quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Sem mentiras e discurso de ódio

Correio Braziliense

A mentira não pode se sobrepor à democracia nem ser plataforma de opressão, tortura e morte de um povo

Cinquenta e nove anos depois da falência do obscurantismo, uma horda de inconsequentes, movidos a fake news e discursos de ódio, tentaram reeditar o golpe militar, ocorrido em 31 de março de 1964. Invadiram a Esplanada dos Ministérios e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). A abominável ocupação criminosa da área dos Três Poderes ocorreu em 8 de janeiro de 2023, sete dias após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que chegou ao terceiro mandato, e do seu vice, Geraldo Alckmin.

Ontem, em cerimônia para comemorar a vitória da democracia e tornar a data mais um momento de glória para o país, o presidente Lula reuniu ministros de Estado, representantes do Congresso Nacional, do STF  e das Forças Armadas. Apesar do evento não ter atraída um grande público, Lula afirmou que "um ato em defesa da democracia brasileira, mesmo que tenha apenas uma pessoa, uma única pessoa, numa praça pública, num palanque, falando em democracia, já é suficiente para a gente acreditar que a democracia vai reinar neste país".

Passo em falso - Merval Pereira

O Globo

Com dois anos de governo, ele não pode ficar vivendo do passado, tem de jogar o país para a frente

O presidente Lula revelou na conversa informal que teve por celular com a atriz Fernanda Torres, quando a parabenizou pela vitória no Globo de Ouro, que pretende transformar 2025 no ano da defesa da democracia. Num momento em que o governo se debate com críticas que consideram que a questão da dívida pública pode desaguar numa crise econômica grave, ele saca da cartola um movimento de defesa da democracia para reavivar o clima que o levou à vitória em 2022.

Naquele momento, no entanto, saíamos de um governo de tendências autocráticas que deixara marcas profundas, confirmadas meses depois da eleição por uma tentativa de golpe que marcou o 8 de Janeiro na nossa História. Hoje já se passaram dois anos desse novo governo que, se de um lado reconstruiu setores simbólicos para a democracia, nada mais mostrou que indicasse um futuro melhor. A não ser a compreensão democrática, que não impede erros recorrentes, como a complacência com regimes autoritários de esquerda.

Ignorar os sinais não vai curar o doente - Nelson Niero

Valor Econômico

Fluxo de notícias ruins só corrobora a percepção de que algo está fora do lugar

Há uma polêmica entre os economistas e curiosos, causada pela recente disparada do dólar e juros, sobre se seria correto dizer que o Brasil está caminhando para uma situação conhecida como “dominância fiscal”. Não é preciso ter um mestrado na “ciência sombria” para saber que se trata de alguma enfermidade econômica importante. Se não dá para cravar que é um caso para a unidade de tratamento intensivo, a percepção que se consolidou nas últimas semanas é que quanto mais tempo levar para começar o tratamento mais graves serão as sequelas.

Apertem o cinto, Trump vem aí - Maria Clara R. M. do Prado

Valor Econômico

O momento no Brasil é de muita reflexão, pois um aumento sistemático das taxas de juro internas não vai atrair o capital estrangeiro necessário para fazer frente à debandada dos recursos rumo aos EUA se Trump tiver sucesso

Você acha que o real está muito desvalorizado? Prepare-se, pois tende a cair ainda mais face ao dólar no curto e médio prazo. E essa não é uma tendência apenas do real, tendo em vista a perspectiva de fortalecimento da moeda norte-americana com a introdução das medidas anunciadas pelo próximo presidente dos Estados Unidos, a ser empossado no dia 20.

Se conseguir implementar tudo o que tem prometido - aprofundamento nos cortes da taxação de empresas e corporações, aumento das tarifas de importação e desregulamentação dos entraves aos negócios - Donald Trump vai injetar um impulso extraordinário ao crescimento do país. Com isso, um ciclo virtuoso se solidifica: dólar forte atrai investimento de fora para os Estados Unidos e ajuda a consolidar a expansão econômica.

