O Globo
Situação revelada por colunistas do GLOBO,
embora lícita do ponto de vista legal, abre amplo espaço para discussão
Foi com um silêncio olímpico que o ministro do STF Alexandre de Moraes reagiu a três recentes revelações da imprensa envolvendo seu nome. A primeira, feita pelo colunista do GLOBO Lauro Jardim, mostrava que, entre os documentos recolhidos pela polícia na operação que prendeu o banqueiro Daniel Vorcaro, estava um contrato firmado entre o agora liquidado e suspeito de transações fraudulentas Banco Master e o escritório comandado pela mulher do magistrado, a advogada Viviane Barci de Moraes, em sociedade com filhos do casal. A segunda revelação, esta feita pela colunista Malu Gaspar, também do GLOBO, foi que o contrato em questão atingia uma cifra astronômica, em torno de R$ 130 milhões — número nunca antes visto, nem mesmo no firmamento dos escritórios mais estrelados do país (um dos maiores valores conhecidos até hoje era o contrato estimado em R$ 60 milhões entre o falecido Márcio Thomaz Bastos e as empreiteiras Odebrecht e Camargo Corrêa na Lava-Jato). A terceira notícia, também dada por Malu Gaspar, é sobre o tipo de serviço que o escritório Barci de Moraes se dispôs a prestar ao Master.
Segundo o texto do contrato, reproduzido pela
colunista, o escritório da mulher e dos filhos do ministro Moraes prometia
representar o Master perante Banco Central, Receita Federal, Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional e Cade, além de acompanhar projetos de interesse do banco
no Legislativo e de fazer a coordenação “estratégica, consultiva e contenciosa”
de seus assuntos perante Judiciário, Ministério Público e Polícia Judiciária.
Em outras palavras, o escritório de Viviane
de Moraes se prontificou a defender os interesses do Master — por R$ 3,6
milhões mensais ao longo de três anos — em todos os vértices do poder. No
Executivo, a área de cobertura do contrato incluía órgãos reguladores e de
fiscalização cujas decisões, cruciais para um banco de alta exposição como o
Master, muitas vezes acabam chegando ao Supremo — assim como desembocam na
Corte que Moraes integra assuntos de ordem constitucional questionados no
Legislativo. No Judiciário, o contrato cita a Polícia Judiciária, função exercida
no âmbito da União pela Polícia Federal — que, em certos casos, faz
investigações, ou deixa de fazê-las, sob ordens de juízes do STF como Moraes.
Nenhuma dessas revelações feitas pela
imprensa, por si só, configura ilícito por parte do ministro, nem gera de forma
automática seu impedimento. O artigo que impedia juízes de decidir sobre ações
envolvendo clientes de escritórios de parentes ou cônjuges foi derrubado pelo
STF em 2023 (para alegria de muitos parentes, cônjuges e juízes, diga-se).
Assim, nas hipóteses relativas a familiares, o Código de Processo Civil prevê
impedimento apenas quando o parente ou cônjuge do juiz, ou ainda o escritório a
que pertencem, atuam no processo específico que ele julga. Em tese, Moraes
poderia relatar uma ação em que Vorcaro seja parte desde que, naquele processo,
não atue advogado do Barci de Moraes.
O ministro, portanto, não precisa se
defender, já que, do ponto de vista legal, nenhum ilícito cometeu até aqui. Do
ponto de vista ético, contudo, a situação revelada pelos colunistas do GLOBO
abre amplo espaço para discussão. Uma manifestação sua sobre o caso —
solicitada por jornalistas e até o momento ignorada — faria mais do que provar
que ele não se considera acima dos homens nem despreza o fato de, como servidor
e autoridade institucional, estar sujeito ao escrutínio público e à prestação
de contas à sociedade. Uma manifestação, neste momento, serviria sobretudo para
prevenir o risco de que uma percepção pública compreensível — a de um banqueiro
suspeito de operação fraudulenta ter pagado um “seguro institucional” à família
de um juiz do STF — ameace a credibilidade da Corte. Por atos recentes, Moraes
foi por muitos saudado como guardião da democracia. Não deve querer agora ser o
fator de desequilíbrio de um dos seus pilares.

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