quinta-feira, 12 de março de 2009

Emprego na indústria cai 1,3% em janeiro, na quarta queda mensal


Fonte: G1

Queda foi verificada na comparação com o mês de dezembro de 2008.Desde setembro, emprego industrial acumula queda de 3,9%, diz IBGE.

O emprego na indústria nacional registrou queda de 1,3% em janeiro na comparação com o mês anterior, na quarta queda mensal consecutiva nessa base de comparação, segundo dados divulgados nesta quinta-feira (12) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Frente a janeiro de 2008, a queda foi de 2,5%, a menor da série histórica do IBGE, iniciada em 2001. No acumulado em 12 meses, a alta de 1,6% foi a menor desde 2007. Desde setembro do ano passado, o emprego industrial acumula queda de 3,9%.
Em janeiro, o contingente de trabalhadores reduziu-se em 2,5% na comparação com o mesmo mês de 2008. As reduções do emprego em São Paulo (-2,1%), região Norte e Centro-Oeste (-4,5%), Paraná (-4,5%) e Santa Catarina (-3,5%) exerceram as pressões mais significativas no total do país.

Por setor, os principais impactos negativos na média global foram vestuário (-8,2%), calçados e artigos de couro (-10,3%) e madeira (-13,3%).

Horas pagas e folha de pagamento

De acordo com o IBGE, o número de horas pagas pelas indústrias registrou queda pela quarta vez consecutiva, acumulando baixa de 5,3%. Houve queda tanto em relação ao mês anterior (-1,8%) quanto em relação ao mesmo mês do ano anterior (-3,6%).

No confronto com igual mês do ano anterior, o número de horas pagas recuou 3,6% em janeiro de 2009, menor taxa da série histórica iniciada em 2001

A folha de pagamento real sofreu queda de 1,2% frente a dezembro de 2008 (com ajuste sazonal), mas avançou 1,2% sobre janeiro de 2008, sendo este o menor resultado desde dezembro de 2006 (0,5%).

Também em janeiro, o valor da folha de pagamento real da indústria, descontando os efeitos sazonais, recuou 1,2% em relação a dezembro passado, o quarto resultado negativo consecutivo, acumulando perda de 4,5%.

Em relação a janeiro de 2008, o valor total da folha de pagamento aumentou 1,2%, mas registrou o menor resultado desde dezembro de 2006 (0,5%).

Pior para os fatos

Carlos Alberto Sardenberg
DEU EM O GLOBO


Não foi apenas no Brasil que o PIB de 2008 veio pior que o esperado. Praticamente em todo o mundo os principais indicadores têm surpreendido para o lado negativo. Em parte, isso tem a ver com o caráter inédito de uma crise global, dessas que ocorrem a cada século. O pessoal não tem parâmetros para avaliar, muito menos para prever.

Mas há equívocos maiores e menores. Aqui, o presidente Lula e o ministro Mantega, quando o tsunami parecia estar apenas lá fora, gostavam de zombar dos analistas neoliberais e dos investidores internacionais que não conseguiram prever e, durante bom tempo, sequer entender a catástrofe.

Mas por acaso eles, Lula e Mantega, previram?

Na verdade, os governantes brasileiros cometeram mais de um equívoco. O primeiro foi embarcar na euforia e achar que o forte crescimento econômico de 2004 até meados de 2008 seria permanente ou quase para sempre. Na verdade, esse foi um equívoco global: quando tudo ia bem, quase todo o mundo previa que as coisas seriam ainda melhores.

O segundo grande equívoco da dupla Lula/Mantega foi achar - ou pelo menos alardear - que o crescimento brasileiro era autônomo, consequência do PAC, no lado do investimento, e de programas como o Bolsa Família e os aumentos reais do salário mínimo, no lado do consumo interno. Resultou daí o entendimento de que o crescimento brasileiro não seria abortado pela crise externa, apenas perderia um pouco de ritmo.

O terceiro, e talvez mais grave equívoco, foi persistir tanto tempo no segundo. Como muita gente lá fora, presidente e ministro brasileiros demoraram para aceitar o tamanho da crise externa e praticamente só se convenceram do impacto que tem no Brasil quando saíram os números do PIB do quarto trimestre, nesta semana..

Lá atrás, quando a economia só dava alegrias, se a administração Lula tivesse sido mais sábia do que os analistas, investidores e governos internacionais, teria adotado uma postura cautelosa nos gastos de custeio da máquina pública e mais preocupada em aumentar investimentos públicos e privados. O governo diz que fez isso com o PAC, mas os números do quarto trimestre mostraram que os investimentos desabaram, exatamente como em outros países que não têm Lula nem PAC. E os números mostram também que o governo abusou de gastos que agora terá dificuldade em cortar.

Pessoas próximas de Lula e Mantega dizem que eles estão genuinamente preocupados. Alguns chegam a dizer que o ministro da Fazenda está muito assustado. Nesse caso, o discurso mais otimista seria apenas uma espécie de propaganda, uma tentativa de influenciar positivamente os humores de empresários, investidores e consumidores.

Será? Mas, nessa sequência, por quanto tempo os governantes terão credibilidade? Quando todo mundo já dizia que o Brasil, neste ano, não cresceria mais que 2%, Lula e Mantega insistiam nos 4%. Agora, quando a grande maioria dos analistas acredita que o país não vai crescer nada ou vai encolher, o Ministério da Fazenda trabalha com 2%. Mas Lula já disse que um zero-a-zero poderá estar muito bom, quando os outros perdem feio. O que indica uma outra linha, a do "menos pior".

Veremos.

Governos erram por toda parte. Mas o problema do governo Lula é não aceitar a realidade quando esta é adversa. O que faz temer pela condução da crise.

Sem crise, sem crédito

No grande ano de 2007, quando o mundo todo cresceu espetacularmente, o crédito concedido nos EUA para a compra de casa própria chegou a 86% do PIB. Para a aquisição de carros, 9,2%.

Na Coreia do Sul, o crédito imobiliário representava 53% do PIB. Para automóveis, 17%.

E no Brasil? Crédito para a compra de residências, apenas 2,1% do PIB. Para veículos, 3%. Esses números melhoraram em 2008, até setembro, mas ficaram longe dos padrões internacionais.

Eis por que a crise é menos virulenta no Brasil. Porque o crédito aqui era uma mixaria.

E isso era um defeito da economia brasileira. Pensar que era virtude leva à conclusão de que a saída para a crise mundial é não ter crédito.

Carlos Alberto Sardenberg é jornalista.

