sábado, 3 de outubro de 2009

O fim do "complexo de vira-latas"

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


A vitória do Rio de Janeiro na disputa pela sede das Olimpíadas de 2016 é um retrato da evolução da situação econômica do país. Em 1992, Brasília se candidatou aos jogos de 2000, e, em 1995, o Rio se candidatou pela primeira vez, às Olimpíadas de 2004. Em 2004, a cidade carioca perdeu mais uma vez na tentativa de sediar o evento em 2012. Em nenhuma das ocasiões anteriores havia condições mínimas para que os Jogos Olímpicos fossem realizados no país, que, além de um presente conturbado, não tinha uma perspectiva de futuro que permitisse um planejamento razoável de projeto tão grandioso.

Mas, entre a primeira tentativa e a vitória de ontem, o país evoluiu em aspectos fundamentais, a partir do Plano Real, lançado no governo Itamar Franco — depois de termos perdido a primeira disputa pelas Olimpíadas —, controlando a praga da inflação e instituindo instrumentos de política econômica que se transformaram em políticas de Estado, como o equilíbrio das contas públicas, o controle da inflação e o câmbio flutuante.

O país que, como ressaltou o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, pode vir a ser a quinta economia do mundo em 2016, tem hoje condições de fazer planos de longo prazo, como organizar uma Copa do Mundo ou uma Olimpíada.

Ao mesmo tempo, nada mais exemplar das voltas que o mundo dá do que a derrota de Chicago logo no primeiro turno, e a vitória do Rio por mais do dobro de votos que a segunda colocada, Madri.

A presença de Barack Obama em Copenhague, contrariando as previsões e nossos temores, não teve a menor importância na decisão dos delegados do Comitê Olímpico Internacional, o que poderia indicar que também a presença de Lula não fez diferença.

Mas o fato é que hoje, assim como o Brasil é muito diferente daquele que perdeu a indicação em 2004, quando ele já estava na Presidência, Lula tornou-se um dos líderes mais importantes do atual cenário mundial.

E assim como Obama representa a nova ordem mundial multipolar, Lula representa a emergência dos países do terceiro mundo nas decisões globais. Os dois estavam em seus papéis, Obama no de líder do país mais influente do mundo que está abrindo mão de sua hegemonia, e Lula no de líder do país que quer ter sua importância reconhecida no mundo.

A escolha de Atlanta como sede da Olimpíada de 1996, derrotando Atenas, é exemplar de como a hegemonia americana se impunha.

O simbolismo de que naquela ocasião se celebraria o centenário das Olimpíadas, cujo início é marcado pelos Jogos em Atenas em 6 de abril de 1896, foi menos importante para o Comitê Olímpico Internacional do que a pressão do governo dos Estados Unidos e o fato de que em Atlanta estava a sede da Coca-Cola e da rede mundial de televisão CNN.

Hoje, foi mais importante levar as Olimpíadas para a América do Sul, e para o país da América do Sul que faz parte do seleto grupo que compõe o G-20, a nova instância de resolução das questões econômicas mundiais.

Embora a Argentina também esteja no G-20, está lá mais pela importância que já teve, enquanto o Brasil representa o futuro da região. Na verdade, a tendência do G-20 é tornar-se, pelo menos na prática, em G-14, com alguns países ficando de fora gradualmente, entre eles a Argentina.

Foi a primeira vez que o Rio de Janeiro entrou na final da disputa, e esse já era um sinal de que o papel do país se consolidara como representante do poder emergente no novo desenho geopolítico saído da crise internacional.

O presidente Lula demonstrou um ressentimento incompreensível em meio a um pronunciamento emocionado e muito bonito: “Os mesmos que não acreditavam que eu pudesse governar o país terão uma surpresa com nossa capacidade de organizar as Olimpíadas”.
Ele, que falou tanto da generosidade do povo brasileiro, poderia ter um sentimento mais generoso na hora de comemorar suas vitórias.

Teve, no entanto, sagacidade política ao recusar a ideia de que derrotara Obama, embora a tentação seja inevitável.

Não citou literalmente, mas abordou o resgate do nosso eterno “complexo de vira-latas” diagnosticado pelo dramaturgo, especialista em brasilidade, Nelson Rodrigues, ao dizer que o país, finalmente, deixava de ser visto como de segunda classe.

O mesmo sentimento tomou conta do economista André Urani, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), um apaixonado pelo Rio de Janeiro e estudioso de seus problemas e, sobretudo, das soluções possíveis.

A primeira reação dele foi dizer que vencer uma disputa com Madri, Tóquio e Chicago e derrotar ao mesmo tempo Obama e o rei Juan Carlos dava uma boa massageada no ego dos cariocas e recuperava a auto-estima.

Assim como Lula, ele também citou os revezes que o Rio sofreu nos últimos 50 anos, com a perda da capital e a fusão da Guanabara com o Estado do Rio.

Na avaliação de Urani, as coisas têm melhorado no Rio com a parceria entre as três esferas de governo — federal, estadual e municipal —, além da parceria com a sociedade civil e a iniciativa privada, que participaram do projeto das Olimpíadas 2016.

Ele espera que a cidade, a partir do planejamento da organização da Olimpíada, possa sair da decadência atual para entrar no século XXI.

Para isso, ele acha que o projeto oficial tem que receber algumas alterações, e o preocupa especialmente o fato de a Barra ser considerada o coração do projeto.

Pegando o exemplo de Barcelona em 1992 e o de Londres para 2012, André Urani diz que as áreas degradadas da cidade, como o Centro, os subúrbios e a área portuária deveriam ser prioritárias.

O projeto do Rio deveria também incluir metas sociais, como acabar com a pobreza até 2016, o que teria um papel importante na redução da violência.

Medida cautelar

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O lance da troca de domicílio eleitoral de Ciro Gomes não é definitivo, mas é claro: o presidente Luiz Inácio da Silva se move na posse da banca e esconde o jogo até o último momento. Vale dizer, até o esgotamento dos prazos legais e a data marcada pelo adversário para dar a partida.

O deputado não precisaria mudar o registro do título de eleitor do Ceará para São Paulo nem para parte alguma se seu plano, como diz ser a sua preferência, fosse a candidatura presidencial. Ou se fosse a preferência dele que comandasse o espetáculo.

Ciro, aliás, sempre disse que uma coisa era sua escolha pessoal, outra a conveniência do partido. Faltou acrescentar que o que vale mesmo é a ordem unida de Lula.

Pois bem, se mudou o domicílio é porque joga com o Planalto, o que também já deixou patente, para o que der e vier: candidatura ao governo, a vice de Dilma Rousseff, a presidente no lugar dela, ou ocupando um palanque presidencial alternativo com o apoio de Lula para fazer a cena em que um morde e o outro assopra o adversário.

Quem morderia seria Ciro e Dilma assopraria com a delicadeza já afamada. Considerando que no campo oposto há também um mordedor (José Serra) e um assoprador (Aécio Neves), o espetáculo, nessa conformação, promete valer o ingresso.

Seja qual for a opção de Lula adiante, a jogada da mudança de domicílio eleitoral de Ciro Gomes deixa as coisas até lá em suspenso. E aí elas começam mais a combinar com o raciocínio do presidente segundo o qual candidato lançado com antecedência é candidato a morrer na praia.

Vítima de toda sorte de queimaduras.

Qualquer coisa pode acontecer e tentar antecipá-las é um exercício de impossibilidade pura. Pelo simples fato de que as decisões dependem das circunstâncias, reféns do imponderável.

Isso nos âmbitos nacional e regional. Note-se uma frase dita pelo governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, no dia do anúncio: "Não estamos discutindo a candidatura ao governo estadual e sim a pré-candidatura de Ciro a presidente. O fato de ele ir para São Paulo vai levar o debate para lá."

"Lá" não é, no entendimento de Campos nem de Ciro, o centro ideal para as decisões, pois ambos são partidários da tese de que a política está excessivamente concentrada nos paulistas.

"Lá" é maior colégio eleitoral do País, o eixo do PT, a base do principal candidato da oposição, o Estado mais complicado para Lula, que precisa urgentemente tomar uma providência para enquadrar a turma que comanda a máquina partidária sob a liderança de Marta Suplicy.

Fio terra

Uma vitória da articulação e da competência nos preparativos, a escolha do Rio é excelente notícia para o País todo. Não só pelo gosto de chegar lá, de sediar a primeira Olimpíada na América do Sul, da projeção internacional que trará, dos resultados internos que produzirá.

Melhor que tudo é o sentido de responsabilidade, do compromisso com a realização pela via do esforço, do investimento e do planejamento - de probidade também, esperemos - a que o Brasil terá de fazer frente.

