terça-feira, 8 de setembro de 2009

Figuras da eticidade

Paulo Meneses, S.J.
DEU EM GRAMSCI E O BRASIL

A seriedade, a dor, a paciência e o trabalho do negativo. Fenomenologia. Prefácio, § 19.

Essa frase de Hegel nos leva a buscar situações — ou figuras — que são valorizadas pela presença do negativo, isto é, em que o negativo faz parte da sua estrutura.

Podemos buscar mais longe no tempo, na figura da esperança, que para Aristóteles e S. Tomás se situa no apetite irascível e se caracteriza pela negação do obstáculo que se opõe à sua realização.

Na mentalidade moderna, a tão falada tolerância é, no fundo, “uma negação da negação”, como já era a esperança, pois seu movimento se destina a destruir a intolerância (que é sempre primeira ou a atitude primária), que desejaria “proibir de ser” o outro. Parece muito pouco, mas é fundamental: as nações, classes e culturas estão ainda longe de admitir o outro, de renunciar a eliminá-lo pela violência ou a extirpar sua alteridade, fazendo-o à imagem e semelhança do mesmo.

Hegel desenvolve na Fenomenologia “as três figuras da moralidade”, que, todas, se situam no embate entre a consciência moral do indivíduo e o curso do mundo, que não parece corresponder à lei do coração (§§ 360-393). Luta inglória e, no fundo, contraditória e autodestrutiva.

Sem forçar o paralelismo, talvez pudéssemos dizer que temos aqui “figuras da eticidade”, onde já no “elemento” do Espírito a negatividade destrói os obstáculos para que ele se manifeste, elimina as barreiras para que um “Nós” se constitua: o princípio da esperança abre as cortinas do futuro e da generosidade; a tolerância cria as precondições para que o outro seja aceito e respeitado.

A esperança

Vamos falar primeiro da esperança: tarefa difícil depois das palavras geniais de Péguy. Que força é essa que lança pontes sobre os maiores abismos do desespero, que faz surgir a luz nas trevas mais densas, que transforma a fraqueza em energia, o desânimo em coragem? De onde vem ela? Certamente do mais íntimo do ser humano, de sua vontade de ser, de sua aposta de que a vitória é possível, porque é necessária. O obstáculo, o mal jamais será mais forte do que nós: não passa de um desafio que tem por efeito mobilizar nossas forças para superá-lo.

Hegel é visto como o filósofo que se volta para o passado, porque tomam a metáfora da coruja — que só levanta voo no crepúsculo — como a síntese de toda a filosofia hegeliana. Mas isso é esquecer sua filosofia da história, que é movida pela ânsia da liberdade e tem como sentido sua realização sempre mais plena. Por trás das aparências e decepções presentes, esse dinamismo trabalha como uma “brava toupeira”, indo na direção certa — na direção da luz. Podia-se dar um exemplo recente desse trabalho de toupeira da liberdade: os horrores da era nazista deram ocasião a uma nova mentalidade, que tornou a ordem democrática e os direitos humanos uma aquisição definitiva para a consciência social na atualidade.

Em Hegel, encontra-se ainda radicalizado esse “obstáculo”, que, para S. Tomás, era a condição (e a luta) da esperança. Aqui, o obstáculo não é algo externo, mas é a força da negação contra a qual se debate o Espírito e, quanto mais parece naufragar ante essa potência, maior é sua vitória. Dois textos ilustram essa dialética:

Fenomenologia, § 340: “O Espírito é tanto maior quanto maior é a contradição da qual retorna para si mesmo”. Essa é a esperança hegeliana, que se mostra mais vitoriosa na medida em que o obstáculo — que a afeta como contradição — é por ela superado no seu retorno a si mesma. Para além da imediatez do positivo bei sich, essa esperança é uma conquista de si mesma, mediada pela passagem forçada do poder da negação.

Fenomenologia, § 32: “A vida do Espírito não é a vida que diante da morte se apavora e se conserva intacta da devastação; mas é a vida que a suporta e nela se conserva. Sua verdade, ele somente alcança no dilaceramento absoluto. O Espírito não é essa potência como o positivo que foge do negativo, mas é essa potência só enquanto encara frontalmente o negativo, demora-se (e mora) junto dele.É esse demorar-se o poder mágico que faz o negativo virar ser”.

Veja-se como são fortes as expressões: esse obstáculo, longe de ser algo externo, é “devastação”, “dilaceramento”; e o Espírito tem de “demorar-se” junto ao negativo. Ainda mais: trata-se de um análogo da “criação ex nihilo”, pois tanta é a criatividade do Espírito que faz jorrar essa irrupção do ser a partir da “devastação”, do “dilaceramento”, que nele produz o negativo. Mas é a força da esperança encarar isso sem medo e, demorando junto a ele, fazer, por seu poder mágico, o nada virar ser.

Estamos em pleno campo da eticidade: essa esperança não é um anelo da “bela alma”, uma fuga da realidade dura em busca de utopias consoladoras, mas é toda voltada para um corpo a corpo com o mundo real: “A força do espírito só é tão grande quanto sua exteriorização: sua profundeza só é profunda na medida em que ousa expandir-se e perder-se em seu desdobramento” (Fenomenologia, § 10).

Assim, ficaram longe as três figuras da moralidade (§§ 360 a 393): saímos daqueles lagos de subjetividade para o alto mar da eticidade, da efetividade.

Essa esperança, que nada tem a ver com a utopia, é a que perpassa o sistema hegeliano. Na expressão vulgar, consiste em “tirar leite das pedras” e, na verdade, mergulha até o fundo do negativo para daí operar a reversão dialética rumo ao ser, à efetividade.

A tolerância

A concepção da tolerância é dificultada pela atitude do entendimento classificador, que não capta sua natureza dialética devido a seu viés de tudo reduzir a “instantâneos”. Na verdade, a tolerância não é uma atitude indiferente e anódina, mas uma “negação da negação”: tem um componente “beligerante”, consistindo em voltar-se contra a intolerância, que é uma rejeição da alteridade e, no fundo, uma tentativa de “proibir de ser” (Paulo Freire) o outro, quer eliminando sua existência, quer destruindo sua alteridade. A tolerância estabelece esse direito de ser do diferente e rejeita essa rejeição.

A tolerância é um conceito histórico surgido com a modernidade e as Luzes, numa luta violenta com a intolerância dominante. Polemistas irados como Voltaire e Locke travaram uma batalha desigual contra a intolerância que reinava nas instituições e nas mentalidades. Essa “beligerância” caracterizou desde o início a defesa da tolerância, que exige não só uma morna resignação — como quando se fala de “casas de tolerância” —, mas requer a abolição de qualquer atitude de estigmatização.

A primeira reação do mesmo frente ao outro não é o acolhimento nem muito menos o amor. A “dialética do senhor e do escravo” ilustra o paroxismo dessa oposição, que passa por uma luta de vida ou morte. De fato, é de vida e morte que se trata: enquanto houver povos massacrando raças, e religiões exterminando a vida dos diferentes, a própria diversidade de sexos dando lugar a assassinatos frequentes das mulheres, não se pode dizer que a tolerância está superada e que já está na hora de falar em atitudes mais acolhedoras da diversidade. O século 20 foi o século dos genocídios, e nada garante que o século presente vá ser mais humano.

