domingo, 28 de dezembro de 2025

Renovação e investimento na pauta eleitoral. Por Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

Seja quem for o eleito em 2026, uma boa administração deverá incluir atenção especial à renovação da indústria e, se possível, à modernização de todo o sistema produtivo

Professoras descreviam o Brasil, há 70 anos, como um país essencialmente agrícola, sem levar em conta, aparentemente, o enorme investimento em industrialização. A indústria cresceu, ganhou destaque entre as economias emergentes e sobreviveu a crises locais e globais, mas voltou a ser, no século 21, bem menos vigorosa que a agropecuária e os serviços. No país governado pela terceira vez pelo ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva, o setor industrial volta a mostrar-se emperrado, com crescimento de 1,7% nos nove meses até setembro, enquanto a produção rural aumentou 11,6% e a dos serviços, 2,8%.

Sem o enorme vigor da agropecuária, a expansão econômica até o fim do terceiro trimestre teria sido bem inferior aos 2,4% registrados oficialmente. Sem esse componente, o avanço de 2,26% estimado para o Produto Interno Bruto (PIB) neste ano seria quase inimaginável. Além de registrar essa estimativa, a pesquisa Focus também aponta, para 2026, a projeção de 1,80%, um número aparentemente medíocre, ou abaixo disso, para um grande país emergente. Mas a mediocridade combina com algumas características importantes do Brasil.

Observada na maior parte deste quarto de século, uma dessas características é a baixa taxa de investimento produtivo, isto é, de capital aplicado em máquinas, equipamentos e obras. No terceiro trimestre, a soma investida equivaleu a 17,3% do PIB, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nem sequer a taxa de 18%, por muito tempo considerada um padrão nacional, vem sendo mantida regularmente neste século. Mesmo esses 18% seriam inferiores ao padrão observado em outros grandes emergentes.

Para investir mais e com maior eficiência, o País precisaria de aplicação mais produtiva de recursos públicos, de juros mais baixos e de perspectivas melhores e mais seguras de crescimento econômico. Juros mais baixos e mais compatíveis com maior investimento produtivo dependeriam de cenários mais positivos e mais seguros para a elaboração da política monetária.

Os condutores dessa política – dirigentes do Banco Central (BC) – mencionam com frequência a insegurança dos investidores e, afinal, deles mesmos em relação às contas públicas, à inflação e às condições dos negócios no Brasil. Não há como escapar desse atoleiro sem um esforço claro e confiável das autoridades em busca de um emprego mais prudente e mais eficaz do dinheiro público. Isso dependerá, em primeiro lugar, de um chefe de governo menos voluntarioso e mais atento às condições de segurança financeira da administração federal.

O presidente Lula já se mostrou, em algumas ocasiões, capaz de entender o valor da prudência financeira e de seguir padrões de cautela e de produtividade no uso de recursos. Mas nem sempre obedece a esses padrões, como se voltasse a ser dominado, de tempos em tempos, pela velha identificação petista entre governo e gastança. Quando isso ocorre, passa a desprezar as advertências e sinalizações de seus auxiliares mais preparados e mais prudentes. O risco tende a crescer quando se misturam mais intensamente, como parece ocorrer neste momento, a administração e a campanha eleitoral.

Essa mistura pode render alguns efeitos positivos, no curto ou no curtíssimo prazo, mas a busca desses efeitos, com objetivos eleitorais, pode comprometer dinheiro sem resultados de alcance relevante. Um pequeno grupo de ministérios vem trabalhando pela modernização do sistema produtivo, mas a chefia do governo tem mostrado pouco empenho na valorização desse esforço.

Um maior comprometimento da Presidência poderia, quase certamente, resultar em maior envolvimento do setor privado. A administração federal, nesse caso, tenderia a liderar um movimento amplo e mais organizado de transformação e de fortalecimento do sistema produtivo. Mas isso dependeria, como parece evidente, de uma clara definição de objetivos e de uma eficiente articulação de programas e de políticas. Dependeria, enfim, da montagem de um conjunto de objetivos e de ações segundo os bons padrões de planejamento. Curiosamente, a velha noção de planejamento, valorizada por figuras ilustres do antigo PT, parece hoje quase ignorada pela Presidência petista.

Em busca de um quarto mandato, o presidente Lula poderá entrar em 2026, ano eleitoral, sem um claro e bem elaborado programa para um novo período. Na ausência de um forte competidor, talvez a candidatura petista seja sustentável com promessas de continuação e de alguns avanços em programas selecionados. Isso poderá mudar, mas, por enquanto, esse é um quadro provável. Se um competidor surgir, no entanto, e tiver sucesso contra Lula, meses serão consumidos na implantação de um novo roteiro governamental. A democracia tem custos e parte deles está associada à renovação de equipes, planos e programas.

Seja quem for o eleito, uma boa administração deverá incluir atenção especial à renovação da indústria e, se possível, à modernização de todo o sistema produtivo. Nem um presidente reeleito escapará de trabalho mais pesado na fase inicial.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.