terça-feira, 13 de outubro de 2009

REFLEXÃO DO DIA

“A imprensa livre pode, naturalmente, ser boa ou má. Mas é certíssimo que, sem liberdade, só pode ser má.”
(Albert Camus)

Fonte: Resistencia, rebelião e morte.

No bambolê do PMDB

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Os aliados da candidatura Dilma Roussef já não têm com o que se preocupar: aquele problema da falta de jogo de cintura ao qual aludiu certa vez o PMDB oferecendo à ministra de presente um bambolê, está devidamente resolvido.

Maleabilidade é o que a ministra-chefe da Casa Civil mais exibe ultimamente. Reza em qualquer altar - seja católico, evangélico, do Senhor do Bonfim ou do Círio de Nazaré -, defende José Sarney com desenvoltura, elogia Jader Barbalho com veemência pedindo mais respeito no trato que se dá ao PMDB e, prova definitiva de que já dança ao ritmo da música exigida, aderiu ao princípio de que aos amigos do poder tudo é permitido.

"Acho que cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém", pontificou com originalidade a respeito das gravações da Polícia Federal, reproduzidas pela Folha de S. Paulo, mostrando como parentes e amigos do presidente do Senado, José Sarney, mandam e desmandam na agenda do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

"No Brasil", lecionou, "nós temos o hábito de pegar uma denúncia qualquer e sair condenando."

Inadmissível, não é verdade? "Pegar uma denúncia qualquer" que a Polícia Federal qualifica de tráfico de influência e ilustra em inquérito com as vozes do ex-ministro Silas Rondeau (afastado do cargo por suspeita de corrupção) e do empresário Fernando Sarney (há dois anos investigado pela PF) e "sair condenando" realmente é uma leviandade.

Ainda mais que o ministro em questão fornece uma justificativa bem consistente. Segundo ele, Rondeau e Sarney marcam reuniões e encontros diretamente com a secretária do gabinete do titular da pasta porque os três têm "uma relação de amizade".

E, com isso, evidentemente ninguém está em condições de condenar Edison Lobão por dar a liberdade aos amigos de "sugerir" audiências, visitas de empresários, temas a serem abordados, caminhos a serem adotados na administração da pasta de Minas e Energia.

Se são amigos, qual é o mal? Estranho é se fossem inimigos. Como se sabe, só os hipócritas, os fariseus, os falsos moralistas, os célebres udenistas invocam o respeito ao princípio da impessoalidade.

Os descolados, modernos, ativos, trabalham com outros conceitos. São regidos pela regra mor caciques redivivos, acostumados a usar o Estado como quem dispõe de um patrimônio privado. A essa concepção de administração pública parece ter aderido a ministra, outrora tida com rigorosa gestora.

Ante a explicitação do novo modelo é de se perguntar à ministra se, uma vez eleita, governará o Brasil conforme as convicções que lhe fizeram a fama de gerente com austeridade e competência, se o figurino atual visa apenas à criação de uma ilusão de ótica para não dispersar os aliados ou se, ganhando a Presidência da República, render-se-á à batida do samba e a manemolência do bambolê que lhe deu de presente o PMDB.

Em qualquer das hipóteses há um risco: de Dilma perder as características antigas, adquirir com as novas feições de caricatura e, com isso, agradar aos companheiros de aliança, mas desagradar profundamente ao cidadão de bem que anda farto de demagogia, leniência e dissolução ética.

Cilada

O termo chantagem seria muito forte. Até impróprio por enquanto. Mas digamos que entre os potenciais aliados do PT na eleição presidencial exista uma pressão para que o partido abra mão de suas conveniências político-eleitorais, sob pena de haver um êxodo na "base" com o pretexto de que os petistas são "egoístas".

Se Dilma subir nas pesquisas, tudo corre pacificamente. Se não subir, correm todos para outros caminhos dizendo que não tiveram outra escolha porque foi o PT que os rechaçou.

É uma sinuca: se não atender às exigências, o PT corre o risco de esvaziar o "entorno" de Dilma Rousseff. Se atender a todas elas, o perigo é esvaziar a si próprio nos Estados.

Exatamente como aconteceu com o partido no Rio de Janeiro, por causa da opção preferencial feita anos atrás pela direção nacional de ceder à política de alianças sem pensar na política do partido.