Então, a tolerância começa por deixar que o outro exista, o que já é grande coisa quando em tantas partes do mundo continua a haver massacres de populações e, até mesmo nos países mais desenvolvidos, a vida das mulheres não está nada garantida dentro de suas casas: como se o movimento da libertação das mulheres tivesse estimulado ainda mais a sanha assassina dos machistas.

E ainda há outro passo a ser dado rumo à tolerância: não basta respeitar a existência do outro, é preciso respeitar também sua alteridade. Nem sempre a intolerância parte em guerra para eliminar o diferente; muitas vezes se contenta com extirpar sua alteridade, fazendo-o assumir as formas e a cultura do mesmo. Notável estratégia dos colonizadores esclarecidos e mesmo de missionários salesianos, que na Amazônia proibiam os índios tukano de falarem sua própria língua. Essa assimilação é muitas vezes buscada pelo oprimido para tirar vantagens da situação.

Descaracterizando-se na medida exigida pelo colonizador, salva-se talvez a vida, mas se perde a razão de viver e de ser: sacrifica-se sua própria alma. Grande parte de nossa juventude tem hoje a síndrome porto-riquenha, preferindo ser integrada no império, mesmo sabendo que nele vai ter uma posição discriminada de cidadão de terceira classe. É de notar como as elites dos países que constituíam a cortina de ferro têm hoje como ideal o neoliberalismo mais ortodoxo, voltando as costas para os tremendos problemas sociais de seus países. Como se vê, um fator ideológico acompanha esse tipo de colonialismo, segundo a frase de Rousseau: “Os escravos perdem tudo sob o jugo de seus grilhões, até mesmo o desejo de rompê-los”.

Pertence à tolerância, por seu caráter de “negação da negação”, essa beligerância em defesa de nossa identidade, esse apego cioso à nossa diferença, contrapondo-se a todo etnocentrismo (eurocentrismo, imperialismo) que atente contra nossa diferença constitutiva.

Uma luta sempre atual, que hoje tem de enfrentar a grande corrente midiática controlada pelas forças dominantes para “formar opiniões” alinhadas em favor da dominação, da desinformação, da descaracterização de nossa realidade.

Mas a tolerância, como a conceituamos, em sua característica dialética, tem a necessidade de ultrapassar-se, de ir além de si mesma. Vemos o que aconteceu no domínio político-religioso, que foi o primeiro campo de luta contra a intolerância. O que no início era simples tolerância da diversidade de crenças deu um salto qualitativo para a situação de hoje: o respeito de todas as crenças ou opiniões em nome da liberdade de consciência, que é admitida como uma evidência não só pelos Estados modernos, mas também pela Igreja Católica pós-conciliar. Existe, para falar como Hegel, um “instinto de razão” no íntimo da tolerância, que aponta para a igualdade efetiva e o reconhecimento do outro na sua diferença. Assim o próprio dinamismo da tolerância tem um núcleo positivo, e sua “beligerância”, uma vez negada a negação que proibia o outro de ser, tende para a positividade do respeito da liberdade e igualdade de todos.

A verdade da tolerância está no reconhecimento.

Paulo Meneses, S.J., filósofo, é o tradutor da primeira edição brasileira da Fenomenologia do Espírito (Vozes, 1999). Escreveu, entre outros livros, as Homilias na Unicap.

A sociologia pública de Burawoy

Fernando Perlatto
DEU EM GRAMSCI E O BRASIL


Ruy Braga e Michael Burawoy (Orgs.). Por uma sociologia pública. São Paulo: Alameda, 2009.

“Uma ciência do social que se imunize contra a sociedade tem tudo para tornar-se academicamente respeitável e... irrelevante”. Esta frase, de Francisco de Oliveira, presente no “Prefácio” da obra Por uma sociologia pública, de Michael Burawoy e Ruy Braga, sintetiza boa parte das ideias que os autores procuram discutir neste livro, que se configura como um interessante estímulo para a imaginação em torno deste tema. Partindo das reflexões em torno da ideia de “sociologia pública”, Burawoy — professor do Departamento de Sociologia da Universidade da Califórnia em Berkeley e outrora presidente da American Sociological Association — e Braga — professor do Departamento de Sociologia da USP — reúnem nesta obra artigos inéditos e outros que já haviam sido publicados em revistas acadêmicas para defender a ideia de uma “prática sociológica” engajada com diferentes públicos extra-acadêmicos, que consiga conjugar o rigor de uma sociologia profissional com a intervenção no espaço público.

O tema da sociologia pública não é de todo novo no Brasil, tendo já sido objeto de seminais investigações [1]. Não é de se estranhar tal fato. Afinal, nós nos constituímos como um país pensado pelos intelectuais. Seja atuando em academias e institutos, seja na universidade, em partidos ou inseridos no aparelho de Estado, a inteligência brasileira buscou se inscrever na esfera pública, formulando e disputando projetos sobre o futuro da nação, desempenhando papel de destaque no processo da modernização brasileira. É importante constatar, por conseguinte, que a universidade, em geral, e a sociologia, em particular, atuaram, sobretudo a partir dos anos 1930, como espaços privilegiados não apenas de reflexão, mas de intervenção dos intelectuais na sociedade. Nesse sentido, Por uma sociologia pública, a despeito de não tratar exclusivamente do Brasil, oferece novas possibilidades conceituais e potenciais campos de reflexão para pensar o tema da inserção pública dos intelectuais em nosso país.

O primeiro capítulo “Por uma sociologia pública”, escrito por Michael Burawoy, apresenta de maneira clara os argumentos que resumem sua ideia do que seja uma “sociologia pública”, que constituirão a base das reflexões desenvolvidas no restante do livro. Ao traçar um breve histórico da reflexão sociológica, o autor ressalta a força do seu impulso moral originário voltado para a intervenção pública, não obstante as pressões ocorridas no decorrer dos anos para que ela abandonasse esta postura. Burawoy desenvolve onze teses enfatizando a sociologia não apenas enquanto ciência, “mas também como moral e como força política” (p. 20). Estas teses têm em comum a ideia de uma “sociologia pública orgânica”, caracterizada por um processo educativo mútuo entre o cientista e seu público. O autor aponta, nesse sentido, a existência de uma “divisão do trabalho sociológico” entre a “sociologia pública”, a “sociologia das políticas públicas”, a “sociologia profissional” e a “sociologia crítica”, enfatizando a necessidade do diálogo entre elas, com o objetivo de se construir uma disciplina que, em tempos de “tirania do mercado e de despotismo do Estado”, assuma a defesa dos “interesses da humanidade”, do ponto de vista da sociedade civil.

No segundo capítulo, “O pêndulo de Marx: sociologias públicas e engajamento social”, Ruy Braga se dedica a compreender a relação existente entre o “marxismo aberto” — que se configura como uma retomada crítica da teoria marxista na década de 90 frente à crise vivida pelo marxismo a partir dos anos 70 aos 90, sobretudo após a dissolução da União Soviética, reunindo nomes como Werner Bonefeld, Richard Gunn e Kosmas Psychopedis — e o campo da sociologia crítica, com destaque para Pierre Bourdieu e sua sociologia como um “esporte de combate”. Após discutir a relação pendular existente entre o marxismo e a academia, bem como a trajetória pessoal e acadêmica de Bourdieu, marcada pela busca de uma sociologia que interferisse na realidade, o autor tece algumas semelhanças e diferenças existentes entre estas duas escolas de reflexão, apontando para o conceito de “sociologia pública”, desenvolvido por Burawoy, permitir abrigar uma relação mutuamente proveitosa entre a sociologia crítica e o marxismo aberto, que poderia se configurar como uma “‘sociologia pública marxista” (p. 116).