A urgência da reforma da dívida global - Anne Krueger

Valor Econômico

Mais da metade dos países de baixa renda estão em dificuldades com dívidas ou perto disso

Os altos níveis de endividamento estão mais uma vez disparando alarmes em todo o mundo. Nos países desenvolvidos, a atenção está voltada para o rápido aumento da dívida pública, enquanto as economias em desenvolvimento lutam para pagar suas obrigações externas em meio à desaceleração do crescimento e a estagnação das exportações.

Apesar dos desafios atuais, a maioria dos economistas acredita que as economias desenvolvidas conseguirão evitar uma crise total, graças à sua capacidade de emitir dívida em suas próprias moedas e implementar metas fiscais e monetárias direcionadas. Nos Estados Unidos, por exemplo, o déficit fiscal ultrapassou 6% do PIB em 2024 e está projetado para alcançar 8% ou mais em 2025. Mesmo assim, as taxas de juros em queda sugerem que as autoridades estão bem posicionadas para enfrentar o problema, que recebeu pouca atenção durante o ciclo eleitoral de 2024.

Etanol: a galinha de ouro da transição energética - José Serra

O Estado de S. Paulo

O Brasil corre o risco de comprometer o desenvolvimento de seu maior trunfo, prejudicando o avanço em direção a um futuro mais sustentável

A galinha dos ovos de ouro, clássico do fabulista grego Esopo, do século 6 a.C., conta a história de um casal que sacrifica sua fonte de prosperidade na esperança de obter riqueza imediata. O etanol brasileiro simboliza essa galinha dos ovos de ouro na transição energética: um pilar estratégico que fortalece a economia e reduz emissões de gases de efeito estufa (GEE). Desde o início do Proálcool, em 1975, o biocombustível já evitou a emissão de mais de 600 milhões de toneladas de GEE, consolidando o Brasil como líder global em energia limpa. Proteger esse tesouro exige enfrentar desafios que podem comprometer seu futuro.

As ‘big techs’ e o fascismo - Eugênio Bucci

O Estado de S. Paulo

Uma a uma, elas deixam cair a máscara de isenção, de objetividade e de compromisso com os fatos e mostram sua natureza essencial

Agora ficou escancarado. Depois do pronunciamento que Mark Zuckerberg divulgou na terça-feira, anunciando que cerrará fileiras com Donald Trump para combater os projetos de regulação das plataformas, projetos que ele qualifica de “censórios”, não dá mais para disfarçar. Seguindo o exemplo de Elon Musk, dono do “X”, antes conhecido como Twitter, Zuckerberg subiu na carroceria do caminhão extremista do trumpismo, sem pejo, sem molejo e com sacolejo. A Meta saiu do seu armário de silício para entrar no fanatismo desvairado.

Eram favas contadas? Sim, eram. Mais cedo ou mais cedo ainda, a maquiagem escorreria. E escorreu. Está tudo na cara. Agora, ninguém mais pode alegar que a desinformação e os discursos de ódio propagados industrialmente pelo maquinário da Meta fossem acidentes de percurso. Não. Promover o trumpismo e todo o seu ideário – ou todo o seu bestiário – não foi um efeito colateral, mas a finalidade do conglomerado monopolista global comandado por Mark Zuckerberg. Detalhe: no seu vídeo, que foi manchete ontem em jornais do mundo inteiro, ele aparece de camiseta preta. Ato falho? Ou intencional?

A Meta e o STF - William Waack

O Estado de S. Paulo

É de enorme impacto para o Brasil a postura da big tech de Mark Zuckerberg

Mark Zuckerberg, o CEO da Meta, apenas expôs um dilema político fundamental no Brasil quando anunciou que vai encerrar o programa de checagem de fatos. A questão colocada para a sociedade brasileira não é apenas como regular redes sociais. É quem tem a legitimidade para isso.

O dilema brasileiro talvez fique mais nítido por meio de comparação com outro regime democrático, o da Alemanha. No qual muito antes da existência da internet já havia um dispositivo na Constituição proibindo o uso ou divulgação de símbolos nacional-socialistas.