Ganhou eleições, brigou com todos os aliados durante o governo e transformou-se numa sublegenda das conveniências do eixo São Paulo-Palácio do Planalto.

"Déjà-vu"

Análise do cientista político italiano Luigi Bonanate, da Universidade de Turim, a respeito do sucesso do primeiro ministro Silvio Berlusconi, apesar de todos os pesares.

"Berlusconi conseguiu manter sua base de apoio intocável. Seu discurso é claro: ele joga parte da culpa nos comunistas, nos opositores, na mídia, imputando-lhes o rótulo de verdadeiro problema da sociedade italiana. Isso faz efeito, porque nenhum escândalo abala seu respaldo."

Para Bonanate, o "verdadeiro problema da Itália é a falta de oposição".

Brasil, uma contradição ambulante

José Pastore
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


A economia vai bem, mas as instituições vão mal. Temos democracia, é verdade. Esse é um marco institucional de grande valor. Não podemos perdê-la. Com ela vem a liberdade de ir e de vir e de tantas outras.

Deveríamos ter também liberdade de expressão. Na prática, a realidade é outra. Basta citar a censura imposta a este jornal, que já dura mais de dois meses.

Outra instituição sagrada em um regime democrático é a da propriedade privada. Pois bem. Sete mil laranjeiras carregadas foram derrubadas na semana passada por invasores que usaram o equipamento do dono da fazenda e, de gorjeta, destruíram as casas dos trabalhadores.

As autoridades se limitaram a praticar a surrada retórica, chamando-os de "vândalos", "irresponsáveis", "criminosos", ao mesmo tempo que tratavam de abafar a CPI do Movimento dos Sem-Terra (MST).

Os atos de desrespeito à propriedade privada são incontáveis. O MST já derrubou eucaliptos de uma fábrica de papel e celulose. Seus seguidores devastaram laboratórios, destruindo valiosas pesquisas agropecuárias de longa duração. E continuam assim. Invadem prédios públicos com a maior facilidade. Se não me falha a memória, já acamparam no Congresso Nacional!

Das autoridades de um regime genuinamente democrático esperava-se uma intervenção firme e definitiva. Pois, nada acontece. Ao contrário, a referida CPI quer apurar graves indícios de que o governo federal financia indiretamente esses grupos que ignoram a lei e o direito.

O problema da insegurança afeta seriamente os que precisam da propriedade para produzir, crescer, gerar empregos, impostos e bem-estar. Mas afeta também a maioria dos brasileiros que tem medo de sair às ruas e até ficar dentro de suas casas.

Por essas e outras é que se pode dizer, sem medo de errar, que a economia vai bem, mas as instituições vão mal. Na instituição do Poder Legislativo, tivemos recentemente o vexame dos atos secretos do Senado Federal. Também não foi o primeiro e, como nos casos anteriores, nada aconteceu. As comissões "não conseguiram ver" nenhuma prova de malversação de recursos. A nós, contribuintes e eleitores, restou assistir às malandragens pela televisão - sem poder de agir.

James Madison dizia que o primeiro estágio de uma democracia ocorre quando os governados passam a respeitar os governantes. O segundo, quando os governantes começam a respeitar os governados. O terceiro, quando os governados passam a controlar os governantes. Ah! Como estamos longe dessa democracia. Aos governados sobrou apenas a obrigatoriedade de respeitar quem não os respeita.

Como dizer, então, que nosso quadro institucional é sólido e amadurecido? Vejam a escola. A grande maioria dos professores tem medo de entrar na sala de aula. A violência tomou conta da maioria dos estabelecimentos. Alunos agridem os mestres com palavras e atos de profundo rancor e incontido ódio. Muitos dos pais seguem o mesmo script e investem contra os mestres que tentam corrigir seus filhos. Dá para construir uma sociedade respeitosa diante de tamanha falência institucional?

Se olharmos para o Poder Judiciário, os casos que vêm à tona são os mais deploráveis. Lembram-se do juiz que assaltou a casa onde trabalhava - o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo? Ele devolveu o dinheiro?

Estarrecidos ficamos sabendo que um magistrado condenado acaba de virar ministro do Supremo Tribunal Federal. O povo que tem, na média, apenas sete anos de escola - e má escola - não consegue entender que a sentença condenatória não transitou em julgado. Será que não haveria outro juiz capaz e em condições mais fáceis de serem compreendidas para ocupar tão alto posto?