Michael Burawoy, no terceiro capítulo, “Abrir as ciências sociais: para quem e para quê?”, retoma muitas das ideias presentes no texto inicial para criticar o relatório Abrir as ciências sociais, elaborado sob a coordenação de Immanuel Wallerstein, que possui, segundo ele, uma série de equívocos justamente por não se colocar as perguntas: sociologia “para quem” e “para quê?”. Burawoy discute a existência de três “ondas da sociologia” — a primeira proveniente da Europa, com “forte tempero utópico”, como resposta à primeira onda de mercantilização que ameaçou a sobrevivência das classes trabalhadoras; a segunda, que teve seu epicentro nos Estados Unidos e se estendeu da Primeira Guerra Mundial até o colapso dos regimes comunistas, procurando estabelecer amplas relações com o Estado na busca pela regulação do mercado; e a terceira marcada mercantilização e pelo avanço do neoliberalismo —, destacando que esta última onda vem enfrentando um processo de resistência criativa por parte dos países do Sul, como Brasil e África do Sul, assim como Portugal, locus este privilegiado, segundo o autor, de desenvolvimento de uma sociologia que logrou combinar de maneira crítica as quatro formas de conhecimento sociológico, sobretudo após o fim do regime salazarista, quando tomou para si o desafio de reconstruir o próprio tecido social de Portugal a partir de então.

No quarto capítulo, “Cultivando sociologias públicas nos terrenos nacional, regional e global”, ao seguir o argumento do capítulo anterior e enfatizar que as sociologias de cada país oferecem respostas específicas para cada contexto de transformações sociais, Burawoy discute o desenvolvimento desta disciplina nos Estados Unidos, na Índia, nos países pertencentes à antiga União Soviética, na América Latina, na Espanha e em Portugal, na África do Sul, na Europa setentrional e Europa meridional. De acordo com o autor, a despeito de a sociologia profissional estadunidense imprimir sua marca sobre as demais sociologias profissionais nacionais, como ponto de referência hegemônico, vêm ocorrendo nos últimos anos mudanças sociológicas importantes nos países da semiperiferia, que, além de dever ser aproveitados pelos Estados Unidos, podem contribuir — a partir de suas divisões do trabalho, de sua ênfase reflexiva e de suas vivas conexões com a sociedade civil — para o cultivo do “jardim da sociologia internacional” (p.159).

Nos dois capítulos seguintes — “O futuro da sociologia” e “A guinada crítica para a sociologia púbica” — Michael Burawoy aprofunda seu argumento, realçando os cuidados necessários para o intercâmbio das sociologias nacionais na contemporaneidade, tanto pelo risco de elas se afastarem dos problemas locais, quanto pela iminente possibilidade da subordinação frente a sociologias desenvolvidas em outros países, sobretudo a estadunidense. Para o autor, o foco da sociologia pública da atual fase deve estar na sociedade civil, eleita como instância primordial, de modo a evitar tanto a “tirania do mercado”, quanto o “despotismo do Estado”. Atuando diretamente com organizações, movimentos e públicos extra-acadêmicos, assim como distante do “controle do mercado e do Estado”, a sociologia pública, de acordo com o Burawoy, deverá se manter continuamente comprometida com alguma visão democrática do socialismo.

O oitavo capítulo “A fabricação da identidade: sociologia pública do trabalho e sindicalismo no Brasil”, de Ruy Braga e Marco Aurélio Santana, e o nono, “A guinada pública: do processo de trabalho ao movimento sindical”, de Burawoy, abordam um assunto semelhante, qual seja: a relação entre sociologia pública e mundo do trabalho. Enquanto o sociólogo norte-americano traça um interessante quadro paradoxal da transformação de uma sociologia profissional crítica para uma sociologia pública crítica do trabalho, ocorrido justamente no período recente de maior declínio do movimento sindical, Braga e Santana estabelecem uma divisão temporal da organização e consolidação da sociologia do trabalho no Brasil. De acordo com os autores, ela teria sido marcada, em seus primórdios, pela busca de afirmação e profissionalização, procurando se diferenciar daqueles estudos “militantes” oriundos do PCB e tendo como destaque os trabalhos de autores como Juarez Rubens Brandão Lopes, Leôncio Martins Rodrigues, Azis Simão e Albertino Rodrigues.

Diferenciando-se deste período inicial de profissionalização, nas décadas de 70 e 80, teria se desenvolvido uma sociologia pública do trabalho no Brasil, com forte engajamento político-social, marcada pelo estabelecimento de um vínculo “orgânico” entre estudiosos e sindicalistas, com destaque para os trabalhos de Francisco Weffort sobre o “populismo”. Atualmente, a partir dos anos 90 e da experiência das câmaras setoriais, estaríamos vivenciando um momento de predomínio da sociologia para as políticas públicas, com o fortalecimento de uma rede de instituições não-acadêmicas — como o Dieese (Departamento Sindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) e o Desep (Departamento de Estudos Sociais, Econômicos e Políticos da CUT) — que lograram construir um discurso analítico capaz de interagir com a sociologia profissional em condições de relativa “igualdade”. A vitória de Lula em 2002 e a chegada de muitos sindicalistas ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) teriam coroado este novo ciclo de profissionalização e de consolidação de uma sociologia para políticas públicas no país.

O quinto e o décimo capítulos são dedicados à ampliação da discussão da sociologia pública no Brasil. Em “Atravessando o abismo: uma sociologia pública para o ensino médio”, Ruy Braga traz para o centro do debate o ensino da sociologia no ensino médio. Ao lado da filosofia, a sociologia havia deixado de ser lecionada nas escolas desde 1971, como ordem do regime militar. Depois de anos de lutas, no dia 9 de junho de 2008, foi sancionado o projeto de lei que tornou obrigatórias estas disciplinas nas três séries do ensino médio em todas as escolas do país. Para além das questões relacionadas ao currículo e à formação de professores, Braga discute a necessidade de se promover o contato do estudante de sociologia com o estudante do ensino médio por meio da sociologia pública, na medida em que somente esta seria capaz de “atravessar as fronteiras da universidade para enredar-se na sempre complexa trama das lutas sociais autênticas” (p. 170).

Já o décimo capítulo, “Sociologia pública: considerações a partir do Brasil”, escrito por Ruy Braga, em parceria com Sylvia Gemignani Garcia e Leonardo Mello e Silva, é dedicado à discussão da sociologia pública no Brasil, tomando como mote as trajetórias intelectual e política de “dois dos mais autênticos representantes dessa sociologia crítica e militante” — Florestan Fernandes e Francisco de Oliveira —, que se mesclam com trajetórias institucionais significativas para o desenvolvimento da sociologia pública no país, como a da USP, da Sudene e do Cebrap. Como bem destacado pelos autores, é difícil imaginar um lugar no mundo onde a proposta de “sociologia pública” elaborada por Burawoy faça mais sentido, tanto pelo fato de nos constituirmos como um dos países mais desiguais do planeta, quanto pela “presença de uma certa forma de fazer sociológico igualmente crítico e militante que dialoga fortemente com a sociologia pública” (p. 255). Daí que, “apesar de ser ainda embrionário” — como ressaltam os autores — “o debate acerca da sociologia pública tem todas as condições para prosperar no Brasil” (p. 265).