Um governo disfuncional

EDITORIAL
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Há uma amarga ironia na coincidência da divulgação do tombo de 3,6% sofrido pela economia brasileira no último trimestre do ano passado com a revelação, no Estado de ontem, de que o governo devolveu ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) um financiamento de US$ 57 milhões para obras de infraestrutura em uma centena de municípios, porque simplesmente não conseguiu gastar o dinheiro. Guardadas, embora, as devidas proporções, o caso dos recursos inaproveitados indica que, enquanto o País crescia a taxas robustas - beneficiado por uma excepcional conjuntura de prosperidade global -, a sociedade em geral não se dava conta do fraco desempenho do governo Lula em fazer a sua parte pelo progresso nacional - impulsionado, desde a sua inauguração em 2003 até o malfadado setembro de 2008, quase que exclusivamente pelo excepcional desenvolvimento da economia globalizada.

O aluvião de discursos triunfalistas com que o presidente proclamava a sua suposta paternidade da expansão econômica e o incessante festival de eventos fabricados para levar os brasileiros a crer nas realizações de um Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) diariamente colocadas sob a lente de aumento da propaganda do Planalto também contribuíram para jogar areia nos olhos da opinião pública, escondendo o abismo entre a exuberância do palavreado oficial e a disseminada incompetência da máquina federal sob o lulismo. O episódio do financiamento desperdiçado do BID envolve metas e cifras relativamente modestas. Tanto pior, portanto, como evidência de torpor administrativo e incapacidade gerencial. É uma história exemplar de desgoverno.

Em 2004, no quadro do Programa de Ação Social em Saneamento (Pass), o Brasil assinou com a instituição financeira regional um contrato que previa, com a contrapartida de recursos próprios da União, investimentos totais de US$ 95,5 milhões para obras de esgoto e tratamento de água em 129 cidades, onde seriam ainda criadas empresas para a fiscalização e manutenção dos serviços. Pois bem. Passou-se um ano até que saísse a licitação para a contratação da firma que cuidaria do programa, conforme exigência do órgão financiador. E apenas em 2006 começou a escolha dos municípios a serem beneficiados, de acordo com critérios como população, localização geográfica e posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas. A intenção era canalizar os investimentos para localidades pequenas e carentes em áreas mais atrasadas, como o semiárido nordestino.

Iniciou-se em seguida no governo um debate decerto bizantino sobre vincular, ou não, o Pass ao PAC. Em 2008, decidiu-se que o programa abrangeria apenas seis municípios. Uma obra foi começada, duas licitações realizadas e os demais editais preparados - antes que tudo fosse suspenso. Depois de profundas reflexões, é de se presumir, concluiu-se que sairia caro demais manter o acordo com o BID para atender não mais de meia dúzia de cidades (nas outras, as obras se incorporariam ao PAC). Na semana passada, enfim, resolveu-se acabar com o Pass e restituir ao Banco o valor disponível, do qual haviam sido aproveitados, ao cabo de quatro anos, US$ 2,5 milhões para aplicação em um único município (Limoeiro do Norte, no Ceará).

Ocorre que a instituição cobra uma taxa de compromisso quando o crédito contratado permanece ocioso - e o governo teve de desembolsar a esse título US$ 570 mil por ano. A troco praticamente de nada. Segundo o Ministério das Cidades, responsável pelo projeto cancelado, o PAC assumirá as obras "sem prejuízo do cronograma". O retrospecto é mais do que suficiente para se descrer da promessa. Provavelmente, como costuma acontecer, tudo recomeçará do zero. Nesse governo, continuidade assegurada é a da discurseira do seu chefe. Não surpreenderá se ele tentar, junto ao povo, neutralizar a golpes de retórica o impacto do mergulho do PIB no final de 2008, que remove a aura do Brasil como o grande caso à parte no desaquecimento econômico global. A propalada excepcionalidade brasileira caminha para virar mito. Também entre nós já se fala em "recessão mais longa e profunda do que se esperava", enquanto no exterior já se ouve que "o Brasil não fugiu à regra". Contra isso pouco podem a jactância do presidente e o seu governo cronicamente disfuncional.

O peso do passado

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Um comentário atribuído ao presidente Lula em recente conversa com o senador Aloizio Mercadante a bordo do Aerolula, registrado pelos jornais e não desmentido por nenhum dos dois, dá a dimensão exata de como a política brasileira anda necessitada de uma arejada. Há um clima passadista no ar, e a volta à cena de políticos que ressurgiram das cinzas de um passado nada glorioso traz também os fantasmas de uma situação política mal resolvida, a crise do mensalão e seus sucedâneos, como o escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos, que acabou levando à renúncia do então todo-poderoso ministro da Fazenda, Antonio Palocci, hoje deputado federal pelo PT de São Paulo.

Nesse diálogo, Lula e Mercadante conversavam sobre a eleição de 2010 e a melhor solução para o PT na disputa da sucessão do governador José Serra em São Paulo. Lula está defendendo, dentro do PT, que Palocci é o melhor candidato, caso seja absolvido pelo Supremo de ter mandado quebrar o sigilo bancário do caseiro que o acusara de ser frequentador assíduo de uma casa no Lago Sul de Brasília, onde lobistas seus amigos instalaram o que ficou sendo conhecida como a República de Ribeirão Preto, onde se faziam festas e negócios.

Pelo raciocínio de Lula, liberado pelo STF, Palocci não deveria se preocupar com outros processos sobre sua gestão na prefeitura de Ribeirão Preto: "Fosse assim, durante as denúncias do mensalão, eu teria ficado trancado no Palácio da Alvorada", teria dito Lula, segundo o jornal "O Estado de S.Paulo".

Por si só, o comentário denota um desprezo pela opinião pública e pela Justiça coerente com a atitude do presidente, que não se cansa de apoiar publicamente todos os seus aliados que respondem a processos na Justiça, como se estivesse acima do bem e do mal.

O constrangimento natural de alguém que é processado é coisa do passado. Hoje, com a ajuda do presidente e de sua popularidade, ninguém mais se envergonha de ser acusado de corrupto.

Basta dizer que isso é uma manobra da oposição, ou das elites reacionárias contra os representantes do governo popular. Mas, se formos rever aqueles dias tumultuados de 2005, em que as denúncias do então deputado Roberto Jefferson desencadearam revelações sobre um esquema de corrupção política que o procurador-geral da República classificou de "quadrilha", constataremos que o presidente Lula não estava tão confiante assim.

Coube ao chefe de gabinete do Palácio do Planalto, Gilberto Carvalho, em recente entrevista à "Veja", confirmar o que na época se comentava na área política: que Lula chegara a pensar em não disputar a reeleição em 2006.

