O Globo
Por Luísa Marzullo, Lauriberto Pompeu, Gabriel Sabóia e Jeniffer Gularte
Centrão frustrado, apoio da família e
silêncio de Tarcísio: tudo sobre o anúncio da candidatura de Flávio Bolsonaro
Senador diz ter sido escolhido por Bolsonaro para disputar o Planalto em 2026
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou nesta sexta-feira (5) ter sido escolhido pelo pai, Jair Bolsonaro, para concorrer à Presidência da República em 2026. Com o movimento, o ex-presidente passa a centralizar, da cadeia, o projeto político de parte da oposição, além de frustrar partidos do Centrão, que buscam uma união em torno do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na sexta, dirigentes de partidos como PP,
União Brasil, Republicanos e PSD avaliavam que a indicação de Flávio, caso seja
concretizada, irá isolar o bolsonarismo, levando essas legendas a adotar a
neutralidade no ano que vem.
O entendimento, contudo, é que esse cenário pode ser revertido. Integrantes desses partidos acreditam que Flávio não possui musculatura para decolar em uma campanha presidencial e a iniciativa servirá para testar o sobrenome Bolsonaro na pré-campanha. Essa é a mesma leitura do Palácio do Planalto, que por enquanto comemora a desarticulação da direita.
‘Missão’
Na sexta, a declaração de Flávio ocorreu após
o senador relatar a aliados que o pai o convocou, na terça-feira, para disputar
o Planalto, em conversa na Superintendência da Polícia Federal (PF) em
Brasília, onde está preso.
— É com grande responsabilidade que confirmo
a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias
Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de
nação.
A fala de Flávio formaliza um movimento
interno que vinha sendo gestado no PL. Segundo relatos, Bolsonaro pediu que o
primogênito passe a se comportar como candidato: viajar pelo país, intensificar
embates com Lula e organizar palanques estaduais, tarefas vistas por aliados
como fundamentais para tentar manter o capital político da família em 2026.
— Flávio me disse que o nosso capitão
ratificou sua candidatura. Bolsonaro falou, está falado. Estamos juntos — disse
o presidente do PL, Valdemar Costa Neto.
Um presidente de partido do Centrão avalia
reservadamente que a candidatura de Flávio não deixa muitas alternativas para
as siglas de centro, e que agora o caminho mais provável é que algumas dessas
legendas fiquem neutras e foquem em fazer um grande número de deputados
federais e senadores.
Nas redes sociais, o presidente do União
Brasil, Antonio Rueda, reclamou de articulações envolvendo a eleição de 2026,
mas não citou Flávio. Minutos após o senador ter a pré-candidatura confirmada,
Rueda disse que “não será a polarização que construirá o futuro”.
Já o presidente nacional do Republicanos,
partido de Tarcísio, o deputado Marcos Pereira (SP), disse não ter sido avisado
previamente por nenhuma liderança do PL sobre a decisão. Questionado se foi
surpreendido, Pereira foi lacônico.
— Não fui comunicado (da decisão). Fiquei
sabendo pela imprensa — disse.
No Centrão, a ideia de apoiar Flávio tem sido
descartada. A avaliação é que o parlamentar, assim como qualquer integrante de
sua família, carrega a rejeição do bolsonarismo. Esses mesmos políticos
acrescentam que Flávio não pontua tão bem nas pesquisas eleitorais quanto
Tarcísio.
Na sexta-feira, a ex-primeira-dama Michelle
manifestou apoio publicamente à pré-candidatura do senador, mesmo após o
desentendimento com Flávio sobre a construção de uma aliança do PL com Ciro
Gomes (PSDB) no Ceará.
Em publicação nas redes sociais, Michelle
escreveu: “Que Deus te abençoe, Flávio nesta nova missão pelo nosso amado
Brasil. Que o Senhor te dê sabedoria, força e graça em cada passo, e que a mão
d’Ele conduza o teu caminho para o bem da nossa nação”.
Com isso, os planos de aliados da
ex-primeira-dama de emplacá-la como vice em uma chapa presidencial ficam, ao
menos por enquanto, adormecidos.
Outros pré-candidatos da direita se
manifestaram sobre o anúncio de Flávio. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado
(União), afirmou respeitar a decisão do ex-presidente. Caiado, que vinha
tentando se viabilizar com o apoio de Bolsonaro, diz que segue pré-candidato,
apesar de ter sido preterido.
