Folha de S. Paulo
O presidente condena volume de emendas, mas
aceita o aumento do valor em troca de folga fiscal no Orçamento
Se há motivo de revolta contra atos do
Legislativo, há também razão para desconfiar da boa-fé dos ataques do Executivo
Mobilizações populares são bem-vindas, úteis
e diria mesmo indispensáveis quando é o caso defender a legalidade, preservar
ou reivindicar direitos ou protestar contra abusos do poder público em quaisquer instâncias da
República.
Mas há sempre o risco de a massa se prestar a manobras de cunho político/eleitoral. Convém, portanto, aos frequentadores desses eventos cívicos avaliar se os legítimos pleitos estarão ou não a serviço de um grupo específico.
Isso, claro, se não estiverem embarcando na
canoa por gosto e de modo consciente.
A cobrança por correção de rumos nas condutas
dos atuais congressistas se inscreve no rol das demandas mais que justificadas.
O Congresso merece, sim, reprimendas.
Não é aceitável que a Casa onde se fazem as
leis desrespeite ordens judiciais. Bem como é inadmissível que ali se avance
nos recursos públicos para fins individuais sem prestar as devidas contas.
Tampouco é admissível que no exercício da
representação popular se façam votações na madrugada, enquanto o país dorme, muito
menos que se legisle em causa própria.
Deputados e senadores têm gabaritado a lista
de desvios. Mas se há fundamento na revolta dos representados, há também um quê
de ingenuidade na adesão à ideia de que o Legislativo é inimigo e o Executivo um amigo do povo.
O excesso de credulidade faz mal ao
discernimento. O presidente não usou um grão de sua celebrada habilidade
política para reorganizar a relação com o Parlamento. Na campanha de
2022, Lula prometeu
que faria isso na base do diálogo, mas no governo ficou claro que levou o
eleitorado na conversa.
Enquanto no palanque Lula considera o avanço
das emendas "um erro histórico", no Palácio aceita sem ensaiar reação
o aumento do valor delas de R$ 50 bilhões para R$ 61 bi no Orçamento —segundo
ele, "sequestrado" pelo Congresso.
Sequestro ao qual se aliou no acordo para
aprovação da redução de penas a golpistas em troca de folga fiscal de R$ 22
bilhões para acomodar as contas.

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