quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Efeitos da crise


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO

NOVA YORK. O movimento do candidato republicano John McCain, de colocar a solução da crise financeira como prioritária em relação à campanha presidencial, foi sem dúvida inteligente, embora o que interesse mesmo ao senador seja ganhar fôlego para tentar recuperar os pontos perdidos nos últimos dias nas pesquisas de opinião. Como nada mudou de uma semana para cá, a não ser os números das pesquisas, que agora dão a vitória de Barack Obama por até nove pontos percentuais de diferença, o que McCain quer com a proposta de adiar o debate, e os dois candidatos se integrarem aos congressistas que estão tentando um acordo em Washington com o governo, é dar a seu gesto um tom quase heróico, colocando-o como o líder que assume a responsabilidade quando o momento exige.


Adiantando-se a Obama em público, McCain tenta dar a sensação de que está mais preparado para enfrentar as emergências. Abrindo mão da campanha para participar das negociações, ele quer parecer o candidato mais aberto para os problemas do país, o que não usa as dificuldades para fazer politicagem.


É uma maneira inteligente de fazer politicagem, pois foi a partir de um telefonema de Obama, sugerindo que os dois fizessem uma declaração conjunta sobre a situação atual da economia, que McCain contrapropôs o adiamento do debate e a ida de ambos para Washington.


A campanha de Obama ainda marca a posição de que é possível fazer as duas coisas, participar das negociações e debater na Universidade do Mississippi, mas, como acontece desde o início da crise, o fato é que o democrata não tem conseguido ser pró-ativo, limitando-se a um discurso que pode ser resumido como "eu não disse?".


Sua dianteira nas pesquisas deve-se muito mais ao impacto da crise econômica na decisão dos eleitores do que a seus méritos próprios. Obama hoje, quando 83% dos eleitores consideram que o país está no rumo errado, é a opção automática. A tentativa de adiar o debate, se vista como uma demonstração de fraqueza, pode dar a Obama a chance de colocar-se na dianteira.


As bancadas dos democratas na Câmara e no Senado têm tido uma participação agressiva nos debates do Congresso em Washington, e partiu delas a definição de que o pacote apresentado pelo secretário do Tesouro, Henry Paulson, e pelo presidente do Banco Central americano (Federal Reserve), Ben Bernanke, não poderia ser aprovado do jeito que chegou ao Congresso.


Há uma convicção generalizada nos meios políticos e financeiros de que os dois jogaram errado ao tentarem fazer com que o Congresso engolisse o pacote sem uma negociação, esquecendo-se de que, em meio a uma campanha eleitoral, é praticamente impossível obrigar candidatos à eleição dentro de quarenta dias a aprovarem medidas impopulares, num pacote que não tem o consenso no meio econômico.


O único consenso é que alguma coisa precisa ser feita, e o pacote do governo americano pode ser o mais próximo do que é preciso fazer, mas tem muitos defeitos que precisam ser pelo menos amenizados. Há, é certo, o perigo de que o período eleitoral exacerbe o populismo econômico, que tem sido a marca dos democratas nas últimas eleições e que foi responsável por colocá-los com a maioria no Congresso.


Mas, até mesmo o republicano McCain está aderindo a esse estilo, tentando livrar-se da sombra da administração George W. Bush. O temor é que o ambiente político, que reflete o ânimo da opinião pública, de repúdio aos "especuladores" de Wall Street, leve a decisões de curto prazo equivocadas e que prejudiquem o funcionamento do sistema financeiro americano a longo prazo.


Aplacar a raiva do contribuinte com uma contenção excessiva dos salários dos executivos financeiros pode fazer com que o pacote de salvação se torne inviável. O problema é definir o que é excessivo, o que merece ser punido, como deve ser regulado o futuro sistema financeiro para que tenha eficiência e gere prosperidade, sem os níveis de irresponsabilidade que estavam sendo tolerados em Wall Street.


O ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que está em Nova York para uma série de contatos, continua espantado com o que está surgindo: "A cada vez que se vê de mais perto, pior parece a situação", comentava ele ontem.


A imagem que usa é a de um paciente na sala de cirurgia, de peito aberto, à espera da operação salvadora que não começa. O pacote proposto pelo governo seria essa intervenção para salvar o paciente na UTI, e, quanto mais demora a ser aprovado, mais se reduz a possibilidade de salvar o paciente.


Armínio acha que não aprovar o pacote seria "uma irresponsabilidade", e considera que a entrada nas negociações dos dois candidatos a presidente é uma medida acertada, pois quem vencer a eleição de 4 de novembro terá pela frente um mandato tumultuado pelas conseqüências do aumento do déficit público.


Armínio Fraga fez um paralelo com a situação brasileira em 2002, na campanha presidencial em que Lula foi eleito, ressalvando que naquele momento havia, além dos problemas de crédito do país, mais uma percepção negativa diante da provável vitória de Lula do que os graves problemas que hoje enfrenta a economia americana.


Com relação ao Brasil, o ex-presidente do Banco Central é otimista, considerando que a gestão de Henrique Meirelles está fazendo um trabalho de controle da inflação fundamental, compensando a tendência gastadora do governo central.


Se o pacote do governo americano conseguir colocar um pouco de ordem no sistema financeiro, e se nós no Brasil não forçarmos a barra para manter um crescimento forte no ano que vem, é possível que já em 2010 as coisas voltem ao eixo normal, avalia Armínio Fraga.

Uma vitória dos eleitores


DEU NO JORNAL DO BRASIL


Jornal do Brasil promove encontro isento e livre com os candidatos a prefeito para confrontar suas idéias

A frente fria se foi. Especialmente a que en- regelava o clima político da campanha eleitoral para prefeito do Rio. O debate realizado ontem pelo Jornal do Brasil esquentou, enfim, a temperatura das eleições municipais 2008 ­ em experiência histórica de confronto de idéias e de propostas entre os dez candidatos à frente nas pesquisas, por ordem alfabética, Alessandro Molon (PT); Chico Alencar (PSOL), Eduardo Paes (PMDB); Fernando Gabeira (PV); Filipe Pereira (PSC);Jandira Feghali (PCdoB); Marcelo Crivella (PRB); Paulo Ramos (PDT); Solange Amaral (DEM); Vinicius Cordeiro (PTdoB).

O espaço isento e eminentemente democrático foi aberto no salão principal da Casa Brasil, sede do JB , no Rio Comprido. Entre as paredes do casarão colonial, vigorou a atmosfera ideal para a liberdade de expressão tanto dos políticos em disputa como para os jornalistas de veículos do Rio, do país e do mundo ­ estes contemplados com perguntas no primeiro bloco do debate. No segundo, foi a vez dos representantes da sociedade civil. No primeiro caso, equipes de todos os grandes jornais e sites do Rio, assim como de correspondentes europeus de veículos como o Le Monde, marcaram presença.

Também formularam questões aos postulantes à gestão municipal titulares da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), da Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio), da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav-Rio), da Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro (FamRio), do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), do Viva Rio e do Rio de Paz ­ convidados para corroborar a isenção que carateriza o JB. O próprio modelo proposto para a realização do debate ­ mediado pelo editor-chefe Tales Faria e pelo editor executivo Marcelo Ambrósio ­ favoreceu a multiplicidade de temas em discussão.

Houve ao todo 10 calorosos embates diretos entre os próprios candidatos, no terceiro e mais esperado dos blocos, no qual cada adversário pôde destinar perguntas a outro, ambos com os nomes definidos em sorteio, com direito a revides de cada parte, 20 ao todo. Houve provocações e acusações mútuas ­ como não poderia deixar de ser ­ mas tudo no nível da cordialidade, respeito e de um modo que proporcionou um confronto amplo e aprofundado de idéias e opiniões diversas, assim como de pelo menos 15 temas diretamente relacionados ao destino da cidade e aos interesses da população.

