O Globo
O sigilo de cem anos é sempre o vencedor,
pois está na mão do poder e é uma arma que desequilibra o jogo
No passado, creio, um escândalo esperava o
outro antes de aparecer. Agora já não se respeita a fila. Eles aparecem a todo
instante, se chocam, se encavalam um no outro, a gente precisa escolher o que
vai acompanhar.
Quem os segue por dever profissional acaba se
tornando graduado em escândalos. Um dos traços mais importantes aparece no caso
do Banco Master. É um escândalo, sem dúvida. Mas, logo em seguida a sua
aparição, surgem novos, típicos do Brasil: os escândalos do abafa.
No caso do Master, o escândalo foi continuado. Primeiro a explosão, depois a relação com ministros do Supremo e, finalmente, a decretação do sigilo numa tentativa de bloquear seu curso. O Supremo contribuiu com Toffoli, que nesse esporte joga em várias posições: sua mulher já foi sócia de advogados do Master, ele próprio viajou para Lima com um advogado do Master e finalmente assumiu o inquérito e decretou um pesado sigilo.
O contrato da mulher de Alexandre
de Moraes com o Master é, se quiserem, outra forma de escândalo: R$3,6
milhões mensais para defender o Banco tão discretamente que ninguém consegue
achar os processos em que ela atuou. E agora vem à tona que Moraes falou pelo
menos quatro vezes com o presidente do Banco
Central (BC), Gabriel Galípolo, interessado no destino que seria dado
ao banco.
Como se não bastasse, o Tribunal de Contas da
União, por meio de um ministro que era deputado de Rondônia, acusa o BC de uma
intervenção prematura na liquidação do Master. O ministro queria esperar que um
número maior de investidores e entidades fossem lesadas.
O outro escândalo que está em cartaz, o roubo
dos aposentados, tem característica distinta. É o escândalo vulcão. Passa umas
semanas adormecido, de repente entra de novo em erupção. O filho do presidente
é acusado de relações com a quadrilha e deve depor na CPMI.
A PF fez várias ações de busca e ficou mais
ou menos claro o envolvimento do senador Weverton Rocha (PDT-MA). Ele é
apontado como sócio oculto da quadrilha que roubava os velhinhos. O presidente
do Senado, Davi Alcolumbre, decretou cem anos de sigilo nas informações sobre a
visita do chefe da quadrilha ao Senado. Isso confirma de novo a lógica do
escândalo à brasileira: depois da eclosão, o segundo e grande momento é o
abafa.
Um dos funcionários de Weverton foi preso.
Outro dia fizeram buscas na casa de uma funcionária do ex-presidente da Câmara
Arthur Lira. Ele é citado 25 vezes no inquérito, mas a maneira como a
investigação foi conduzida e divulgada dá a impressão de que a funcionária
destinou irregularmente R$ 4 bilhões em emendas a seu bel-prazer e contemplou
Alagoas só para fazer um agrado ao chefe.
A PF fez questão de afirmar, e a imprensa
repete disciplinadamente: Lira não é investigado. No Brasil, a culpa é sempre
do mordomo, outro importante ensinamento no curso avançado de escândalo.
Foi por denunciar Lira que o deputado Glauber
Braga quase perdeu o mandato. É outro ensinamento que o curso de escândalo no
Brasil reserva para o estudioso: ai de quem denunciar, certamente pagará caro
pela ousadia.
Na política brasileira, ao lado das clássicas
contradições, existe uma que nasce desse turbilhão de escândalos: transparência
versus sigilo. O sigilo de cem anos é sempre o vencedor, pois está na mão do
poder e é uma arma que desequilibra o jogo. Alguém segura a bola é diz: acabou
o jogo, voltem no próximo século.

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