segunda-feira, 12 de outubro de 2009

REFLEXÃO DO DIA

Num partido democrático, deve-se poder pronunciar a palavra "esquerda". A esquerda contribuiu para o progresso da Itália, foi parte fundamental da Resistência e protagonista das grandes conquistas sociais e civis. Ser de esquerda significa ficar do lado dos últimos (palavra cara também aos católicos) e lutar pela igualdade e a liberdade. Ser de esquerda significa também apostar no mérito. Logo, o PD, que é um partido progressista, não pode deixar de ser de esquerda.


Pietro Spataro, L'Unità, 11 de outubro de 2009.

Pra casa, Ciro!

Ricardo Noblat
DEU EM O GLOBO


Nenhum chefe político gosta de ser contrariado. Chefes em geral não gostam. Lula desenhou a sucessão dele com régua e compasso. Mesmo assim deu errada aquela jogada do terceiro mandato consecutivo. Não convenceu nem seus aliados mais fiéis. Então ele inventou Dilma, sem passado dentro do PT, sem a mínima experiência eleitoral.

Se ela não emplacasse, quem sabe o terceiro mandato não ganharia as ruas e acabaria aprovado pelo Congresso? Por ora, Dilma de fato não emplacou. Mas a crise financeira internacional sepultou o sonho do terceiro mandato. Foi um vacilo de Lula concordar com o desejo de Ciro de se testar como candidato. Ciro logo passou Dilma nas pesquisas de voto.

Lula está sinceramente convencido de que a comparação dos resultados do seu governo com os resultados do governo de Fernando Henrique servirá de combustível para incendiar a candidatura de Dilma. E que sua presença ao lado dela dizendo a todo instante: “Minha candidata é Dilma”, derrotará José Serra sozinho ou ele com Aécio Neves de vice.

Marina Silva, candidata do PV? Lula não aposta um tostão furado na candidatura dela. Descarta que ela possa crescer o suficiente para provocar um segundo turno entre Dilma e Serra. Uma eleição plebiscitária, tal como ele a concebe, se esgotará no primeiro turno. Se Dilma perder... Lula terá feito tudo para elegê-la. E Serra não será assim tão mal para ele.

O que não dá é Ciro bater Dilma no primeiro turno e se classificar para concorrer com Serra no segundo. O mito Lula sairia afetado. Ele não teria demonstrado força sequer para garantir Dilma no segundo turno. Ouviria: cadê o poderoso cabo eleitoral ambicionado por 10 entre 10 candidatos às próximas eleições? O gato comeu. De resto, Ciro é imprevisível.

O que não murmuraria o PT, hein? Sim, porque diante de Lula só resta ao PT murmurar. Estrilar? Não. Espernear? Esqueça. Revoltar-se? Jamais! Mas o que murmuraria o PT? Forçado a ir com Dilma, o PT ainda se veria na humilhante situação de ter que sair gritando por aí: “Ei, ei, ei, Ciro é nosso rei”. Logo o PT que não engole Ciro nem em São Paulo...

Divirta-se Ciro enquanto puder como aspirante à vaga de Lula. O PSB, seu partido, prefere tê-lo como candidato à vaga de Serra. Ciro cometeu a bobagem de transferir seu título de eleitor para São Paulo. Mesmo que perca, ajudará à eleger deputados do partido. Para presidente, o PSB espera o momento certo de anunciar que é Dilma desde garotinho. PDT e PCdoB estão com Dilma. Com Ciro só tem ele e quase 20% do eleitorado.

O uso da popularidade

Fernando Rodrigues
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - Lula tateou o terreno, mas parece ter abandonado de vez a espinhosa missão de corrigir a anômala invenção do capitalismo sem risco brasileiro chamada caderneta de poupança. Nenhum país do planeta consegue vencer completamente a inflação, os juros altos e a indexação quando o governo está obrigado a garantir a todos um rendimento de 6% ao ano, mais a variação da TR (Taxa Referencial). Tudo livre de imposto.

A medida é altamente popular. A menos de um ano da eleição, políticos não apreciam correr riscos. Taxar a poupança não rende votos. Esse episódio ilustra à perfeição como o Brasil está longe de se tornar de fato o que Lula e parte do PT acham que o país já é. As dezenas de reformas institucionais empacadas ficaram em segundo plano por causa da recuperação da economia. Sumiu da agenda do governo a urgência para melhorar a Previdência e o sistema tributário.

Aí vem o paradoxo. Lula é o presidente mais forte politicamente desde o fim da ditadura militar. Sua aprovação pessoal, na redondeza dos 80%, tem chance real de romper novos recordes em 2010. O filme sobre sua vida ajudará.

Rivaliza com o marketing antecipado de grandes produções de Hollywood. A economia, tudo indica, crescerá na casa dos 4% anuais ou mais no ano que vem.

Apesar de todo esse poder, Lula não se arrisca. É quase certo que seu sucessor terá menos força política, seja Dilma (PT), Serra (PSDB) ou Ciro (PSB). Em resumo, se o lulismo e seu ícone não tiveram coragem de implantar determinadas reformas, por que o próximo presidente teria? Não terá. Algum dia, o encanto se quebra. O Brasil perceberá quais são seus bolsões de atraso, embora pareça ser nula agora a disposição dos eleitores para ver a realidade. É mais cômodo acreditar no "Brasil Grande" da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016.

Bate-boca com fatos não leva a nada

Marco Antonio Rocha
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

É normal que políticos no auge de campanhas eleitorais, de cima de palanques ou arengando às massas, ajam como brucutus contra adversários, como cruzados de lança em punho contra os infiéis. Autoridades do governo, mesmo as que militam em partidos, o que precisam é convencer, e não derrotar.

Mas diversos petistas no governo Lula nunca depõem armas, militam a vida toda, em tempo integral.

No ano que vem o PT completa 30 anos. Qualquer jornalista não petista que esteja na profissão um pouco mais do que isso há de lembrar do espírito aguerrido do PT "de combate" nas redações. Era inimigo de morte quem não fosse petista de carteirinha, não cantasse loas a Lula, lançasse a menor dúvida sobre os elevados e puros propósitos do PT e dos líderes do partido ou sobre a capacidade técnica de petistas que exerciam cargos públicos. Pior, era inimigo do povo e lacaio do capitalismo. Era quase impossível, a quem divergisse do PT, argumentar em termos civilizados com o "bom petista".