A campanha municipal não será a mesma depois do debate promovido pelo jornal ­ o primeiro e único de um meio de comunicação antes do primeiro turno. Esta corrida eleitoral, durante a maior parte do tempo, foi ofuscada por discussões relacionadas à própria garantia da segurança e da ordem do processo eleitoral. O JB foi o primeiro a denunciar os efeitos de práticas criminosas em currais eleitorais do tráfico de drogas e de milícias.

Assim como o JB também pode se orgulhar, após o evento de ontem ­ transmitido pela internet durante quatro horas sem qualquer interrupção, com internautas acompanhando do México, dos Estados Unidos e até do Japão ­ de ter sido o pioneiro no resgate da essência política do debate eleitoral. Como disse o diretor-geral Marcos Troyjo ao final do encontro, o JB agora convida os (e)leitores a se preparar, por meio deste caderno, para votar mais conscientes no pleito do dia 5 de outubro.

Elegância até para a hora do pinga-fogo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Momento mais aguardado do encontro entre os candidatos, o confronto direto foi marcado por insinuações, acusações veladas e embate de idéias em um tom de cordialidade

Quem acompanha os deba- tes entre candidatos a cargos eletivos pela televisão não imagina que seja possível enfrentar uma disputa como a que envolve a prefeitura do Rio sem partir para a discussão feroz com os oponentes. No encontro no JB , porém, o antagonismo das opiniões e propostas só se revelou no momento em que os candidatos puderam partir para o confronto direto, no terceiro bloco.

Fora dos microfones, o clima foi de cordialidade e bom humor. Solange Amaral, por exemplo, cochichou ao ouvido de Marcelo Crivella, e um jornalista que estava próximo jura que, quando se separaram, ela disse a ele: ­ Tá bem, então sobre isso eu não pergunto. Questionada pelo repórter, a candidata do DEM desconversou: ­ Você é muito observador, heim...

Fernando Gabeira, Chico Alencar e Alessandro Molon brincavam que já estavam cansados de tanto se encontrarem em debates. Uma brincadeira que soava como provocação a Eduardo Paes, partici-pante bissexto nesse tipo de evento por ser o líder nas pesquisas.

Chico chegou fazendo o sinal de vitória com os dedos. Gabeira repetiu o gesto; e Jandira Feghali, idem. Sobraram beijinhos e brincadeiras, extensivas até aos assessores, que também já se conhecem de outros debates.

O curioso era ver como políticos de matizes ideológicas tão diferentes se cumprimentavam com tanto carinho. Chico Alencar e Crivella, por exemplo.

Só Filipe Pereira e Vinícius Cordeiro pareciam tímidos diante de tal intimidade entre os adversários.

A trégua foi suspensa no terceiro bloco, quando a regra previa que os candidatos perguntassem uns aos outros. Mas, apesar da troca de acusações, no fim todos se cumprimentaram. Solange, inclusive, ganhou um beijo de Paulo Ramos. E ambos garantiram que, caso passem, ao segundo turno, voltarão ao JB para um novo debate, já anunciado pelo jornal.

Ataque à homofobia acaba virando crítica à Cidade da Música

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Um último e ácido embate. As- sim pode ser definido o confronto entre a candidata Solange Amaral (DEM) e o bispo da Universal Marcelo Crivella (PRB). Ao contrário de todos os outros participantes, a pupila do alcaide Cesar Maia foi a única que tirou da cartola o dever de casa: o artigo do senador "Perigo para as famílias", publicado em novembro do ano passado, onde Crivella defende o direito de poder declarar que não gosta de algumas posturas de homossexuais e, por isso, é contrário ao PLC 122/2006, que tramita no Senado e já foi aprovado na Câmara dos Deputados, que criminaliza a homofobia.

Ao fim do artigo, o bispo convida a população a ir para as ruas protestar caso o projeto seja aprovado e sancionado pelo presidente Lula. ­ Engenheiro, bispo da Igreja Universal. Marcello Crivella, o senhor quer ser prefeito do Rio de Janeiro e diz que vai chamar o povo pra ir às ruas pra se opor. Vai chamar a população e dizer que devemos ir às ruas? Dizer que vai às ruas protestar por uma Lei que a Câmara aprovou. Queria ouví-lo sobre isso. Fiquei impressionada ­ diz Solange.

A resposta de Marcelo Crivella foi seca, imediata e provocou risos. ­ Continue impressionada. Eu falei do PLC 122 do Senado, que é uma excrescência. O Célio Borja já se manifestou sobre isso e diversos juristas porque fere direitos que antecedem até a lei civil. Sobrepõe o direito à liberdade de expressão. Ninguém pode ter no país a obrigação de concordar que não se pode criticar o homossexualismo.

Com o tradicional tom de voz baixo e calmo, completou: ­ Não falo do homossexual, mas do homossexualismo. Não acho que este seja o melhor caminho para o ser humano. Tenho minha consciência pautada pelos princípios cristãos de que este não é o melhor caminho para o ser humano. Falo como pai.

Surpresa, Solange não conseguiu desconstruir o discurso do bispo e insistiu ser o mais importante no artigo o fato de ele ter convocado a população para ir às ruas. Na tréplica, Crivella alfinetou Cesar Maia. ­

Grave é deixar de fazer política pública. Ao invés de se preocupar com a educação das crianças, com a dengue, de fazer um projeto que contenha a favelização, construímos a Cidade da Música com um custo altíssimo e atravessamos a rua e o Lourenço Jorge está em péssimas condições. O debate aqui não passa pelo tema que a senhora levantou.

Ironia com a pergunta alheia, bate-bola sobre habitação

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Ambos têm razão nas acu- sações recíprocas ­ começou o pedetista Paulo Ramos, referindo-se às farpas trocadas por Marcelo Crivella e Eduardo Paes sobre financiamentos de campanha, na pergunta anterior. A intervenção arrancou risos da platéia antes que Ramos respondesse quais seriam suas propostas para ampliar as ofertas de emprego e melhorar a renda da população carioca, pergunta do petista Alessando Molon. ­

As alianças determinam as condições de gestão. E o poder econômico compra a consciência política. Para que prevaleça o interesse público, é fundamental que não hajam contratos com empresários. Voltando ao tema proposto, Paulo Ramos disse que uma boa solução para gerar emprego, principalmente nas comunidades carentes, é melhorar a política de habitação: ­ Favela não é solução urbana. Resolver o problema da habitação sem remover pessoas, mas construir novas casas no mesmo lugar é uma alternativa que pode gerar emprego e renda. Ávido para mostrar suas idéias, Molon aproveitou o tempo que tinha para questionar as proposições do adversário.

Aproveitou para apresentar em 30 segundos, seu plano de governo para um tema que ele mesmo levantara: ­ Eu vou apostar nas vocações da cidade para geração de emprego e renda. Vou investir na produção do conhecimento e revitalizar a Zona Portuária, com a construção de um centro de convenções.

Privatização de hospitais se torna o pivô de provocações

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Quem deu a largada na série de perguntas entre os candidatos foi Jandira Feghali (PCdoB). Defensora de debates, principalmente na televisão, a candidata comunista não se fez de rogada e pegou pesado com o adversário Fernando Gabeira (PV). Com o discurso familiar e repetitivo de que é mulher, mãe e médica que trabalhou por 15 anos nos hospitais públicos do Rio, Jandira questionou se Gabeira pretende privatizar os hospitais públicos, a exemplo do ex-governador Marcello Alencar (PSDB), que hoje o apóia. ­ É difícil responder uma pergunta referente a uma outra pessoa tanto tempo depois, mas vou respondê-la dissociada da pequena malícia política da candidata ­ esquivou-se Gabeira, provocando risos na platéia.