Quando se olha para os partidos políticos - peças-chave da democracia - o desânimo nos domina. Eles são reconhecidos pelos próprios políticos como descarados balcões de negócios, com raríssimas exceções.

Partidos que capturam os nossos votos prometendo ética e honestidade são constantemente pilhados nas mais deslavadas falcatruas. Nada disso tem consequência. Já é lugar-comum dizer que o Brasil é o país da impunidade. Pergunto: impunidade casa com democracia?

Que tipo de instituições nós temos para apurar e punir? De fachada estão aí a polícia e a Justiça. Mas, de efetivo, elas só funcionam para os mais fracos, também com poucas exceções. As suspeitas de fraude e corrupção dos poderosos costumam ficar onde sempre ficaram - no limbo!

Ah! Como eu gostaria de ver este país com instituições fortes, atuantes e respeitáveis. Deus nos deu tantas coisas boas. É certo que entregaremos aos jovens uma nação com uma renda per capita mais alta. Um país que vai se transformar em grande exportador de petróleo. E que hospedará a Copa do Mundo e a Olimpíada. Mas, no campo das instituições, valores e ética de conduta, entregaremos o País que recebemos e piorado em vários aspectos.

Enquanto tais instituições não amadurecerem, continuaremos com uma democracia de segunda classe. Os valores básicos se deterioram a cada dia. Quem anda na linha passa por bobo ou desinformado.

Essa é a concepção que grassa em nossa juventude. Vejam estes dados: 30% dos brasileiros confessam que passaram em exames escolares com base na cola. Esses são os que confessam. E os outros? Vinte e sete por cento dizem que não devolvem o troco quando recebem a mais do que o devido. Esses são os que têm a coragem de dizer. E os outros?

O que mais dói é saber que os maiores contraventores nesses "pequenos delitos" são os mais estudados. Vejam o que a escola da violência está produzindo!

Paremos por aqui, reconhecendo que para chegar à verdadeira democracia teremos de enfrentar uma longa trajetória em que o fortalecimento das instituições é essencial.

Por tais motivos, quando vejo a distância que existe entre o sucesso da economia e a pobreza das instituições brasileiras, junto-me ao jurista Célio Borja quando diz: "O Brasil é uma contradição ambulante."

*José Pastore é professor de relações do trabalho da FEA-USP.

Lula entre dois atos

Fernando de Barros e Silva
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - "Não tem nenhum [outro] grande líder. No Brasil hoje -e esse é um dado triste para o Brasil-, a única figura de dimensão nacional sou eu". Quem fala é Lula. Está num jatinho que vai de Macapá a Belém, a cinco dias do segundo turno das eleições de 2002. A cena faz parte de "Entreatos", o documentário dos bastidores da campanha petista, dirigido por João Moreira Salles e lançado em 2004.

Se o diagnóstico já estava certo, hoje parece ainda mais verdadeiro. Até por isso, enquanto a biografia romanceada de Lula, by Barretão, não chega às telas, não perde tempo quem se dispuser a assistir ao filme em que o próprio candidato representa seu personagem.Hoje, o que mais chama a atenção em "Entreatos" é a capacidade que Lula teve de sobreviver a seus coadjuvantes. Praticamente todos encolheram ou foram banidos do poder.

O protagonismo do presidente, em contrapartida, só aumentou.

É curioso rever Mercadante, o maior papagaio de pirata, usando a câmera como um espelho, no qual contempla seu ego irrevogável. Ou lembrar de Zé Dirceu, para quem a câmera parece sempre uma intrusa, pondo em risco segredos & negócios de Estado. Deu no que deu.

Palocci, Gushiken, Duda Mendonça, Silvinho Pereira, Frei Betto, Ricardo Kotscho -todos os que aparecem ao redor de Lula de alguma forma fizeram água. Dilma, na época, não existia politicamente. E Delúbio, que existia até demais, não surge em cena, quem sabe por isso.

Fica claro em "Entreatos" que Lula já tinha perfeita noção de seu tamanho histórico. Mas também fica patente que ninguém ali sabia bem o que iria fazer no governo.