Essa espécie de vírus xiita ainda não abandonou as veias de muitos petistas que estão em altas funções republicanas, são funcionários de Estado, e não mais militantes de comitês de agit-prop.

Marta Suplicy, depois de trombar com uma administração municipal destruidora de egos e de ser humilhada por uma derrota eleitoral que não esperava, percebeu que não era, afinal, a rainha da cocada preta e que o povo não a comprava pelo preço que ela pensava que valia. Melhorou, mas não se curou de todo da doença infantil do petismo. Ainda reage mal às contrariedades.

Um outro, esse um caso difícil porque junta "petistite" encruada com valentia gaúcha, é o ministro Tarso Genro. Dá a impressão de que todas as manhãs, na frente do espelho, enquanto faz a barba, só pensa nos dragões de tocaia lá fora para comê-lo e que vai ter de abater. Veste o paletó como couraça, pega o guarda-chuva como uma Excalibur e dispara por Brasília como se estivesse em Camelot. Está quase todos os dias nos jornais, "respondendo" a alguém com dois quentes e um fervendo, como diziam nossos avós.

Um terceiro ferrabrás petista, Marco Aurélio Garcia, diplomata - imaginem ! -, vê o mundo povoado por americanos canalhas e seus lacaios. Seu guru não parece mais ser o presidente Lula, e sim o fundador do socialismo bolivariano, ou socialismo do século 21, ou que outro nome tenha a estripulia político-caribenha, cevada em petrodólares, que Chávez perpetra do alto do seu trono na Venezuela. Onde quer que esteja um crítico da política externa do governo Lula, ali estará para combatê-lo o cavaleiro templário Don Diego Garcia, com seu feroz e desarrumado semblante.

Ao que tudo indica, a ministra-candidata, Dilma Rousseff, junta às sezões de agressividade petista o temperamento de praticante de kicking-box, sem nem um pingo do senso de humor do seu líder. Caso o suceda, teremos, provavelmente, a presidente mais ranheta do planeta.

Se na arena política esse comportamento é tedioso e canhestro, no terreno da economia só causa perplexidade, sobre ser inútil. No entanto, há petistas "de combate" também aí.

Acompanhamos todos, no momento, um debate sobre os rumos da economia brasileira que não é apenas acadêmico nem neutro, pois os argumentos, do governo e de analistas não-governo, porém experientes e respeitados na economia, influem em decisões empresariais de investimentos e nos movimentos dos mercados, particularmente os de ações e de futuros. Esse debate já produziu um consenso relativamente amplo de que o governo Lula enfrentou com competência a crise financeira internacional e conseguiu evitar para o Brasil o pior dos mundos, embora nem todos os efeitos negativos.

Mas o governo se mantém na defensiva agressiva. É que a discussão, agora, diz respeito a como retomar o crescimento econômico com políticas que evitem, mais adiante, o recrudescimento da inflação que, em consequência, imporá uma nova rodada ortodoxa na administração da moeda e do crédito.

Ora, a muitos analistas está parecendo que o esforço de investimento que o governo faz, e anuncia, com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com os preparativos para a Copa do Mundo e para a Olimpíada, com projetos de infraestrutura importantes, como o trem-bala, com a exploração do petróleo do pré-sal, etc., é maior do que o "Brasil S.A." pode atender. Tudo isso, aliado a gastos inevitáveis com a campanha eleitoral do ano que vem, com o aumento dos gastos de custeio da máquina pública que já ocorre desde o início deste ano, com o aumento do déficit do INSS e de outros déficits governamentais, cria uma expectativa de descontrole gradual das contas fiscais, de maior inflação, de elevação dos juros, etc. Expectativa que inquieta o mercado, eleva os juros futuros e se manifestou até no Relatório de Inflação do Banco Central (BC). Contra sua tradição de não se meter onde não é chamado, o BC advertiu sobre o risco de pressões inflacionárias, alinhando-se com as preocupações de analistas privados.

Foi o que bastou para os templários, aninhados no Ministério da Fazenda, saírem a combater moinhos de vento. Argumentos? - "imbecis", disse Paulo Bernardo, do Planejamento; "terroristas", acusou Nelson Barbosa, da Fazenda; "bobagens", murmurou Mantega. Argumentos bons para gerar manchetes, mas inúteis para amainar ou contraditar as expectativas dos especialistas, de investidores e de empresários. Como inútil foi o presidente Lula proclamar que fez o maior ajuste fiscal da história do Brasil... em 2003 ! Palmas para ele, mas o diabo é o desajuste de agora.

Cabe às autoridades criar fatos que amainem as expectativas e inquietações desfavoráveis. E não ficar batendo boca com os analistas
*Marco Antonio Rocha é jornalista

Sem crise à vista

Luiz Carlos Bresser-Pereira
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A economia voltará a crescer, mas não se imagine que estaremos voltando ao desenvolvimento sustentado

QUANDO, EM outubro de 2008, explodiu a crise financeira global, previ que seus reflexos na economia real seriam menores do que os do crash de 1929 porque a reação monetária e fiscal dos governos seria muito mais forte e decidida do que fora 80 anos antes.

De fato, isso ocorreu, o desemprego aumentou muito menos do que nos anos 1930, e, agora, os países de renda média como a China e o Brasil já saíram da crise, enquanto os países ricos começam a sair. Ninguém, entretanto, está muito seguro do que acontecerá com a retomada. Nada indica que seja forte e firme; tanto poderá ser lenta e hesitante como poderá ser seguida de nova crise.

Aposto na primeira alternativa. Como os países ricos foram aqueles cujas empresas e famílias mais se endividaram, será necessário um tempo relativamente grande para que elas consigam se desalavancar. Enquanto for esse o quadro, o investimento e o consumo privado permanecerão deprimidos. O grande esforço fiscal realizado pelos países teve o efeito esperado de minorar a insuficiência de demanda agregada, mas não teve o condão de relançar o gasto privado, de forma que a recuperação deverá ler lenta, na forma de um "U" com ampla base.

Nos países ricos, portanto, a probabilidade de que nova crise se desencadeie é pequena. Os mercados de commodities e de ações estão se reaquecendo em consequência do grande aumento da liquidez internacional, mas esse aumento de preços dos ativos não é suficiente para criar uma nova bolha: nos Estados Unidos, o mercado acionário está apenas 15% acima do valor de setembro de 2008.