Gestores nos hospitais

O candidato verde respondeu que instituições filantrópicas podem, sim, gerir unidades de saúde, como em São Paulo. ­ Sou favorável, ainda que gestores, em vez de médicos, administrem os hospitais ­ acrescentou Gabeira. Não satisfeita com a resposta do candidato e ansiosa por um momento de embate e um clima mais polêmico, Jandira, sem papas na língua, disse que as alianças mostram as condições de gestão do futuro prefeito e questionou a influência do PSDB na sua participação: ­ Eu tenho medo do que pode acontecer porque, para mim, Marcello Alencar foi o pior governador que o Rio já teve.

Sem alterar o tom de voz ­ como de costume ­ Gabeira revidou o ataque da candidata sem perder a compostura. ­ Parece que você, Jandira, não está tendo tempo de acompanhar a nossa campanha e de ler os jornais com tranqüilidade ­ alfinetou. ­ Desde o início, meu discurso é de que os partidos não vão ocupar nenhuma estrutura administrativa da prefeitura. Ao contrário de Jandira ­ que faz questão de destacar as diferenças entre os candidatos ­ Gabeira adotou um discurso politicamente correto e uma postura de não agressão aos demais candidatos. ­ Não é uma pessoa ou um governo que vão conseguir solucionar os problemas dessa cidade. Temos que criar uma frente ­ concluiu Gabeira.

Contratação sem concurso público vira telhado de vidro

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Na sua vez de pôr um dos ad- versários contra a parede, o candidato Filipe Pereira (PSC) foi sorteado para fazer uma pergunta a Eduardo Paes (PMDB). Pereira cobrou o ingresso de pessoal sem concurso público para as Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) 24 Horas, cobrando "a falta de valorização do funcionário público, tendo em vista a contratação de médicos terceirizados para trabalhar nas UPAs". Para Filipe, a política do governo do Estado para o setor está sendo trazida para o município: "Preocupa saber que o servidor público se vê frente ao governo, que prioriza novos funcionários a outros que estão há 25 anos na folha de pagamento", afirmou.

Na resposta, Paes defendeu o governador Sérgio Cabral (PMDB) e anunciou a boa nova: ­ Foi feito concurso público e os médicos que passaram assumirão em 1º de outubro. Todos os funcionários das UPAs passam a ser concursados ­ disse o candidato. O peemedebista reforçou, ainda, que a saúde será uma prioridade em seu mandato. ­ As pessoas estão morrendo e é por isso que a prioridade será a saúde, começando pela atenção básica com Programa de Saúde da Família para todas as comunidades, com os postos de saúde abrindo mais cedo e fechando mais tarde. Vamos fazer 40 UPAs 24 horas. Trouxe este projeto para a minha candidatura e o presidente Lula vai levar para todo o Brasil 500 UPAs.

Recursos cada vez mais parcos na cultura carioca

DEU NO JORNAL DO BRASIL

O debate, que começou com uma pergunta sobre cultura, terminou com acusações a candidatos que recebem dinheiro de grandes empresas para financiamento de campanha e a outros que fazem alianças com políticos que até mesmo estão presos. Com tom de voz exaltado, o candidato Vinícius Cordeiro (PTdoB) perguntou ao professor Chico Alencar (PSOL) quais seriam suas propostas para investir na cultura, já que, segundo dados apresentados por Vinícius, a prefeitura diminuiu os investimentos. Em 2004, foram investidos R$ 240 milhões e em 2007, o investimento chegou a "míseros" R$ 65 milhões.

A cultura é vista como um gasto para a cidade quando pode ser um atrativo, um grande investimento ­ ressaltou Vinícius. Chico apontou a desigualdade dos equipamentos culturais como uma das causas do abismo social: ­ Oitenta e cinco por cento dos equipamentos culturais do Rio estão concentrados na Zona Sul da cidade, onde vive apenas 25% da população ­ ressaltou Chico. ­ Existe carência em algumas áreas, inclusive de bibliotecas públicas, inclusive na Zona Oeste, porque não é interessante para algumas empreiteiras. Estas que financiam algumas campanhas. Vinícius tentou trazer o deputado federal para o debate cultural, mas não teve sucesso. Chico continuou com o discurso político: ­ A população precisa entender quem é quem. A criminalidade está em um processo acelerado de captura das instituições republicanas. Tem até candidata a vereadora do presa, a Carminha Jerominho do PTdoB, com chances de ser eleita.

Embate entre Estado e prefeitura

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Falta de saneamento básico na Zona Oeste acabou respingando na construção das UPAs

Este foi o debate entre os gran- des: aquele que representa o governador Sérgio Cabral, o peemedebista Eduardo Paes, e a candidata do prefeito Cesar Maia, Solange Amaral (DEM). O tema: saneamento. Mas, empolgados com o rumo da saúde pública, partiram para críticas e defesas das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).

Antes de rumar para a discussão da eficiência ou não dos postos de saúde, Eduardo Paes indagou a Solange quais seriam seus projetos para melhorar o saneamento na Zona Oeste já que, devido a um acordo com a Cedae, o tema virou responsabilidade da prefeitura. Orgulhosa de Maia, Solange contou que a atual administração faz obras de esgotamento sanitário em 380 ruas de Sepetiba. ­ A prefeitura está cuidando da Zona Oeste, coisa que a Cedae nunca fez, desde a sua fundação ­ criticou a deputada federal. ­ A Cedae só atua depois que o cano fura e o buraco aparece.

UPA e Lula

Farpas à parte, os candidatos concordaram em um ponto: saneamento é questão de saúde. Por isso, Paes cobrou da atual administração municipal mais atenção à saúde básica e investimentos na prevenção de doenças. ­ As pessoas estão morrendo e é por isso que a prioridade da nossa administração vai ser a saúde, começando pela atenção básica com o Programa Saúde da Família para todas as comunidades ­ prometeu. Na réplica, Solange, questionou o que classifica como péssimo sistema estadual de saúde e o modelo das UPAs, principalmente pela falta de licitação na construção das estruturas e de concurso para os funcionários públicos. ­ Onze hospitais são de responsabilidade do Estado.

Um já foi fechado este ano: o Hospital do Caju. Na tréplica, para fortalecer os argumentos daquela que é hoje sua principal proposta para a saúde, as UPAs, Paes citou a ampliação do projeto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: ­ Eu trouxe esse projeto para a minha candidatura e o presidente Lula vai levar para todo Brasil. Nesses postos, o custo do atendimento por paciente é muito menor do que o dos postos da prefeitura, que mal funcionam. A partir de janeiro, se vencer, vamos ter prefeitura, governo do Estado e Federal trabalhando juntos. Isso não é proposta, é conceito. A prefeitura e governo do Estado não podem ser trincheira política.

Financiamento de campanha e uso da máquina no alvo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Chico Alencar (PSOL) não aliviou a companheira de esquerda Jandira Feghali (PCdoB) durante o debate. Apesar de dar espaço para a candidata comunista desferir ataques aos adversários e à política de segurança do governo com uma pergunta sobre o papel dos partidos na seleção dos candidatos, Chico Alencar apertou-lhe o calo com outra sobre financiamento público.

Para acabar com o vínculo entre crime e política, Jandira Feghali sugeriu que os partidos escolham melhor aqueles que entram em suas fileiras. ­ Tráfico tem no mundo inteiro; milícia só no Brasil. Qualquer criança sabe quem é o chefe da milícia em sua comunidade. Só a polícia não sabe? Isso se deve a um déficit institucional ­ disse. A política de combate ao crime também foi alvo de crítica da candidata do PCdoB.

Ela considera que se faz apenas a criminalização dos pobres e da pobreza, e que o governo não prepara a polícia militar e nem a pune quando ela erra por causa do despreparo. ­ E ainda havia aquele discurso de que milícia era um mal menor. Seqüestraram e torturaram jornalistas e ainda não houve punição. Essas prisões que fizeram de Carminha e de Jerominho é puro marketing eleitoral ­ acusou Jandira, acrescentando que o governo permite a expansão das milícias.