De certa forma, o enredo da comunhão nacional que vivemos hoje, cuja síntese apoteótica está na figura do próprio Lula (o filho do Brasil), é uma criação do ator eclético e camaleônico que ele soube ser.

Quanto de ficção e quanto de realidade? Fernando Meirelles disse há pouco que "Lula é o melhor ator, não sei se o melhor presidente". Na falta de um país, já temos um filme.

Balzac e o Nobel

Marcos Nobre
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


MUITO SE discutiu sobre se Obama merecia ou não o Prêmio Nobel da Paz.Acho que esse prêmio tem pouca coisa que ver com merecimento. É política mesmo. E são políticas as razões da premiação.

O momento é de transição. A liberalização econômica dos últimos 30 anos primeiro minou a base do antigo bloco soviético. A partir de 1989, juntou-se ao rótulo "globalização" para prolongar de maneira artificial a Guerra Fria em favor da supremacia dos EUA. Até o limite brutal do governo de George W. Bush e de uma crise econômica como há muito não se via.

Muita gente pensa a transição atual por analogia à transformação do início do século 20, quando a Inglaterra perdeu progressivamente o lugar de potência hegemônica em favor dos EUA. O enfraquecimento do dólar seria o indício mais claro de que um substituto já estaria à vista. Ou pelo menos seria indício de que os EUA deixariam sua posição de supremacia em favor de um novo multilateralismo. O problema é saber quem seria esse substituto (as bolsas de apostas dão a China como favorita). Ou quais seriam os países em condições de participar desse cartel multilateral do poder mundial.

Nesse ponto, talvez só mesmo Balzac possa ajudar. Lá da primeira metade do século 19 vem a digressão registrada em seu romance "A Falsa Amante": "Digamos de passagem que a Polônia poderia conquistar a Rússia pela influência de seus costumes em lugar de combatê-la pelas armas, imitando os chineses, que acabaram chinesizando os tártaros e que chinesizarão os ingleses, como se deve esperar".

Essas esperanças francesas de Balzac foram frustradas, e os ingleses acabaram vencendo os chineses pelas armas em 1842. A Inglaterra tornou-se a principal potência mundial da época. E o verbo "chinesizar" (ou "sinizar") é ocorrência raríssima. Ao contrário de "americanizar", como se sabe.

Balzac errou, mas estava certo. A vitória pelas armas é incontestável, mas a conquista pelos costumes é essencial a qualquer império. E isso distingue essencialmente a hegemonia dos EUA de qualquer outra. Para além da superioridade bélica, os EUA alcançaram uma hegemonia cultural e civilizatória sem precedentes. Sua pretensão é a de universalizar um "way of life". Não é por acaso que o inglês se tornou língua franca.

Não existe substituto à vista para essa hegemonia. Nem a economia mundial vai conseguir sair da crise sem que os EUA se recuperem. O Nobel para Obama é reconhecimento e reafirmação da supremacia dos EUA. Mas com o pedido de que, se possível, sejam mais delicados no trato.

A esquerda em busca de um eixo

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


No momento em que o PT volta a mostrar aversão a alianças com outros partidos, sua costela esquerda, o P-SOL, está adiantado na discussão das composições a ser feitas em 2010. Na prática, isso significa o apoio da sigla à candidatura verde da senadora Marina Silva a presidente da República e que a vereadora Heloisa Helena vai disputar o Senado.

Em sua curta existência, nascido do primeiro racha do PT no governo, no calor da discussão da reforma previdenciária, o P-SOL transformou-se numa das siglas mais fechadas na escala partidária. Na extrema-esquerda, ameaçava reproduzir o caciquismo dos partidos mais conservadores, com Heloisa Helena, sem dúvida, como manda-chuva do partido.

A importância da mudança da sigla está de imediato no impacto que a saída de HH do páreo sucessório provocará nas pesquisas. A simples entrada de Marina na disputa levou Ciro Gomes (PSB) a reafirmar sua candidatura e elevar o estresse entre o Palácio do Planalto e os pessebistas. Resta saber qual será a repercussão do apoio do P-SOL à ex-ministra do Meio Ambiente.