A hipótese não apenas foi seriamente cogitada, como a cúpula do governo considerava possível até mesmo a decretação do impeachment de Lula. Segundo o relato de Carvalho, os então ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos chegaram certa noite a sugerir ao presidente Lula que fizesse um acordo com a oposição: em troca de poder cumprir todo o seu mandato, ele abriria mão da reeleição.

Sabe-se agora, e esse detalhe não está na entrevista, que a força do senador José Sarney com o presidente tem muito a ver com sua posição naquele momento difícil. Lula contou recentemente, com lágrimas nos olhos, que Sarney, que era presidente do Senado, chegou a dizer que sairia com ele, e foi um dos seus maiores sustentáculos políticos.

O interessante é que Lula se preocupava naquele momento com a situação econômica, pois, segundo Gilberto Carvalho, o presidente está convencido de que 90% de sua popularidade estão ligadas à melhora da economia, e apenas 10% ao seu propalado carisma.

Na crise política de 2005 desencadeada pelo mensalão, o que preocupava o presidente era a inflação de 5,69%, que, embora em queda, continuava alta, e o PIB, que crescera apenas 2,3% naquele ano, ficando à frente apenas do Haiti na região.

Todas essas histórias interligadas têm a ver com o estado de nossa democracia atualmente.

Passado o susto e superada a reeleição, Lula tratou de montar um governo cuja coligação partidária, imensa e difusa, sem uma lógica política, parece ter a única finalidade de protegê-lo de uma crise institucional, sem que haja um programa de reformas ou grandes propostas para o Congresso.

Para manter-se no poder sem sustos, Lula aceita todas as chantagens políticas do PMDB e loteou o Ministério, que é tão grande quanto os partidos que têm que estar nele.

O senador José Sarney preside mais uma vez o Senado, e não poderia haver garantia maior de apoio político, mesmo que o preço seja o retorno do senador Renan Calheiros e a derrota do PT para Collor na Comissão de Infraestrutura.

E, dependendo de uma decisão do Supremo que deve sair no próximo mês, poderemos ter novamente Antonio Palocci no centro da política nacional.

Ser lançado candidato a governador de São Paulo seria apenas o primeiro passo, que no momento tem reações internas no PT que provavelmente não se sustentarão por muito tempo.

A crise econômica pode ser uma boa oportunidade para a volta de Antonio Palocci ao governo. Dependendo da receptividade política, não será surpresa se ele se tornar rapidamente uma alternativa de Lula à própria Presidência da República, retomando um antigo projeto político.

O eleitor no nevoeiro

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Quando se especula sobre o efeito político da crise econômica que se materializa por aqui na queda de 3,6% no PIB do último trimestre de 2008, o que se pretende é saber se a popularidade do presidente Luiz Inácio da Silva sobrevive em ambiente adverso.

Em tese, o grau de resistência tenderia a cair na proporção direta do aumento das dificuldades decorrentes da crise, numa palavra, o desemprego.

Na prática, Lula já enfrentou ao longo desses quase sete anos de governo momentos muito ruins e conseguiu superar todos eles. Nenhum deles, porém, guardou relação com o bolso das pessoas.

Houve crises políticas, há uma crise moral endêmica, mas nunca nada que afetasse a sensação de bem-estar geral traduzida na garantia dos lucros dos mais ricos, no crescimento do poder de compra dos remediados e na sobrevivência assegurada aos mais pobres.

Essa maioria foi indiferente enquanto o jogo disse respeito a valores abstratos. Como se comportará diante do risco de prejuízos objetivos é a questão em torno da qual não há, por ora, nada além de apostas, intenções e adivinhações.

Não por carência de massa crítica com capacidade de análise nem por falta de experiência na área.

Na visão de um ex-presidente da República com larga vivência no assunto, os dados disponíveis ainda são insuficientes. Tanto a crise é inédita, quanto a condição de Lula é específica.

Fernando Henrique Cardoso governou o Brasil por oito anos e enfrentou sete crises econômicas: em 1996, a do México; em 1997, da Ásia; em 1998, da Rússia; em 1999, a do câmbio; em 2001, a do apagão elétrico e a retração pós-11 de setembro nos Estados Unidos; em 2002, a turbulência resultante dos receios a respeito do que faria o PT no poder.

No período, lembra, o PIB oscilou negativamente junto com as crises, apresentando resultados positivos duas vezes, exatamente nos anos de calmaria: 1996 e 2000.

Mas, se os números reagem automaticamente, a reação das pessoas depende de outros fatores. Na opinião de Fernando Henrique, basicamente de dois: a durabilidade da crise e a politização do assunto.

"Se a oposição não falar nada, fica mais fácil o governo administrar o mau humor geral. No meu caso, o PT gritou muito, transformou a adversidade num cenário mais grave do que a realidade." Atributo, analisa, em boa medida ausente no modo de operação dos atuais oposicionistas.

Politicamente, este seria um ponto favorável ao governo. Não o único, na percepção de FH. "Lula tem uma capacidade enorme de se adaptar às situações. Além disso, não em compromisso com a coerência. Diz uma coisa hoje, o contrário amanhã e fica tudo por isso mesmo."

Em outubro, o presidente Lula previa nada mais que uma "marolinha", depois decretou o fim da crise e, com a divulgação dos novos números, já comemora por antecipação o fato de que no Brasil, "ao contrário de outros países", não haverá recessão.

"Para mudar o discurso de novo, não custa." Aliás, Fernando Henrique aposta que, se o quadro se agravar, Lula mudará de estilo. Abandonará o tom ufanista para assumir uma atitude mais sóbria. "Fará o estilo sério."

Quando instado a examinar o cenário do ponto de vista estritamente eleitoral, Fernando Henrique lembra que aí não se fala mais da figura de Lula, mas da candidatura de Dilma Rousseff.

"Como escreveu o Marcos Lisboa (diretor do Unibanco, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda), biografia não se transfere. Na eleição, será Dilma em julgamento. Se o eleitor transferir seu mal-estar para o governo, haverá prejuízo porque ela é o governo."

Então, nessa hipótese, bastaria a oposição aguardar a transferência das expectativas positivas do eleitorado para contar com a vitória em 2010?

Nem por um só instante, Fernando Henrique acha que o PSDB pode esperar ganhar a eleição por gravidade. "Se o partido não for capaz de se apresentar com projeto confiável e consistente não será, necessariamente, visto como a solução."

Essa necessidade de se mostrar como um contraponto, um porto mais seguro, em função do agravamento da situação econômica é um dos motivos pelos quais FH passou a defender a entrada do PSDB no debate eleitoral propriamente dito.

"O outro é que Lula tomou a iniciativa de abrir o jogo."

Até então, o ex-presidente achava que o governador de São Paulo, José Serra, estava certo em adiar a entrada em cena para 2010 e via na proposta do governador Aécio Neves de antecipação do processo de escolha do candidato do PSDB à Presidência uma precipitação indevida.