Já nos países de renda média, a retomada é mais forte. No Brasil, a ação do Ministério da Fazenda e dos bancos públicos foi bem-sucedida, a confiança foi retomada, e os investidores em ações já recuperaram boa parte de suas perdas. Não haveria, entretanto, espaço para nova crise financeira? No curto prazo, não creio. Bolhas especulativas são raras nos países de renda média e não chegam a ser suficientemente fortes para dar origem a crises bancárias, entre outras razões porque os bancos locais não se mostram dispostos a financiar a especulação necessária para que uma bolha de ativos resulte em crise desses mesmos bancos.

No Brasil, o que há a temer são as crises cambiais ou de balanço de pagamentos que decorrem de tentar crescer com poupança externa: foi assim em 1982 e em 1998. Como o financiamento dos deficit em conta corrente é feito em moeda estrangeira, o país fica sempre sujeito à perda da confiança dos credores externos e a uma "parada súbita" seguida de violenta depreciação da moeda local. Estamos caminhando nessa direção, já que a tendência à sobrevalorização da taxa de câmbio voltou a se manifestar e o país já voltou à situação de deficit em conta corrente, mas não há por que temer uma crise nos próximos dois anos porque as reservas brasileiras continuam muito elevadas. Pelo contrário, o que devemos esperar é que a economia brasileira volte a se aquecer e que, em 2010, tenhamos uma taxa de crescimento relativamente elevada, compensando a baixa expansão de 2009.

Não se imagine, porém, que estaremos voltando ao desenvolvimento sustentado. Nossas taxas médias de crescimento continuarão modestas -aproximadamente a metade do que poderiam ser se decidíssemos seguir o exemplo dos países asiáticos e combinássemos responsabilidade fiscal com uma política cambial que garantisse uma taxa de câmbio competitiva.

Luiz Carlos Bresser-Pereira , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

Com maior apoio político, neofascistas ganham espaço na Itália

DEU EM O GLOBO ONLINE

RIO - No país que inventou o fascismo e que sempre manteve - apesar da derrota na Segunda Guerra Mundial - um consistente núcleo saudosista e colecionador de brindes de Benito Mussolini, a volta dos seguidores do "Duce" assusta tanto quanto o retorno dos nazistas na Alemanha. Reportagem de Vera Gonçalves de Araújo, publicada na edição de domingo do GLOBO, mostra que o cenário é ainda mais complicado, já que alguns dos líderes da extrema-direita conquistaram cadeiras no Parlamento. E com o avanço político, mais doses de violência contra imigrantes, ciganos e homossexuais.

Alessandra Mussolini, neta do ex-ditador e sobrinha de Sophia Loren, foi eleita eurodeputada. A política, que subiu no palanque de Silvio Berlusconi no ano passado, é considerada um dos trunfos da coalizão Casa das Liberdades.

Um dos grandes motivos de preocupação está nas arquibancadas de estádios de futebol. Com a exceção da torcida do Livorno, tradicionalmente de esquerda, todas as outras torcidas organizadas têm em comum os símbolos, os gestos, os slogans fascistas.

Os neofascistas também são cada vez mais visíveis nas patrulhas metropolitanas, milícias legalizadas na semana passada pelo governo Berlusconi.

Oposição quer mudar ''lei da mídia'' de Cristina

Ariel Palácios
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Maioria opositora que assume o Congresso em dezembro promete revisar texto original

Líderes da oposição argentina anunciaram neste fim de semana que pretendem mudar a lei de radiodifusão aprovada pelos aliados do governo da presidente Cristina Kirchner na madrugada de sábado no Senado. O plano é alterar vários pontos polêmicos do pacote conhecido como "lei da mídia", a partir do dia 10 de dezembro, quando novos senadores e deputados assumem seus cargos, revertendo a maioria que o governo detém atualmente na Câmara e no Senado.

"Toda a lei estará sujeita a revisões e ao voto da maioria, que assumirá em dezembro", disse o senador Eduardo Sanz, chefe do bloco da União Cívica Radical (UCR). Os representantes do Partido Socialista, que votaram a favor da lei do governo de forma geral, também consideram que as normas precisam de várias modificações.

No entanto, representantes do governo afirmaram que pretendem resistir a eventuais mudanças. Para isso, Cristina poderia recorrer ao uso intensivo de vetos presidenciais.

A lei é vista como um golpe direto no principal conglomerado de comunicações da Argentina, o Grupo Clarín, com o qual a presidente Cristina e seu marido e ex-presidente, Néstor Kirchner, estão em pé de guerra desde o ano passado. O jornal Clarín tornou-se um dos principais denunciantes de casos de corrupção do governo.

A lei impede que um grupo de mídia possa ter ao mesmo tempo um canal de TV aberta e um canal de TV a cabo. Além disso, restringe a atuação de um canal de TV a apenas 35% da população do país.

Além dos novos deputados e senadores, os empresários da comunicação também prometem impedir a aplicação da lei, que obrigará, no prazo máximo de um ano, que cada grupo de mídia que possua um canal de TV aberta e um de TV a cabo de forma simultânea venda um dos dois canais.

O Grupo Clarín, por intermédio de seu diretor de Relações Externas, Jorge Rendo, anunciou que "recorrerá à Justiça para fazer valer seus direitos". Segundo Rendo, "existem artigos que são inconstitucionais". Ele também diz que a lei de mídia dos Kirchners possui pontos "insólitos" que "não existem em nenhum lugar do mundo".

O Grupo Uno também expressou sua intenção de ir aos tribunais para tentar impedir a aplicação da lei, que prejudicará a empresa. Segundo seu presidente, Daniel Vila, a lei, "além de estar mal redigida, fere a Constituição em vários artigos".

"O que poderia acontecer se daqui a um ano não vendo minha empresa?", perguntou. Segundo ele, será necessário "fechar as portas, pagar as indenizações e despedir" seus 16 mil empregados diretos.

''Estou numa prisão'', diz mulher de Zelaya

Lourival Sant'Anna
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Primeira-dama deixa para trás vida confortável, adota causa do marido e vira exemplo de luta na embaixada

A vida de Xiomara Castro de Zelaya tem sido uma montanha-russa desde que seu marido foi derrubado, na madrugada de 28 de junho. A primeira-dama, que coordenava os programas sociais do governo, assumiu a dianteira da "resistência", encabeçando as marchas que foram ao encontro de Manuel Zelaya nas duas tentativas frustradas de voltar ao país e na ocupação da embaixada brasileira. Há três semanas, Xiomara trocou o conforto da casa alugada no Valle de los Ángeles - ela não quis mais morar na sua casa, depois que o Exército a invadiu - pelo confinamento na missão brasileira em Tegucigalpa.