Mal entendido

Alguns leitores escrevem para reclamar das "críticas" ao novo ministro do Supremo Tribunal Federal, José Antonio Toffoli, no artigo de ontem, que, se lido com a atenção devida - ou escrito com mais clareza -, permite a percepção de que as críticas são dirigidas ao Senado e não ao advogado. A começar pelo título: Toffoli 10, Senado 0.

Em miúdos: com ele, ou qualquer outro, o Senado não cumpre a tarefa de escrutinar o saber, a reputação e a independência do indicado. Trata indicações - não apenas ao STF, mas às agências reguladoras também - como questões políticas ou assunto de ordem pessoal.

Como se a sabatina rigorosa denotasse falta de educação, ou pudesse representar uma ameaça de retaliação por parte do possível futuro integrante da corte.

No caso de Toffoli, como foi dito, a apresentação esteve irrepreensível. Não deixou nenhuma pergunta sem resposta. Mas valeu palavra dele que não foi posta a teste. Os "ataques" de alguns senadores foram só para marcar posição.

Na próxima vez em que um ministro da Suprema Corte dos Estados Unidos for indicado, recomenda-se o acompanhamento da sabatina. Mas é preciso paciência, porque às vezes leva meses. Não é como aqui, na base da fidalguia e da fatura liquidada em poucas horas.

Se essa é a forma mais correta de se aprovar o nome de um dos 11 guardiães da Constituição, cujas decisões representam a última palavra, perdão leitores. O Brasil merece, e pode, mais.

A propósito

Se por algum motivo a Justiça houvesse imposto ao Estado a censura para assuntos de educação, o jornal não poderia noticiar (e evitar) a fraude nas provas do Enem.

Um humanista na política

Miguel Reale Júnior
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


No momento em que nossa vida política sente a ausência de diretrizes éticas, prevalecendo a busca do poder para a satisfação efêmera da ambição pessoal, vindo a instaurar-se o desmando na apropriação do Estado pelos apaniguados, é bom relembrar a figura de um estadista movido por ideias-força bem claras e sérias, no ano em que se completam dez anos de sua morte.

Franco Montoro integrou a Juventude Universitária Católica (JUC) e depois, no seu percurso de vereador a deputado federal, compôs os quadros do Partido Democrata-Cristão (PDC), do qual era presidente, quando de sua extinção pelo Ato Institucional nº 2. Trouxe, então, para o exercício da política a convicção de que ideologia não se improvisa ao sabor das circunstâncias. Formou seu pensamento na convicção de se dever reconhecer a dignidade de cada cidadão dando-lhe meios de vir a ser sujeito de seu próprio desenvolvimento, tendo-se por fim último a proposta de um conjunto de ações em prol do bem comum.

Para tanto não se contentava com as fórmulas tão somente formais da democracia para integrar o homem comum ao processo decisório, o que exigia a abertura de novos caminhos no exercício da política, não limitado à simples representação popular pelo voto, para se concretizar pela "participação organizada e ativa da população nos assuntos de seu interesse". Cumpria, a seu ver, incentivar a participação, que promove autonomia, e não o mero assistencialismo, que só cria passividade.

A participação tem benefícios de variada ordem: de um lado, leva ao centro de decisão a visão concreta dos problemas da administração e da vida comunitária e, de outro, é um valioso instrumento de promoção e desenvolvimento da pessoa, que se sente partícipe do processo de formulação de políticas e de soluções. Para Montoro, essa participação pode dar-se em diversos planos, como, por exemplo, nas associações de moradores e nos clubes de mães, nos conselhos da escola, nos conselhos comunitários de segurança pública, nas associações de defesa do meio ambiente, em associações de consumidores, em conselhos comunitários para indicação de prioridades orçamentárias, entidades na quais prevalece o diálogo, e não o individualismo ou o paternalismo.

Assim, na visão de Montoro, o exercício da cidadania consiste em ser agente, e não simples espectador do processo decisório, para ter em suas próprias mãos a história que ajuda a escrever, pois respeito à dignidade humana e desenvolvimento apenas são alcançados com "a participação consciente e responsável das pessoas e grupos da comunidade". A participação em obra coletiva, que se sente própria, leva ao entusiasmo e anima a consecução da ação, mediante o espírito de cooperação no seio da comunidade.

Esta era outra ideia-força de Montoro: a prevalência da comunidade. Contra o individualismo acendrado e contra o estatismo, Montoro pregava o comunitarismo, com a desconcentração das atividades e das decisões, por via do qual se estatuía que "o que puder ser debatido com os representantes da comunidade não deverá ser resolvido nos gabinetes fechados". Ao se privilegiar a participação e a comunidade, tem-se por consequência obrigatória a descentralização das decisões e das atividades administrativas, pois, segundo Montoro, "tudo o que puder ser decidido e realizado pelo bairro, pelo município, pela região não deverá ser absorvido pela administração superior".

Assim, desenham-se as três ideias-força do pensamento de Montoro: participação, comunidade, descentralização. Em síntese, a população, que melhor conhece seus problemas e soluções, deve participar dos órgãos comunitários a serem ouvidos pela administração no diagnóstico da situação e na escolha dos caminhos a serem trilhados, pois a forma descentralizada de governar apresenta a solução mais adequada, mais transparente e mais barata. Dizia Montoro que "descentralizar é colocar o governo mais perto do povo e, por isso, torná-lo mais participativo, mais eficiente, mais democrático". Fazia da democracia uma tarefa de todos.

Montoro transformou em realidade a sua pregação. Bastaria lembrar as realizações no campo da educação: a merenda escolar passou a ser municipalizada, com os recursos transferidos para as prefeituras. De início houve a adesão de 118 municípios e em 1985, no final do governo de São Paulo, a totalidade dos municípios estava no programa, que consistia em ter na cidade um Conselho Municipal da Merenda Escolar com representantes da prefeitura, da Câmara Municipal, da Secretaria da Educação, da Associação e Pais e Mestres e de produtores e fornecedores locais.


O resultado foi espantoso: comida adequada ao paladar das crianças, com maior variedade, utilizando produtos da região, com economia de transporte e embalagem e com geração de empregos na preparação e distribuição de alimentos no local. Ao lado disso, foram criadas 5 mil hortas escolares. Os alimentos, não mais industrializados, passaram a ser fornecidos in natura, com menor custo e melhor qualidade. Nas mais diversas áreas implantaram-se a descentralização e a participação: habitação, segurança e saúde, por exemplo.

Além dos manifestos benefícios decorrentes da participação e da descentralização, esta forma de governar impediu o fisiologismo arraigado em nossa prática política, consistente no clientelismo, que prefere o amigo ao mais competente, tratando a coisa pública como se privada fosse, para fazer da política apenas "uma oportunidade de negócios e vantagens pessoais" ou a "exaltação do poder pessoal", messiânico.

Em vez da esperteza, que se transformou em valor positivo na política brasileira hodierna, Montoro pregava o humanismo político fundado na solidariedade e na seriedade, em vista do bem comum.

Estadista humanista como Montoro deixa saudades.

Miguel Reale Júnior, advogado, professor titular da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras, foi ministro da Justiça

Atomizar, polarizar

Cesar Maia
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


A pedagogia dos historiadores quase sempre busca uma data para marcar a fronteira entre períodos. O 9/11/1989, a queda do Muro de Berlim, é a data escolhida para o fim da Guerra Fria.

Assim, a política foi se desideologizando e todos caminharam para o centro. A esquerda ficou social-democrata, e a direita, social-liberal, ambas como faces do mesmo centro. O que não impede que se passe de um lado para o outro sem nenhuma cerimônia. Programas de renda mínima (Bolsa Família...), tão caros aos governos à esquerda, são tipicamente social-liberais: buscam igualar o ponto de partida para as iniciativas individuais.

Essa indiferenciação crescente, entre partidos e entre governos, terminou por estimular a atomização partidária. Os EUA são uma exceção, porque, nas primárias, permitem que forças que poderiam ser novos partidos aceitem disputar eleições pré-presidenciais e concordar com seus resultados.

O Uruguai é outra exceção, e pela mesma razão. Até a Alemanha, com um sistema eleitoral feito para eliminar os extremos, hoje é parte dessa atomização, com o crescimento dos pequenos partidos e a criação de mais um, à esquerda.

Com isso, os governos são e serão de coalizão. O Reino Unido conta hoje com três partidos competitivos e um -nacionalista- em ascensão. Isso para não falar da nossa América Latina, onde a atomização é a regra. O Chile adotou um sistema de grandes coalizões, transformando seis partidos em dois blocos, mas está às vésperas de desmontar o seu inteligente sistema binário.

Junto à atomização vem a tecnologia eleitoral, que permite a antipolíticos serem transformados em estrelas a golpes de ilhas de edição.