Sobre as prévias tucanas, FH acha mais prudente se pronunciar só depois da manifestação da Justiça Eleitoral sobre prazos, prevista para hoje.

Mas agora considera que o partido, por meio dos dois pré-candidatos, deve começar a falar. De forma "dura" na responsabilização do governo e de maneira consistente ao apresentar suas credenciais como alternativa de poder.

"Se não fizermos grandes besteiras, ganhamos a eleição."

Lula em SP. O pragmatismo de Palocci para superar a resistência ao petismo

Jarbas de Holanda
Jornalista

Os discretos sinais emitidos anteriormente por Lula em favor da indicação de Antonio Palocci para a disputa do governo paulista pelo PT foram substituídos na semana passada por clara recomendação da candidatura do ex-ministro da Fazenda às lideranças estaduais da legenda. A partir de conversa dele com o senador Aloísio Mercadante, que, decerto, como um dos postulantes à indicação, ficou chocado com a iniciativa do presidente. A essa conversa seguiram-se informações da imprensa de que a recomendação recebeu apoio da ala liderada por Marta Suplicy e do ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Mas circularam também notícias sobre a articulação de resistências a Palocci, ostensivamente por parte de deputado José Eduardo Cardoso, secretário nacional do partido e ligado ao ministro Tarso Genro, procurando envolver outros nomes de possíveis candidatos – o prefeito de Osasco, Emídio Souza, o ex-prefeito de Guarulhos, Eloi Pietá, o ex-presidente da Câmara Federal, Arlindo Chinaglia.Tais resistências baseiam-se na vulnerabilidade de Palocci a fortes ataques de natureza ética na campanha eleitoral, mesmo que o STF rejeite o pedido do Ministério Público de processo contra ele pelo caso da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. O que inviabilizaria a realização pelo PT de uma campanha eleitoral ofensiva – considerada importante para a recuperação do partido das grandes derrotas sofridas nos últimos anos no estado e na capital de São Paulo – contra o adversário a ser lançado pelo PSDB.

Tratando dessas resistências, o jornalista Raymundo Costa, do Valor, em sua coluna de ontem, aponta – atribuindo à parte da cúpula estadual petista – o que pode constituir mera manobra de bloqueio à indicação de Palocci, ou a proposta de um processo gradativo de superação do risco eleitoral que a candidatura dele representará. “Para a reabilitação de Palocci – assinala a coluna – o PT acha que ele precisa (depois de isentado, se for, pelo STF) de uma ‘nova missão que possa inseri-lo em alguma coisa positiva e de forte interação com a sociedade’. A ‘nova missão’ seria a chefia da Casa Civil, com a liberação de Dilma Rousseff, em outro ministério, para a campanha sucessória. Bem sucedido numa volta por cima no núcleo do Palácio do Planalto, Palocci poderia ser candidato, ou não, a governador de São Paulo, segundo a proposta.

A qual, porém, teria de ser vendida ao presidente Lula, que não parece interessado nela. Pois a sua avaliação pessoal é que Palocci, isentado pelo STF do envolvimento na quebra do sigilo do caseiro (no que está postando), será o melhor candidato, ou o único realmente competitivo, que o PT poderá apresentar em São Paulo. Pelo seu amplo reconhecimento como administrador competente e pragmático, no comando que exerceu da política econômica do governo. O que lhe confere uma imagem positiva, bem diversa da do esquerdismo petista – de alternativas como Mercadante ou Marta Suplicy – claramente minoritária no eleitorado de São Paulo. E lhe propiciaria bom relacionamento com os círculos empresariais e uma disputa equilibrada do voto das camadas médias contra o adversário tucano, seja Geraldo Alckmin ou Aloysio Nunes Ferreira. E, nos cálculos do presidente, a dimensão popular de Palocci seria proporcionada pela condição de candidato do lulismo e intimamente vinculado à campanha de Dilma Rousseff. Embora tudo isso esteja, de fato, na dependência de decisão do STF sobre a grave imputação que pesa sobre ele; da avaliação que a própria sociedade fará a respeito, se ele for o candidato; da postura do eleitorado paulista no embate presidencial simultâneo (após duas derrotas do próprio Lula); dos efeitos políticos da crise econômica, que seguem representando a grande incógnita condicionante das composições partidárias para a sucessão presidencial e as disputas estaduais de maior peso.

Presidentes do STF e do CNJ, sempre unidos

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, propôs "uma corregedoria judicial" ou outra forma de controle externo das instituições policiais, a propósito de supostas escutas telefônicas que teriam sido feitas indiscriminadamente pela Polícia Federal (PF) no decorrer das investigações da Operação Satiagraha - que resultariam em dois pedidos de prisão do empresário Daniel Dantas pela justiça de primeira instância, seguidas de dois habeas corpus de Mendes que beneficiaram o empresário.

Essa pode ser uma discussão para se colocar na mesa em um debate sobre a ampliação da democracia brasileira, e seria recomendável que se discutissem com seriedade limitações à atuação das polícias que lidam diretamente com a segurança pública, e sobre as quais, em especial nos grandes centros urbanos, chovem acusações de violações de direitos humanos. Mas seria bastante conveniente se, aproveitando a oportunidade, fosse debatida igualmente uma forma de controle externo do Judiciário. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é uma experiência de eficiência bastante duvidosa quando se tem uma gestão personalista e voluntariosa no STF. Acaba se tornando um instrumento de controle pessoal sobre as instâncias inferiores e não consegue coibir uma expansão excessiva de poder da presidência do Supremo.

É difícil falar em atuação independente do CNJ. Um exemplo disso é o fórum criado pelo CNJ e pelo STF para analisar as ações relativas a problemas fundiários. Essa iniciativa resulta de mais um conflito público de Mendes. Na semana passada, ao comentar do assassinato de quatro capangas de uma fazenda por integrantes do Movimento do Sem Terra (MST) - um crime que pode chegar a ser julgado pelo Supremo que preside, e existem grandes chances de isso acontecer -, Mendes aproveitou e apontou o dedo acusador para o governo. Acusou-o de ser conivente com atos ilegais do MST. Não satisfeito, atacou o Ministério Público Federal. "Os recursos públicos não são recursos do governo. Será que nós na sociedade queremos pagar por isso? (...) Claro que nós não podemos esperar. Do contrário, daqui a pouco nós vamos ficar celebrando uma missa de sétimo dia, missa de trigésimo dia, missa de um ano. Nós estamos falando em mortes", disse o presidente do STF, cobrando o MP. Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva relativizou as opiniões do ministro, afirmando que ele falou como cidadão, Mendes esclareceu: não falou como cidadão, não, mas como "presidente do Judiciário".