O deputado Chico Alencar (RJ) listou os motivos pelos quais o partido deve apoiar Marina. Argumenta que o P-SOL nasceu do repúdio ao "transformismo conservador do PT". Mas não conseguiu aglutinar a esquerda "e quebrar o grave quadro de desencanto com a política". O que ocorreu foi uma crescente "naturalização da corrupção".

Arrefeceram a indignação com o "mensalão" e outros "procedimentos espúrios", sem falar no questionamento ao "continuísmo da política econômica ortodoxa de ajuste fiscal e do superávit primário", combatidos hoje pelo P-SOL, como eram antes pelo PT.

O P-SOL se vê ignorado como oposição ao governo, condição atribuída aos "demo-tucanos". Pior, diz ele: "Em vários embates a pseudopolarização que agrada o sistema coloca o bloco PT/PMDB e caudatários (PTB, PP, PR...) no campo da "esquerda" , como nos debates do Pré-Sal".

"Lula, com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o "Minha Casa, Minha Vida", poderosas alavancas eleitorais, é o "avanço possível"; fora dele só há regresso ao privatismo máximo e ao Estado mínimo, reza o senso comum de amplas parcelas, até progressistas. Para elas, o que vem de Lula é sempre aceitável e justificável".

O papel e influência de Lula são vistos como "frutos de duas décadas de lutas, das quais foi o principal dirigente: ele mantém força, que é utilizada para evitar os enfrentamentos e passar sua política, elogiada por grandes empresários - "Lula salvou o capitalismo", como exaltou o ex-deputado Delfim Netto".

Beneficiadas com cargos e verbas - analisa o deputado -, centenas de direções sindicais, nas principais categorias, funcionam como correias oficialistas de transmissão. "A força do atual governo e sua capacidade de aglutinação social deve-se muito mais a políticas compensatórias e localizadas do que a mudanças estruturais. Falta um polo aglutinador, social e político, capaz de ocupar o espaço no debate do enfrentamento da crise a partir de uma perspectiva de esquerda".

O P-SOL, em sua autocrítica, reconhece que, se não conseguir articular condições políticas para garantir a candidatura HH, não será mais visto como portador de um projeto alternativo de país, acredita Chico Alencar.

"Em política, espaço vazio é espaço logo ocupado por outro". E o fato novo para a disputa de 2010, o "outro", é a saída de Marina do PT e sua filiação ao PV, "Como ponderam diversos camaradas e mostra a realidade, sua candidatura deverá atrair setores preocupados com o meio ambiente, descontentes com a corrupção, à direita e esquerda (como HH, em 2006), uma juventude "potencialmente ecológica", além de parte dos movimentos sociais que sempre orbitaram em torno do PT", diz.

"É preciso, com urgência, dialogar com esses setores a partir de balizas programáticas, reconhecendo o forte apelo que causa a trajetória emblemática de Marina - não do seu "furta-cor" PV", diz o texto de Chico, apreensivo com o que começa a ser dito de dirigentes de um até agora pouco visível PV.

O que o P-SOL teme é que, na atual situação, o cenário de 2010 possa ser ainda pior que o de 2006, mesmo sem Lula no páreo, o que acontece pela primeira vez desde 1989. A redemocratização brasileira completou um ciclo com o PT. A esquerda, principalmente aquela desencantada com Lula, está atrás de um novo eixo

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

Serra faz discurso político em missa

Soraya Aggege
DEU EM O GLOBO

Depois de Dilma no Círio de Belém, tucano vai a Aparecida

SÃO PAULO. No dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), discursou ontem para 43 mil católicos que participaram das homenagens no Santuário Nacional de Aparecida (SP). A exemplo do que tem feito a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, também pré-candidata à sucessão do presidente Lula — que cumpriu um périplo religioso no últimos dias —, o tucano participou de ato na basílica e aproveitou para dizer que o país precisa de governantes íntegros, que sirvam em vez de se servir do povo.

Apenas este mês, Dilma já participou de cerimônia da Assembleia de Deus em São Paulo; foi à Igreja do Bonfim, em Salvador; e no domingo fez propaganda do governo Lula na procissão do Círio de Nazaré, em Belém.

— O Brasil precisa de governantes íntegros, que sirvam ao povo, em vez de se servirem do povo; e que tenham como preocupação central abrir oportunidades a nossas famílias: oportunidades de trabalho, de cultura, em um ambiente de espiritualidade fraterna.