A performance dos presidentes-estrelas se descola da avaliação de seus governos. Na América Latina é assim em geral, e só há convergência, no inverso, quando o presidente desmancha. Com isso, a oposição só é eficaz personalizando a crítica.

O presidente-estrela, com a atomização, joga todos para dentro do governo, fazendo sua maioria parlamentar. E tanto faz, pois seu governo não afeta sua popularidade. Consolidada a maioria, governa de forma autocrática e provoca a oposição de forma a estimular a máxima polarização. Um dos polos é ele, e nunca seu governo.

Essa é a fórmula. Nas democracias mais avançadas, suavemente. Nas democracias pela metade, de forma descarada, onde, depois da eleição, e já no exercício do poder, o regime se torna autoritário, aberto ou disfarçado. Eliminam-se assim os direitos políticos dos cidadãos.

Em economias mais fortes, como o Brasil, os excessos vêm disfarçados pelos riscos: a resistência é maior.

Mas, sublinhe-se: apenas disfarçados.

O papel do passado nas eleições

Alberto Carlos Almeida
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A história é resultado da ação das instituições, do contexto e das pessoas. A interação entre instituições e pessoas é bem conhecida e mapeada. Jean Monet, político francês tido como o arquiteto da Comunidade Europeia, afirmou uma vez que as pessoas fazem as coisas acontecer, ao passo que as instituições fazem as coisas permanecer no tempo. As pessoas agem, decidem, tocam, mudam de rumo. As instituições conservam.

Foi preciso haver líderes de fibra para que a Comunidade Europeia tivesse sido fundada. Cabe aqui uma breve menção ao terceiro elemento-chave na história: o contexto. A decisão de unir os países europeus foi levada a cabo pelas pessoas, mas motivada pelo contexto: uma Europa cansada de se destruir depois de passar por duas grandes guerras. A união dos países, em particular da França e da Alemanha, poderia contribuir para evitar a repetição da tragédia.

As pessoas importam não apenas para tomar decisões que alterem o rumo da história, mas também, e isso é muito importante, para motivar o eleitor a escolhê-las. Exatamente isso. Pessoas diferentes atraem motivações diferentes. Um bom candidato é uma pessoa reconhecida pelo eleitorado. Reconhecida por vários atributos positivos. Um candidato sem chances é, na maioria das vezes, alguém sem tais atributos.

As pessoas e seus atributos são mais importantes quando a reeleição não é possível. Esse é o caso da eleição presidencial de 2010: Luiz Inácio Lula da Silva não pode se candidatar novamente. Em 1994, primeira vitória de Fernando Henrique Cardoso, as características pessoais do candidato foram mais importantes do que a avaliação que o eleitorado tinha do governo.

Qual é a base empírica para tal afirmação? A comparação entre o FHC de 1994 e o FHC de 1998. Em 1994, aproximadamente 60% dos eleitores que avaliavam positivamente Itamar Franco votaram em Fernando Henrique. Quatro anos mais tarde, esse mesmo porcentual subiu para incríveis 80%. Quando é o próprio governante quem disputa a eleição, o eleitor olha mais para o seu governo do que para a sua personalidade. Quando a reeleição não é possível, o eleitor olha para os candidatos, nenhum deles exercendo o cargo que está em disputa, e avalia suas características pessoais. Isso é algo lógico.

É exatamente pensando nas pessoas de José Serra e Aécio Neves, em comparação a Dilma Rousseff, Antonio Palocci ou qualquer outro possível candidato do PT, que se pode afirmar o favoritismo dos tucanos para 2010. Comparem-se as figuras públicas e ver-se-á quem são os mais capazes para prometer o que vão prometer.

Serra goza de amplo reconhecimento em todo o Brasil. Para as pessoas da classe baixa ele é o homem que criou os genéricos. Os genéricos são sinônimo de medicamento mais barato. Pagar menos por algo que tenho de comprar sempre significa uma coisa muito simples: terei mais dinheiro no bolso para outras compras.

Ao se tornar o pai dos genéricos, Serra marcou em definitivo sua presença entre as pessoas de renda mais baixa porque contribuiu para que elas aumentassem sua capacidade de compra. Tanto isso é verdade que as pessoas de classe A e B valorizam não este, mas um outro atributo de Serra: o fato de ser um bom governador à frente do Estado mais importante da federação, São Paulo.

São muitos os atributos positivos de Serra: muito conhecido em todo o Brasil, alguém que cria e põe em prática legislações inovadoras e benéficas para o grande público, como são os casos recentes da Nota Fiscal Paulista e da lei antifumo - muito bem aprovadas pelos paulistas -, tem a imagem sólida de bom administrador, governa o segundo maior orçamento do país, não pesam sobre ele denúncias ou escândalos de corrupção, está à frente de bons indicadores de emprego e desenvolvimento para São Paulo, etc. Ufa, a lista é longa.

Some-se a ela uma outra lista, a de atributos positivos de mais um tucano de grande destaque: Aécio, governador de Minas. Ele está em seu segundo mandato como governador desse Estado. Saiu de um mandato de deputado federal para o cargo de governador. Isso é raro, ainda mais na idade em que ele obteve tal feito. Esse passo gigante foi possível porque antes Aécio tinha sido presidente da Câmara dos Deputados.

Ser presidente da Câmara, ou mesmo de uma Assembleia Legislativa, é algo obtido apenas pelos políticos jeitosos e conciliadores. Ser presidente da Câmara dos Deputados e, em apenas dois anos, tomar medidas de grande impacto que comuniquem uma imagem positiva para o presidente da casa não é fácil. Aécio conseguiu isso. Atualmente ele governa o segundo maior colégio eleitoral do Brasil e nestes quase sete anos de governo o neto de Tancredo Neves formou a imagem de bom gestor, divulgou aos quatro cantos que Minas, sob sua liderança, fizera um choque de gestão de grande envergadura.

Serra de um lado, Aécio de outro e Dilma contra ambos. Quem é Dilma? Sabemos que é uma petista tardia, de 25ª hora, o que mais? Sabemos que ocupa o cargo de ministra da Casa Civil do governo Lula, o que mais? Sabemos que já ocupou uma secretaria de Estado no Rio Grande do Sul, o que mais? Sabemos que foi guerrilheira. Não precisa mais nada. Dilma nunca disputou uma eleição, nunca foi eleita para nenhum cargo, nem o de vereadora em Porto Alegre. O currículo de Dilma está muito, muito aquém dos currículos de Serra e de Aécio. Mais aquém ainda se Serra e Aécio somarem seus currículos. Em eleição isso importa.

Qualquer eleição pode ser vista como uma entrevista de emprego. Os postulantes ao cargo, seja de presidente, governador ou deputado, se apresentam ao eleitor pedindo o voto. Os candidatos pedem um emprego para o eleitor, no caso de uma eleição nacional o emprego de presidente.

Recentemente, entrevistei várias pessoas para a vaga de jornalista em minha empresa. A primeira pergunta é clássica: por favor, conte-me um pouco sobre a sua carreira, sobre a sua experiência como jornalista. Por que o passado importa? Você confiaria em promessas de quem não tem passado? Confiaria em quem não tem um passado vinculado àquela vaga de emprego que você oferece? Suponhamos que um médico se candidatasse a um posto de assessor de imprensa. Creio que ele estaria em desvantagem diante de qualquer jornalista. O mesmo vale para a política.

Em 2010 os candidatos a presidente pedirão o seu voto. Eles vão fazer promessas para o futuro, dizer e mostrar como vão melhorar a sua vida. Porém, você só vai acreditar nas promessas, por melhor que sejam, se eles derem motivos para que acredite. Por se tratar de uma eleição sem candidato a reeleição, esses motivos virão, em grande parte, do currículo da pessoa. Façam-se três colunas em um papel e escrevam-se os currículos de Serra, Aécio e Dilma. A Wikipédia poderá ajudá-lo nessa tarefa. Olhando comparativamente esses currículos o leitor terá a chance de ver os motivos que levam Serra e Aécio a ser os favoritos para 2010.

Tive a chance de ver políticos irritados quando lhes era dito que tinham um nível muito grande de lembrança ou recall, como se essa afirmação fosse um demérito. Como se recall fosse "só recall?" Recall não é pouca coisa. Por exemplo, não é tarefa fácil ser conhecido nacionalmente. Na verdade, isso é uma formidável barreira à entrada na competição política. Por que a maioria de nós, quase a totalidade, não tem a menor condição de ser candidato a presidente? Porque somos ilustres desconhecidos e o eleitor não vota em desconhecidos.