Xiomara é uma das pessoas mais bem-humoradas no sobrado, mesmo depois de uma semana de fracasso das negociações para a restituição do presidente deposto. "Por que estão desanimados?", perguntou aos jornalistas na manhã de sexta-feira. "Animem-se!" Xiomara diz que ela e o marido só souberam "por terceiros" do pleito do Brasil e da Organização dos Estados Americanos (OEA) para a remoção do casal da embaixada. Ela festejou os 49 anos no local e ainda não conheceu o neto Juan Manuel, que nasceu no dia 30.

"Desejávamos tanto o retorno de Mel", disse ela, usando o apelido pelo qual o presidente é conhecido. "Agora queremos que a família se junte de novo. Queremos voltar para casa, ter uma vida normal para nós e para o povo e queremos também que os criminosos tenham seu castigo. Aqui nos sentimos numa prisão."

Mas Xiomara não se queixa. Ela disse que a morte do jovem Isis Obed Murillo Mencía, de 19 anos, com um tiro de fuzil, durante manifestação contra o golpe em 5 de julho, e a reação de sua mãe, mudaram sua visão das coisas. "Fui visitar a mãe dele, e foi ela que me consolou", conta. "Ela me disse: "Tenho orgulho porque meu filho morreu para defender seus ideais. Vou voltar com meus outros filhos para apoiar a resistência"."

Segundo Xiomara, foi "a maior lição" de sua vida. "A partir desse dia, comprometi-me com a resistência. Meus filhos, minha mãe, a mãe de Mel e eu percorremos todo o país."

GUINADA

A primeira-dama, que conheceu Zelaya com 12 anos, começou a namorar com 15 e casou-se com 16, garante que seu marido, de 56 anos, nunca foi de esquerda. Seus críticos o acusam de ter abandonado os ideais de seu Partido Liberal e se convertido ao socialismo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, depois de ter chegado à presidência de Honduras.

"O presidente sempre se preocupou com os mais pobres", disse. "Nesses três anos e meio, ele reduziu a pobreza, impulsionou o crescimento econômico e desenvolveu a infraestrutura." Ao mesmo tempo, garante ela, "nunca os empresários tiveram tantos lucros".

Berço do PT em pé de guerra

Tiago Pariz
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


Lideranças que dominavam o comando do partido em São Paulo perdem terreno depois de escândalos e têm de disputar espaço com companheiros menos cotados

Em seu berço de nascimento, o PT está em processo de renovação e em briga deflagrada sobre quem é o nome mais importante do partido. Em São Paulo, lideranças que antes determinavam o rumo do partido estão em declínio e, nesse vácuo, emergem figuras capazes de questionar até interesses do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa deterioração dos proeminentes foi precipitada pelos recentes escândalos que chacoalharam o partido, como os episódios do mensalão, dos aloprados e do caseiro.

O PT tinha um grupo fechado de tomada de decisões inquestionável. Quando os ex-ministros José Dirceu, Luiz Gushiken, Antonio Palocci e o senador Aloizio Mercadante decidiam o rumo petista, a militância obedecia. Apesar de ter poder acumulado, esse grupo está enfraquecido e sofre para fazer valer sua palavra. Dirceu e Gushiken foram envolvidos no mensalão, e Palocci saiu do governo acusado de quebrar o sigilo funcional do caseiro Francenildo Santos Costa. Já Mercadante foi alvejado depois que seus principais assessores na campanha pelo governo paulista em 2006 foram envolvidos na compra de um suposto dossiê com informações sobre uma pretensa relação do atual governador José Serra com a máfia das ambulâncias. O grupo ficou conhecido como “os aloprados”.

“Antes o que eles falavam era lei. Hoje não é bem assim. Há um novo grupo mais disseminado de deputados que diluiu o poder”, afirmou uma liderança paulista. Ao custo dessa derrocada, surgiram novos nomes com potencial de ocupar esse vácuo. O prefeito de Osasco, Emídio de Souza, o líder da bancada na Câmara, Cândido Vaccarezza, o ministro da Educação, Fernando Haddad, e o deputado José Eduardo Cardozo. “Está havendo um processo de transição de liderança para pessoas que têm destaques em suas áreas, mas ainda não têm o mesmo peso na máquina que o antigo grupo tinha”, explicou outro nome do PT de São Paulo.

Emídio de Souza reconhece que os recentes tumultos dentro do partido ajudaram a acelerar a renovação. “(O surgimento de novos nomes) tem a ver com os escândalos, mas mesmo que não tivesse acontecido, teriam surgido novas lideranças”, disse o prefeito de Osasco, que disputa a possibilidade de concorrer ao governo.

Apoio a Ciro

Essa briga em torno da escolha do melhor caminho na eleição para o governo paulista no ano que vem é o exemplo mais claro dessa condensação de lideranças e briga por espaço. Hoje existem duas correntes de sobrevivência: uma que acha que, por falta de nomes, o melhor é apoiar o deputado pelo Ceará Ciro Gomes (PSB), e a outra, que defende que, mesmo com um concorrente pouco competitivo, é importante ser cabeça de chapa. A segunda ala é encabeçada pela ex-ministra Marta Suplicy, que depois de duas derrotas para o PSDB paulista (uma para o governo e outra na reeleição para a prefeitura) também está em declínio.

José Dirceu defende o acerto com Ciro Gomes. Mas, diferentemente de outros tempos, a tese de Dirceu encontra dificuldades. Marta bate na tecla de que é preciso candidato próprio para tentar se impor em cima de seus correligionários, mas ela depende de um apoio que o presidente Lula não está disposto a dar. Por isso, num processo de sobrevivência política depois de ser cassado, Dirceu estimula essa briga e está do lado dos deputados. E depois de muita briga e turras internas o presidente da legenda, deputado Ricardo Berzoini, também passou a jogar o jogo da nova turma em ascensão. Mercadante, antes de ser alvejado, buscou ocupar um espaço deixado pelo deputado João Paulo Cunha, também envolvido no mensalão, em Osasco. Não conseguiu e deixou a porta aberta para Emídio.