É justamente a partir desta perspectiva — de contribuir para suscitar o debate em torno da sociologia pública e colaborar para que ela prospere no país — que a obra Por uma sociologia pública deve ser compreendida. Não obstante seus méritos e sua qualidade, este livro poderia ter alcançado um melhor resultado se possuísse menos capítulos com textos semelhantes e se estes fossem mais bem explorados. Se, por um lado, a grande quantidade de capítulos faz com que argumentos similares sejam repetidos continuamente — o que acontece nos textos de Burawoy —, tornando cansativa a leitura de determinados trechos da obra, por outro, alguns capítulos poderiam ter sido mais bem explorados — o que acontece em alguns dos textos de Braga —, como, por exemplo, aquele dedicado à obrigatoriedade do ensino da sociologia no ensino médio e o capítulo final sobre a sociologia no Brasil. Além disso, talvez tenha faltado à obra um texto escrito em conjunto pelos dois autores, que pudesse armar, de maneira mais sintética, uma visão comparativa entre o desenvolvimento das sociologias públicas nos Estados Unidos e no Brasil.

Outro aspecto a ser ressaltado negativamente da obra é o foco que Burawoy dá à sociedade civil, em detrimento da “tirania do mercado” e do “despotismo do Estado”. Apesar de algumas poucas advertências feitas pelo autor para se evitar uma leitura enviesada acerca deste ponto, há um risco permanente na interpretação dos textos de Burawoy de se cair numa ideia que interprete a sociedade civil como o reino da “pureza”, condenando-se o Estado, como se ele fosse tão deletério quanto o mercado. Se isso já não parece ser verdadeiro nos países centrais, é menos ainda em países periféricos, em geral e, no Brasil, em particular, onde o Estado, além de ter sido um dos locus centrais de inserção dos intelectuais na vida pública, historicamente, desempenhou e tende a desempenhar funções centrais no processo de combate à desigualdade de renda abissal aqui existente.

No entanto, convém destacar que estas críticas não apagam o mérito principal do livro, relacionado, sobretudo, ao estímulo no Brasil da discussão em torno da ideia de “sociologia pública” de Burawoy, que, apesar de ampla, oferece muitas pistas para serem trilhadas nas investigações subsequentes. A bibliografia mobilizada também possibilita a incursão dos leitores brasileiros em novos universos, que precisam ser mais bem conhecidos, relativos à temática abordada. Dessa forma, ao fim e ao cabo, saímos da leitura de uma obra como essa com a certeza de que não há como se construir um projeto de aprofundamento social e político da democracia no país sem que coloquemos em primeiro plano o papel de uma sociologia que, além de se institucionalizar, não se esqueça de seu impulso originário e vá ao encontro da esfera pública, dialogando permanentemente com os setores subalternos no processo de transformação da sociedade.

Fernando Perlatto é mestrando do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e pesquisador do Centro de Estudos Direito e Sociedade (Cedes-Iuperj).

Nota
[1] A título de exemplo, basta citar: Werneck Vianna, Luiz. “A institucionalização das Ciências Sociais e a reforma social: do pensamento social à agenda americana de pesquisa”. In: A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, p. 195-242, 2004.

A favor do debate

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


O debate sobre o novo modelo proposto pelo governo para a exploração de 70% das reservas de petróleo da camada de pré-sal ganhou nova dimensão com a explicitação, por parte do presidente Lula, da intenção do governo de misturar o sentimento nacionalista do cidadão comum com aspectos técnicos que deveriam levar mais tempo para serem debatidos no Congresso.

Ao usar a data de Sete de setembro para afirmar, em cadeia nacional de rádio e televisão, que o pré-sal é “uma segunda independência”, e incitar os cidadãos a pressionarem seus representantes políticos para que aprovem o plano proposto pelo governo como sendo “o melhor para o Brasil”, o presidente está usando sua popularidade para colocar os parlamentares contra a parede.

O economista Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra estrutura (CBIE), ironiza a situação afirmando que “nunca antes neste país se viu o governo federal conduzir uma discussão sobre um tema da importância do pré-sal de forma tão autoritária e de maneira nada democrática”.

Ele considera “inaceitável” a tentativa de “jogar goela abaixo da sociedade brasileira”, através do regime de urgência constitucional, modificações na atual legislação do petróleo “que podem causar efeitos danosos para as futuras gerações”.

Além disso, Pires lança um novo dado na discussão: para ele, ao propor capitalizar a Petrobras com as reservas de petróleo das chamadas franjas em torno dos campos já licitados do pré-sal, “o governo cria um novo regime de cessão de direitos que irá conviver com o atual de concessão e o de partilha”.

Além de causar insegurança regulatória para as empresas privadas que já estão presentes nos campos licitados do pré-sal, com a decisão, “o governo não cumpre com a promessa de que a nova legislação não mexeria no passado”.

Para o economista, o projeto que cria a nova estatal Petrosal introduz no modelo de exploração do petróleo uma duplicidade desnecessária e perigosa ao propor para a nova empresa funções de gestora dos contratos de partilha e dos contratos de comercialização de petróleo e gás natural que já são atribuições de órgãos existentes.

A primeira função é atualmente exercida pela Agência Nacional do Petróleo, em relação aos contratos de concessão.

“Nesse sentido, a Petrosal vai esvaziar a ANP”, diz Pires, para completar: “O governo brasileiro abandona o modelo de controle da produção e fiscalização do campo por meio de uma agência reguladora e passa agora a ter essas funções exercidas por uma estatal com critérios pouco transparentes”.

A segunda função faz com que a Petrosal reencarne os antigos Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) e o Instituto Brasileiro do Café (IBC). “Trocar o papel de Estado arrecadador de impostos para comercializador de petróleo é um atraso, vide as experiências passadas com o IAA e IBC que só deixaram heranças malditas”, comenta Adriano Pires.

Outra função da Petrosal será participar dos comitês operacionais dos campos de petróleo, com poder de veto. Aos que afirmam que isso teria sido copiado da estatal norueguesa Petoro, o economista responde que não é verdade.

Segundo afirma, “na Noruega a estatal participa dos comitês operacionais porque a Petoro é investidora e, portanto, entra no risco do negócio. No Brasil, a Petrosal nada investe e apenas vai exercer uma ingerência política na administração dos campos”.

Também o monopólio na operação dos novos blocos do pré-sal é criticado pelo diretor CBIE, pois “tende a afastar investimentos das empresas petroleiras tradicionais e a trazer investimentos das empresas petroleiras estatais, em particular, as chinesas que possuem grande quantidade de capital e pouca experiência em operar campos de petróleo”.

Além de considerar inconstitucional o projeto de capitalização da Petrobras, Pires diz que ele “acaba prejudicando os acionistas minoritários, inclusive os do FGTS, quando o governo cede os direitos de suas reservas para a Petrobras”.