Assim é possível garantir um futuro de amor, de paz, que permita ao nosso país se encontrar dentro da justiça e da solidariedade — discursou Serra.

Depois da missa, o tucano disse que não pretendia usar o evento para mandar recados a ninguém e que a afirmação foi apenas de uma reflexão pelo dia da padroeira.

No total, 175.667 pessoas visitaram a cidade de Aparecida (a 180 quilômetros de São Paulo) durante o feriado de ontem, segundo a assessoria de imprensa da basílica. Foram celebradas quatro missas ao longo do dia

Tucano fala em missa sobre papel de governante

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Um dia depois de a ministra da Casa Civil e pré-candidata petista à Presidência em 2010, Dilma Rousseff, participar do Círio de Nazaré, ontem foi a vez de outro pré-candidato ao Planalto, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), marcar presença em evento religioso de grande porte, em comemoração ao Dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil.

Anteontem, Dilma assistiu ao Círio, em Belém (PA), que reuniu cerca de 2 milhões de fiéis.

Ontem, Serra foi à missa no santuário de Aparecida (a 167 km de São Paulo) e também falou sobre política. Segundo os organizadores, o evento contou com 43 mil pessoas.

Em discurso e em entrevista coletiva, Serra afirmou que "o Brasil precisa de governantes que sirvam ao povo, não que se sirvam do povo". "[Ser cristão] para mim significa, no governo, servir ao povo. A minha felicidade depende de eu poder proporcionar mais felicidade aos outros. Isso para mim é o que significa ser cristão", disse.

Durante seu discurso, falando sobre Nossa Senhora Aparecida, o governador afirmou que sua grandeza serve para a "libertação do nosso povo".

"Essa libertação pressupõe uma sociedade mais justa, igualitária e políticos que trabalham nessa direção, olhando para hoje e para o futuro. Quando se governa, tem que se governar com um olho no presente e um olho no futuro."

Adversária de Serra, Dilma e outros petistas têm defendido que a próxima campanha presidencial se transforme numa comparação entre o governo do PT (entre 2003 e 2010) e o do PSDB (entre 1995 e 2002).

O tucano disse ainda que os governantes devem se empenhar "em abrir às nossas famílias, às famílias brasileiras, um futuro de trabalho, de cultura, de fraternidade, um futuro de amor, paz e que permita ao nosso país se encontrar dentro da Justiça e da solidariedade".

Serra terminou o discurso saudando romeiros de todo o Brasil presentes na missa. "É um orgulho que venham para nosso Estado, para este santuário, que para todos nós representa uma grande conquista espiritual do povo brasileiro."

À tarde, Serra participaria de evento na favela de Heliópolis, zona sul de São Paulo, devido ao Dia das Crianças. Mas a forte chuva que atingiu o local antecipou o encerramento do ato.

Serra antecipa negócio como BB para ter mais caixa em 2010

Catia Seabra
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O governo de José Serra (PSDB-SP) está prestes a fechar com o Banco do Brasil um negócio que deve garantir ao Estado R$ 1,3 bilhão no ano eleitoral de 2010.

São Paulo estenderá de 2012 até 2014 o direito do BB de gerir a conta salário dos servidores estaduais, antecipando uma "venda" que seria necessária só no próximo governo. Já o BB poderá escapar da nova regra da conta salário, que permitirá ao servidor escolher o banco a partir de 2012.

Serra antecipa acordo com BB para aumentar caixa em 2010

Proposta para Banco do Brasil gerenciar conta de servidores até 2014 renderá R$ 1,3 bi

Com acordo, exclusividade do BB sobre conta salário de funcionários públicos de SP, que venceria em 2012, pode se estender por 23 meses


Na busca por recursos para extenso cardápio de obras, o governo Serra está prestes a fechar negócio com o Banco do Brasil que garantirá R$ 1,3 bilhão aos cofres do Estado no ano eleitoral de 2010. Concretizada a proposta expressa num termo de compromisso, o governo venderá ao BB -dono da Nossa Caixa- o direito de administrar, com exclusividade, a conta salário dos servidores estaduais por mais 23 meses.

Desde abril de 2007, a Nossa Caixa detém a exclusividade sobre a folha de pagamento do Estado. Mas, com a nova operação, a intenção é prorrogar a vigência desse contrato de 2012 até 2014. Com isso, o Banco do Brasil terá cinco anos de exclusividade sobre as contas dos servidores de São Paulo.