Lula gostaria que o PT apoiasse Ciro e desistisse de concorrer ao governo para que a ministra Dilma Rousseff tivesse um único palanque forte em São Paulo. Lula tem o apoio de parte do novo grupo petista e do ex-ministro José Dirceu. Hoje, se o PSB não concordar com a possibilidade e lançar o deputado cearense à Presidência da República, as novas lideranças estão fechadas com Emídio de Souza. Além de ser o nome de parte dos deputados federais paulistas, ele conta com o apoio de 14 dos 20 deputados estaduais. Essa conta é apresentada por deputados estaduais para tentar rejeitar a tese de que o nome de Palocci é o mais forte no estado. “Quem iria imaginar que um prefeito de Osasco poderia pleitear ser governador de São Paulo num partido que tem Marta Suplicy, Aloizio Mercadante e tantos outros?”, indaga outro petista.

Para não ficar na defensiva, parte do PT já tem antecipado conversas com potenciais aliados. Estão na mira PDT, PCdoB, PR e prefeitos do PMDB descontentes com o alinhamento do presidente regional da legenda, Orestes Quércia, com o governador José Serra (PSDB).

Novidade

Pré-candidato ao governo de São Paulo, o prefeito de Osasco, Emídio de Souza, disse que o PT vai montar um palanque forte para a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ele afirmou que a manutenção dos candidatos petistas deve-se ao movimento dos outros partidos, sobretudo o PSB, que flerta com a possibilidade de Ciro Gomes ou Paulo Skaf como concorrentes. Souza ressaltou, no entanto, que a legenda não está fechada para composições e alianças. --> --> --> --

Rede de intrigas

Marta Suplicy

Tem o maior percentual de potenciais eleitores nas pesquisas de intenção de voto, mas teve seu poder enfraquecido no PT depois de duas derrotas seguidas para o PSDB. Decidiu apoiar a candidatura de Antonio Palocci ao governo estadual para tentar fortalecer seus militantes.

José Dirceu

Depois de ser cassado por envolvimento no mensalão, o ex-deputado passou a atuar nos bastidores em favor da candidatura da ministra Dilma Rousseff. É um dos defensores da tese de que é preciso abdicar do nome próprio e apoiar Ciro Gomes.

Aloizio Mercadante

Líder do PT no Senado, foi desautorizado publicamente pelo governo por não apoiar o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Perdeu uma eleição para o governo de São Paulo depois de seus assessores se envolverem no escândalo dos aloprados. Sua reeleição ao Senado não é tida como confortável.

Cândido Vaccarezza

Foi eleito líder do partido sem apoio de Ricardo Berzoini, do líder do governo Henrique Fontana (PT-RS) e do ex-líder Maurício Rands (PE). Ganhou espaço ao se aproximar de Dilma e de Lula, além de passar a negociar diretamente pelo governo na Câmara. É defensor da tese de subjugar o palanque estadual em favor da ministra da Casa Civil.

Antonio Palocci

Ex-ministro da Fazenda, saiu do governo pela porta dos fundos, mas ganhou fôlego político depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) o inocentou de qualquer envolvimento na quebra do sigilo funcional do caseiro Francenildo Santos Costa. Hoje é um dos nomes lembrados para disputar o governo paulista.

Emídio de Souza

Prefeito da quinta maior cidade de São Paulo, surgiu como concorrente ao governo estadual com a falta de opção entre os antigos medalhões petistas. Tem apoio da maioria dos deputados estaduais para sua empreitada.

Filho de Sarney interfere em agenda de Lobão

DEU EM O GLOBO

Gravação mostra que ele marca encontros e instrui ministro

BRASÍLIA e BELÉM. Diálogos gravados pela Polícia Federal (PF) revelam que o empresário Fernando Sarney, filho mais velho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem livre trânsito no gabinete do ministro de Minas e Energia, o aliado peemedebista Edison Lobão. Fernando interfere na agenda do ministro e até determina com quem Lobão deve se reunir. Silas Rondeau, que ocupou o mesmo cargo, também atua no ministério e marca audiências de empresários com o ministro. A ação dos dois foi noticiada ontem pela "Folha de S.Paulo".

Em algumas conversas, Fernando fala com Lobão sobre reuniões que ocorreriam no ministério e dá instruções ao ministro. Numa delas, em setembro de 2008, Fernando avisa a Lobão que agendou um encontro dele, ministro, com um grupo ligado à Associação Brasileira de Energia Eólica. Os empresários apresentariam projetos do setor.

Lobão disse que Fernando solicitava audiências, mas confirmou que recebeu empresários atendendo a um pedido de Rondeau. Fernando Sarney não se pronunciou. Rondeau negou interferência na agenda de Lobão. Para a PF, o conteúdo dos diálogos configura o crime de tráfico de influência.

Serra critica governo por falta de investimento

DEU EM O GLOBO

SÃO PAULO. Às vésperas da viagem do presidente Lula e da ministra Dilma Rousseff à região do Vale do Rio São Francisco, o governador José Serra (PSDB) visitou a região neste final de semana e criticou a falta de investimentos do governo em projetos de irrigação, o que, segundo ele, tem inviabilizado assentamentos do Incra na região do semi-árido brasileiro. O governador questionou a eficácia da reforma agrária.

Em mensagens postadas no Twitter, Serra explicou ontem que visitou um assentamento do Incra em Petrolina no sábado e constatou que as 600 famílias lá assentadas não tinham água para beber nem para plantar suas lavouras de subsistência.

- (As famílias) Têm de trabalhar fora ou se conformar com o Bolsa Família - disse Serra no Twitter, onde tem 112 mil seguidores. - Infelizmente, há anos não se investe mais em irrigação no semiárido. Grandes obras pararam. Pena. Cada hectare irrigado gera três empregos - disse o governador tucano, pré-candidato do PSDB à Presidência da República.

Serra visita assentamento no Sertão

Jorge Cavalcanti
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

A quarta visita deste ano do presidenciável do PSDB a Pernambuco foi a mais política de todas. Teve encontro com aliados, corpo-a-corpo na Festa da Uva e do Vinho e até discurso para os sem-terra

PETROLINA – A quarta visita deste ano do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), a Pernambuco – que aconteceu no sábado passado, no Sertão, foi a mais política de todas. Com uma agenda extensa e eclética, o presidenciável tucano fez de quase tudo. Inclusive visitas a obras do governo federal que se arrastam há anos. Primeiro, esteve no projeto Pontal, de irrigação. Depois, no assentamento Catalunha, do Incra, o maior do Nordeste, no município de Santa Maria da Boa Vista. E foi ali que ele discursou como candidato para cerca de 500 trabalhadores sem-terra.

