quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

O cambalacho de Hugo Motta. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Refém de padrinhos, presidente da Câmara revela fraqueza política que nem truculência em plenário é capaz de disfarçar

No sábado, Flávio Bolsonaro abriu um leilão para retirar sua recém-lançada candidatura à Presidência. “Eu tenho preço para isso”, informou, sem corar. O senador não quis dizer o que ou quanto cobraria para sair da disputa. Diante da insistência dos repórteres, arriscou um gracejo: “Quem dá mais?”.

Ontem o deputado Hugo Motta fez seu lance. De surpresa, pautou a votação de um projeto sob medida para reduzir as penas dos golpistas condenados pelo Supremo Tribunal Federal. O objetivo, claro, é livrar o capitão da cadeia. Pela manobra, sua temporada no xadrez seria abreviada para pouco mais de dois anos.

O presidente da Câmara também ofereceu um mimo a Eduardo Bolsonaro. Foragido nos EUA e réu por coação no curso do processo, o Zero Três terá o mandato cassado por um motivo menor: excesso de faltas. Com isso, escapará da inelegibilidade e ficará livre para retomar a cadeira no ano que vem.

Motta ainda acenou com um terceiro brinde ao bolsonarismo: a cassação do deputado Glauber Braga, do PSOL. Ele deve ter a cabeça entregue num pacote que inclui os extremistas Carla Zambelli e Alexandre Ramagem, já condenados à perda do mandato pelo Supremo. Glauber entrou na mira do Conselho de Ética após se destemperar e agredir um provocador que xingou sua mãe. O episódio virou pretexto para retaliá-lo por sua cruzada contra a farra das emendas.

O processo contra o psolista começou com ar de perseguição e termina em tom de espetáculo. Ontem ele se aboletou na cadeira de presidente em protesto contra a cassação anunciada. Numa reação truculenta, Motta mandou cortar o sinal da TV Câmara e expulsar os jornalistas do plenário. Protegidos pela censura à imprensa, seguranças imobilizaram Glauber com violência, rasgando seu paletó. A deputada Célia Xakriabá, que tentava defender o aliado, foi arremessada ao chão.

Sem liderança sobre os colegas, Motta tem se mostrado um presidente débil, tutelado pelos padrinhos Ciro Nogueira e Arthur Lira. O cambalacho para abortar a candidatura de Flávio Bolsonaro escancarou mais uma vez sua dependência do Centrão. E expôs uma fragilidade que nem o surto autoritário de ontem foi capaz de disfarçar.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.