Devido à operação, o Estado antecipará "uma venda" que, em tese, seria necessária apenas em 2012, só no próximo governo. Mas não será o único beneficiado com o acordo.

O BB, por sua vez, poderá escapar de uma regra com vigência programada para 2012: a nova conta salário. A partir de 2012, o servidor pode escolher um banco para depósito do seu salário. Mas, se fechar negócio agora, sob as regras atuais, o BB poderá alegar, em 2012, que tem direito adquirido até 2014.

Em abril de 2007, o governo de São Paulo vendeu à Nossa Caixa a exclusividade da conta dos funcionários por cinco anos. Em março deste ano, o Banco do Brasil comprou a Nossa Caixa, incluindo esse "monopólio". Hoje, negocia a prorrogação do contrato por 23 meses. Esse período refere-se ao tempo transcorrido de abril de 2007 até março de 2009.O argumento é que o BB pretende ter direito a cinco anos de exclusividade a contar da compra da Nossa Caixa.

Fechado o negócio, o BB comprará ainda a exclusividade para concessão de empréstimos aos funcionários estaduais com desconto em folha e administrará o pagamento aos fornecedores do Estado.

Procurado pela Folha, o secretário estadual da Fazenda, Mauro Ricardo Costa, explicou que a Nossa Caixa detinha esses direitos quando pertencia ao governo de São Paulo. Mas, como não estavam previstos em contrato, não foram transferidos para o BB no processo de venda da Nossa Caixa.

"A venda do controle acionário não se confunde com a venda de outros direitos do Estado. São duas operações. A venda da Nossa Caixa e a venda de outros direitos", afirmou.Segundo ele, a negociação está prevista num termo de compromisso firmado entre Banco do Brasil e governo do Estado. Pela proposta, o BB deterá esses direitos por cinco anos. A prorrogação, diz, serviria para compatibilizar todos os prazos.

A assessoria do BB confirmou que a negociação está em curso. Mas informou que não se manifestará por se tratar de estratégia comercial.

O governo conta com o sucesso da operação. Tanto que prevê, no Orçamento de 2010, dotação de R$ 1,3 bilhão sob o título "Receitas patrimoniais oriundas do contrato de garantia de exclusividade na prestação de serviços financeiros".

Também no ano que vem será liberada a maior fatia de empréstimos da gestão Serra. Segundo o cronograma, ao menos R$ 4,211 bilhões serão desembolsados em 2010 para obras de infraestrutura. O valor representa 62,03% do total a ser liberado nos quatro anos de governo (R$ 6.789.882).

O governo Serra obteve autorização para contratação de R$ 11,6 bilhões em empréstimos. Mas boa parte ficará para o sucessor. Para o ano que vem, o Orçamento prevê R$ 21,9 bilhões em investimentos.

Outra fórmula para ampliar receita foi a aprovação do projeto que permite a venda de títulos para antecipação de cerca de R$ 900 milhões em créditos que o governo tem a receber. A medida possibilita que o Estado antecipe o recebimento de dívidas parceladas em 2008.

PSDB aposta em polarização de biografias

Caio Junqueira, de São Paulo
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Assim como o governo Lula, os tucanos apostam na polarização da eleição presidencial em 2010."Só que o embate não vai ser entre as realizações de Lula e FHC, mas entre a biografia de um realizador e a de uma desconhecida", diz o jornalista e publicitário Luiz González, que deverá ser o principal estrategista da campanha do PSDB, referindo-se ao governador de São Paulo, José Serra, e sua oponente, a ministra Dilma Rousseff. Para González, que trabalha para o PSDB paulista há 15 anos, a internet vai ser importante na campanha, mas não tanto quanto a televisão.