Diante da penúria do local, Serra se disse preocupado com a falta de água para as cerca de 600 famílias. “Sou governador de São Paulo. Não posso fazer nada por vocês”, esquivou-se ele. O assentamento fica a oito quilômetros do Rio São Francisco e a dois quilômetros da área irrigada. Inicialmente, Serra não queria discursar. Mas os agricultores insistiram e ele cedeu. Subiu em um degrau e falou aos acampados.

Apesar do estilo sisudo, o presidenciável até que se mostrou simpático – dentro do possível permitido pelo seu perfil. Sorriu, posou para fotografias e até contou piada sobre futebol para os senadores Marco Maciel (DEM) e Sérgio Guerra (PSDB), no Bodódromo, local em Petrolina que reúne restaurantes especializados em carne de bode.

Na noite do sábado, a Festa da Uva e do Vinho, em Lagoa Grande, fechou a programação do tucano em Pernambuco. O evento seria a última oportunidade de Serra testar o corpo-a-corpo com os potenciais eleitores. Mas, no segundo dia de feira, o público ficou abaixo do esperado. Mesmo assim, Serra visitou os estandes pacientemente e posou para mais fotos. Dessa vez, ao lado da rainha e da princesa da festa.

Na penúltima vez que esteve em Pernambuco, Serra visitou o Parque Aza Branca, em Exu, dedicado à memória de Luiz Gonzaga. Na ocasião, o tucano evitou o clima de campanha e a companhia de aliados, diferentemente da visita a Petrolina. Em junho, o governador esteve no arraial promovido por Sérgio Guerra na sua fazenda em Limoeiro, na Zona da Mata. A primeira visita do ano foi em março, para o lançamento do livro Daquilo que eu sei – Tancredo e a transição democrática, do ex-ministro da Justiça Fernando Lyra, no Paço Alfândega (Recife).

No Pará, Dilma defende PMDB e elogia Jader

Chico de Gois * e Gerson Camarotti
DEU EM O GLOBO


Em jantar com aliados de 9 partidos para costurar aliança, ministra diz que legenda é estigmatizada por querer cargos

BELÉM e BRASÍLIA. Mergulhada de cabeça na costura do apoio à sua candidatura à Presidência da República, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, saiu de jantar na noite de sábado no Pará com o deputado federal peemedebista Jader Barbalho e outros 24 aliados defendendo o PMDB. Para Dilma, o partido - principal parceiro da campanha de 2010, ocupando provavelmente o posto de vice na chapa - é estigmatizado em relação ao apetite por cargos. No encontro, do qual participaram ao todo nove legendas, Dilma citou o PMDB como o principal parceiro do governo, solidário com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A ministra lembrou ainda que o Palácio do Planalto tem retribuído esta solidariedade, em episódios como a defesa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), nos recentes escândalos familiares e da própria Casa.

- Foi um sinal de reciprocidade, entrosamento e solidariedade do governo com o PMDB - enfatizou Dilma, segundo participantes do jantar, em referência ao partido, com o qual o PT vem se desentendendo no Pará.

Guerra entre PT e PMDB no estado preocupa Planalto

Ontem, antes de acompanhar o Círio de Nazaré, ela rebateu críticas sobre o fisiologismo que ditaria as alianças do PMDB:

- Podia fazer um comentário? Sabe o que acontece? Uma coligação tem de ter tempo de amadurecer. E às vezes você tem idas e vindas. Qualquer relação entre pessoas é assim. Acho que estigmatizam muito o PMDB porque o PMDB quer isso, quer aquilo, quer aquilo outro. Acho que ou a gente governa em conjunto ou a gente não governa.

Estiveram no jantar, no Centro de Convenções Hangar, representantes de nove partidos da base aliada: PT, PMDB, PRB, PR, PTB, PDT, PSB, PCdoB, PP e PSC. Muito simpática com todos, a ministra fez questão de fazer referências pessoais aos principais líderes e foi especialmente atenciosa com Jader Barbalho.

- Você não sabe como o conheci. Foi ouvindo você. Foi em 2005, no auge de mensalão, no Palácio da Alvorada. Estava numa sala ao lado e fiquei impressionada com o pragmatismo político e seu conhecimento para enfrentar aquele momento - elogiou Dilma, de acordo com os presentes.

Há forte preocupação no Palácio do Planalto com o clima de guerra entre aliados no plano nacional. Por isso, depois da passagem pela Bahia, onde tentou aproximar os grupos do governador Jaques Wagner (PT) e do ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), Dilma aproveitou os festejos do Círio de Nazaré para tentar pacificar a disputa entre petistas e peemedebistas no Pará.

O grupo político de Jader ameaça fechar aliança no Pará com o PSDB, desembarcando da candidatura à reeleição da governadora Ana Júlia Carepa (PT). A ministra apelou a todos os partidos pela unidade em torno do projeto de 2010 no Pará:

- Quem está sentado nesta mesa decidirá a eleição do próximo ano. Se todo mundo estiver junto, já podemos saber qual será o resultado de 2010 - afirmou a ministra, que comeu pato no tucupi.

* Enviado especial

'Ela está muito simpática', retribui Jader

DEU EM O GLOBO

No discurso que fez aos presentes, ela lembrou que a eleição de 2010 é uma disputa entre dois projetos: o do governo Lula contra a gestão tucana do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Segundo os presentes, a participação direta de Dilma nas articulações está cada vez mais cristalizada na estratégia da campanha petista.

- Ela está muito simpática. Isso permitiu criar um ambiente de absoluta confraternização política. Ela foi cheia de gentilezas com o PMDB - comentou Jader Barbalho.

No Pará, embora o PMDB de Jader Barbalho participe do governo de Ana Júlia, com o controle de dois terços das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no estado, como disse a própria governadora, há dificuldades para que o partido apoie a petista na reeleição. O PMDB chegou a propor que o filho de Jader, o prefeito de Ananindeua, Helder Barbalho, seja vice na chapa de Ana Júlia. Mas ela resiste e, por isso, a aliança está difícil.