Daí, o presidente do STF, Gilmar Mendes, reagiu contra o governo que atacou e acordou com o presidente do CNJ, Gilmar Mendes, que o conselho vai fazer um "fórum" para monitorar as decisões judiciais e o cumprimento delas em todos os Estados.

O STF, com a vigência da súmula vinculante, passou a ter um enorme controle sobre as decisões de instâncias inferiores da Justiça. Faz parte do jogo, mas esse é um poderoso instrumento de centralização do Judiciário. Paralelamente, o CNJ, a partir do início da presidência de Gilmar Mendes, tem atuado como força auxiliar do Supremo. Mendes deu dimensão a isso, por exemplo, quando usou os cargos cumulativos na presidência do STF e do CNJ para pedir, em nome das duas instituições, ao corregedor-geral do Tribunal Regional Federal da 3ªregião, desembargador André Nabarrete, que acionasse o juiz Fausto De Sanctis, que decretou a prisão de Dantas duas vezes. A acusação é a de que De Sanctis teria afrontado todo o STF, na figura de Gilmar Mendes. Gilmar Mendes, presidente do Supremo, e Gilmar Mendes, presidente do CNJ, reclamam oficialmente contra um juiz que teria atentado contra todo o Supremo, na figura de Gilmar Mendes.

Ao botar o seu dedo na questão dos conflitos de terra, que tem um potencial explosivo muito grande e deve ser tratada preferencialmente como política de governo (que tem votos e mecanismos de negociação para evitar a radicalização de lado a lado), Mendes conseguiu ir além do que o próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, que não poupa críticas ao governo Lula. FHC acusou o governo de ser indulgente com o MST, mas evitou condenar o repasse de recursos a assentamentos. "Não existe reforma agrária sem o repasse de recursos a assentamentos. O que é preciso saber é se são legítimos", afirmou. Os governos de FHC não foram nada tolerantes com o MST, mas nem o tucano conseguiu evitar de incluir repasses a assentamentos como políticas de governo.

A questão agrária tende a provocar cada vez mais conflitos, daqui até a eleição de 2010. Os partidos políticos claramente manipulam o tema com fins políticos. E já existe uma evidente radicalização ideológica em torno do tema, que se acirrou com ofensivas e contra-ofensivas de proprietários rurais e sem-terras. Não é preciso colocar mais lenha nessa fogueira.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

"Não se esqueçam de mim!"

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - As atenções latino-americanas estão voltadas para os interesses de Cuba, Bolívia, Equador e, sobretudo, Venezuela no encontro Lula-Obama, no sábado, mas Lula vai levar um apelo inesperado de um outro país: a Colômbia.

Numa conversa com Lula, o presidente Álvaro Uribe disse que estava preocupado com a guinada de Bush para Obama (e dos republicanos para os democratas), avaliando que os "esquerdistas" Raúl Castro, Evo Morales, Rafael Correa e até Hugo Chávez, tido como o inimigo número 1 de Washington no continente, podem até levar vantagem.

Mas e a Colômbia? E ele, Uribe? Na contramão do movimento político da região, Uribe é o "direitista", o contraponto a Chávez, o maior aliado norte-americano e o que embolsou um caminhão de dinheiro de Bush, dando de ombros para os vizinhos para fazer um TLC (Tratado de Livre Comércio) em separado com os EUA -que o Congresso ianque não aprovou.

Os "esquerdistas" anti-Bush e antirrepublicanos continuam devolvendo diplomatas norte-americanos e fazendo biquinho, mas todos sabem que Obama, até pela biografia, tem muito mais capacidade para compreender os problemas dos países pobres e negociar com eles.

Mas Uribe teme uma inversão da balança: que Obama se aproxime dos outros e corte o "Plan Colômbia" e a suculenta verba que despeja no país sob a rubrica "combate ao narcotráfico". Foi à custa dele, plano, e dela, verba, que Uribe enfraqueceu as Farc, acabou com os sequestros e reuniu condições de ser um dos mais populares presidentes da América do Sul, com índices que rivalizaram com os de Lula quando da libertação espetacular de Ingrid Betancourt.

Ele, é claro, não quer perder essa bocona, até porque sonha em conquistar o direito de re-reeleição. E pediu explicitamente a Lula para fazer um "lobby" a favor dele e da Colômbia com Obama. "Não se esqueçam de mim!"

Dilma e Serra defendem as mesmas receitas para crise

Fernando Barros de Mello e Jose Alberto Bombig
DEU NA FOLHA DE S. PAULO



Potenciais candidatos em 2010, petista e tucano pedem corte de juros e mais investimento

Em evento em São Bernardo, ambos ouviram gritos de "presidente" e falaram dos principais programas dos governos federal e estadual

Um dia após a divulgação da queda de 3,6% do PIB brasileiro no último trimestre de 2008, os dois principais pré-candidatos à Presidência pregaram, lado a lado, uma receita parecida contra a crise econômica: diminuir a taxa de juros e aumentar os investimentos públicos.

Em evento em São Bernardo do Campo, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), foi aplaudida ao dizer que a crise econômica "é uma oportunidade única para o Brasil passar a ter juros civilizados". "Nós iremos baixar os juros básicos e iremos pelo menos criar uma referência para os "spreads" [diferença entre a taxa que o banco paga e a que repassa ao cliente] no Brasil", disse Dilma, que discursou por cerca de 40 minutos, afirmando que a crise é "sistêmica" e de "trilhões".

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), disse que o Brasil tem a maior taxa de juros do mundo e que a redução da taxa básica deveria ter sido adotada há seis meses, quando os efeitos da crise começaram a atingir a economia interna.

Após o evento, eles foram juntos até o Palácio dos Bandeirantes. Na saída do encontro, Serra disse que a política eleitoral deve ficar em segundo plano em tempos de crise. "Trocamos idéias gerais sobre economia. Não cotejei [se há mais convergências que divergências]. Ela sabe o que eu penso e viu o que falei durante a palestra. Eleição no Brasil está sendo tratada de maneira muito prematura."

Segundo o governador, seria ruim se os nomes colocados na pré-campanha tentassem "faturar eleitoralmente": "A gente tem de trabalhar para enfrentar a crise. São Paulo é um Estado grande, complexo. Não dá tempo de governar e fazer campanha. Eu escolho governar".

Em São Bernardo, Dilma e Serra ouviram gritos de "presidente". Ambos falaram de carros chefes dos governos federal e estadual. Ela citou o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), prometeu bilhões em crédito para financiar obras de saneamento, repetiu a proposta de construir 1 milhão de moradias até 2010 e anunciou projeto de R$ 4 bilhões para obras de drenagem.