Ser desconhecido, porém, não é somente ser desconhecido, é muito mais do que isso. O recall ou nível de conhecimento é uma forma de sintetizar o currículo do candidato, a avaliação da pessoa, seu reconhecimento, suas virtudes políticas. Por que a candidata do governo vem caindo nas pesquisas desde maio? Porque não é conhecida do eleitorado. E por que não é conhecida? Porque, ao contrário de Serra e Aécio, ela não tem um currículo político de grande envergadura.

Afirmei em meu livro "A Cabeça do Eleitor" que derrotar um governo bem avaliado não é tarefa para quem quer, mas sim para quem pode. Serra e Aécio são justamente os líderes políticos que podem fazer isso.

Dilma cresce rápido por causa de Lula e cai rápido por causa de sua falta de consistência. A sua falta de consistência recebe, por parte do eleitorado, o nome de desconhecimento: "Eu não conheço a candidata".

O que acontecerá com Dilma quando Lula tiver que deixar sua candidata voar sozinha? Isso é inevitável. Será Dilma, e não Lula, quem irá aos debates. Será Dilma que terá que responder aos jornalistas em entrevistas coletivas ou situações de pressão. O currículo dela contribui para que tenha um bom desempenho em tais situações? A resposta é fácil: certamente não. Lula é o vento que sopra a sua pipa, mas para voar e permanecer no alto ela precisa ser leve.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" (Record).

Que venham os anéis

Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO


Ganhamos porque merecemos. O Brasil fez uma campanha profissional, uma apresentação que equilibrou técnica e emoção, estava unido e tem um bom projeto. Começa hoje o longo trabalho de transformar sonho em realidade. Os 113 anos de história das Olimpíadas da era moderna trazem lições de acertos e erros que podem ajudar o Rio a traçar o mapa do caminho até a vitória

Foi bom sonhar, trabalhar, chorar. A sensação de superação e conquista aquece a alma. É assim que os brasileiros se sentem hoje.

Quem viu se orgulhou.

Quem torceu não acreditou quando ouviu o nome mágico: Rio de Janeiro! Olimpíadas podem dar certo. Ou não. Temos sete anos para garantir que a nossa dará.

Há quem diga que é muito dinheiro e que ele deveria ser investido em outras coisas, como educação. É muito dinheiro, mas uma parte dele voltará à sociedade em empregos; ao governo, em impostos; à cidade em benefícios.

O evento em si traz várias receitas.

E a educação? O Rio tem agora inúmeros desafios, um deles é sim aumentar o investimento em educação.

O estado precisa preparar seus habitantes para tirar o melhor proveito das oportunidades que vão surgir.

Um evento como esse não tem um efeito localizado.

Seus reflexos se espalham e irradiam para além do esporte, para além do Rio, para além do tempo.

Há cidades que tiveram ganhos para sempre, há cidades que ficaram com as cicatrizes.

Montreal ficou com uma dívida que levou 30 anos para acabar. Barcelona entrou numa era de pujança e charme. Sidney limpou suas águas pondo definitivamente a questão ambiental nos anéis olímpicos. O Brasil deve agora olhar para trás e aprender com a história. Há muitas escolhas. Devemos fazer as certas.

O professor Marcelo Proni, da Unicamp, fez um estudo no Ipea em que analisa o que aconteceu em Barcelona, Sidney e Pequim.

Ele conta que Sidney, em 2000, tirou nove milhões de metros cúbicos de lixo de 160 hectares de vias navegáveis; usou materiais recicláveis; plantou árvores e protegeu fauna e flora; fez construções que tiraram melhor proveito da luz natural.

Era o início da era dos jogos sustentáveis da qual não poderemos fugir.

A preocupação ambiental e climática tem que estar em cada passo, em cada escolha, em cada etapa do projeto.

As Olimpíadas serão em 2016, na era pós-Kioto, quando o mundo estará mais preocupado, e mais ameaçado, pelo aquecimento global.

O Rio pensa que porque tem mar, mata, natureza exuberante, que o meio ambiente está dado. É um erro. Além da despoluição, precisamos proteger o que temos e compensar o que emitiremos. Esse é o passaporte do futuro.

As Olimpíadas de Atenas em 2004 ficaram marcadas pelos desvios e fraudes em obras. Isso precisamos evitar com a mesma mistura de paixão e técnica que usamos para vencer.

Corrupção se vence combatendo fervorosamente esse mal que mina a vida brasileira. Como diz a campanha deste jornal: gritemos contra ela. Juntos. Nós e vocês. Seremos muitos.

Existem hoje fórmulas que inibem a prática da corrução: mais transparência, prestação de contas, acompanhamento de cada gasto.

O Brasil não pode aceitar uma sombra sobre a nossa alegria. As autoridades têm a responsabilidade de adotar práticas que sosseguem nosso medo de que uma parte do dinheiro vá por conhecidos desvios.

Somos um país que gosta de improvisos. Essa característica é qualidade às vezes, é defeito na organização de um evento desse porte. Em Atlanta, houve reclamações sobre as falhas no sistema de comunicação.

O planejamento tem que ir além de 2016. Seul ficou com elefantes brancos.

Nós não podemos nos dar ao luxo. O Pan deixou alguns alertas. No dia seguinte, olha-se para o espaço e não se sabe para que serve. As construções tem que ser multiuso.

Barcelona é nosso norte.

Como o Rio, a cidade da Catalunha estava vivendo a perda progressiva de densidade econômica. O projeto foi tão bem feito que é até hoje um símbolo de sucesso.

A cidade se reinventou, encontrou seu nicho como fornecedora de serviços culturais e centro turístico.

Os visitantes foram nas Olimpíadas e continuaram indo. Barcelona, que na época do evento tinha a metade da taxa de desemprego que no resto da Espanha, continua ainda hoje dando lições de como fazer um evento inesquecível.

Olimpíadas são o momento em que esporte, economia, política, cultura e questões sociais se misturam.

Em 1936, em Munique, já estava claro que um pesadelo se abateria sobre a humanidade.

A vitória de Jesse Owens foi a luz que indicou a todos o caminho certo para além do nazismo. Em 1980, o boicote americano a Moscou foi a esclerose da guerra fria. O que ficou na lembrança de todos foi o Misha, o simpático mascote dos Jogos.

A guerra fria acabaria anos depois, felizmente.

Olimpíadas são magia, sonho, chance. O presidente Lula lembrou ao Comitê Olímpico que a festa é da humanidade. Querendo dizer que, dos quatro candidatos, só nós não tínhamos tido nossa chance. Ontem, tivemos.

Agora, é transformar em vitória a oportunidade.

Há muito a fazer, mas hoje é só alegria. Merecemos.

A Olimpíada-2016 e os votos de 2010

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


A explosão de júbilo nacional – da Amazônia devastada ao Nordeste castigado pela ironia das enchentes e ao Sul clamando pelo socorro das vítimas das enchentes que derrubam casas, deixando milhares de famílias no desespero de não saber por onde recomeçar depois de enterrar os mortos, que tudo perderam até o gosto de viver – com o anúncio, às 13h51, da distante Copenhague, da escolha do Rio, com o feitiço da Cidade Maravilhosa e as manchas das favelas miseráveis, antro de gangues que assaltam, roubam, matam e exploram a venda de drogas, para sede dos Jogos Olímpicos de 2016 alerta não apenas para a evidência do desafio e da sua importância, que vai muito além do ouro das medalhas dos campeões.

O presidente Lula apostou todas as fichas, expôs a sua liderança ao risco de uma derrota e agora carrega a carga de abrir mais uma gigantesca frente de obras, que envolve governadores e prefeitos ao custo de alguns trilhões. E, no pêndulo das cobranças, a inevitável mistura de acertos e erros, na arrancada que enlouqueceu uma população que se irmana no orgulho de uma vitória que desperta a inveja do mundo.

É fácil celebrá-la e elogiar os vitoriosos. Com a imparcialidade de 60 anos de ininterrupto exercício do jornalismo político, que só assim pode ser respeitado, muito tenho criticado o atual governo nos seus notórios pecados. E pelo quinhão da sua responsabilidade pela crise moral que infecciona o pior Congresso desde a ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas.

Agora, acertou em todos os lances, alguns de ousado risco. O primoroso discurso que o presidente leu, com a ênfase de fazer inveja ao William Bonner, revelou a sua aplicação para brilhar para uma plateia que reunia as principais lideranças do mundo, não apenas nos esportes mas na política. Lula leu como se improvisasse, com voz firme e no tom exato, sem um erro e excelente jogo cênico nas voltas para todos os ângulos do auditório.

E agora? A dosagem da urgência, com as brechas para as imprevisíveis dificuldades, é da responsabilidade do presidente e do seu mastodôntico ministério, com as mudanças para substituir os que disputarão mandatos. Até 31 de dezembro de 2010, Lula é o responsável por mais da metade das obras para os Jogos Olímpicos de 2016, com o sucessor no segundo mandato da reeleição. Na berlinda, a candidata oficial, ministra Dilma Rousseff, colherá parte dos ganhos com o surto de euforia do país. E que a oposição terá de engolir sem fazer careta, forçando o riso tão espontâneo como esmola de sovina.

