansão de R$ 6 milhões e da suspeita de relação com milicianos, vivos e mortos, Flávio já cometeu pecados maiores, ao menos à luz dos postulados do grupo. Em 2019, empenhou-se em enterrar a CPI da Lava Toga, para satisfação dos ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, dois dos integrantes mais notórios do arqui-inimigo STF. A petição da CPI — iniciativa do senador Alessandro Vieira (MDB) destinada a “passar a limpo” o Judiciário — tinha como ponto de partida a investigação das motivações que originaram o hoje “imorrível” inquérito das fake news, aberto por Toffoli e relatado por Moraes. Flávio não apenas se negou a assinar a petição, como telefonou a senadores pedindo que retirassem seus nomes da lista. A Lava Toga jamais viu a luz do dia. O fato de, meses depois, Toffoli ter atendido a um pedido da defesa de Flávio em decisão que suspendeu as investigações da rachadinha, deu força aos rumores de que os presidentes do STF e da República, Bolsonaro, haviam combinado abafar a Lava Toga em troca da liminar que favoreceu Flávio. Tão fortes foram os rumores que Toffoli veio a público negar o acordo. O episódio atesta a aparentemente inesgotável capacidade do bolsonarismo de ignorar as contradições de representantes do clã — nesse caso, a fundamental contribuição do senador para desperdiçar a chance de desinfetar com a luz do sol as chagas dos tribunais superiores.

— Esse tipo de episódio não pega no Flávio — releva um estrategista da oposição com interlocução na família. — Os radicais podem xingar nas redes, mas, lá na frente, votarão num Bolsonaro, e acabou.

Ao menos três presidentes dos maiores partidos de oposição creem que Flávio levará a candidatura até o fim e já trabalham com a hipótese de ele ir ao segundo turno. Esse cenário não tem impedido o presidente do PSD, Gilberto Kassab, de dizer a interlocutores que lançará o governador Ratinho Junior na virada do ano, “desde que as coisas continuem como estão” — quer dizer, se o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, hoje candidato à reeleição, não mudar de planos.

No âmbito da família Bolsonaro, a situação é, no momento, favorável a Flávio. Michelle, desconsiderada por Jair como candidata, passou a ser vista como “inviável” até pelo presidente do seu partido, Valdemar Costa Neto, depois da tentativa de intervir na montagem do palanque do PL no Ceará. Eduardo, que chegou a ameaçar lançar-se candidato, vinha perdendo voz e impacto nas redes antes até da cassação do seu mandato. A suspensão da Magnitsky sobre Moraes sepultou qualquer ambição individual do Zero Três — hoje um reiterado apoiador da candidatura do irmão mais velho.

Se a presente união do clã representa para Flávio um obstáculo a menos, muitos outros o aguardam. Um deles é o sabido desconforto dele diante de confrontos públicos (chegou a desmaiar durante um debate em 2016, quando candidato a prefeito do Rio). Outro é a astronômica rejeição de 62% a seu nome revelada pela pesquisa Quaest — a soma das fraquezas do filho com os passivos do pai.

 

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