Ele citou a Nossa Caixa Desenvolvimento, falou de investimentos em estradas, compra de tratores para agricultores e de abertura de escolas e faculdades técnicas. Sobre o Rodoanel, disse que "não só estamos mantendo investimento como acelerando". Foi aplaudido. Citou ainda "grande investimento" no metrô e na CPTM.

Os dois fizeram elogios ao Bolsa Família e falaram da importância do mercado interno. Dilma citou uma "nova classe média", formada por pessoas que deixaram as classes D e E.Ainda no aspecto econômico, os dois presidenciáveis trocaram alfinetadas sobre as gestões FHC e Lula. Sob aplauso de uma plateia com muitos sindicalistas, Dilma lembrou o apagão energético sob FHC, dizendo que faltou investimento em infraestrutura, e disse que, no passado, "diante de uma crise financeira o governo quebrava porque era parte da crise". Segundo ela, "hoje é parte da solução". Ela disse que o governo recorria ao FMI, que tinha um "receituário recessivo".

"Era proibido investir em infraestrutura, investir em saneamento, proibido reajustar o salário mínimo e rede de proteção social nem pensar", disse Dilma, segundo quem hoje Serra tem "uma capacidade de investimento invejável".

O tucano, que disse ter dado "pitacos" sobre política econômica, propôs mudanças na lei de concorrência e na questão do endividamento de prefeituras e Estados. Fez elogios à gestão do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), mas criticou a reação tardia do Banco Central.

Mais cheiro de queimado

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Exportação da China volta a desabar novo, crédito piora de novo: comércio em baixa e crédito raro avariaram o Brasil

O BRASIL FAZ água porque os estilhaços da explosão do mundo rico fizeram buracos no nosso casco. Importamos os estilhaços da crise, que continuam a lascar navios pelo planeta afora. O naufrágio do nosso PIB se deveu à contração de crédito e à baixa do comércio mundiais. Que pioram.

O valor das exportações chinesas caiu ainda mais em fevereiro: 25,7% (ante fevereiro de 2008). No primeiro bimestre, a baixa foi de 21,6%; no caso das importações, a queda foi de 34%. Se o comércio chinês caiu, o do resto dos exportadores de peso (EUA, Alemanha, Japão) não deve ter se saído melhor em fevereiro, para dizer o mínimo.

Há sinais de nova contração de crédito na praça mundial. Nos meses anteriores e imediatamente posteriores à quebra de grandes bancos americanos, a taxa que os bancos dizem cobrar uns dos outros na praça de Londres, a Libor, foi às alturas. Depois de janeiro de 2009, planou suavemente para baixo e, por um tempo, até esquecemos dela. Ontem, o economista e colunista desta Folha Paulo Rabello de Castro observava em sua coluna que a taxa Libor indicava um novo risco de "apagão" financeiro. Pois é. A Libor deu uma nova decolada. E daí?

Trata-se aqui da diferença ("spread") entre os juros interbancários (Libor) e, grosso modo, a taxa esperada para os "Fed funds", a taxa "básica" de juros americana (a "Selic" deles), o que na medonha língua financeira se chama "Libor-OIS ("overnight indexed swaps") spread". O aumento desse "spread" em tese é um indício de que cresceu a relutância dos bancos de emprestar uns aos outros e/ou escassez de capital nos bancos e/ou alta no risco percebido de calote. Está no maior nível desde o início de janeiro, quando houve o primeiro tremelique financeiro do ano. Para usar uma metáfora, trata-se de algo como um "risco-bancos", mais ou menos como há um "risco-país".

Para piorar, o "risco-empresas" também voltou a subir. Isto é, juros para empresas estão mais altos, outro sinal de relutância financeira e de que a redução de juros "básicos" pelos bancos centrais ainda não está surtindo efeito bastante.

Porém, a conversa de muito porta-voz do mercado, os gestores de dinheiro que papagueiam pelos meios de comunicação, é que há "sinais de esperança" de que a crise bancária no mundo rico estaria arrefecendo. Não parece estar, mas o pessoal anda comprando ações de bancos por esses dias, e o custo de fazer seguro contra calotes do Citi e do Bank of America caiu um tico.Quem gerencia a crise não parece muito tranquilo. Timothy Geithner, secretário do Tesouro dos EUA, pediu ontem quem os países ricos gastem mais e que os fundos emprestáveis do FMI passem de US$ 250 bilhões para US$ 750 bilhões, a fim de estimular as economias "emergentes" e tapar rombos em suas contas externas. Não parece a atitude de alguém que espera dias de sol. Por falar nos EUA, ainda não se sabe como eles vão lidar com o papelório podre nos bancos.

Em suma, continuam as explosões da economia mundial que avariaram a economia brasileira: o crédito no centro do mundo continua restrito, piorando agora, e o comércio mundial desaba.

Juros não salvam

Panorama Econômico :: Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO


A queda dos juros não faz milagres. Faz parte da solução, mas não vai nos tirar do buraco onde entramos. Ela reduz o gasto do governo; tem algum impacto na estrutura dos juros bancários; afeta as expectativas. A queda de 1,5 ponto percentual decepcionou alguns, mas se eles caíssem mais, por imposição do governo, os juros de mercado subiriam. O efeito seria o oposto.

Uma taxa de juros de 11,25% ao ano continua sendo alta. Havia muitas previsões no mercado de que a queda poderia ser de até 2 pontos percentuais. O IPCA divulgado ontem foi alto, de 0,55%, mas 60% do índice foi a alta sazonal dos preços de educação e material escolar. Para o mês que vem, o economista Luiz Roberto Cunha prevê uma volta aos níveis de 0,15% a 0,20%. Hoje, a inflação em 12 meses está alta, perto de 6%, mas ele prevê que até junho o índice deve convergir para o centro da meta.

Criticar o Banco Central, ter outra visão, avaliar de forma diferente o que ele pensa, todo mundo faz. O que seria um desastre, com efeitos opostos ao desejado, seria uma intervenção política no BC para decidir a taxa de juros.

Neste sentido, a declaração do senador Sérgio Guerra, presidente do PSDB, feita na véspera da decisão, foi espantosamente inepta. Mostra que os tucanos não entenderam seu próprio governo. O senador oposicionista disse que como o Banco Central não é independente, o presidente Lula é que deveria baixar os juros. Ora, a autonomia do BC, iniciada no governo tucano, é parte do remédio, e não da doença. A taxa de juros que vale para uma grande parte da economia é decidida pelo mercado privado. Se ficasse claro que a Selic é decidida politicamente, os juros subiriam na prática.

