sábado, 13 de dezembro de 2025

O juiz venceu. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Ainda que anestesiado pelo ritmo dos despachos em Brasília, operações a cada lance mais criativas-ousadas, o cronista peleja para não se acomodar ante as notícias recentes que comunicam – como se prática natural – acordos políticos firmados entre ministro do STF e os donos do Senado; de repente admitido que uma ADPF possa ser instrumentalizada, ademais cassando um direito político, para forçar que o Congresso, submetido, reforme a lei nos termos das “orientações” do juiz-parlamentar.

Não faltaria ao rito viciado a corrupção da palavra, de modo que o juiz que legisla, na verdade, orienta. O juiz venceu. Jogou e venceu. Sem surpresas. O Judiciário brasileiro – para prazer do Direito Xandônico – é o mais forte do mundo. (Venceu a Magnitsky!)

O vencedor, incansável, tem o mérito de se reinventar sempre. Você terá percebido o advento influente deste tipo peculiar de perversão na República depravada: o ministro do Supremo, instituição onipresente, que é também consultor de constitucionalidades; que examina preventivamente, por fora, projetos de parlamentares e lhes dá fé. Ou não, vetando-os ainda na origem.

Estabelecida assim, e recebida-tratada com normalidade, a anomalia do ministro de Corte constitucional – aquele que tem a palavra final, que declara inconstitucionalidades – prestador do serviço informal de antecipação de juízos. Uma forma gentil de condicionar a prerrogativa de deputados e senadores. Maneira hábil de legislar. Modo adicional de esculhambação do controle de constitucionalidade.

Viu-se isso – esse processo consultivo – como elemento fundamental para que o projeto de lei da redução de penas avançasse. Não bastaria somente a palavra do fiador-geral da República Davi Alcolumbre, de que faria o troço andar celeremente no Senado. Tampouco seria suficiente o pacto entre o candidato-negócio Flávio Bolsonaro e o consórcio centrônico Ciro Nogueira/Antonio Rueda, de que não seriam apresentados destaques pela anistia “ampla, geral e irrestrita” e de que haveria os votos para aprovar a matéria.

Esse conjunto, por urdidura complexa que tivesse, restaria aquém. A blitz só se impôs porque ministros do STF, aqueles agentes políticos que controlam o tribunal, avalizaram o texto de Paulinho da Força. A rigor, para desespero (e galho dentro) dos bolsonaristas que acusam a “ditadura do Supremo”, ministros do STF firmaram um acordo com Jair Bolsonaro – que aceitou a “solução possível” e mandou a turma engoli-la.

Sejamos ainda mais claros: parte do tribunal que condenou os golpistas duramente chancelou o movimento parlamentar que ora pretende tirar o ex-presidente do regime fechado em pouco mais de dois anos. Um acordão, “com Supremo, com tudo” – de mãos dadas Bolsonaro, o centrão tarcisista, o censor Hugo Motta, Alcolumbre e os ministros do STF que mandam na Corte. E talvez ainda Donald Trump. •

 

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