A Olimpíada será assunto nos cadernos esportivos, nos debates pelas redes de TV até o seu encerramento, em 2016. Desde o andamento das obras, seguindo os organogramas de cada uma. E para os jornalistas esportivos é um presente de rei. O treinamento dos atletas candidatos a uma vaga na representação brasileira será acompanhado por especialistas em cada uma das modalidades.

Para a campanha que começa com as convenções partidárias, em junho do próximo ano, os acordos e alianças são mais importantes que os Jogos Olímpicos de seis anos depois. Mas a estrutura publicitária do governo é a maior, a mais cara e a mais competente dos últimos anos.

Como a oposição não disse ao que veio, não definiu a sua chapa e atravessa uma fase caipora com a sucessão de derrotas nos confrontos no Congresso, a cada euforia do governo corresponde um amuo dos tucanos e do DEM.

O presidente passa a impressão que descobriu o segredo de Midas e transforma em ouro tudo que toca. Por mais algumas semanas, a vitória em Copenhague, a esperta brincadeira Nós podemos, plágio do We can do presidente Barack Obama, sustenta o sucesso olímpico.

E depois? Várias e imensas frentes de obras: do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Minha Casa Minha Vida, para a construção de 1 milhão de residências populares e, a cada dia, o apelo de ministros, governadores, prefeitos para o corre-corre da construção e reforma de estádios, vilas olímpicas, pistas para as provas de atletismo, prédios para o alojamento de dirigentes e atletas e todo uma conta de trilhões que se evaporam como a poça d’água em dias de calor.

Oposição da UNE diz que a entidade ignora que alunos foram prejudicados

DEU EM O GLOBO

Um grupo dissidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) criticou ontem o posicionamento da entidade diante do vazamento das provas do Enem. Em nota, assinada por nove integrantes da chapa que ficou em segundo lugar na eleição da UNE e que integra a diretoria, o grupo critica as declarações do presidente da entidade, Augusto Chagas, que se limitou a classificar o vazamento como “muito grave” e a pedir “rigorosa investigação”.

Para o grupo, a UNE e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) “ignoram que quatro milhões de estudantes estão prejudicados”.

— Além de ser atrelada ao governo federal, a presidência da UNE não tem posicionamento firme sobre o problema. Além de defender a apuração rápida, era preciso exigir a participação dos estudantes na averiguação do vazamento — afirmou o diretor de Universidades Públicas da UNE, Silaedson da Silva Juninho, que faz parte do grupo chamado O.E. (Oposição de Esquerda).

Juninho informou que o grupo vai incentivar mobilizações nos grêmios estudantis na próxima semana para tentar articular um movimento nacional. A oposição da UNE quer formar uma comissão para ser recebida pelo governo federal.

— Não queremos só criticar, mas fazer parte do processo.

Queremos levar propostas. E a criação de uma comissão independente, formada não só pelas entidades, mas também por alunos de cursinhos pré-vestibulares, para acompanhar as investigações é a nossa primeira proposta — disse Juninho.

Na nota, o grupo se diz contrário ao Enem e diz que os protestos de estudantes quinta-feira são “o resultado de uma política desastrosa do governo Lula”.

“Além do fato de o governo federal, através do Ministério da Educação, ter empurrado tal modelo goela abaixo dos estudantes, se prova que técnica e politicamente a proposta é confusa e equivocada. (...) O fato é que o governo não teve capacidade de organizar o exame”

STF suspende posse de suplentes

Mariângela Gallucci
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Liminar foi concedida por Cármen Lúcia, para quem PEC dos Vereadores muda processo eleitoral já encerrado

Diante da corrida dos suplentes, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem a suspensão da posse de novos vereadores nas Câmaras Municipais com base na emenda que aumentou em 7.709 o número desses cargos em todo o País. Eventuais posses já ocorridas com base na chamada PEC dos Vereadores também deverão ter os efeitos suspensos.

Cármen concedeu liminar a pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. A medida, tomada em caráter de urgência, deverá ser analisada em breve pelo plenário do STF - a quem caberá decidir se referenda ou não a liminar. A expectativa é de que a decisão da ministra seja confirmada.

"A eleição é processo político aperfeiçoado segundo as normas jurídicas vigentes em sua preparação e em sua realização", afirmou Cármen. Segundo ela, a emenda muda um processo eleitoral já encerrado, o de 2008. A ministra disse que era necessário conceder a liminar para resguardar eventuais direitos dos eleitores, das Câmaras Municipais e dos partidos.

Na ação, entregue na terça-feira ao STF, o procurador contestou a emenda, promulgada no dia 23. Alegou que o tribunal já decidiu que o número de vereadores deve ser proporcional à população dos municípios e pediu que fossem declaradas sem efeito eventuais posses de suplentes.

Na quinta, o procurador solicitou que a ministra decidisse o pedido de liminar com urgência porque havia notícias de que novas posses de suplentes ocorreriam com base na emenda aprovada pelo Congresso. A primeira delas ocorreu na sexta-feira passada no município de Bela Vista de Goiás (GO). O procurador disse que em Conselheiro Pena (MG), dois suplentes também teriam sido empossados.

"Sem qualquer justificativa, a alteração constitucional promove imensa interferência em eleições já encerradas, pondo todos os municípios do País a refazer os cálculos dos quocientes eleitoral e partidário, com nova distribuição de cadeiras, a depender dos números obtidos, que podem, inclusive, trazer à concorrência partidos que não obtiveram lugares anteriormente", afirma o procurador na ação.

Na segunda-feira, o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, encaminhou ofícios aos presidentes de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) alertando para o fato de que, pelo entendimento da corte, propostas como a PEC dos Vereadores não podem valer para a atual legislatura. De acordo com o ministro, esse tipo de norma não pode retroagir, beneficiando suplentes que participaram da eleição passada. Ou seja, a mudança não valeria para os eleitos em 2008. Somente poderia vigorar para a eleição de 2012.

À espera de perdão para infidelidade, 28 parlamentares trocam de partido

Luiza Damé e Isabel Braga
DEU EM O GLOBO

PMDB ganhou três deputados, mas perdeu sete deles, além de um senador

BRASÍLIA
. A decisão da maioria dos partidos de não recorrer à Justiça contra os infiéis, combinada com a lentidão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em julgar os processos contra parlamentares, incentivou o troca-troca partidário nos últimos dias. Pelo menos 24 deputados federais e quatro senadores trocaram de partido para disputar as eleições de 2010, confiantes de que não serão punidos por infidelidade partidária.

O partido que mais perdeu foi o PMDB — sete deputados e um senador. E ganhou três deputados. Segundo o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), o partido não vai tentar reaver esses mandatos: — O PMDB é um partido grande e democrático, e tem de compreender as questões regionais dos filiados.

Prazo para filiação e troca de partido se encerra hoje O prazo para filiação e troca de partido se encerra hoje. Pela Lei Eleitoral, quem vai disputar as eleições tem de estar filiado a um partido político um ano antes do pleito. Em 4 de outubro de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o mandato pertence ao partido, e não ao eleito. Desde então, o TSE julgou 13 processos de infidelidade, mas só o deputado Walter Brito Neto (PB), que trocou o DEM pelo PRB, perdeu o mandato.

Outros cinco casos ainda serão julgados, incluindo os movidos pelo DEM contra os deputados Jairo Carneiro (BA), que foi para o PP, e Nilmar Ruiz (TO), que se filiou ao PR. Na reta final das filiações, o DEM perdeu quatro deputados.

— Vamos continuar entrando no TSE contra todos os que mudarem de partido — disse o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ).

Presidente do PSB paulista — partido que perdeu dois deputados —, o deputado Márcio França (SP) conta que há suplentes dispostos a pedir, na Justiça Eleitoral, os mandatos dos parlamentares inféis.

Mas França reconhece que a decisão de muitos de trocar de partido está relacionada à expectativa de lentidão da Justiça Eleitoral: — O deputado sai apostando na demora do julgamento.

Acredita-se também em negociações com os partidos. O deputado Rodovalho (DF), que trocou o DEM pelo PP, por exemplo, disse que seguiu o orientação do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, que também é do DEM.

Rodovalho alegou que estava sem espaço no partido.

— Não sei se o DEM agirá linearmente em todos os casos.

Só espero que a direção do partido tenha bom senso — disse.

O presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ), disse que não irá atrás do mandato do deputado Pastor Manoel Ferreira (RJ), novo filiado do PR: — Não vou perseguir o pastor Manoel. Ele que vá com Deus. Não vou pedir o mandato, embora lamente o papel dele de deixar o mandato.

O deputado Severiano Alves (BA) foi filiado por 18 anos ao PDT e deixou a legenda para ingressar no PMDB, afirmando que foi praticamente obrigado a sair. Ele reclama da atuação do presidente licenciado do partido, Carlos Lupi, ministro do Trabalho.

— O Lupi fez uma intervenção no partido na Bahia pelo acordo com o PT. Filiou pessoas sem reunir a bancada. Fui alijado, fiquei duas noites sem dormir. Eles não têm moral para pedir meu mandato. Se entrarem, mostro que rasgaram a história do PDT na Bahia — disse.

Agaciel Maia se filia ao PTC e pode ser candidato Autor de uma das propostas que criam a janela de troca partidária durante um mês no ano que antecede a eleição, o deputado Flavio Dino (PCdoB-MA) afirmou que a decisão de políticos de enfrentar a regra e trocar de partido mostra que a regra mais rígida descolou-se da realidade brasileira.

— Quando a regra é muito rígida, produz dois cenários: ou é imposta com a força, ou ela se desmoraliza. É o que acontece com a regra da fidelidade, acabou ficando descolado da realidade brasileira. O processo político brasileiro reflete a sociedade brasileira, altamente dinâmica. O Brasil não é Suécia.

Os fatos estão dando razão à janela — disse o deputado.

Ontem, o ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia filiou-se ao PTC. Ele poderá se candidatar ano que vem a uma vaga na Câmara dos Deputados, obtendo assim imunidade parlamentar.

Anteontem, foi divulgado relatório da comissão do Senado para analisar os atos secretos, que responsabilizou Agaciel e João Carlos Zoghbi, ex-diretor de Recursos Humanos da Casa, pela não publicação desses atos.

Troca-troca engorda PSC e PR; oposição encolhe 17%

Ranier Bragon, Maria Clara Cabral
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

46 políticos de projeção nacional já mudaram de partido; prazo termina hoje

Ex-líder do PR acena com "maior poder de barganha"; tucano diz que "partidos que apoiam o presidente sempre levam vantagem"

O encerramento hoje da atual temporada de troca-troca de políticos entre os partidos deve consolidar na Câmara dos Deputados o crescimento em quase 100% de duas legendas: o PSC (Partido Social Cristão) e o PR (Partido da República). Em sentido contrário, a oposição vai encolher, em média, 17%.

Apesar de a Justiça Eleitoral ter criado uma regra anti-infidelidade em 2007, nas últimas semanas ao menos 46 deputados federais, senadores e figuras de projeção nacional abandonaram ou estão para trocar suas legendas por outras.

O número deve crescer, já que o prazo para que os candidatos às eleições de 2010 estejam devidamente filiados termina hoje. Ontem, as principais lideranças partidárias estavam nos Estados acertando as últimas composições. O deputado federal Jefferson Campos (SP), por exemplo, acertou a troca do PTB pelo PSB.

Na Câmara dos Deputados, PSC e PR foram os que mais incharam desde as eleições de 2006. Criado em 1990, o PSC havia conseguido nove cadeiras nas urnas, mas deve entrar na semana que vem com 17 deputados, um crescimento de 89%.

"O único atrativo que o PSC oferece é o trabalho que faz na Câmara. Além do fato de não ter dono", declarou o líder da bancada, deputado Hugo Leal (RJ). Entre outros, entraram na legenda os deputados Marcondes Gadelha (PB), ex-PSB, Laerte Bessa (DF), ex-PMDB, e Sérgio Brito (BA), ex-PDT.

Já o PR nasceu no final de 2006 como resultado da fusão do PL (Partido Liberal) com o Prona -legenda criada por Enéas Carneiro (1938-2007).

PL e Prona haviam eleito 25 deputados. Agora, o PR deve encerrar o período do troca-troca com 44, sendo cinco novos integrantes só nas últimas semanas. Seguindo os passos do ex-governador Anthony Garotinho, o deputado Geraldo Pudim (RJ), ex-PMDB, foi um dos que ingressou na legenda.

"O PR é uma sigla nova, que ainda está se organizando nos Estados. Ou seja, o deputado que entra geralmente passa a ter o controle do diretório. Tem força política para negociar com o governo e um maior poder de barganha", afirma Luciano Castro (RR), que liderou a bancada no ano passado.

Oposição

Já os três maiores partidos de oposição, DEM, PSDB e PPS, elegeram 153 deputados em 2006, mas agora devem somar apenas 127, 26 cadeiras a menos. A queda da oposição nesta legislatura (17%) é similar à ocorrida em igual período da legislatura anterior (2003-2006), quando encolheu 22%.

"É claro que os partidos que apoiam o presidente sempre levam vantagem. Em uma país como o nosso, onde os partidos políticos são tão fragilizados, onde as fronteiras partidárias são tão diluídas, é mais fácil estar na base", diz o líder tucano na Câmara, José Aníbal (SP).

Em 2007, o TSE decidiu que o mandato pertence à legenda, não ao político. Com isso, restringiu a legalidade do troca-troca aos casos de fusão ou criação de partido, desvio reiterado do programa partidário ou grave perseguição interna. Fora dessas situações, o "infiel" corre o risco de perder o mandato.

Mas até agora isso não tem ocorrido, já que o TSE só condenou um dos 18 políticos cujos casos foram analisados, além de partidos como PMDB e PT terem aberto mão de pedir os mandatos de volta na Justiça. E como a atual legislatura caminha para o final, os casos de condenação daqui para frente tendem a ameaçar apenas uma pequena parte do mandato.

Troca-troca atropela decisão do STF

Marcelo de Moraes e Leandro Colon
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Apesar de mandatos pertencerem aos partidos, políticos não se intimidam com risco de perderem as cadeiras

Dois anos depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) definir que os mandatos de parlamentares que mudam de legenda pertencem aos partidos, o troca-troca partidário voltou a se impor no cenário nacional. Se a decisão do Supremo, em 4 de outubro de 2007, provocou a perda de mandatos e conteve a dança das cadeiras dentro dos partidos, agora esses efeitos vêm sendo ignorados pelos políticos, que voltaram à antiga prática, sem temer punições e buscando novas siglas conforme suas conveniências eleitorais.

Hoje termina o prazo legal para essas novas filiações partidárias com vistas às eleições de 2010 e poucos políticos fizeram seus movimentos preocupados com o viés ideológico de suas legendas.

Na prática, as filiações se deram com base em dois aspectos centrais. A primeira onda foi na direção de partidos com pré-candidaturas presidenciais com potencial de bom desempenho, como é o caso do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) e da senadora Marina Silva (PV-AC).

Essa atração funcionou não apenas com políticos experientes, mas com empresários interessados em contribuir e participar dessas novas campanhas. O PSB de Ciro atraiu o presidente da Fiesp, Paulo Skaf. Já o PV de Marina levou o presidente da Natura, Guilherme Leal, além de empresários dos grupos Klabin e Brasilinvest.

De quebra, essa onda ainda arrastou políticos como o vereador Gabriel Chalita, que deixou o PSDB para entrar no PSB, e o ex-ministro do Turismo e das Relações Institucionais Walfrido dos Mares Guia, que deixou o PTB de Roberto Jefferson para se tornar companheiro de partido de Ciro.

ESPAÇO

O segundo principal fator do troca-troca partidário foi a busca de espaço para o lançamento de candidaturas majoritárias. Políticos escanteados nas suas antigas legendas buscaram novas oportunidades em partidos menores.

O Partido Social Cristão (PSC) abrigou políticos rejeitados por suas antigas legendas. Em troca da filiação, entregou o comando regional a esses caciques. Um exemplo é o ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz, que deixou o PMDB pelo PSC. Ele será candidato ao governo. Carregou junto um deputado federal, Laerte Bessa.

O senador Mão Santa (PI) foi outro que trocou o PMDB pelo partido cristão, onde será candidato à reeleição. Mão Santa vai presidir a legenda no Piauí.

Em recente entrevista ao Estado, o presidente do PSC, Vitor Nósseis, não escondeu que dinheiro é fundamental para a chegada dessas novas lideranças. "É como a relação entre marido e mulher. Se o dinheiro sai pela porta, a mulher sai pela janela."

GAROTINHO

No Rio de Janeiro, o ex-governador Anthony Garotinho também preferiu deixar o PMDB para poder concorrer ao governo do Rio. Como o PMDB não abriria mão da candidatura à reeleição do governador Sérgio Cabral, Garotinho se mudou com todos seu aliados para o PR para poder concorrer.