Gravata de Lula foi recado de que o governo é petista – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A gravata vermelha de Lula — em vez da azul, amarela e verde que gosta de usar, ou mesmo a faixa presidencial, que seria mais simbólica — não foi um descuido de personal stylist

"Foi bonita a festa, pá/ Fiquei contente/ Ainda guardo renitente/ Um velho cravo para mim/ Já murcharam tua festa, pá/ Mas certamente/ Esqueceram uma semente/ Nalgum canto de jardim/ Sei que há léguas a nos separar/ Tanto mar, tanto mar/ Sei, também, quanto é preciso, pá/ Navegar, navegar/ Canta primavera, pá/ Cá estou carente/ Manda novamente/ Algum cheirinho de alecrim". Ao assistir às cerimônias realizadas nesta quarta-feira, para comemorar a derrota da tentativa de golpe do 8 de janeiro de 2023, no Palácio do Planalto, lembrei-me da letra de Tanto Mar, de Chico Buarque, sobre a Revolução dos Cravos, que resultou do colapso do colonialismo português e pôs abaixo a ditadura salazarista, em 25 de abril de 1964.

Seu impacto no Brasil se traduziu também na ampla mobilização política da oposição brasileira nas eleições de novembro daquele ano, que levou o MDB à espetacular vitória eleitoral, o que abalou o regime militar, já desgastado e com fissuras aparentes. Nessa época, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já era dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. No ano seguinte, foi eleito presidente do sindicato e iniciaria sua trajetória de principal líder do "novo sindicalismo brasileiro". Lula ainda era avesso aos partidos políticos e nem sonhava em fundar o PT, o que só viria a acontecer em 10 de fevereiro de 1980, no governo Figueiredo.

Dos golpistas à tentativa de golpe - Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

O sabichonismo político tenta nos acalmar enquanto a democracia pega fogo

Envelheceram mal as apostas de profetas da democracia risco-zero. Desde 2018, esse grupo de missionários tenta acalmar a cidadania brasileira sobre riscos à democracia, entendida como máquina de contagem de votos independente de qualquer outro atributo que dê a esses votos um lastro genuíno de autogoverno coletivo e liberdade pública.

Desde avaliação da personalidade de Bolsonaro, tarefa que a ciência política nunca autorizou politólogo a fazer em nome dela, ou da afirmação de que "democracia modera", conclusão a que a história política nunca permitiu chegar em nome dela, ou da sacada de que Moro seria um "dique" ao presidente, até a máxima da catatonia analítica "instituições estão funcionando", foram muitas tentativas de apaziguar o "alarmismo".

Sempre equivocadas, o tempo as transformou em caricatas. De golpistas na Presidência à tentativa de golpe e plano de assassinato, os alertas de risco não eram tão extravagantes e clarividentes assim.

A psicanálise foi mais realista e arguta. O psicanalista Luiz Meyer, na Folha de junho de 2020 ("Por que haverá golpe"), antecipava tentativa de golpe não como dúvida de cientista político mergulhado em planilha de dados, mas como determinação psíquica inexorável. Não tratava do golpe como hipótese, nem tinha a ambição sabichona de cálculo de riscos. Quis apenas explicar por que o ímpeto golpista não era brincadeira:

A hora da memória e o momento da justiça - Bruno Boghossian

Folha de S. Paulo

Investigação e punição por tentativa de golpe são mais importantes que cerimônias

A cerimônia que marcou os dois anos dos ataques de 8 de janeiro conferiu à lembrança do golpismo um ar corriqueiro. Os atos organizados pelo governo Lula produziram símbolos já esperados, discursos sem muita surpresa e mensagens que se tornaram óbvias. Nem mesmo as ausências, queixas e manifestações de incômodo causaram espanto.

A memória não depende de pirotecnia para servir como ferramenta de acerto de contas de uma sociedade com seu passado. A tarefa coletiva de evitar retrocessos exige basicamente que as ameaças e violações que marcam a história sejam reconhecidas de maneira mais ou menos consensual e resistam a tentativas de distorção e relativização.