Dilma disse que vê sinais positivos para que a aliança se concretize no Pará e também em nível nacional. Ela fez a ressalva de que não gostaria de "meter a colher de pau" em assuntos locais, porque não conhece a realidade do estado.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que acompanhou Dilma, disse que o jantar serviu para solidificar o apoio do PMDB paraense à candidatura petista.

Stedile chama Lula de "mal informado"

Eduardo Scolese
Da Sucursal de Brasília
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Líder sem-terra discorda de presidente, que considerou "vandalismo" a ação do movimento que destruiu laranjal em Iaras (SP)

Economista e líder sem-terra afirma que pedido de abertura de CPI por parte de congressistas da oposição tem motivação eleitoral


João Pedro Stedile, 55, da direção nacional do MST, afirma que o movimento não perdeu o foco, que condena todo o tipo de "vandalismo" e que o presidente Lula está "mal informado", numa referência à declaração do petista na qual chamou exatamente de "vandalismo" a ação do movimento numa área de plantação de laranja no interior de São Paulo. Em entrevista à Folha Stedile minimiza a derrubada dos pés de laranja na área da Cutrale, pois, segundo ele, a produção seria destinada à exportação, e não para a mesa dos brasileiros.

FOLHA - Independentemente da situação da propriedade [o Incra diz que está ocupada de forma irregular, o que é negado pela empresa], a ação chama a atenção pela destruição deliberada de alimentos. Foi um erro destruir aqueles pés de laranja?

JOÃO PEDRO STEDILE - O fato de a área ser grilada, confirmado pelo Incra, não é algo secundário. Esse é o fato. Um dos princípios que o MST respeita é a autonomia das famílias de nossa base. A distância, a população pode achar que derrubar pés de laranja foi uma atitude desnecessária. A direita, por meio do serviço de inteligência da PM, soube utilizar [as imagens] contra a reforma agrária, se articulando com emissoras de TV para usá-las insistentemente. Nunca essas emissoras denunciaram a grilagem nem a superexploração que a Cutrale impõe aos agricultores.

FOLHA - Ao destruir alimentos, o MST não teme perder o apoio das camadas mais pobres da população, como das 12 milhões de famílias que dependem do Bolsa Família para comprar sua própria comida?

STEDILE - Cerca de 98% da produção de suco no pais é exportada. Esse suco não vai para a mesa dos pobres, com ou sem Bolsa Família. Já o nosso modelo para a agricultura brasileira quer assegurar produção de alimentos, a geração de emprego e renda no meio rural. Queremos produzir comida e, inclusive, suco de laranja para chegar à mesa de todo o povo brasileiro. Não para o mercado externo. Mesmo assim, a área de exploração da laranja [no país] diminuiu em 400 mil hectares nesses dez anos, pela exploração que a Cutrale impõe aos agricultores.

FOLHA - O presidente Lula chamou a ação de "vandalismo". O MST ainda o enxerga como aliado?

STEDILE - Nós também condenamos o vandalismo. Usar 713 milhões de litros de venenos agrícolas por ano, que degradam o meio ambiente, também é vandalismo. Nesse caso, o presidente está mal informado, pois as famílias acampadas nos disseram que não roubaram, não depredaram nada. Depois da saída deles e antes da entrada da imprensa, o ambiente foi preparado para produzir imagens de impacto. Propomos que uma comissão independente investigue a verdade.

FOLHA - É correto hoje dizer que a conjuntura nacional, principalmente de estabilidade econômica e de assistência oficial aos pobres do país, é desfavorável ao MST?

STEDILE - Os dados do censo [agropecuário] revelam que menos de 15 mil latifundiários são donos de mais de 98 milhões de hectares. A renda média dos assalariados do campo é menor que um salário mínimo. Diante disso, reafirmamos que é fundamental democratizar a propriedade da terra, como manda a Constituição, e mudar o modelo agrícola, para priorizar a produção de alimentos sadios para o mercado interno. Quem acha que a reforma agrária não é necessária está completamente alheio aos problemas e aos interesses do povo.

FOLHA - Essa conjuntura deixa o MST sem foco?

STEDILE - Ao contrário. Nunca foram tão necessárias essas mudanças. Bancos e empresas transnacionais controlam a agricultura. E, quando ocupamos uma terra para pressionar a aplicação da reforma agrária, enfrentamos todo esses interesses. O Brasil precisa de um projeto que combata as causas da desigualdade social e garanta o acesso a terra, educação, moradia e saúde a todos, e não apenas a uma minoria.

FOLHA - Algum nome para as eleições de 2010 anima o movimento?

STEDILE - O MST preserva sua autonomia. Nossos militantes participam das eleições como qualquer cidadão. Infelizmente, cada vez que chega o período eleitoral, a direita se assanha para enquadrar as candidaturas contra o MST e a reforma agrária. Esse pedido de CPI tem apenas motivação eleitoral. O [deputado Ronaldo] Caiado [líder do DEM na Câmara] confessou que o objetivo da CPI é provar que o governo repassa dinheiro para o MST fazer campanha para a Dilma [Rousseff], o que é ridículo.

Mulheres e minorias para trás

Gilberto Scofield Jr.
DEU EM O GLOBO

Brasil é um dos países com maior disparidade salarial da América Latina, diz BID

Afalta de projetos educacionais com foco em mulheres e minorias, especialmente entre os mais pobres, além da discriminação pura e simples, colocam o Brasil na incômoda posição de um dos mais desiguais da América Latina se levadas em consideração as defasagens salariais de gênero e entre brancos e outras raças/minorias, diz estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ao qual o GLOBO teve acesso com exclusividade e que será divulgado hoje.

No Brasil, as mulheres ganham, em média, 29,7% menos do que os homens, a maior diferença encontrada entre os 18 países avaliados pelo BID e quase o dobro da média da região (17,2%). A defasagem salarial por raça no Brasil é ainda maior, de 30%, e também a mais gritante entre as nações que estão no estudo do BID.

O relatório, intitulado "Novo século, velhas disparidades: diferenças salariais entre gêneros e etnias na América Latina", preparado pelos economistas Hugo Ñopo, Juan Pablo Atal e Natalia Winder, mostra que, na média da região, negros e indígenas ganham 28% a menos que os trabalhadores brancos, enquanto homens ganham 17,2% a mais que mulheres. Isso considerando grupos com a mesma idade e nível de instrução.