Na mão inversa, o DEM foi um dos partidos que sentiram os efeitos mais fortes no troca-troca partidário. Integrante da oposição, mas sem ter uma candidatura própria à Presidência, acabou "desidratado", com a perda garantida de pelo menos quatro filiados na Câmara, além da saída de deputados estaduais por todo o País.

Apesar disso, o comando do partido decidiu entrar na Justiça Eleitoral para cobrar a devolução do mandato dos parlamentares considerados infiéis. Para o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), esse movimento de mudança de legendas seria baseado na convicção de que não se repetirão as punições pela infidelidade partidária.

"Parece que eles foram informados pelos governadores de seus Estados que essas punições não seriam feitas. Não sei se é verdade, mas é um absurdo não se respeitar o princípio da fidelidade partidária", avalia Maia.

Honduras: negociação começa na próxima semana

Ricardo Galhardo
Enviado especial
DEU EM O GLOBO

Missão da OEA chega a Tegucigalpa; Zelaya e Micheletti indicam interlocutores para a mesa de diálogo

TEGUCIGALPA. Depois de três meses da crise política iniciada com o golpe de Estado de 28 de junho, o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, e o presidente deposto, Manuel Zelaya, finalmente vão iniciar um diálogo em busca de acordo.

As negociações serão mediadas pela Organização dos Estados Americanos (OEA), que enviou uma missão ontem a Tegucigalpa a fim de preparar o terreno para uma reunião de chanceleres prevista para o dia 7.

Segundo o assessor da secretariageral da OEA, John Bihel, os dois lados já indicaram cinco interlocutores cada para compor a mesa de negociação. Fontes ligadas a Micheletti contaram que a negociação teria como ponto de partida o Acordo de San José, com modificações pontuais. No meio político hondurenho, o otimismo leva a especulações sobre a possibilidade de um acordo antes mesmo da missão de chanceleres.

Micheletti defendeu uma saída doméstica para a crise. A OEA teria um papel secundário, de dar amparo ao diálogo.

— Creio que este é um problema hondurenho e o mais lógico seria que nós, hondurenhos, o resolvêssemos. Logicamente, gostaríamos que viesse alguém para contribuir com o diálogo — disse Micheletti.

Os representantes da OEA, que chegaram ontem a Honduras, adotaram um discurso semelhante.

— Nossa tarefa é propiciar o diálogo para a restituição da ordem constitucional — disse o secretário de Relações Políticas da OEA, Victor Rico.

A missão encontrou em Tegucigalpa um ambiente político muito diferente de domingo, quando foram impedidos de entrar no país.

Micheletti, que até então vinha sendo enfático em recusar a possibilidade da restituição de Zelaya, foi lacônico ao responder sobre o assunto, ontem: — Sobre isso quem vai falar são as pessoas indicadas para a negociação.

Para Arias, Constituição hondurenha é a pior Zelaya disse aos deputados brasileiros que admite voltar à Presidência com poderes reduzidos.

Segundo eles, o objetivo de Zelaya não é mais governar, e sim dar um exemplo de repúdio aos golpes no continente.

Micheletti também se mostrou otimista quanto a um acordo.

O único fato que destoou do clima de conciliação e otimismo foi uma declaração desastrada do presidente da Costa Rica, Óscar Arias, autor do Acordo de San José, afirmando que o silêncio da Constituição hondurenha sobre a possibilidade de impeachment alimenta a crise. “Eu me forcei a estudar a Constituição de Honduras. Não creio que haja constituição pior na face da Terra”, disse ao jornal “Miami Herald”.

A declaração foi duramente criticada por políticos.

Apesar da distensão no campo político, a repressão aos movimentos que pedem a restituição da ordem constitucional continua. Ontem, 38 sem-terras presos durante a desocupação do Instituto Nacional Agrário foram transferidos para uma penitenciária.

Segundo a polícia, 3.200 pessoas foram presas desde o golpe e 2.200 desde a volta de Zelaya ao país, na segundafeira passada.

De acordo com o Comitê de Defesa dos Direitos Humanos de Honduras, 12 pessoas morreram desde o dia 28 de junho em função do golpe. A Polícia Nacional rejeita o número e fala em quatro mortes, mas não mas não admite a responsabilidade por nenhuma delas.

Encontro com Micheletti divide os brasileiros

DEU EM O GLOBO

Dois deputados se recusaram a participar do encontro

TEGUCIGALPA. Contrariando todo o esforço político e diplomático de Brasília para isolar e deslegitimar o governo interino de Honduras, parte da comissão de deputados brasileiros que esteve em Tegucigalpa se encontrou quinta-feira à noite com o presidente Roberto Micheletti.

O encontro não constava da agenda dos deputados e provocou um racha na comissão. Entre os que participaram do encontro, regado a vinho branco, canapés e sorrisos, com o presidente interino estava o líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PT-PE). Tanto os deputados quanto Micheletti disseram que a visita não significa o reconhecimento do governo interino.

Além do líder petista, participaram Raul Jungmann (PPS-PE), Bruno Araújo (PSDB-PE) e Claudio Cajado (DEM-BA). Ivan Valente (PSOL-SP) e Janete Pietá (PT-SP) não foram à reunião. Para eles, qualquer forma de diálogo com o governo interino poderia ser interpretada como um reconhecimento por parte das autoridades brasileiras. Segundo testemunhas, houve uma séria discussão entre os integrantes da comitiva antes da reunião.

— É uma comissão da oposição — disse Jungmann ao presidente interino.

Da parte hondurenha participaram Micheletti, a vicechanceler Marta Alvarado, que também não escondia os sorrisos de satisfação, e assessores de segundo escalão.

A forma como o governo encarou o encontro estava explícita logo na entrada na Chancelaria, onde uma surrada bandeira brasileira, fora do padrão, foi colocada ao lado da hondurenha.

Quando foi permitida a entrada de jornalistas, Micheletti e os deputados conversavam animadamente sobre futebol.

“Onde está o lulista?”, perguntou Micheletti Na saída, Micheletti e Alvarado posaram para fotos ao lado dos deputados. Preocupado com a possível ausência do líder do PT, Micheletti perguntou: — Onde está o lulista? Segundo Jungmann, o encontro teria sido combinado na última hora. Os deputados anunciaram que Micheletti prometeu religar os telefones fixos da embaixada, cortados desde o dia 21, além da liberação do diplomata brasileiro Lineu Pupo de Paula para entrar e sair da representação brasileira e da suspensão do ultimato de dez dias para que o Brasil definisse o status diplomático de Zelaya.

Ambos os lados negaram que a visita represente um reconhecimento formal. Segundo Rands, o objetivo foi garantir proteção à embaixada. O presidente Lula, correligionário de Rands, disse que não dialoga com “o governo golpista” de Micheletti.

Depois dos parlamentares brasileiros, Micheletti se reuniu ontem com uma delegação de legisladores americanos, do Partido Republicano. A viagem contraria a política da Casa Branca de não reconhecer o governo interino hondurenho. (R.G.)

2016, o ano que já começou

Copenhague
DEU EM O GLOBO

Agora só faltam 7 para:

Fazer uma estação de metrô por ano

Duplicar as vagas da rede hoteleira

Despoluir a Baía e as lagoas da Barra

Construir e reformar 33 instalações esportivas


Foi uma decisão histórica e emocionante, que levou às lágrimas o presidente Lula e as mais de 30 mil pessoas que foram à Praia de Copacabana e comemoraram em clima de Copa do Mundo a conquista do Rio. Pela primeira vez, os Jogos Olímpicos serão na América do Sul, e o Brasil se juntará a EUA, Alemanha e México no restrito grupo de países que fizeram uma Copa do Mundo e uma Olimpíada em apenas dois anos. Agora os governos municipal, estadual e federal terão que trabalhar muito para tirar do papel as promessas feitas ao COI. São apenas sete anos para fazer o que não se fez em 50: renovar o caótico sistema de transportes (foram apenas duas novas estações de metrô nos últimos oito anos), duplicar para 48 mil as vagas em hotéis, modernizar a infraestrutura de segurança, despoluir a Baía de Guanabara e as lagoas da Barra, e construir e reformar 33 instalações esportivas, inclusive a Vila Olímpica. Pelé e João Havelange foram decisivos na vitória, que se mostrou até fácil: 66 votos contra 32 de Madri. Chicago foi eliminada de cara. O mercado financeiro festejou.

Depois do início difícil, uma vitória por goleada

Rio herda maioria dos votos de Chicago e de Tóquio, cidades eliminadas nas duas primeiras rodadas

Numa semana marcada por metáforas sobre o equilíbrio na disputa puta pelas Olimpíadas de 2016, ninguém imaginava que o dia terminaria com o Rio recebendo um número de votos duas vezes superior ao da segunda colocada (66 a 32) e ganhando 20 votos a cada rodada. Muito menos que essa cidade seria Madri.