Segurança, prioridade esquecida - Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Regras constitucionais inadequadas e visões opostas sobre o assunto vêm bloqueando os necessários avanços

segurança pública é o grande fracasso do sistema democrático que se construiu sob a égide da Constituição de 1988. Nos 36 anos desde a sua promulgação, o país promoveu profundas reformas no sistema de proteção social. Elas permitiram a universalização da atenção primária em saúde por meio do SUS; o acesso à educação básica para todos —além da ampliação do ensino médio e do ensino superior; a existência de um conjunto robusto de políticas assistenciais organizadas no Suas (Sistema Único de Assistência Social), ancoradas no Bolsa Família e no BPC (Benefício de Prestação Continuada).

Com Zuck e Musk na coleira, mentiroso Trump late para o mundo - Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Em pronunciamento patético, dono da Meta ajoelha e reza para o novo presidente americano e abole checagem factual

Numa patética declaração de sabujice e oportunismo, Mark Zuckerberg ajoelhou e rezou para Donald Trump, o novo presidente CEO dos Estados Unidos, conhecido mentiroso serial.

O anúncio da reviravolta na política de moderação de conteúdos na Meta, dona do Facebook e do Instagram, não pareceu ter nada a ver com convicções e princípios. Foi uma rendição governista em defesa de seus bilhões, o que diz muito sobre a situação da comunicação de massas em nossos tempos de big techs e pós-verdades.

A declaração fez lembrar aqueles vídeos gravados à força por ativistas "arrependidos", com uma arma fora de cena apontada para sua testa. É bastante preocupante que o arrependido tenha citado um suposto consenso de ideias na América e aceitado docilmente a coleira de Trump para latir com o pitbull louro contra o mundo, especialmente o ocidental.

Em sua defesa da desinformação, com sórdida manipulação de estereótipos, o famoso Zuck considerou que o governo americano é o único defensor da liberdade de expressão, em contraste com a Europa reguladora e com a América Latina e seus "tribunais secretos" a ameaçar o "free-speech".

O que ela queria ser quando crescesse - Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Aos 10 anos, em 1976, Fernanda Torres já sabia tudo e até o tipo de filme que preferia

Há 49 anos, em janeiro de 1976, a repórter de uma revista perguntou a Fernanda Torres, filha de Fernanda Montenegro e Fernando Torres: "O que você quer ser quando crescer?". A pergunta fazia sentido: Fernanda tinha 10 anos.

"As meninas da minha idade querem trabalhar na televisão, porque acham bonito. Eu não", ela respondeu. "Eu gosto mesmo é de teatro, e sei muito bem como é. Assisto sempre aos ensaios da mamãe, fico um tempão vendo todo mundo decorando os papéis. E nunca me chateio. Também faço teatrinho no colégio, nas aulas de criatividade. Mas não gosto de teatro infantil, por isso só vou ser atriz quando crescer."

Reordenamento dos Velhos Centros das Cidades - Cláudio Carraly

Revitalização, Qualificação e Sustentabilidade Econômica

Os centros das capitais brasileiras, em grande parte edificados durante as décadas de 1960 e 1970, refletem hoje um paradoxo urbano, projetados para atender às necessidades de uma época marcada pelo crescimento acelerado e pela modernização das cidades, esses espaços, que já foram o epicentro do comércio, da vida cultural e do cotidiano urbano, hoje enfrentam desafios complexos como degradação física, obsolescência da infraestrutura, esvaziamento populacional e migração de empresas para outras áreas da cidade. Para transformar os centros das cidades brasileiras em áreas revitalizadas, qualificadas e economicamente sustentáveis, é necessário adotar uma abordagem inovadora e integrada que vá além das soluções tradicionais.

Os centros das capitais brasileiras passaram por um processo de expansão e verticalização no passado, em um período de intensas transformações urbanas marcadas pelo desenvolvimentismo e pela industrialização. Porém, essas áreas, que inicialmente concentravam serviços, comércios e atividades culturais, começaram a enfrentar um processo de degradação e esvaziamento a partir das décadas seguintes, a expansão das cidades em direção às periferias, o aumento do uso de automóveis particulares, a construção de shoppings, mudanças de hábitos de consumo afastaram a população dos antigos centros.