- Esse é um ponto importante. Se os juros forem politizados, o mercado vai concluir que a inflação subirá no futuro, o prêmio de risco sobe e isso impacta os juros futuros. E são os juros futuros que fazem efeito na economia, e efeito imediato - explica o economista chefe da Febraban, Rubens Sardemberg.

O mercado de juros futuros já tinha derrubado a taxa, mesmo antes de o Banco Central reduzir a Selic. O alívio, portanto, já estava fazendo efeito na economia. É o que explica também o economista Fábio Giambiagi, especialista em contas públicas.

- Os juros já despencaram, porque a percepção é que o Banco Central será levado, pelas circunstâncias econômicas, a um ciclo mais longo de taxas de juros. No mercado secundário, em outubro, as taxas eram de 15% para uma selic de 13,7%. Em fevereiro, antes do corte da Selic, já estavam em 11%. Em outubro, o leilão de NTN-F para vencer em 2017 pagou 18,3%, e no último leilão, agora em março, a taxa caiu para 12,9%.

Se houver a percepção, explica Fábio, de que não é o Banco Central que decide os juros, aumenta o temor de que haja inflação, descontrole da conta corrente, e essas expectativas fazem com que os juros futuros subam.

Tudo é mais complicado do que parece, e Rubens Sardemberg resume:

- O Banco Central controla muita coisa, mas não controla tudo.

Fábio Giambiagi explica que o próprio impacto da queda dos juros na redução do custo da dívida é mais complexo do que parece, porque parte da dívida é formada por títulos prefixados ou indexados a índices de preços.

Há outras complicações no mercado de crédito brasileiro. Parte das empresas tem vantagens determinadas pelo governo e pagam juros subsidiados. É o crédito direcionado. Os bancos são obrigados a emprestar a juros menores para o setor rural. Tentam fugir dessas exigências, que recaem mais sobre os bancos públicos. Quando alguma coisa acontece de errado na economia, os produtores pedem rolagem da dívida. O risco do não pagamento desses empréstimos e a obrigação de oferecer a taxas menores recaem sobre os tomadores do mercado livre. O chamado mercado livre tem 45% do total do crédito no Brasil.

Grandes empresas são tomadoras de crédito diretamente do BNDES e pagam apenas a TJLP, de 6,25% ao ano. É o BNDES direto. Empresas menores têm que ir aos agentes repassadores, e pagam essa TJLP mais um spread de 4%. O crédito ao consumidor tem as mais diversas faixas de preços. O consignado com taxas menores; o das financeiras com taxas altíssimas.

Por ter tido juros sempre muito altos, o mercado de crédito no Brasil foi criando esses atalhos de juros mais baixos para grupos específicos: as grandes empresas, os produtores rurais, os funcionários públicos e aposentados. Continua tendo o dinheiro mais caro do mundo, mas o preço varia de acordo com o freguês: de juros negativos a preços de agiota. Uma redução da taxa Selic, por maior que seja, não corrige essa confusão.

Comparada com o resto do mundo, a taxa básica de juros em 11,25% é muito alta; comparada com nossa história, é até baixa; confrontada com a queda forte do nível de atividade, parece um exagero. Mas se os juros caíssem mais drasticamente, não trariam de volta o ritmo de crescimento perdido. Será preciso mais do que derrubar os juros. As taxas vão continuar caindo nas próximas reuniões.

Que Bonito, hein!

Paulo Yafusso
DEU EM O GLOBO


Aeroporto só começará a funcionar agora, apesar de Lula ter inaugurado pista há cinco anos

CAMPO GRANDE. O Aeroporto de Bonito, pólo do ecoturismo de Mato Grosso do Sul, começa a operar no início do mês que vem. E é um exemplo das inúmeras viagens do presidente Lula e da ministra Dilma Rousseff, pré-candidata à Presidência, para "inaugurar" obras. Embora só vá começar a ter voos regulares agora, ele teve a pista "inaugurada" por Lula há cinco anos, durante a gestão do governador Zeca do PT. Em 12 meses, Dilma já fez 30 viagens para promover obras do governo. O também pré-candidato à Presidência José Serra, governador tucano de São Paulo e que já acusara petistas de "piratear" obras do estado, disse anteontem que "o talento mercadológico, de marketing, é sempre um ponto fraco do PSDB e um ponto forte do PT".

Lula esteve no aeroporto em 2 de abril de 2004 para festejar a "inauguração". Apesar das comitivas, dos discursos e das promessas, porém, o presidente "batizava" apenas a pista de dois mil metros de extensão, que depois ainda teve de passar por ajustes. Somente no próximo dia 3 de abril, a Trip realizará o primeiro voo comercial entre Campo Grande e Bonito.

A inauguração do Aeroporto de Bonito é uma das armas de Mato Grosso do Sul para tentar fazer da capital, Campo Grande, uma das cidades-sedes da Copa de 2014. A outra concorrente no Pantanal é Cuiabá, capital de Mato Grosso.

Segundo a presidente da Fundação Estadual de Turismo, Nilde Brum, a conclusão da obra demorou por problemas ambientais e por causa do rigor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

Em 2003, o governo federal liberou R$1,5 milhão para a obra em Bonito, em parceria com o governo do estado. Para a construção do terminal de passageiros, foi feita licitação, e a empresa vencedora se comprometeu a investir R$2,2 milhões. Em troca, vai explorar o terminal.

Apesar de o voo inaugural estar previsto para abril, voos comerciais só passarão a ter regularidade em maio.

Governo devolve ao BID verba para saneamento

DEU EM O GLOBO

Cinco anos depois, só uma obra prevista saiu do papel

BRASÍLIA. O governo brasileiro devolveu ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) US$57 milhões que seriam aplicados em obras de saneamento básico em dois municípios do estado do Ceará (Limoeiro do Norte e Quixeramobim), três de Pernambuco (Ipojuca, Santa Cruz do Capiberibe e Surubim) e um do Rio Grande do Norte (Assu). Os recursos se referiam a um contrato firmado pelo governo Lula com o banco em 2004 para a execução de um projeto chamado PASS (Programa de Ação Social em Saneamento).

No entanto, passados cinco anos, a única obra que saiu do papel foi em Limoeiro do Norte. Dificuldades dos beneficiados na elaboração dos projetos foi a principal explicação do Ministério das Cidades para a demora na aplicação da verba, numa área onde o país é carente.

O contrato venceu no último domingo e, como o governo brasileiro optou por não prorrogá-lo, o programa foi extinto. A justificativa do Ministério das Cidades foi o alto custo do empréstimo, pois o país precisa remunerar o organismo com uma taxa de permanência pelo não uso do dinheiro.