Na sua concepção, um país como o Brasil, “que possui um parque industrial moderno e dos mais competitivos do mundo, um sistema tributário sofisticado e eficiente, estabilidade econômica e um regime democrático consolidado, não pode e não deve adotar um modelo anos 50 para o setor de petróleo”.

Ele também acha que a volta do monopólio da Petrobras como a única operadora dos blocos do présal ainda não licitados “tende a afastar investimentos e a aumentar o risco da estatal, dado que a empresa será obrigada a aportar recursos em todos os blocos com um mínimo de 30%”.

Além disso, diz Pires, o monopólio na operação dos novos blocos do pré-sal “transformará a Petrobras na única compradora de bens e serviços para a indústria do pré-sal no Brasil, e com isso a indústria arcará com risco de ter somente um comprador, e a Petrobras terá o risco de ser obrigada, por uma política paternalista, a pagar mais caro pelos bens e serviços”.

Na coluna de sábado, “Visões para 20 anos”, feita com base em um trabalho dos economistas Claudio Porto e Rodrigo Ventura, da consultoria Macroplan Prospectiva, Estratégia & Gestão, havia uma informação errada sobre a produção diária de petróleo no Brasil, confundida com as reservas totais do país.

O Brasil em 2008 tinha reservas provadas de 14 bilhões de barris de petróleo (em 1969, eram de 1,1 bilhão), o que o coloca na 16aposição no ranking mundial dos países com maiores reservas da commodity.

Com as reservas do pré-sal já licitadas nos campos de Tupi, Iara e Parque das Baleias (29% de toda a área do présal), a reserva nacional pode saltar para 30 bilhões de barris na próxima década.

Em 2008, o Brasil produziu em média 2 milhões de barris dia, e as previsões mais conservadoras para 2015 apontam que alcançaremos uma produção de 3,5 a 4 milhões de barris dia.

Cheque em branco

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Se o presidente Luiz Inácio da Silva deseja mesmo, como disse em seu pronunciamento de domingo à noite, que a sociedade se engaje na questão do pré-sal, é preciso mais do que exortar as pessoas a se "mobilizarem" e "pressionarem" o Congresso a aprovar o quanto antes os projetos das normas de exploração do petróleo.

É necessário dar todas as informações, estimular a circulação de ideias, opiniões, abrir espaço à crítica, conduzir o assunto de maneira aberta e consistente, explicando como e porquê a população deve e pode influir na discussão.

Do jeito como a coisa está sendo posta - e o foi com ênfase absoluta no domingo - o presidente parece mais um ativista em seu ofício de recrutamento de seguidores dispostos a aderir cegamente a uma causa.

Tirando os especialistas, o que as pessoas sabem sobre o pré-sal é o que o governo diz. E o governo, pela voz do presidente da República, não informa, panfleta.

O modelo de exploração proposto, disse Lula em seu discurso, "impede que qualquer governante gaste de forma irresponsável os recursos" que assim, irão para "a educação, ciência e tecnologia, cultura, defesa do meio ambiente e combate à pobreza".

Além do mais, garante o "futuro dos nossos filhos e netos", mantém o petróleo "nas mãos do povo", assegura "o progresso" e é a representação material da independência, impedindo que ela seja apenas "um quadro na parede e um grito congelado na história".

Palavras que produzem efeito, mas não propiciam conhecimento. E sem conhecer - digamos, não total, mas mais ou menos do que se trata, com prós e contras, mediante o exame do contraditório -, a sociedade não pode verdadeiramente se "mobilizar" e "pressionar" o Congresso contra os "interesses menores da oposição", entre outros motivos porque não sabe se são mesquinhos mesmo ou se fazem realmente sentido.

Só se sabe o que o governo diz: a proposta do marco regulatório enviada ao Congresso é o "bem" e as discordâncias representam o "mal".

Desse modo, o governo trata os brasileiros não como cidadãos com direito ao exercício do discernimento mediante todas as variantes em jogo, mas como massa de manobra.

A tropa de choque governista no Congresso funciona nessa base. Mas, no caso, o preço já está incluído no serviço.

À sociedade é preciso convencer com argumentos racionais, inteligíveis, simples, porém não simplificadores da realidade ao ponto de reduzi-la a uma disputa entre patriotas interessados no melhor para o País e traíras da pátria, empenhados no pior para o Brasil.

O problema principal aqui nem é o pedido de urgência ao Congresso, que obriga a votação a ser feita em 90 dias nas duas Casas sob pena no trancamento da pauta. Uma discussão consistente e madura pode muito nem ser feita nesse período, se houver interesse e disposição.

O ruim da história é o clima messiânico que se instala em torno do pré-sal e a manipulação maniqueísta que o governo faz, procurando desqualificar o debate e sempre buscando alcançar a adesão incondicional sem o menor respeito à existência do "outro". Seja ele um adversário político ou só um brasileiro interessado naquilo que interessa ao País, não necessariamente aos governos.

O QUE FAZER

O PMDB defende que Lula retire o pedido de urgência para a votação dos projetos do pré-sal, mas acha que, nessa altura, a retirada é politicamente complicada, para não dizer impossível.

Sendo assim, a análise de gente da cúpula é a de que a oposição deveria parar de brigar contra a forma e se ater ao conteúdo. Em português: votar logo no prazo proposto pelo governo, a fim de tirar o assunto de pauta.

Na opinião de peemedebistas com trânsito mais do que livre na oposição, os papéis estão trocados: Lula deveria ser contra a urgência, para aproveitar ao máximo o discurso patriótico, já que, nessa concepção, o presidente está com a "boa causa".

À oposição deveria, nessa interpretação, interessar a votação o mais rápido possível: para escapar do papel de algoz que Lula lhe impõe e para tirar o presidente o discurso do "bem" contra o "mal".

PIOR AINDA

O senador Eduardo Azeredo corrige: não é dele - como dito aqui - a ideia de introduzir no texto da nova lei eleitoral uma referência "explícita" à liberdade de expressão, como forma de amenizar as críticas às restrições impostas pela legislação ao uso da internet.

Segundo o senador Azeredo, que propôs a permissão da propaganda paga na web, ele não é a favor do controle à rede, "mas da responsabilidade no seu uso, em defesa da privacidade e da liberdade de todos".

Em nome desse conceito - e na sua mensagem deixa de lado o "detalhe" -, defende a proibição de emissão de opinião a respeito dos candidatos, tal como ocorre no rádio e na televisão.

Poderosa combinação

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O otimismo em relação ao futuro da candidatura da Dilma Rousseff a presidente está de volta ao PT. Mas em vez do pré-sal, é a expectativa de uma retomada consistente do crescimento econômico que anima os petistas. Eles já falam em vitória no primeiro turno, independente do fato de só haver dois candidatos à eleição, como gostaria o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ou quatro, na cédula que passou a ser desenhada desde a entrada em cena da ex-ministra Marina Silva.

"Ainda assim será eleição uma plebiscitária", diz o deputado João Paulo Cunha (PT-SP). "Para que isso ocorra, não importa que sejam dois, três ou quatro os candidatos".

João Paulo Cunha é um desses petistas para quem as candidaturas de Ciro Gomes (PSB-CE) e de Marina Silva (PV-AC) viram pó, ao longo da disputa, e que a eleição será definida num Fla-Flu tucano-petista no qual a candidata de Lula estará em condições de liquidar o embate no primeiro turno.

