Correio Braziliense
Presidente da Câmara está cada vez mais alinhado aos adversários de Lula, sobretudo ao projeto do Centrão de unificar a oposição em torno de Tarcísio de Freitas
A iniciativa do presidente da Câmara, Hugo
Motta (Republicanos-PB), de pautar simultaneamente a mudança na dosimetria das
penas aplicadas aos envolvidos no golpe de 8 de janeiro e os processos de
cassação de mandato de Glauber Braga (PSol-RJ), Carla Zambelli (PL-SP),
Alexandre Ramagem (PL-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PL-SP) produziu mais estresse
político em Brasília.
Não apenas porque favorece abertamente a oposição e ameaça impor novas derrotas ao governo Lula, mas também porque revela um método de condução da Câmara que combina improviso, força bruta e ausência de mediação política. O resultado é um presidente fragilizado perante a opinião pública, tentando impor autoridade pelo braço e não pela construção de consensos.
A ocupação da cadeira da Mesa Diretora por
Glauber, seguida de sua remoção à força pelos seguranças da Câmara, expôs falta
de bom senso na condução dos trabalhos e um estilo de direção do tipo “macaco
em casa de louças”. A cena seria impensável sob Ulysses Guimarães ou mesmo,
goste-se ou não, sob Arthur Lira (PP-AL), padrinho político de Motta. Ambos
sabiam que a autoridade do presidente da Câmara repousa menos na capacidade de
usar a força institucional e mais na habilidade de prevenir conflitos.
Ao pautar matérias explosivas ao mesmo tempo,
sem aviso, sem negociação e sem sequer informar o relator do projeto de nova
dosimetria das penas, o deputado Paulinho da Força (Republicanos-SP), Motta
criou as condições perfeitas para o tumulto de ontem, protagonizado por
Glauber. Tudo agravado pelo cerceamento do trabalho da imprensa e do acesso à
informação por parte da sociedade, com as agressões e retirada de jornalistas
do plenário e o corte da transmissão da TV Câmara às 17h34, exatamente quando o
conflito se ampliava.
O gesto fere o princípio da publicidade dos
atos legislativos, apesar da narrativa de que o presidente tentou evitar que o
país assistisse ao caos que se instaurava sob seu comando. A justificativa dada
pela assessoria — “um protocolo” não especificado — apenas reforçou a percepção
de improviso e opacidade. Em vez de controlar a crise, Motta a multiplicou.
No campo político, a pauta escolhida pelo
presidente da Câmara produziu um efeito imediato: colocou o governo de Lula na
defensiva e premiou a oposição, duplamente. De um lado, o avanço do projeto que
reduz a pena de Bolsonaro e demais condenados pelo 8 de Janeiro; de outro, a
abertura de julgamentos que podem resultar na cassação de adversário direto e
manutenção dos mandatos de deputados de extrema direita.
Ofensiva
Essa combinação, apresentada de surpresa,
evidencia que Motta opera cada vez mais alinhado aos interesses da oposição,
sobretudo ao projeto do Centrão de unificar a oposição em torno da candidatura
do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). Aproveita o desgaste
crescente do Planalto com o Senado, em razão da indicação do advogado-geral da
União, Jorge Messias, ao Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, a decisão
de Motta ignorar novamente o entendimento da Corte que determina a cassação
automática de deputados condenados ao regime fechado, amplia o conflito
institucional entre Câmara e Supremo.
Sob a alegação de que “quem pode mais, pode
menos”, o presidente escolheu o rito mais lento, mais político e mais
imprevisível para cassação dos deputados condenados pelo Supremo, o que
interessa diretamente ao campo bolsonarista. É o mesmo procedimento que
beneficiou Carla Zambelli, também condenada criminalmente. A mensagem implícita
ao STF é clara: a Câmara não aceitará imposições e reivindica para si a palavra
final, mesmo quando a Constituição oferece interpretação diversa, embora não
seja uma Casa revisora das decisões judiciais.
O caso de Glauber adiciona outra camada ao
imbróglio. O parecer do relator Paulo Magalhães (PSD-BA) mistura episódios
distintos, alguns já arquivados, e reaviva conflitos antigos do deputado com
Arthur Lira, o que seus aliados denunciam como casuísmo. Entretanto, ao colocar
sua própria cabeça em jogo com o gesto de ocupar a Mesa, Glauber acabou
oferecendo ao presidente da Câmara o pretexto perfeito para endurecer. A
escalada do conflito não fortalece Motta. A imagem que projeta é a de um
presidente fraco, que perde o controle do plenário, perde a boa relação com a
imprensa, perde a narrativa e tenta reconquistar autoridade pela imposição.
O governo, por sua vez, foi pego
completamente de surpresa pela pauta dupla. A articulação política do Planalto
não esperava que o presidente da Câmara fizesse avançar o projeto da dosimetria
antes de ajustes finais do relator, nem que levasse a plenário quatro cassações
simultâneas num contexto de altíssima volatilidade. A postura de Motta reforça
a percepção de que a Casa vive uma espécie de rolo compressor do Centrão:
decisões de impacto são aprovadas de última hora, sem acomodar bancadas, sem
calibrar tensões e sem medir os riscos para a governabilidade. Almeja recuperar
autoridade, mas opta por métodos que a corroem e termina associando sua imagem
à truculência, ao improviso e ao descontrole.

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