Financiamento cidadão

Quanto ao financiamento pú- blico, chamado de cidadão por Chico Alencar, Solange disse que pretende lutar para que a lei que o institui seja aprovada. Embora tenha afirmado não ter preconceito contra doações do setor empresarial. ­ Temos compromissos com a cidade e não com as empresas ­ afirmou Jandira Feghali. As baterias da candidata também se voltaram contra as campanhas que ela julga milionárias. Acusou, sem citar nomes, um dos candidatos de ter muito dinheiro para gastar em material de propaganda e de, ainda assim, usar a máquina do governo. Disse que as somas astronômicas investidas podem ter alguma influência sobre o resultado das urnas, mas que não levará o candidato à prefeitura. ­

Vencerá o candidato que conseguir a adesão popular. Nunca mudei de partido ­ afirmou. Em sua réplica, Chico Alencar criticou a posição de Jandira Feghali sobre o financiamento de campanha. Argumentou que haviam empresas cujas atuações são contrárias aos interesses da cidade, sim, e das quais não se pode aceitar doações para a campanha.

De tudo um pouco: milícia e até Estado laico

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Sorteado para confrontar Vinícius Cordeiro (PTdoB) e sem intimidade com os principais pontos de governo de seu oponente, o candidato Paulo Ramos (PDT) escolheu o tema religião. Ele quis saber o que Vinícius acha da intolerância religiosa, mas aproveitou para atacar, mesmo que indiretamente o bispo Marcelo Crivella (PRB) e Eduardo Paes (PMDB): ­ De um lado afirmam que uma corrente evangélica se transforma em partido político. Por outro lado, temos um cardeal do Rio trazendo um documento do Papa para um candidato. Como você vê esta questão da intolerância religiosa? Com um tom de voz elevado e firme, Vinícius agradeceu à pergunta para falar um pouco sobre sua trajetória de vida: ­ Bom você me perguntar isso porque sou membro da Igreja Batista há 28 anos. Milito em organizações de justiça e paz.

Combato a corrupção eleitoral. Já cassei prefeito e não aceito a pecha de ser associado a este negócio de milícia ou criminalidade ­ aproveitou para se defender da acusação de Chico Alencar (PSOL) de que o partido de Vinícius tem em seus quadros Carminha Jerominho, candidata a vereadora que está presa por envolvimento com a milícia da Zona Oeste, e foi buscar no Sul do país um motivo para criticar o adversário que sequer participava da rodada de perguntas: ­ Chico é católico, vai até regularmente à missa. Gosto muito de você Chico, apesar do PSOL ter pego dinheiro lá em Porto Alegre de uma construtora. Sou a favor da separação entre Igreja e Estado. É um dos princípios mais caros do protestantismo histórico. Sou contra a aula de religião na escola.

Esquerda unida em bate-papo amigável sobre violência

DEU NO JORNAL DO BRASIL

A esquerda finalmente afinada. Assim foi o que deveria ser um embate entre os candidatos Fernando Gabeira (PV) e Alessandro Molon (PT). Os dois passaram quase sete minutos em uma conversa digna de amigos de infância. Seus pensamentos eram, digamos assim, complementares. De forma generosa, Gabeira perguntou a Molon sobre algo que já conhecia bem: "O que um prefeito realmente pode fazer para reduzir a violência no Rio de Janeiro, para aumentar a segurança pública do Rio". A afinidade era tamanha, que o petista gastou parte dos três minutos a que tinha direito para agradecer a pergunta. Só então explanou: ­ O conceito do nosso programa de governo é fazer do Rio uma cidade segura para todos. O Gabinete de Gestão Integrada Municipal é o meu primeiro compromisso. Não é possível que a Guarda Municipal vá para as ruas todas as manhãs sem saber para onde a PM está indo. Não existe integração.

É compromisso meu expandir a iluminação na cidade. A troca de lâmpadas queimadas tem de deixar de ser um favor do vereador. Muita gente, para desenturpir bueiro, conseguir poda de árvore e trocar lâmpada queimada, tem que pedir ao vereador. Essa relação fisiológica e suja da Câmara com a população e com o executivo vai mudar. Na réplica, Gabeira disse que "acrescentaria alguma coisa" e disparou sua crítica ao atual prefeito: ­ Temos baixo nível de inteligência, e a prefeitura pode contribuir porque tem acesso a câmeras e relatórios da Guarda Municipal ­ disse, antes de levantou, novamente, a bola para Molon cortar: ­ A interface com a cultura, que não é só levar o lazer, mas visa a paz, unir a cidade partida, essa cultura também merecia atenção, não acha? E a bola foi cortada de forma imediata: ­ Acho.

Concordo e acrescento as políticas para a juventude, que são os jovens no Rio os que mais matam e os que mais morrem, entre 15 e 24 anos. É inaceitável que a prefeitura não tenha proposta séria para a juventude. Por falta de escolha, muitos acabam cedendo à tentação do crime.

União para criticar a hegemonia do PMDB

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Marcelo Crivella (PRB) não pensou duas vezes ao decidir unir forças com Felipe Pereira (PSC) para criticar o PMDB. Os dois são evangélicos, apesar de pertencerem a igrejas distintas. ­ Filipe, você não acha que o fato de o PMDB já ser governo do Estado, dominar a Assembléia Legislativa, o Tribunal de Contas do Estado e o do município é prejudicial? Me preocupa a falta de alternância política e a existência de um poder hegemônico. Filipe não desperdiçou a bola levantada por Crivella e tratou de dar seu recado. Disse que nenhum governante faz nada sozinho e até esnobou os concorrentes. ­ No meu governo, o critério será técnico. Não descarto a participação de nenhum de vocês no meu secretariado ­ afirmou. Crivella replicou que é preciso alertar os eleitores sobre os perigos de um partido dominar todas as esferas de poder. ­ Isso gera, inclusive, o uso da máquina nas campanhas e os gastos milionários que estamos vendo. Felipe completou que a hegemonia partidária se transformou numa espécie de desfalque que o cidadão fluminense tem sofrido: ­ É preciso alertar para essa concentração de poder.

A voz e a vez da sociedade organizada se manifestar

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Uma das instituições no encontro, OAB vai à Justiça por debate na TV

O segundo bloco do debate do Jornal do Brasil foi o momento em que representantes da sociedade civil deram voz aos clamores da população. O ponto alto do encontro foi a decisão do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio (OAB-RJ), Wadih Damous, de apresentar, até o fim do dia, um parecer na Justiça para pressionar as emissoras de TV a realizarem um novo debate. Damous, da OAB-RJ, lamentou também o papel da Justiça Eleitoral na eleição, que, ao criar "regras restritivas, praticamente anulou a democracia". Outro momento mais acalorado foi a interpelação da presidente da Federação das Associações de Moradores do Rio (FamRio), Márcia Vasconcelos, que criticou repetidamente a falta de contato com o atual prefeito da cidade, Cesar Maia.

Por causa da citação proibida ­ não poderia haver ofensas nem citações de candidatos ­ a candidata de Maia, Solange Amaral (DEM), obteve um direito de resposta bastante comemorado. Solange usou o tempo para defender o programa Favela-Bairro, do qual foi coordenadora, e para ressaltar a criação de um novo banco carioca nos moldes do extinto Banco Nacional de Habitação (BNH), com o intuito de construir 100 mil casas na cidade.