- A desigualdade salarial por gênero não chega a ser um problema grave em países desenvolvidos da Europa ou nos Estados Unidos, mas é uma realidade grave no Oriente Médio e, num segundo patamar, na América Latina, que é uma das regiões mais desiguais, do ponto de vista econômico, do mundo. O Brasil não tem tantas etnias diferentes como as 21 da Guatemala, mas, nem por isso, é menos desigual quando comparamos a remuneração de brancos com negros e descendentes de índios - comenta o economista Hugo Ñopo.

Diferença é maior no topo da pirâmide

O modelo de comparação salarial foi criado por Ñopo há sete anos, mas os dados dos 18 países latino-americanos envolvidos na pesquisa começaram a ser cruzados efetivamente há dois anos e tomaram como base, no Brasil, a Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (Pnad) e levantamentos semelhantes em outros países.

O relatório mostra que a defasagem salarial por gênero é alta, a despeito de as mulheres serem mais instruídas. As trabalhadoras têm, em média, 0,8 ano a mais de estudo do que os homens na América Latina, o que não impede que elas recebam bem menos mesmo em cargos semelhantes.

A defasagem salarial por gênero também é mais alta entre trabalhadores autônomos, em comparação com os que mantêm vínculos empregatícios formais nas empresas. A autonomia, dizem, é um ponto positivo e negativo neste caso. É bom porque dá flexibilidade para as mulheres dedicarem mais tempo aos filhos, mas, sem o apoio do parceiro, é também uma forma de afastá-las do mercado de trabalho, reduzindo sua renda.

No caso das etnias e raças, o BID incluiu no estudo apenas sete países onde havia informações étnicas disponíveis em suas pesquisas domiciliares: Brasil, Bolívia, Chile, Equador, Guatemala, Peru e Paraguai. Segundo as estatísticas, há entre 28 milhões e 34 milhões de indígenas na América Latina (cerca de 10% da população) e, em todos os países, este grupo representa a maior fatia entre os pobres e miseráveis, apesar de todos os avanços sociais dos últimos anos.

Porém, curiosamente, as maiores diferenças salariais estão nos extremos da distribuição de renda, ou seja, entre os maiores e menores salários. E entre os homens, os mais velhos e os moradores de áreas rurais. O Equador é o país com menor diferença salarial: apenas 4%.

De certo modo, o estudo do BID evidencia, dentro dos países latino-americanos, o mesmo padrão de uso de mão de obra de minorias de países desenvolvidos. Esses trabalhadores estão empregados em ocupações de baixos salários. O que os economistas chamam de "segregação ocupacional" permeia o mercado de trabalho latino-americano, onde as minorias estão em posições de chefia ou de empregadores, que recebem os maiores salários.

- No caso de raça e etnia, o diferencial é notadamente a educação. E o que se diz aqui é a qualidade da educação, porque a má qualidade educacional das minorias, uma fatia da população mais pobre, dá a negros e índios menos condições de competir no mercado de trabalho - explica Ñopo.

Na política, pouca presença das brasileiras

Vivian Oswald e Fabiana Ribeiro
DEU EM O GLOBO

Mulheres são só 9% dos parlamentares, pior representatividade da América Latina

BRASÍLIA e RIO. Não é só na renda que a desigualdade de gênero no Brasil salta aos olhos. A despeito das pré-candidaturas da ministra Dilma Rousseff (PT) e da senadora Marina Silva (PV) à presidência da República, por exemplo, o Brasil é o país em que as mulheres têm a menor representatividade no Congresso e na vida política da América Latina.

A constatação é do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), no seu último relatório sobre o desenvolvimento humano no mundo. O estudo mostrou que apenas 9% dos assentos da Câmara e do Senado são ocupados por parlamentares do sexo feminino.

O problema de gênero no país é um fato, segundo o economista sênior do organismo internacional, Flavio Comim. As brasileiras vivem mais e têm mais anos de estudos no país. Porém, elas ganham pouco mais de US$7 mil por ano, em média, segundo o estudo do Pnud. Já os homens têm rendimento médio de US$12 mil.

- Isso é um indicador revelador. A melhora do mercado de trabalho não é acompanhada pela vida política - disse Comim.

Entre os países latino-americanos, Cuba tem o maior número de parlamentares mulheres (43%), sendo seguido por Argentina (40%). No ranking mundial, a Suécia é o país com maior número de mulheres no Legislativo, com 47% dos assentos totais. A Finlândia, que tem uma mulher como presidente, Tarja Halonen, vem em seguida com 42%.

No Brasil, a participação das mulheres em cargos ministeriais também está entre os piores: 11%. O Chile, cuja presidência é ocupada por uma mulher, Michelle Bachelet, é o campeão neste quesito na América Latina, com 40%, sendo seguido de Trinidad e Tobago (36%).

IBGE: mulheres ganham menos em todos os tipos de ocupação

Novos cruzamentos da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), divulgada na última sexta-feira pelo IBGE, também confirmam, mais uma vez, a desigualdade existente entre homens e mulheres no mercado de trabalho. Apesar de a escolaridade feminina ser maior (em média 9,2 anos de estudo) do que a masculina (8,2), a presença do homem em cargos de chefia é bem maior do que a das mulheres. A proporção de mulheres dirigentes (4,4%), por exemplo, ainda é inferior à participação dos homens (5,9%) na mesma função.

- O preconceito é ainda uma realidade no mundo do trabalho. Sem falar que a mulher ainda carrega o peso dos cuidados com a família e, é claro, não abre mão disso - disse Hildete Pereira, professora da UFF, acrescentando que, a despeito de resistências, a mulher avança em setores masculinos, como o da construção civil.

Não há sequer uma posição da ocupação pesquisada pelo IBGE em que a mulher apareça com remuneração superior a do homem. Até na função de empregador, os ganhos são menores: o dos homens é R$3.161, já o das mulheres, R$2.497 - 22% a menos. Mesmo no conjunto de trabalhadores domésticos - atividade tipicamente feminina - o homem ganha mais. O rendimento médio das trabalhadoras domésticas sem carteira é R$298, enquanto a média dos homens é de R$404.

- Nunca foi tão atual a bandeira feminista de 1975 que dizia "trabalho igual, salário igual". Infelizmente, as mulheres ainda ganham menos do que o homem. E isso não é só aqui, ainda que seja uma comportamento forte por aqui. No mundo inteiro, as mulheres ocupam apenas 17% dos cargos de gerente - disse Hildete.