Não só porque as bolsas de apostas ao redor do mundo previam uma corrida particular entre Rio e Chicago, mas também porque a lógica olímpica colocava a capital espanhola numa posição incômoda — as Olimpíadas de 2012 serão realizadas em Londres e há mais de 50 anos o COI não realiza duas edições consecutivas num mesmo continente.

O dia começou em meio à expectativa provocada pela decisão do presidente dos EUA, Barack Obama, de ir a Copenhague, o que, segundo a mídia internacional, poderia dar a Chicago um empurrão decisivo. Na apresentação de Chicago 2016, porém, o que se viu foi uma tentativa de usar o carisma de Obama e da primeira-dama, Michelle, junto aos delegados do COI.

Já na sessão de perguntas ficava claro que o COI tinha reservas em relação a pontos fundamentais do projeto de Chicago, como a decisão de realizar as provas de ciclismo a 55 km do centro nervoso dos Jogos.

Rio levou tropa de choque para Copenhague Na sabatina, nem mesmo Obama conseguiu dar uma resposta convincente a uma indagação do príncipe de Mônaco, Albert II, sobre o legado de uma quinta Olimpíada de Verão americana. O presidente dos EUA concentrou demais sua resposta na questão geopolítica, o que, nos corredores do Bella Center — o centro de convenções que serve como base do COI na Dinamarca — desagradou a alguns delegados.

Tóquio fez sua apresentação em seguida, marcada muito mais pelas tentativas japonesa de injetar paixão a seu projeto olímpico após críticas feitas pelo COI durante a avaliação das candidaturas.

O Rio levou uma tropa de choque que, diferentemente das outras candidaturas, não se limitou a atletas famosos ou dirigentes.

Da abertura feita pelo expresidente da Fifa João Havelange, aos discursos de autoridades como o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, a candidatura equilibrou paixão com um minucioso desfile de informações, tocando em pontos considerados problemáticos, como a questão da violência e dos desafios logísticos para a realização da Copa de 2014.

Filme-surpresa do Rio emociona a plateia Pareceres técnicos alternaramse com depoimentos emocionados, como o da velejadora Isabel Swan e da velocista Barbara Leôncio. Bárbara também marcaria presença no emocionante filme-surpresa que mostrava a representação humana dos anéis olímpicos nas areias de Copacabana.

O pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi centrado na maturidade do Brasil e na ausência de uma edição sul-americana dos Jogos Olímpicos.

— Somos a décima economia do mundo e ainda não sediamos os Jogos Olímpicos. Para os outros, será apenas mais uma Olimpíada. Para nós, será algo inédito. Está na hora de o COI corrigir essa injustiça — disse Lula, que, diferentemente dos outros participantes, que se expressaram em inglês, francês e espanhol, fez seu discurso em português.

Se o favoritismo do Rio era esperado, a eliminação de Chicago na primeira votação (com 18 votos, contra 28 de Madri; 26 do Rio e 22 de Tóquio) foi a surpresa do dia. A esperada queda de Tóquio na segunda rodada (com 20 votos, contra 46 do Rio e 29 de Madri) gerou apreensão, pois colocaria os cariocas frente a frente com Madri, que, para 2012, por muito pouco havia ficado fora da disputa, além de contar com a bênção de Juan Antonio Samaranch, que, de 1980 a 2001, foi o homem forte do COI . A apresentação dos espanhóis, ainda que não tão celebrada como a brasileira, foi bastante aplaudida.

Representantes da candidatura de Madri andavam sorridentes pelos corredores do Bella Center. No fim, porém, assistiram à chegada de uma nova ordem no movimento olímpico. Se os soldados madrilenhos desapareceram após o anúncio da vitória do Rio, um dos comandantes do projeto, o primeiro-ministro Jose Luiz Zapatero, fez questão de ser gracioso na derrota: — Madri esteve muito perto, mas o Rio finalmente conseguiu vencer. Parabenizo os brasileiros.

Diferentemente do que sugere a vitória por ampla vantagem, o caminho até a Olimpo foi marcado por tensão e muitas orações. Antes de entrar no auditório do Bella Center, todos os integrantes da comitiva brasileira deram as mãos e rezaram.

Numa antessala, minutos antes da apresentação, Pelé e João Havelange puxaram um coro de “Cidade Maravilhosa”.

Com exceção do presidente Lula, todos permaneceram no Bella Center. Lula almoçou com o primeiro-ministro da Dinamarca e foi para o hotel acompanhar a apuração. De início, não voltaria ao centro, mas mudou de ideia e chegou ao Bella Center cerca de dez minutos antes da abertura dos envelopes.

No intervalo antes da divulgação da cidade vencedora, o prefeito Eduardo Paes foi até o comitê de imprensa e cantarolou “Cidade Maravilhosa”.

Mais tarde, na saída da sala de reuniões do Bella Center, a Bandeira do Brasil era exibida por integrantes da delegação do Rio. O hino da Cidade seria repetido no auditório do centro de convenções, puxado pelo presidente do COB, Carlos Arthur Nuzman, e por Paes

Olimpíadas 2016: Parabéns, Rio! Parabéns, Brasil!

Valéria de Oliveira
DEU NO PORTAL DO PPS


O presidente nacional do PPS, Roberto Freire, divulgou nota em que o partido comemora a escolha do Rio de Janeiro, em votação realizada nesta sexta-feira em Copenhague (Dinamarca), para sediar as próximas Olimpíadas, que serão realizadas em 2016. "É uma sonho antigo do continente, e a justa vitória pertence não apenas à beleza do Rio de Janeiro, com sua paisagem deslumbrante de montanha e mar, mas a seu povo, que tem uma inigualável alegria, amabilidade, hospitalidade e tantas outras qualidades que fazem da sua gente – brasileiros ali nascidos ou oriundos de qualquer lugar – uma população habilitada a receber o mundo todo para um evento de tamanha grandeza", afirma o texto.

O PPS adverte, entretanto, que a implemantação de políticas públicas na área de esportes e o fim de práticas como o superfaturamento que ocorreu durante os Jogos Pan-Americanos em 2007, também no Rio, são desafios que o próximo governo do Brasil terá de enfrentar para que as Olimpíadas tenham sucesso.

Segundo o TCU, R$ 2 bilhões e 740 milhões, fruto de superfaturamento, sumiram naquele evento."Isso não pode se repetir nas Olimpíadas", observa o partido. Se houver competência na realização das nossas Olimpíadas, diz a nota, o país pode comemorar, "torcer pelo Brasil para que tenhamos êxito em cada modalidade e fazer a festa, porque, quando se trata do povo brasileiro, alegria e emoção estão garantidas". Veja íntegra da nota abaixo:

“Parabéns, Rio! Parabéns, Brasil!

O PPS se soma à alegria de todos os brasileiros e, particularmente, dos cariocas, que conquistaram, nesta sexta-feira, o direito de sediar as Olimpíadas de 2016. O partido congratula-se com cada cidadão, com cada atleta deste país e de toda a América Latina, que pela primeira vez recebe os Jogos Olímpicos. É um sonho antigo do continente, e a justa vitória pertence não apenas à beleza do Rio de Janeiro, com sua paisagem deslumbrante de encontro de montanha e mar, mas ao seu povo, que tem uma inigualável alegria, amabilidade, hospitalidade e tantas outras qualidades que fazem da sua gente – brasileiros ali nascidos ou oriundos de qualquer lugar – uma população habilitada a receber o mundo todo para um evento de tamanha grandeza.

As Olimpíadas se realizarão em 2016, daqui a exatos 2.400 dias, período no qual é gigantesco o desafio para cumprir tarefas de fundamental importância para que elas transcorram com sucesso. Políticas públicas para a área de esportes, que atualmente não existem, precisam ser implementadas; práticas como o superfaturamento ocorrido nos Jogos Pan-Americanos de 2007 devem ser varridas para sempre. Somente naquele evento, segundo o TCU (Tribunal de Contas da União), o povo arcou com um prejuízo de R$ 2 bilhões e 740 milhões, dinheiro que foi parar no bolso de corruptos. Isso não pode se repetir nos Jogos Olímpicos. O próximo governo tem de administrar com essa preocupação e coordenar a preparação dos jogos com competência e honestidade.

É uma emoção a conquista de sediar os Jogos Olímpicos. Será uma grande responsabilidade fazer com que eles entrem para a história dos esportes como exemplo de beleza, organização e gestão competente do dinheiro público. No mais, é torcer pelo Brasil para que tenhamos êxito em cada modalidade e fazer a festa, porque, quando se trata do povo brasileiro, alegria e emoção estão garantidas.

Roberto Freire
Presidente Nacional do PPS”