Sorteio prévio

Representantes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), da OAB-RJ, da Federação do Comércio Varejista do Rio (Fecomércio-Rio), das ONGs VivaRio, Rio de Paz, Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), da Associação Brasileira de Agências de Viagens do Rio (ABAV-RJ) e da FamRio interpelaram os candidatos, depois de um sorteio prévio, com questões que variaram, entre outras, sobre dengue, salário dos professores, carga tributária, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e segurança pública. O diretor cultural da ABI, Jesus Chediak, argumentou que, nos dias de hoje, "o candidato é visto como produto e o eleitor, como mercado", e para o petista Alessandro Molon, Chediak reservou pergunta sobre quais seriam as propostas dele para os professores. Molon disse que vai priorizar a estratégia de motivar o professor e os demais profissionais de educação, com aumento de salários e cursos de atualização. ­

Esse é um bom subsídio pedagógico para que o sistema funcione bem. É preciso resgatar também o papel dos inspetores, porque eles organizavam toda a escola relembrou. Questionado sobre as medidas preventivas para evitar uma nova epidemia de dengue, o senador Marcelo Crivella (PRB) ironizou uma citação do atual prefeito que, no auge da crise, tentou explicar o motivo de o município de Niterói ter sido "salvo" da epidemia e o Rio, não. ­ Niterói tem as mesmas condições climáticas que o Rio e não sofreu com a doença. Por isso, quero retomar o Programa Saúde da Família (PSF) para tratar preventivamente as doenças ­ ponderou. Um representante do empresariado fluminense, Orlando Diniz, presidente da Fecomércio-Rio, questionou o peemedebista Eduardo Paes sobre a excessiva carga tributária.

Este respondeu que a cidade tem uma postura hostil para com a atividade econômica. Na avaliação de Paes, a carga tributária elevada, a excessiva burocracia e a informalidade afastam os empresários e empreendedores da Cidade Maravilhosa. ­ Quero estimular áreas geográficas esquecidas na cidade, como a Leopoldina, incentivando empresas de telemarketing lá ­ sugeriu. A diretora do Ibase, Dulce Pandolfi, questionou Jandira Feghali (PCdoB) sobre o papel da prefeitura nas obras do PAC. Para Jandira, a responsabilidade dessas obras deve ser do município e não do Estado. A comunista pretende municipalizar o programa federal. Paulo Ramos, do PDT, criticou a política de segurança pública do governo do Estado: ­ Por causa da política de enfrentamento, a polícia fluminense é a que mais mata e morre no Rio.


Programa de artistas no Rio

Ricardo Miranda
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


Atores, cantores e dançarinos, conhecidos do público ou ainda anônimos, tentam vaga na Câmara de Vereadores com monólogos que duram no máximo 10 segundos no horário eleitoral do rádio e da TV

Se a capital fluminense, para muita gente, é sinônimo de artistas por todos os lados — nas ruas, nos bares, nas praias —, nada mais natural que, nas eleições municipais, esse universo de atores, cantores, compositores e dançarinos também desfile em busca do voto do eleitorado carioca. Eles já foram mais numerosos e mais relevantes, gente como Francisco Milani, Antonio Pitanga e Neuza Amaral, mas continuam tentando uma vaga na Câmara de Vereadores com monólogos que costumam durar, no máximo, 10 segundos no horário eleitoral gratuito.

“Pela política com arte”, é o que consegue dizer o ator Stepan Nercessian (PPS), presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão do Rio. Militante comunista, esse goiano de Cristalina não é novato nessa arena. Ele tenta a reeleição para vereador. Embora reconheça que o artista, por ser mais conhecido, já começa em vantagem, ele ressalva que muito pouca gente na “categoria” é realmente politizada e que as campanhas deixam todos à míngua, já que são obrigados a se “desincompatibilizar” de seu ganha-pão para obedecer a legislação eleitoral.

Para entrar na campanha, Stepan deixou um quadro no humorístico global Zorra Total e dispensou outros trabalhos, como o de protagonista do humorístico Faça Sua História, da Globo. “É a única profissão em que você precisa parar de trabalhar pra concorrer. Mas a gente vai levando”, conforma-se o ator, bem-humorado.
Na Globo, outra baixa foi o humorista Pedro Bismarck, intérprete do personagem Nerso da Capitinga, que deixou o mesmo Zorra Total porque é cabo eleitoral de um candidato.

Animais

Outro ator — e diretor, tradutor, autor e produtor — que tenta se reeleger vereador no Rio é Claudio Cavalcanti (DEM), cujo mote de campanha é o respeito aos animais e o slogan uma velha gíria, “É isso aí, bicho”, que soa mais como um trocadilho infame. Na propaganda eleitoral na TV, o vegetariano Cláudio surge na tela com um gato no ombro, um cãozinho na mão e a neta no colo, vestida de Branca de Neve (!). “Vou ser ator até morrer, essa é minha grande paixão. Mas tenho como missão de vida a defesa dos direitos dos animais. Só por isso me meti na política. Não sou político nato, com P maiúsculo. Sou assumidamente político de um tema só”, diz Cavalcanti, que tem em casa 26 animais, entre cachorros e gatos.

Já o humorista Castrinho tem circulado em eventos sociais pedindo votos, mas não para ele. A candidata da família é sua mulher, Andrea Loureiro do Valle, que adotou o “nome de urna” de Andrea Castrinho (DEM) e tem, entre suas propostas, seis meses de ônibus grátis para quem doar sangue. Artistas da velha guarda também estão presentes na campanha, como o sambista Noca da Portela (PSB), que, curiosamente, deixou o jingle de sua campanha para o neto, Diogo Pereira.

Na bancada de ilustres desconhecidos, mas reflexo dos nossos tempos, muitos MCs e DJs, como Saddam (PCdoB) e Tião Brasil (PDT), esse último auto-intitulado “o vereador do reggae” e defensor da “revolução rastafari”, seja lá o que isso signifique.

Itararé contrariado


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


A eleição municipal no Rio de Janeiro expõe todos os defeitos da política feita hoje na cidade que já foi capital e ainda é o cartão postal do Brasil: carência de lideranças de expressão nacional, adesismo governista em contraposição ao tradicional e salutar oposicionismo e, o mais grave, a infiltração da criminalidade no processo eleitoral.

Mas, no tocante às finanças das campanhas, desmente o Barão de Itararé mostrando que, às vezes, de onde menos se espera pode realmente sair algo que se aproveite.

Atrasada de um lado pelos motivos já citados, a eleição do Rio avança e dá o exemplo no quesito transparência. O jornal Valor em sua edição de ontem publicou a lista dos doadores de contribuições às campanhas dos sete candidatos, postas na internet bem antes do prazo exigido por lei, que é o fim da eleição.

Seis deles abriram os nomes dos contribuintes e as quantias ofertadas, cabendo a exceção ao senador Marcelo Crivella, o único a recorrer ao velho argumento de que o sigilo protege o doador do “constrangimento”. Revelou o nome de algumas empresas sem informar os valores doados por elas e ponderou que, assim, está “dentro da lei”.

O bispo, pelo visto, não entendeu o espírito da coisa. Não se trata de cumprir a lei aprovada dentro do possível permitido pela resistência do legislador - um coletor permanente. Trata-se, isso sim, de ultrapassar seus limites a fim de consolidar a melhor prática.

Isso não resolve o problema do caixa dois, evidentemente. Neste, nem o financiamento público dá jeito. Mas, convenhamos, não deixa de ser um alento ver os candidatos da cidade plataforma de lançamento das novidades no Brasil lançando a moda desse bom costume.

De uma vez só revisitam o pessimismo de Itararé, desmontam a consistência da alegação de “constrangimento”, reequilibram a balança até então pendente para o lado dos vexames e ainda dão um chega para lá no lema consagrado por Delúbio Soares em notória reunião do PT onde se discutiu a possibilidade de o partido pôr suas contas de campanha na internet já em 2004.

“Transparência assim é burrice”, pontificou o então tesoureiro do PT, decidindo assim a votação em prol da obscuridade. Meses depois, o PT viria a padecer por ter feito a escolha esperta, porém, equivocada.