Os registros petistas remetem a duas ocasiões. Em 1993, Lula chegou a ter 43% das intenções de voto. O então candidato petista crescia nas pesquisas quanto maiores eram os infortúnios na economia. Em 1994 Fernando Henrique Cardoso decretou o Plano Real (Lula ficou contra) e não tardou a alcançar o primeiro lugar. Saiu do zero para ganhar a eleição. No primeiro turno. Foi reeleito em 1998, outra vez no primeiro turno, ainda sob a influência da estabilização da economia.

O mesmo se deu com Lula em 2001. É bem verdade que ele enfrentou concorrência no meio do caminho. Primeiro de Roseana Sarney, que deixou a corrida antes do tiro de largada, pelo motivos conhecidos, e depois de Ciro Gomes, que chegou a marcar 28% contra 33% de Lula, em agosto. Ciro afogou-se no destempero, a economia ia mal e o petista manteve-se na pista, em crescimento. Foi por pouco que não levou no primeiro turno contra o candidato tucano José Serra.

"O que define a eleição é a combinação da situação econômica do país com a capacidade gerencial do governo", acredita o deputado João Paulo Cunha.

O produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 5,1% em 2008, mas no último trimestre do ano a economia foi sacudida pela crise financeira internacional. Não houve crescimento. Isso projetou uma onda de desânimo no PT. Aparentemente, agora a crise está de saída e João Paulo está convencido de que o país entrará numa escala ascendente. "Se não tiver nenhum problema, como a crise passada, vamos chegar a 2010 com crescimento econômico muito bom".

O que seria uma combinação eleitoral poderosa, pois o PT espera chegar às eleições presidenciais do próximo ano com resultados para mostrar em alguns dos principais programas de governo. É claro, tem o pré-sal, por meio do qual o PT chama o PSDB para o debate ideológico, mas tem também projetos populares como o "Minha Casa, Minha Vida".

O governo não vai entregar 1.000000 de casas até a eleição, mas o grupo majoritário do PT avalia que se forem entregues 100 mil, 130 mil o efeito será parecido, pois passará a mensagem de que o programa está em movimento. E o PAC do Saneamento e Habitação, em nove regiões metropolitanas, terá então o que os petistas chamam de "visibilidade significativa".

Tomando por base o instituto Datafolha, o PT aponta que em 14 meses a ministra da Casa Civil saiu de 3% para 16%. Ou seja, cerca de 17 milhões de eleitores se movimentaram em direção à candidatura de Dilma Rousseff. José Serra, que é considerado no partido o adversário certo da ministra, tinha 36% em março de 2008, mesmo patamar registrado em maio de 2009. Na opinião de João Paulo, "o teto de todo mundo que fica contra um governo com economia ascendente".

Nas pesquisas espontâneas, aquelas em que o entrevistado cita um nome sem ver uma lista precisamente elaborada, Dilma já está com 4%, a apenas um ponto de Aécio Neves, governador de Minas, e a dois do tucano que lidera as pesquisas, José Serra.

Para João Paulo, a ministra não precisa crescer muito nas pesquisas, "mas devagar e continuamente". Segundo o deputado, 20% será um bom índice, ao final deste ano, e 30% em meados do ano que vem. Se esse plano de voo se realizar, João Paulo não tem dúvidas da eleição da ministra no primeiro turno.

Otimismo é uma marca registrada do PT, nem sempre confirmada nas urnas. É só lembrar da eleição municipal de 2004, quando o partido cantava vitória em 1.000 municípios, mas não chegou a 500. Mas esse é o estado de ânimo atual petista.

Dilma tira agora uma semana de férias. Só na volta será possível afirmar que, como dizem os petistas, ela passou a controlar o temperamento e a entender melhor os meandros do Congresso e os movimentos socias.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

Neoliberal é a mãe

José Roberto Afonso
DEU EM O ESTDO DE S. PAULO

Para que serve o Estado? O lançamento do pré-sal também serviu para resgatar um pós-doce.

Foi dito: "O papel do governo é como o de uma mãe. Não pode faltar nada pra ninguém. Tem de aumentar o cobertor ou colocar todo mundo mais juntinho para que recebam a caloria necessária que advém dos recursos." Seria o contraponto a quando "tínhamos a política neoliberal do Estado mínimo". Essa visão se equivoca ao julgar o Estado por seu tamanho, quando importa a natureza da sua intervenção. Neoliberalismo difere da caricatura reinante: é não priorizar o crescimento da economia e crer que se redistribuirão renda e bem-estar mesmo sem crescimento acelerado.

A forma como se enfrenta a crise financeira global é ilustrativa. Se crise é igual à oportunidade, como no ideograma chinês, esta é perdida para se promoverem reformas institucionais no Brasil. É um erro achar que mundo afora o gasto público está sendo expandido a troco de nada.

Mudanças estruturais são promovidas nos EUA no caso da saúde pública (politicamente tão difícil quanto mexer na Previdência brasileira). Investimentos públicos maciços em infraestrutura (não publicidade) redesenham o mapa viário da China ou antecipam obras olímpicas em Londres. Nada parecido ocorre hoje no Brasil, que acumulou know-how em reformas nas últimas crises: da abertura ao exterior, passando pela desestatização até a montagem do tripé macro (metas de inflação, câmbio flutuante e austeridade fiscal).

Preservar o arcabouço e corrigir excesso de dosagem foi mérito e é condição necessária, mas não suficiente, para o País conseguir crescer no ritmo das economias emergentes, puxadas por China e Índia - onde a crise só diminuiu a taxa de expansão, enquanto acumulamos a maior taxa negativa no PIB do 4º trimestre de 2008. Virou mania comparar-se a países ricos e inebriar-se de que sairemos da crise antes e crescendo mais do que eles - como se nossa expansão demográfica fosse mínima, a infraestrutura estivesse toda construída e investimentos e produção não precisassem crescer rapidamente.

Nenhuma outra grande economia se deu ao luxo do Brasil de não promover nenhuma mudança estrutural em meio à crise. Não se negam os resultados da reação do governo no curtíssimo prazo, mas custarão caro e comprometerão o longo prazo. Na política fiscal ativa, o aumento de gasto foi decidido antes da crise e acabou liderado por custeio. A reação mais relevante foi bem liberal: reduzir impostos (em especial o que mais pertencia a governos locais, o IPI) para incentivar o consumo. Perdeu-se a chance de adotar desoneração tributária total de bens de capital e exportações. Pior foi armar a herança maldita, que se pode agravar se a receita federal tiver caído de patamar de modo duradouro.

Os bancos públicos entraram em negócios de que outros precisavam sair e inicialmente concentraram o fomento numa única estatal. Ainda não conseguiram alavancar firmemente investimentos privados. É perdida a oportunidade de viabilizar grandes projetos de investimentos, ao aproveitar a liquidez e sofisticação de nosso mercado de capitais, que poderia financiar os empreendimentos com controle estatal, desde que a gestão fosse entregue à iniciativa privada, numa nova forma de parceria. Pior ainda é regredir na regulação, se agências forem politizadas e decisões, centralizadas. A economia moderna exige um Estado que bem regule, em vez de um Estado inchado, que não transforma nem prepara a sociedade para o crescimento. Carga tributária alta resume o equívoco da visão maternal e com síndrome de rico.