“É uma decisão do ex-presidente Jair
Bolsonaro, juntamente com sua família, e cabe a todos nós respeitá-la. Ele tem
o direito de buscar viabilizar a candidatura do senador Flávio Bolsonaro. Da
minha parte, sigo pré-candidato a presidente e estou convicto de que no próximo
ano vamos tirar o PT do poder e devolver o Brasil aos brasileiros”, disse em um
comunicado.
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema
(Novo), foi na mesma linha e reforçou que o pleito deve ter “múltiplas”
candidaturas. “Quando anunciei minha pré-candidatura ao presidente Bolsonaro
ele foi claro: múltiplas candidaturas no primeiro turno ajudam a somar forças
no segundo. Então, faz todo sentido o Flávio apresentar seu nome à Presidência.
É justo e democrático”, escreveu.
Já o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de
Deus Vitória em Cristo, postou que “o amadorismo da direita faz a esquerda dar
gargalhadas”. Uma das lideranças evangélicas mais próximas de Bolsonaro, ele
ressaltou que não estava falando “nem contra e nem a favor de ninguém”.
No governo Lula, o movimento político é visto
com cautela pelo entorno do presidente. Na avaliação de aliados, não dá para
considerar que a decisão está tomada e que não haverá reversão nos próximos
meses.
O movimento de Bolsonaro foi visto por
integrantes do governo como uma reação ao mais recente entrevero público da
família do ex-presidente e uma forma de reforçar o projeto da família
Bolsonaro.
Dificuldade para alianças
Lula e seu entorno consideram Tarcísio o
candidato mais competitivo do grupo adversário, mas não veem eleição fácil com
o nome Bolsonaro na urna.
Uma ponderação feita por lulistas é que
Flávio, embora seja o nome mais moderado da família, terá dificuldade de juntar
o Centrão em torno da sua candidatura. O PT já trabalha para rachar partidos
como MDB, PSD, Republicanos e PP nos estados e ter pelo menos parte dos apoios.
O fator Tarcísio também é considerado mesmo
na hipótese de ele disputar a reeleição. Uma ala mais pragmática do governo
pontua que Tarcísio, ao tentar mais quatro anos no Palácio dos Bandeirantes,
fortalece a votação do candidato de direita em São Paulo, maior colégio
eleitoral do país.
Já Flávio Bolsonaro puxa muitos votos no Rio
de Janeiro, berço do bolsonarismo, o que poderá fortalecer a votação dos
Bolsonaro no estado. Por outro lado, avaliam que o nome de Flávio seria um
constrangimento a candidatos a governos estaduais de centro-direita no
Nordeste, onde há mais defecções para Lula.
Polêmicas e investigações que envolvem o
senador
Rachadinha na Alerj - Flávio Bolsonaro foi
investigado por um suposto esquema de rachadinha em seu então gabinete de
deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). A rachadinha é
quando há o desvio de parte dos salários dos funcionários. Em 2020, o hoje
senador chegou a ser denunciado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, mas
o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou a quebra de sigilo do parlamentar
em 2021. Isso enfraqueceu a acusação, levando-a ao arquivamento.
Loja de chocolates - Em 2018, relatório do
Coaf revelou uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício
Queiroz, ex-assessor do então deputado estadual Flávio Bolsonaro. Entre 2007 e
2018, o dinheiro, segundo promotores, era lavado com aplicação numa loja de chocolates,
num shopping do Rio, que foi alvo de busca e apreensão. O valor estaria ligado
ao caso das rachadinhas. Queiroz teria coordenado o esquema. Ao todo, foram
identificados 383 depósitos na conta dele.
Mansão em Brasília - Em 2021, Flávio
comprou uma mansão no valor de R$ 6 milhões no Lago Sul, bairro nobre de
Brasília. A casa de dois andares tem área de 2.400 m², com 1.100 m²
construídos. O senador deu uma entrada de R$ 2,87 milhões e financiou R$ 3,1
milhões pelo Banco BRB em 30 anos. O parlamentar, no entanto, pagou toda a
dívida em 2024. Na época, Flávio, que recebe um salário de R$ 44 mil por mês,
destacou que é “empresário e advogado”, além de ter a atividade parlamentar.
Vigília por Bolsonaro - Recentemente, Flávio entrou na mira do STF após postar um vídeo convocando a população a se manifestar contra a prisão domiciliar do pai. A gravação virou uma das justificativas para a decretação da prisão de Jair Bolsonaro, ordenada por Alexandre de Moraes. Segundo o ministro, Flávio “incitou o desrespeito ao texto constitucional, à decisão judicial e às próprias Instituições, demonstrando que não há limites da organização criminosa na tentativa de causar caos social e conflitos”.

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