Na ocasião, quem fez a proposta foi o ainda petista Chico Alencar, hoje candidato a prefeito pelo PSOL que lançou agora de novo a idéia com a imediata adesão do candidato do PV, Fernando Gabeira.

Fica posto o padrão e o divisor: transparência é uma coisa; burrice, outra bem diferente. Qualquer dúvida, cartas aos 40 do mensalão devem ser endereçadas ao Supremo Tribunal Federal.

Isonomia

Se o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco mantiver a cassação da candidatura do petista João da Costa à Prefeitura do Recife por abuso no uso da máquina administrativa, adversários dos protegidos por estruturas oficiais poderão buscar seus direitos na Justiça.

Base legal não lhes falta, visto que a infração da lei eleitoral no dispositivo que veta o uso da máquina corre de forma aberta País afora. Nas capitais e grandes cidades, com grande visibilidade e aceita com naturalidade.

O presidente da República põe a administração federal a serviço de seus preferidos; em São Paulo, Gilberto Kassab usa a prefeitura de forma desabrida; Márcio Lacerda, em Belo Horizonte, é carregado no andor das máquinas estadual e municipal; no Rio, o governo do Estado constrói Eduardo Paes e assim por diante, para citar só os casos mais vistosos.

Conforme a decisão sobre Recife, ou se reinstala a legalidade geral ou se locupletam todos.

Distância abissal

O Palácio do Planalto animou-se muito com os índices de Dilma Rousseff para 2010, registrados na última pesquisa CNT/Sensus. A variação entre 8% e 12% deixaria a ministra em condição semelhante à do candidato a prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, que saiu em último e, com o apoio do prefeito e do governador de Minas, disparou em primeiro.

Não é bem assim. Em Minas, além do eleitorado, Aécio Neves conta com a subserviência dos partidos, a simpatia da imprensa, a docilidade da Justiça, transita em ambiente acrítico. Mal comparando, o ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz era o rei de Brasília, elegeu-se senador e não resistiu a 15 minutos de exposição nacional. Renunciou.

Vale-tudo

No começo da campanha, Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab trocavam amabilidades reconhecendo mutuamente a “legitimidade” de suas candidaturas.

Agora se vê que o limite do “legítimo” localizava-se à beira do ringue onde ambos deixaram os floretes antes de subir armados de porretes.

O PSDB, o DEM e a antropofagia eleitoral


Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A vida do PSDB não está nada fácil. A briga do candidato tucano à prefeitura de São Paulo, Geraldo Alckmin, para chegar ao segundo turno das eleições a qualquer preço, está adicionando nome e sobrenome a uma crise de identidade séria, profunda e que poderá ter enormes repercussões nas alianças, nos compromissos e até nas chances eleitorais do partido nas eleições de 2010. Alckmin agrega ingredientes a essa crise, mas o simples fato de ele ter poder para isso já é um indicativo de que o PSDB vive grandes impasses.

Ao fim e ao cabo, Alckmin acabou sendo a expressão, a representação física de uma opção ideológica que obriga o PSDB, local ou nacionalmente, a se unir e ao mesmo tempo disputar poder com o DEM. A aliança entre o PSDB e o DEM ficou pouco funcional, visto que a unidade dos dois não significa agregar duas faixas de eleitores diferentes; a disputa entre o PSDB e o DEM tornou-se antropofágica.

O candidato tucano à prefeitura é um político que, perto das estrelas do partido, estaria fadado a permanecer nos limites da política paulista, em especial no interior do Estado, onde tem, de fato, um eleitorado para chamar de seu. Quanto mais o partido foi para o centro, todavia, mais atraiu Alckmin para o cenário nacional.

Não existem grandes diferenças ideológicas, ou táticas, entre Alckmin e os tucanos do PSDB nacional de hoje. Foram eles que ascenderam quando as estrelas do partido - os chamados cardeais - ocupavam governos estaduais para se credenciarem a postular a Presidência da República, ou se aposentavam (ocorreram as baixas também - as maiores foram a do governador Mário Covas e a do ministro Sérgio Motta). Foram eles que passaram a ocupar os postos de comando do partido quando o presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), numa coalizão às avessas, assumiu completamente o conservadorismo do parceiro PFL (hoje DEM), em vez de trazê-lo para o centro, e transferiu para o ministério quadros do PSDB que seriam vitais naquele momento para manter algum elo da estrutura burocrática tucana com a social-democracia.

A qualidade dos políticos que estão no comando partidário hoje não é muito superior à de Alckmin. Eles são o produto das mesmas opções feitas pelo partido quando estava no poder. Na oposição, em algum momento isso teria que repercutir no equilíbrio de poder interno. Era inevitável.

Com um perfil certamente menos cosmopolita e de menor preparo que outros quadros paulistas, ainda assim Alckmin expandiu a sua liderança no Estado - e de alguma forma foi estimulado pelo grupo que hoje se opõe a ele, certo de que o ex-governador manteria a mesma dobradinha que fez com Covas, em que um fazia política nacional, o outro política local. Os cardeais do partido, por horror a disputas internas ou por falta de entendimento do que representaria ceder a hegemonia a uma ala conservadora ideologicamente e afeita à política tradicional, abriu facilmente espaço para a expansão da liderança de Alckmin também a nível nacional. Hoje, qualquer marola do ex-governador no horário eleitoral gratuito, numa disputa local, tem repercussão nacional. O ex-governador, que faz política local, tornou-se, por inércia, uma personalidade nacional.

Quando era situação, o PSDB facilmente acomodava esses impasses ideológicos via política tradicional. Aliás, a guinada conservadora e a aliança com o PFL facilitavam isso. Na oposição, e principalmente na oposição a Lula, essa deixou de ser uma solução possível. O PSDB e o DEM, afinal, não estão no governo federal e não detêm a máquina que lhes permitiria operar essa política. Além do mais, a política tradicional está de cabeça para baixo, quer pela popularidade de Lula na população normalmente atraída pela política de compadrio - o que reduziu os espaços de influência especialmente do DEM no Nordeste -, quer pela política de complementação de renda, que tem desintermediado o voto do pobre. Fazer política tradicional nos Estados e municípios, nessa conjuntura, também não é muito fácil. Na população de maior renda e maior escolaridade, o PSDB e o DEM estão disputando voto a voto - isso é claro nas últimas pesquisas eleitorais da capital paulista. O impasse é claro: os quadros que estavam solidamente instalados na máquina burocrática do partido quando FHC deixou o poder não tinham vínculos orgânicos com a social-democracia, tinham um perfil ideológico e uma prática política assemelhados aos do PFL, e, uma vez destituídos da máquina de governo, não conseguiram fugir do modelo de oposição udenista.

Essa é a argamassa que modela o partido nesses seis anos de oposição. E não é à-toa que o PSDB não consegue se contrapor ideologicamente à popularidade de Lula. A oposição udenista é a oposição do discurso, do ataque pessoal, da manobra, da "onda de pânico". Uma das contra-indicações desse padrão de oposição é que o discurso do ataque pessoal torna-se padrão. E da cada vez maior semelhança ideológica com o DEM, é que, numa disputa eleitoral, não é possível diferenciar o discurso, já que os partidos não são diferentes. Prevalece, então, o ataque pessoal. Espera-se que, até 2010, o PSDB tenha resolvido esse impasse. Senão, será a nacionalização do bate-boca.


Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

Batalha no Rio: Vaticano X Igreja Universal


Milton Coelho da Graça

São 12 os candidatos à Prefeitura do Rio, representando mais de duas dezenas de partidos, mas há outra batalha eleitoral mais importante, que possivelmente será a decisiva.

Marcelo Crivella é candidato do PRB e mais dois pequenos partidos, mas é realmente o candidato do complexo religioso-empresarial-político chamadoIgreja Universal do Reino de Deus.