É ilusão achar que a carga é paga só por outros (que recolhem IPTU ou descontam Imposto de Renda no salário) que não os abençoados por benefícios assistenciais, pois, quando estes são gastos, pagam impostos escondidos nos preços do que compram. Ao contrário dos países desenvolvidos, aqui os mais pobres são tributados em proporção superior aos mais ricos e a injustiça se agravou nos últimos anos. Além disso, a qualidade de nossa carga e o seu aumento arrefecem nossa capacidade de crescer.

O futuro poderá cobrar caro pela preferência em se tratar o governo como uma mãe, supostamente generosa, mas que precisa que seus filhos continuem pobres e dela dependentes. Não se preocupa em ensinar os filhos a andar pelas próprias pernas, a remover os obstáculos ao crescimento, não planeja nem corrige. Paradoxalmente, quem assim se porta não passa de um conservador e autêntico neoliberal.

*José Roberto Afonso, economista, é mestre pela UFRJ e doutorando da Unicamp

Um inimigo comum

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - Há uma lógica cristalina na definição pelos caças Rafale para renovar a frota da FAB e fechar o pacotaço militar do Brasil de Lula com a França de Sarkozy. Uma lógica não só técnica ou comercial, de compra e venda, mas política.

Por trás dos 36 caças, 4 submarinos, 50 helicópteros e tecnologia para construir uma base, um estaleiro e um submarino de propulsão nuclear, por bilhões de euros, há uma decisão geopolítica: a França e o Brasil se unem, não exatamente contra os EUA, mas por um melhor equilíbrio internacional.

Numa comparação doméstica, Colômbia e Peru aprofundam a sua dependência dos EUA, e Venezuela arrasta Equador e Bolívia para os braços da Rússia e do Irã, enquanto o Brasil escapa da polaridade e opta pela França. Os dois são aliados dos EUA, mas não incondicionais, e tentam evitar que os US$ 13 tri de PIB da maior potência definam os destinos do mundo. Nem por isso alimentam o "outro lado".

A França é um país central do mundo rico, um dos mais sofisticados tecnologicamente e o mais político da Europa. E o Brasil é um país continental, com a Amazônia, a Amazônia Azul, mercado crescente e, agora, o pré-sal. Fecha as duas pontas: biocombustíveis e petróleo.

Sem falar nas jazidas de urânio, entre as maiores do planeta.

Desde o início de 2008, quando Jobim foi à França, à Rússia e aos EUA, ele deixou clara, em inúmeras declarações, a preferência brasileira pelos submarinos e caças franceses. E que, por trás das compras, havia o interesse estratégico.

O Brasil já diversificou seus mercados e, ao fechar o maior pacote militar de sua história, sinaliza ao mundo: França, pelos ricos, e Brasil, pelos emergentes, se movem contra o chamado "mundo unipolar". Ou seja: trabalham para neutralizar a força acachapante dos EUA no pós-Guerra Fria.
É mais uma alavanca para a almejada liderança do Brasil nesse novo mundo.

A cultura das armas

Marcos Nobre
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


O ANO DA FRANÇA no Brasil mostrou a que veio: foi uma oportunidade para fechar grandes negócios com armas. Nada menos que R$ 22,5 bilhões, sem contar o contrato de compra de caças, que pode custar outros R$ 10 bilhões e que deve ir também para a França.

A discussão sobre os contratos continua em banho-maria. As explicações oficiais seguem sendo insuficientes. Joga-se a nuvem do antinacionalismo e do antipatriotismo contra quem exige esclarecimentos, quando qualquer nacionalista e patriota só merece esse nome se fizer valer antes de tudo a transparência exigida pelas instituições democráticas que o país com tanta dificuldade conseguiu construir.

Uma coisa é um aparelhamento adequado das Forças Armadas brasileiras que seja compatível com a extensão do país e com o atual patamar de armamento sul-americano. Coisa muito diferente é um projeto de se tornar potência hegemônica regional inconteste. Os contratos com a França representam o primeiro passo para isso.

A realização desse projeto inclui a tentativa já fracassada outras vezes de instalar uma indústria bélica de importância no país. Já parece suficientemente assustadora a ideia de usar dinheiro público para financiar a produção e exportação de armas para destruir vidas. Mas essa nem é ainda toda a história.

Tornar-se potência militar significa gastar muito mais recursos do que o necessário para manter o equilíbrio bélico regional. É esse gasto excedente que rouba recursos da luta contra a miséria e a desigualdade. E que terá por consequência produzir tensões onde hoje elas não existem e obrigará países vizinhos a tomarem o mesmo caminho desastroso. Não bastasse isso, serão preciosos recursos do pré-sal que acabarão por financiar, direta ou indiretamente, esse projeto militarista.

A cultura francesa foi hegemônica no Brasil por pelo menos um século e meio, até os EUA lhe tomarem essa posição. Mas esse tombo em nada abalou o velho colonialismo francês, que, condescendente, continua a oferecer ao povo brasileiro a oportunidade de degustar os biscoitos finos que fabrica.

E são mesmo muitas vezes biscoitos de sonho. Só que, como sempre, a França continua sem dar a receita. Práticas reais de cooperação e intercâmbio passaram longe da lista de mais de 400 eventos culturais do Ano da França no Brasil.

Figuras renomadas vêm, fazem seu show e se vão.

O que fica são armas. Para essas, o governo francês promete ensinar a receita. Transformou as armas da cultura no prelúdio enganoso de uma cultura das armas.

Marcos Nobre escreve às terças-feiras nesta coluna.

Lula recorre até ao pré-sal para defender gasto militar bilionário

Bernardo Mello Franco e Luiza Damé BRASÍLIA
DEU EM O GLOBO

Acordo de R$ 31,1 bi com a França incluirá compra de 36 caças

No 7 de setembro, o presidente Lula ampliou o discurso nacionalista e usou a Amazônia e o pré-sal para defender o acordo militar de R$ 31,1 bilhões com a França. Com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, acertou que o Brasil comprará 36 caças, num negócio estimado em R$ 7 bilhões. O pacote já incluía submarinos e helicópteros. "Temos 300 milhões de hectares na Amazônia que precisamos preservar. Descobrimos outra riqueza, o pré-sal. O petróleo foi motivo de muitas guerras. O Brasil não quer guerra", disse Lula. Sarkozy anunciou a compra de 10 aviões militares da Embraer, defendeu a entrada do Brasil no Conselho de Segurança da ONU e a candidatura do Rio à Olimpíada de 2016. O dia foi marcado por manifestações de "Fora Sarney" pelo país.

Pré-sal e Amazônia para justificar acordo militar

Lula recebe Sarkozy e assina compra de 36 aviões de combate da França; pacote, que inclui submarinos e helicópteros, custará R$ 31,1 bi

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirmou ontem que o Brasil comprará 36 aviões de combate Rafale, da fabricante francesa Dassault. O anúncio foi feito ao lado do presidente francês, Nicolas Sarkozy, que veio ao país para fechar o negócio, estimado em R$ 7 bilhões, e ontem assistiu ao desfile de Sete de Setembro. A escolha encerra uma batalha comercial iniciada há 11 anos em torno do reaparelhamento da Força Aérea Brasileira (FAB). Foram derrotados os caças Gripen, da sueca Saab, e F-18, da americana Boeing. No total, o Brasil deve gastar R$ 31,1 bilhões em acordos com a França, incluindo a compra de submarinos e helicópteros.

