“Mas os preconceitos contra
a política - a ideia de que a política interna é uma teia de mistura e ardis
tecida por interesses escusos e ideologias ainda mais escusas e a externa um
pêndulo a oscilar entre a propaganda insulsa e o exercício da força bruta –
remonta a uma época muito anterior à invenção dos artefatos capazes de destruir
toda vida orgânica do planeta. No que tange à política interna, esses
preconceitos são pelo menos tão antigos quanto a democracia partidária – isto é,
pouco mais de um século -, que pela primeira vez na história moderna pretendeu
representar o povo, algo em que o próprio povo nunca acreditou. A origem da
política externa pode ser nas primeiras décadas da expansão imperialista da
virada do século, quando o Estado nacional começou, não prol da nação, mas dos
interesses econômicos nacionais, a estender o domínio europeu por todo o globo.
Mas aquilo que hoje dá ao amplo preconceito contra a política a sua força real –
a fuga na impotência, o desejo desesperado de exonerar-se da capacidade de agir
– era naqueles dias preconceitos e privilégio de uma pequena classe que
acreditava, nas palavras de Lorde Acton, que “o poder corrompe, e o poder
absoluto corrompe absolutamente”. Ninguém, talvez, mais do que Nietzsche – em sua
tentativa de reabilitar o poder – reconheceu mais claramente que essa
condenação do poder refletia claramente os anseios ainda inarticulado das
massas, embora também ele, bem ao espírito da época, identificasse, ou
confundisse, o poder – que individuo algum é capaz de possuir, dado que só pode
surgir da ação cooperativa de muitos – com o uso da força, cujos meios um
individuo pode tomar e controlar.”
*Hannah Arendt (1906-1975), A promessa da política, p. 150. Editora Difel,
2008.

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