Crivella, número 2 na hierarquia da Universal, começou sua carreira política em 2002, elegendo-se Senador da República pelo Rio. Foi o segundo mais votado e Sérgio Cabral Filho, o primeiro.

Desde então a Arquidiocese do Rio tratou de empenhar-se nas eleições posteriores para evitar que uma maior influência da Igreja Universal a tornasse majoritária como força religiosa e política. Não consegui saber com certezase a Opus Dei recebeu determinação papal de ajudar esse trabalho em 2004 (nos últimos dias do primeiro turno mais de 300 paróquias se mobilizaram para votar em Cesar Maia para prefeito, que venceu com 50,1% dos votos, com Crivella em segundo lugar). Ou em 2006, quando Cabral se elegeu Governador, derrotando Denise Frossard no segundo turno, porque Denise havia deixado Crivella em terceiro lugar, graças a uma forte mobilização católica nos últimos dias de campanha.

Mas, na atual eleição municipal, a Opus Dei assumiu um papel mais vigoroso, articulando desde 2006 uma aliança. Também não foi possível determinar com certeza em que circunstâncias o governador Sérgio Cabral Filho escolheu Eduardo Paes como seu candidato para a Prefeitura do Rio e até arriscar uma exdrúxula edição do Diário Oficial do Estado, só para anunciar a exoneração dele da Secretaria de Esportes para cumprir o rito da desincompatibilização perante a Justiça . Mas tenho boa informação de que a influência da Opus Dei teve papel muito importante nessas decisões.

Eduardo Paes, dois anos atrás, teve apenas 5,3% dos votos para Governador (contra o próprio Sérgio). Os dois, até outubro de 2006, sempre estiveram em partidos diferentes e nunca manifestaram afinidade política. Só após essa eleição é que Paes se transferiu para o PMDB e Cabral só conseguiu impor o nome dele como candidato do partido depois de um enfrentamento contra Anthony Garotinho e o presidente da Alerj, Jorge Picciani, dominador absoluto do Comitê Estadual do partido. Também não pode se esquecer que, para apoiá-lo com tanta insistência, o Governador deve ter tido um trabalhão para amansar o ódio de Lula e de d. Marisa Letícia pelo deputado federal que tanto atazanou o casal presidencial e um dos filhos naquelas CPIs que tanta agitação fizeram na TV mas até hoje não deram em nada.

Para não haver dúvida de como a Opus Dei atuou fortemente nos bastidores, há menos de duas semanas do dia da eleição, em 20 de setembro, o Vaticano anunciou o envio de uma bênção que o Santo Padre havia dado a Eduardo Paes em outubro do ano passado. Um gesto primoroso, porque, além de Paes – que nunca teve militância católica ostensiva – dois outros candidatos a Prefeito têm essa característica em seu currículo: Alessandro Molon, eleito deputado estadual pela primeira vez, basicamente por sua visibilidade como militante carismático; e Chico Alencar, deputado federal amplamente apoiado pela eleitores católicos admiradores da Teologia da Libertação. Agora, é óbvio, ficou mais fácil explicar aos eleitores católicos em quem devem votar.

A Opus Dei também operou com muita habilidade conseguindo trazer para a candidatura Paes o discreto mas eficiente apoio de importantes lideranças empresariais cariocas, inclusive das Organizações Globo, que não poderiam aceitar uma vitória política desse porte – e logo no Rio - do complexo Rede Record-Igreja Universal.

Será engraçado se a estratégia da Opus Dei funcionar tão bem, tão bem, a ponto de Marcelo Crivella nem ir ao segundo turno. O prefeito Cesar Maia vem prevendo isso em seu ex-blog há várias semanas.

SAIBA MAIS AQUI SOBRE A OPUS DEI

Opus Dei significa Obra de Deus em latim e é o nome de uma organização católica, criada na Espanha em 1928 por Escrivá de Balaguer, (ainda era então um jovem de 26 anos, morreu em 1975 e foi canonizado em 2002). Escrivá a concebeu como uma brigada da fé cristã, formada por padres e leigos, pela preocupação, na década de 20 do século passado, com movimentos em favor de mudanças sociais e idéias republicanas na Espanha, além da tomada do poder pelos comunistas na Rússia.

Hoje com 85 mil membros em 63 países (no Brasil, cerca de 2 mil), dos quais 98% são leigos e uns 200 sacerdotes, a Opus Dei, em seus órgãos de divulgação, inclusive o site (www.opusdei.org.br), afirma que “sua missão consiste em difundir a mensagem de que o trabalho e as circunstâncias do dia-a-dia são ocasião de encontro com Deus, de serviço aos outros e de melhora da sociedade”, além de colaborar “com as igrejas locais, oferecendo meios de formação cristã (palestras, retiros, atenção sacerdotal), dirigidos a pessoas que desejam renovar sua vida espiritual e seu apostolado.” Também explica que “ajuda a encontrar Cristo no trabalho, na vida familiar e nas demais atividades cotidianas”.

Em 1982, o Papa João Paulo II deu uma nova dimensão à Opus Dei, dando-lhe
um status único – prelazia pessoal – em que não está subordinada a qualquer hierarquia católica local, mas sim diretamente ao Sumo Pontífice, através de um prelado nomeado como uma espécie de “executivo-chefe”. Esse “executivo” atualmente é monsenhor Javier Echeverría (o que, de certa forma, demonstra que a influência espanhola persiste).

A revista Veja, em reportagem de 17 de maio de 2006, motivada pelo livro “O código Da Vinci”, ficção de grande sucesso mundial em que um membro da Opus Dei é um assassino, deu outra versão sobre os propósitos da organização e assim explicou o privilégio de ligação direta com o Papa:

“Apoio incondicional a João Paulo II, na defesa dos dogmas e valores católicos ameaçados pela modernidade”. (...) “A idéia de Escrivá (...) era que qualquer católico poderia ser um santo no dia-a-dia, no exercício de sua profissão. Para tanto, não se admite nenhum meio-termo na obediência às orientações da Igreja. A prelazia é ortodoxa em sua condenação ao aborto e ao sexo pré-matrimonial. O perfil típico de seu integrante é um profissional com formação universitária.

“Embora a organização não goste de ser caracterizada como tal, ela é uma espécie de corpo de elite católico. É também uma força conservadora, com contornos de direita. Na Espanha de Escrivá, vários de seus membros foram ministros da ditadura de Francisco Franco.”

A Opus Dei nunca afirmou ser uma organização secreta, mas jornais italianos já divulgaram o que seriam trechos dos estatutos. recomendando que ninguém revele sua condição de membro nem a de companheiros. O respeitado tributarista Yves Gandra Martins, o professor de jornalismo Carlos Alberto di Franco e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alkmin já foram citados publicamente como ligados à organização. Mas, em entrevista à Folha de São Paulo, Alkmin negou: “Não sou da Opus Dei; respeito quem é, mas não conheço.”

ACABE O MAU HUMOR

Se v. quer rir à vontade, vá ao saite www.chargeonline.com.br , onde achará os trabalhos de 40 mestres do cartunismo brasileiro.

ENTRE NO DEBATE

Se v. tiver algum comentário a fazer sobre esta coluna, mande um e-mail para milton@dm.com.br

E NÓS CONVERSANDO...

O presidente Chávez, da Venezuela, anunciou o fim da construção de duas refinarias para petróleo pesado – uma na China, outra na Venezuela. Com isso, a Venezuela reduz custos que a Petrobras continua tendo, exportando petróleo pesado e importando o tipo leve. Enquanto isso, continua sendo empurrado com a barriga o projeto da refinaria Abreu e Lima, projetado para Pernambuco, num consórcio de Petrobras e PDVSA, a estatal petrolífera venezuelana. E cujas negociações começaram muito antes do contrato entre China e Venezuela, para construção das duas refinarias que já estão funcionando.