Para justificar os altos investimentos em compras para as Forças Armadas, o presidente recorreu ao discurso nacionalista. Citou a descoberta das reservas de petróleo na camada do pré-sal e a necessidade de proteger as riquezas da Amazônia: — O Brasil é um país que prima pela paz. Ao mesmo tempo, temos 300 milhões de hectares de terras na Amazônia que precisamos preservar.

E agora descobrimos outra riqueza que é o pré-sal. Deve sempre passar pela nossa cabeça a ideia de que o petróleo já foi motivo de muitas guerras, muitos conflitos. E o Brasil não quer guerra nem conflito.

Segundo Lula, os caças franceses foram escolhidos porque o país foi o único a se comprometer a transferir tecnologia aeronáutica para a FAB: — Decidimos começar a negociação para a compra do Rafale. Para nós, o avião é importante, mas importante mesmo é ter a tecnologia para que possamos produzir esse avião no país. É isso que estamos negociando.

No fundo, o Brasil quer comprar um avião com a garantia de uso e transferência total da tecnologia.

“Queremos construir e vender juntos”

Como contrapartida à compra dos caças, Sarkozy anunciou a intenção do governo francês de ajudar a desenvolver e comprar dez unidades do futuro avião de transporte militar KC-390, a ser produzido no Brasil pela Embraer. O modelo deve substituir os antigos Hércules C-130 da Aeronáutica.

Os presidentes não anunciaram os custos dessa operação.

Segundo Lula, a assinatura dos acordos inaugura uma parceria militar estratégica, com a cooperação entre os dois países. Além da compra dos caças, o acordo militar com a França inclui R$ 19 bilhões com a construção de submarinos — quatro convencionais e um nuclear — e R$ 5,1 bilhões com a fabricação de 50 helicópteros.

— A França não quer só vender para o Brasil, e o Brasil não quer só vender para a França.
Queremos pensar juntos, criar juntos e construir juntos.

Se possível, vender juntos — disse, arrancando gargalhadas dos franceses.

Animado com o anúncio da compra dos caças, Sarkozy enalteceu os investimentos brasileiros na área militar e disse que o país pode se tornar o principal parceiro da França no setor: — Um país forte é um país que pode se defender. Os grandes atores do mundo têm uma política de defesa ambiciosa. Se existe um país no mundo onde há espaço para a tecnologia francesa, é o Brasil. Compartilhar tecnologia não nos dá medo, porque o tempo da colonização já acabou.

Sorridente, Sarkozy se desmanchou em elogios a Lula, a quem chamou de amigo, líder e “homem especial”. Em entrevista ao lado de Lula no Palácio da Alvorada, o francês manifestou apoio ao Brasil em quase todas as frentes de batalha do Itamaraty, desde a luta por uma vaga no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas até a candidatura do Rio para sediar as Olimpíadas de 2016.

— O mundo tem necessidade da liderança do presidente Lula, por seu amor pela África, suas convicções democráticas e pelo exemplo que ele representa com sua trajetória. Tenho orgulho de ser seu amigo — disse.

A novela dos caças se arrastava desde 1998, quando a Aeronáutica começou o projeto FX, no governo Fernando Henrique. O processo estava em fase final. Em 2003, com três dias no cargo, Lula suspendeu a licitação, na época orçada em US$ 700 milhões, para a compra de 12 aviões, dizendo que destinaria o dinheiro ao Fome Zero.

Em novembro de 2007, a Aeronáutica anunciou a retomada do programa, com o título de FX-2.

Frente fluminense em defesa dos royalties

Henrique Gomes Batista
DEU EM O GLOBO

Cabral reúne bancada do Rio e defende que União divida a sua fatia com outros estados

Garantir a participação de 40% dos royalties do pré-sal ao Estado do Rio.

Foi com esse objetivo que o governador Sérgio Cabral (PMDB) realizou, ontem, um jantar no Palácio das Laranjeiras, reunindo a bancada fluminense no Congresso. O governador defendeu uma nova postura no encontro: em lugar de mostrar intransigência na divisão dos recursos, como até agora, Cabral se disse favorável à redistribuição dos royalties do petróleo — porém usando a fatia federal, não do quinhão os estados produtores, basicamente Rio, São Paulo e Espírito Santo.

— O que é da União deve ser realmente redistribuído a outros estados. Queremos garantir o que está na Constituição. As compensações financeiras, os royalties e a participação especial, mencionados na Constituição, são do Estado do Rio e não vamos perdê-los — afirmou o governador, reforçando o argumento de ilegalidade da partilha com outros estados, já usado pelo secretário estadual de Fazenda, Joaquim Levy.

Outro argumento é que os estados produtores sofrem com a exploração do óleo, com custos ambientais e sociais, ou seja, o ideal é retirar recursos da União. Cabral disse ainda que o Rio não se opõe aos demais estados, sendo aquele que mais pensa o Brasil, e ressaltou que o debate só terá efeito a longo prazo, quando efetivamente estará sendo explorado o petróleo do pré-sal: — Nem estarei aqui em 2020, quando o pré-sal realmente vai gerar recursos. Nem sei qual será o valor do petróleo. Com o carro elétrico pegando no mundo, talvez o preço do petróleo nem esteja tão valorizado como imaginamos.

Todos estão certos de que, com a discussão do novo marco regulatório do setor petrolífero, haverá uma guerra, com os estados longe das reservas brigando para receber parte dos recursos. A mudança de estratégica deveu-se, principalmente, ao fato de a bancada combinada dos três estados produtores ser inferior ao número de deputados das outras 24 unidades da federação — ou seja, as chances de derrota no Congresso seriam grandes.

Por isso, o governo passou a aceitar a divisão de recursos com os outros estados, mas não do quinhão dos produtores.

Jantar tem a presença de empresários fluminenses O coordenador da bancada fluminense na Câmara dos Deputados, Hugo Leal (PSC), acredita que toda a discussão deve ser feita no sentido de incluir recursos para os estados produtores, não para dividir com outros estados. Segundo Leal, a proposta debatida previamente na bancada na semana passada, em Brasília, apenas acrescentava a proteção da destinação da participação especial aos estados produtores, ou seja, mantinha a atual regra de divisão dos recursos oriundos do petróleo.

Ele, entretanto, afirmou que estava aberto a ouvir e discutir as propostas que seriam apresentadas durante a noite de ontem pelo governador.

— Ele é o anfitrião, e quem recebe é que apresenta o cardápio — afirmou Leal.

Além do governador e do vice, estavam presentes ao jantar o prefeito do Rio, Eduardo Paes; os três senadores da bancada fluminense, incluindo Francisco Dornelles (PP); 28 deputados federais (a bancada do estado tem 46); oito secretários do governo Cabral; dois deputados estaduais; o presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB); o líder do governo, Paulo Melo; e Wagner Victer, da Cedae; José Luiz Alquéres, presidente da Light e da Associação Comercial do Rio; Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, presidente da Firjan; e Orlando Diniz, da Fecomércio-RJ.