O diretor de Articulação da Secretaria de Saneamento da pasta, Sérgio Gonçalves, argumentou que a realidade do país hoje é outra, pois o governo federal conta com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê investimentos pesados no setor de saneamento com recursos baratos, do Orçamento Geral da União.

CGU apontou falha em obra em cidade cearense
Ele citou também decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que, no fim do ano passado, determinou a aplicação integral da Lei de Licitações (8.666) nos empréstimos internacionais. Até então, o governo vinha utilizando a legislação, mas com flexibilidade. Além disso, Gonçalves disse que a Controladoria-Geral da União (CGU) já tinha apontado falhas na licitação na única obra em andamento, a de Limoeiro do Norte.

Esses dois fatores, segundo o secretário, forçariam a renegociação do contrato com o banco em novas bases e o cancelamento das licitações já realizadas ou em andamento.

- Não sabíamos quanto tempo isso ia levar - afirmou o diretor.

Ele disse que a população não deixará de ser atendida e que os seis municípios beneficiados pelo programa do BID foram incluídos no PAC. Ainda nesta semana, disse, serão empenhados R$90 milhões para assegurar as obras.

O BID foi procurado, mas não se manifestou. Fontes do banco lamentam que o programa não tenha sido executado no prazo previsto, pois a verba tem a finalidade de complementar ações governamentais em áreas que recebem menos atenção do Executivo.

Depois do tombo do PIB... Juros têm queda recorde

Patrícia Duarte e Luciana Rodrigues
DEU EM O GLOBO


O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC reduziu a taxa básica de juros em 1,5 ponto percentual, dentro das estimativas mais conservadoras. A taxa passou para 11,25% ao ano, o menor nível histórico, como em 2007. Apesar de ter sido o maior corte em mais de cinco anos, economistas, empresários e líderes sindicais temem que tenha chegado tarde demais. Segundo fontes próximas ao Planalto, o presidente Lula também teria considerado que os juros demoraram para cair.

Ameaça de recessão derruba juros

Em decisão unânime, BC corta taxa básica para 11,25% ao ano

Pressionado pela séria ameaça de recessão, o Comitê de Política Monetária (Copom) acelerou o passo e reduziu ontem os juros básicos de 12,75% para 11,25% ao ano, recolocando a Taxa Selic em seu menor patamar histórico. O corte de 1,5 ponto percentual - o de maior magnitude desde novembro de 2003 - representava a média das projeções de mercado, mas ainda assim foi encarado como um movimento cauteloso por analistas, setor produtivo, trabalhadores e lideranças políticas. Após a divulgação da retração de 3,6% na atividade econômica no quarto trimestre de 2008, crescera a avaliação de que caberia nas contas do Banco Central (BC) uma diminuição de 2 pontos percentuais.

A decisão de ontem foi unânime - em apenas duas horas de reunião - e o Copom deixou claro que pode continuar cortando a Selic nos próximos encontros. Porém, na visão de analistas de mercado, não houve qualquer sinalização de qual será a intensidade dos próximos cortes de juros.

Em comunicado, a autoridade monetária informou que "acompanhará a evolução da trajetória prospectiva para a inflação até a sua próxima reunião (dias 28 e 29 de abril), levando em conta a magnitude e a rapidez do ajuste da taxa básica de juros já implementado e seus efeitos cumulativos, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária".

Não repetiu, porém, que estava realizando "parte relevante" do ajuste nos juros neste encontro, como ocorreu no de janeiro. Naquela ocasião - com atraso, na comparação com os principais emergentes e países ricos - o BC decidiu reduzir os juros, em 1 ponto percentual, mas rachado. Três dos oito diretores queriam um corte de só 0,75 ponto.

Incerteza sobre próximos cortes

Para a próxima reunião do BC, muitos analistas apostam em nova redução de 1,5 ponto.

- O Brasil tem muito espaço para fazer política monetária, cortar juros. Todos os indicadores, como crescimento da atividade e inflação, mostram que dá para fazer isso - resumiu o economista-chefe do Itaú, Tomas Malaga, que projeta uma Selic a 9,25% no fim de 2009.

Alguns economistas ponderam, no entanto, que o BC deve calibrar bem suas decisões:

- O corte (de 1,5 ponto) foi até ousado, mas o comunicado é conservador, o que é bom. A recuperação da economia pode ser mais rápida do que se imagina - afirmou a economista-chefe do ING, Zeina Latif.

O tom cauteloso do comunicado divulgado após a reunião do Copom só aumentou as dúvidas sobre quais serão os próximos passos do BC.

- Ao dizer que levará em conta "a magnitude e a rapidez do ajuste da taxa básica", o BC sinalizou para o mercado que o atual ritmo de corte pode não se manter. E começava a haver um consenso de que o BC manteria o ritmo de 1,5 ponto percentual de corte nos próximos meses - explicou Jankiel Santos, economista-chefe do BES Investimentos.

Para Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Santander e ex-diretor do BC, o comunicado mostra que a autoridade monetária não quis se comprometer com nenhum tipo de trajetória para corte de juros.

- Daqui para frente, o BC definirá seus próximos passos de acordo com os sinais de curto prazo da economia. Poderá vir um novo corte de 1,5, ou reduções maiores ou menores. O cenário ainda é de muita incerteza.

Os principais motivos que levaram o BC a optar por um corte mais agressivo na taxa de juros foram conhecidos nas duas últimas semanas. Primeiro, veio a produção industrial de janeiro, com queda de 17,2% frente ao mesmo mês do ano passado, pegando de surpresa até mesmo os mais pessimistas.

O fantasma da recessão cresceu ainda mais na terça-feira, quando o IBGE divulgou que a economia brasileira havia encolhido 3,6% no último trimestre de 2008.

Como a Selic é a taxa que baliza o custo dos empréstimos, ao reduzi-la o BC ajuda a baratear o crédito, tanto para as empresas quanto para os consumidores finais. Juros menores podem estimular o consumo e os investimentos, impulsionando a retomada do crescimento.

À tarde, sindicalistas fizeram uma manifestação em frente à sede do BC, em Brasília, para cobrar agressividade no corte de juros. Liderados pela Força Sindical, cerca de 40 manifestantes queimaram um boneco representando o presidente da autoridade monetária, Henrique Meirelles. Eles bateram no boneco - cuja cabeça tinha uma foto do rosto de Meirelles - com paus, chinelos e socos durante alguns minutos e, depois, atearam fogo.

Brasil tem maior taxa real do mundo

Mesmo com o corte de ontem na Selic, o Brasil continua como o país de maior taxa de juro real (descontada a inflação) do mundo. Levantamento feito pela consultoria UpTrend mostra que, considerando a inflação projetada para os próximos 12 meses, o juro real brasileiro é de 6,5% ao ano.