A CONVERSA PODE ENTERRAR O PRÉ-SAL

A exploração de petróleo a mais de 200 quilômetros da costa e a quatro quilômetros de profundidade, no chamado pré-sal do Oceano Atlântico, exige bem mais do que conversa: grana, muita grana, tecnologia ainda a ser desenvolvida, alternativas de transporte etc. E temos de andar depressa porque as alternativas ao petróleo estão se fortalecendo. A General Motors
está apostando firme no carro elétrico Volt e cuidando inclusive da criação de
uma rede de recarga nos Estados Unidos.. Honda e outras fábricas japonesas também trabalham a mil no carro elétrico e nas pastilhas combustíveis de hidrogênio. Os medos sobre energia nuclear estão se desvanecendo e todos já olham com inveja e se preparam para seguir França e os outros poucos países que há muito tempo reduziram a dependência do petróleo para a produção de energia elétrica.

Toda essa corrida tecnológica pode não acabar com a nossa sede de petróleo, mas certamente contribuirá para a redução da dependência e do preço. Não podemos deixar de pensar que, abaixo de um certo preço do barril, nem valeria a pena fazer furos no pré-sal.

DESTA VEZ LUPI SAI OU NÃO SAI?

Aparentemente chegou ao limite a paciência do presidente Lula para aturar as bobagens do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Essa última – de usar o FGTS para comprar ações da Petrobras – foi demais. Ao voltar de Nova York, Lula tem a palavra “Lupi” como primeiro item de sua agenda. Façam suas apostas: Como Paulo Pereira da Silva está encrencadíssimo com a polícia e a Justiça, há vários nomes do PDT na lista de possibilidades para assumir o Ministério do Trabalho.

PRA QUÊ TANTO?

As fortunas pessoais em todo o mundo chegavam a um total de 105 trilhões de dólares, segundo estimativa da respeitada consultoria americana Boston Group há um mês, que constatou ter sido 2007 o sexto ano consecutivo de crescimento desse dinheirão, principalmente na América Latina e na Ásia.

Admitindo-se um total de um bilhão e meio de famílias em todo o mundo, uns 11 milhões (1%) tinham mais ou menos 30 trilhões de dólares. Mas desses trintinha, 21 trilhões estão nas mãos (e em cofres) de 11 mil famílias (0,001%) controlam 21 trilhões.

O número 1, como se sabe, é Warren Buffet, que, ainda esta semana, investiu a bagatela de 5 bilhões de dólares no banco Goldman Sachs, que anda meio depauperado. O número 2, o mexicano Carlos Slim, tem muito dinheiro no
Brasil: entre outras coisas, é dono da Claro e sócio dos irmãos Marinho em uma parte das Organizações Globo.

ATÉ ONDE VOTO É TRANSFERÍVEL?

Cientistas políticos de todo o Brasil estão debruçados sobre as últimas pesquisas que mostram a altíssima popularidade do presidente Lula: mais de 70% dos brasileiros aprovam seu governo. Mas Marta Suplicy vai ter de encarar o segundo turno na cidade de São Paulo embora Lula esteja lhe dando o máximo de apoio possível. Fenômeno semelhante está acontecendo em cidades da Grande São Paulo, inclusive em São Bernardo. Dilma Roussef, na intenção de voto para a presidência da República, ainda está ali por volta dos 2%, muito atrás de José Serra e Ciro Gomes.

A dúvida dos cientistas é a seguinte: o presidente conseguiria mesmo eleger um poste na eleição de 2010?



O uso depois, e já, da popularidade de Lula

Jarbas de Holanda

O aumento da aprovação popular ao governo Lula na pesquisa CNT/Sensus divulgada anteontem, de 57,5% para 68,8% entre abril e setembro (enquanto a dele próprio elevou-se ainda mais, de 60% para 77,7%) foi avaliada em seguida tendo em vista sobretudo o potencial e as limitações da transferência da força do presidente para uma candidatura lulista no pleito presidencial e, agora, nas eleições municipais. Outros dados da pesquisa, específicos sobre esse pleito, incluem simulações que apontam o tucano José Serra com intenção de votos entre 38% e 45%, dependendo dos adversários – numa delas, Ciro Gomes com 17,4% e Dilma Rousseff com apenas 8,4%. O que de pronto, segundo Dora Kramer em sua coluna de ontem, reanimou na agenda de boatos de Brasília a retomada da proposta de mudança constitucional para um terceiro mandato consecutivo do atual presidente.

Quanto à transferência de prestígio de Lula na corrida eleitoral deste ano, parte das respostas está sendo dada por índices, contraditórios, do desempenho de candidatos bem identificados com ele, ou mais próximos, na reta de chegada do primeiro turno. O grau de influência mostra-se muito alto no Nordeste – exemplarmente no Recife –, em várias cidades médias e maiores desta região e de outras, bem como na periferia da Grande São Paulo e das metrópoles do Rio e de Belo Horizonte, mas é neutralizado no Centro Sul, de Minas Gerais ao Rio Grande (e também em algumas capitais do Centro-Oeste, do Norte e do próprio Nordeste) pela predominância de lideranças regionais oposicionistas ou de vôo próprio, como Aécio Neves, José Serra e Sérgio Cabral, e de fatores locais, como o enorme desgaste do principal aliado lulista do Paraná, Roberto Requião, e o forte prestígio do prefeito de Curitiba, Beto Richa, candidato à reeleição, ou ainda pelo recall negativo dos governos gaúchos do PT.

Porém, a parte mais importante da avaliação sobre a influência da alta popularidade de Lula nas campanhas eleitorais em curso só poderá ser feita com base nos resultados do segundo turno. Para o qual o presidente combinará o uso ostensivo de seu forte carisma e da bateria de instrumentos da máquina político-administrativa federal – nas disputas que se travarão de Manaus (se o não-lulista Amazonino Mendes não vencer logo em 5 de outubro) a Salvador e a Porto Alegre. Tentando gerar uma “onda vermelha” do lulismo (como a que sufocou o adversário Geraldo Alckmin em 2006), capaz de reverter derrotas ou consolidar vitórias, parciais, no primeiro turno, nos diversos estados e regiões, e de compensar a continuidade da fraqueza eleitoral do PT nos maiores centros do Sudeste e do Sul com uma eleição em São Paulo de Marta Suplicy na capital e demais petistas na Região Metropolitana.

Outro ingrediente do cenário da véspera de conclusão do primeiro turno, ligado à disputa pela prefeitura paulistana mas que tem fortes implicações nacionais, é o acirramento do embate entre Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab para a definição de qual deles vai enfrentar Marta Suplicy na disputa final. Exacerbação que poderá acentuar-se ainda mais se os dois se mantiverem empatados nas pesquisas desta semana, ou que poderá começar a reduzir-se se um deles lograr nítida vantagem. Com a torcida do lulismo para que a persistência do conflito venha a dificultar ao máximo uma posterior soma de votos dos dois concorrentes do mesmo campo político nacional e estadual. E com a preparação do governador Serra para a complicada tarefa de promover a aglutinação desses votos.

Isso num contexto, curioso, em que o presidente Lula e o governador, em face das implicações relevantes para um e outro dessa disputa, terão de empenhar-se a fundo nela. Mesmo sendo conhecidas as preocupações do primeiro com os dividendos (indesejáveis para ele) que o grupo de Marta procurará retirar de uma vitória (contrapondo a expressão que ela ganhará à incerteza político-eleitoral da pré-candidata lulista à presidência, Dilma Rousseff). E mesmo também, no caso de Serra e na hipótese da passagem de Alckmin ao segundo turno, que sejam igualmente conhecidos seus problemas de relacionamento com o candidato do partido. Preocupações e problemas que serão postos à margem pelos projetos contrapostos dos dois atores no controle e na sucessão do governo do estado de São Paulo e na disputa da presidência da República em 2010.