"Serra vai ganhar guerra de biografias"

Luiz González, 56 anos, paulistano, neto de espanhóis da Galícia, deverá ser o principal estrategista da campanha do governador de São Paulo, José Serra, a presidente em 2010. É o marqueteiro preferido dos tucanos paulistas. Sua ascensão no marketing político foi concomitante à consolidação do PSDB no governo estadual. Já se vão 15 anos desde que fez a campanha de Mário Covas, em 1994, mesmo ano em que trabalhou para Serra, que disputava o Senado. Quatro anos depois, ajudava Covas a se reeleger. Em 2000, perdeu com Alckmin na prefeitura, mas o fez governador dois anos depois. Voltaria a trabalhar para Serra na campanha à prefeitura em 2004 e ao governo do Estado em 2006, quando atuou para Alckmin na disputa presidencial. No ano passado, elegeu Gilberto Kassab (DEM) prefeito.

Foi em sua agência Lua Branca, detentora de contratos de publicidade tanto com a Prefeitura de São Paulo quanto com o governo paulista, que ele recebeu o Valor para uma entrevista, explicitou sua estratégia que, a exemplo do governo, é de polarização entre Serra e Dilma - "Só que o embate não vai ser entre Lula x FHC, mas entre a biografia de um realizador e a de uma desconhecida". A seguir, trechos da entrevista:

Valor: O senhor não teme a transferência de votos de Lula para Dilma?

Luiz González: Aqui em São Paulo ou em Caetés (cidade pernambucana em que Lula nasceu)? Em Caetés haverá mais. A pergunta é: quanto Lula vai transferir nos lugares onde a informação é menos variada, chega mais devagar e as pessoas dependem mais do Estado? Quanto isso pesa mais do que a admiração que as pessoas possam ter por um cara como o Serra e a expectativa de que com ele o lugar onde o eleitor vive melhora? Lula fez campanha para Marta. Foi para o palanque e resultou em quê? Nada. Não levantou meio ponto porque o eleitor aqui é atento.

Valor: Mas e no resto do país?

González: Alckmin era desconhecido nacionalmente, enfrentava um mito que tinha disputado as cinco últimas eleições e que havia feito um governo em que a economia ia bem. Agora está invertido. A Dilma é desconhecida, o Serra é mais conhecido e tem mais biografia. Dilma precisa mostrar o que o governo fez. Pode subir até certo ponto, mas para subir para valer tem que expor a pessoa.

Valor: Foi a privatização que derrotou o Alckmin?

González: Eu nunca saí de um estúdio tão festejado como naquele dia do debate da Bandeirantes. Não só os políticos mas também os coleguinhas. E eu sabia que tinha dado errado. Tinha falado pra ele: não faz isso. Foi ali que ele perdeu a eleição. Colocou o dedo na cara do Lula, foi desrespeitoso. O público fala: "Quem é esse cara? Tô desconhecendo". E teve também a reação do Lula no segundo turno. Fez a famosa reunião no Palácio do Planalto com 17 ministros, despachou um para cada Estado e escalou quatro para aparecerem no "Bom Dia Brasil", "Jornal Hoje", "Jornal Nacional" e "Jornal da Globo". Várias entrevistas do PT metendo a ripa no Alckmin e do nosso lado ninguém. O Tasso (Jereissati) estava no interior do Ceará, o Sérgio Guerra, em Pernambuco, o César Maia sumiu. Consegui o Heráclito Fortes para dar uma coletiva. Se você dá uma entrevista às 15h eu tenho que dar outra às 15h30. Esse é o jogo. E o nosso foi um desastre.

Valor: A força do Lula no Nordeste também não foi decisiva?

González: Não foi apenas no Nordeste. Uma grande derrota que ele sofreu foi no Amazonas. Perdemos em Minas, que tem 10 milhões de eleitores, por 1 milhão de votos. No Amazonas, que tem 2 milhões, perdemos por 900 mil votos. Amazonas virou Minas, que é o terceiro colégio eleitoral do país, porque os dois candidatos da base do Alckmin, Arthur Virgílio e Amazonino Mendes, brigaram o tempo todo e nenhum deles conseguiu defender o candidato da acusação de que ele acabaria com a Zona Franca.

Valor: Em 2010, o comando de Lula sobre a campanha não fará a diferença?

González: Uma coisa é o Lula outra é essa mulher [Dilma] que ninguém sabe de onde veio. Estou colocando como caricatura o discurso, mas no fundo é o seguinte: será que as pessoas estão dispostas a aguentar o PT mais quatro anos sem o Lula? Sem o Lula ficam só os Waldomiros [Waldomiro Diniz, ex-assessor do Planalto flagrado em vídeo recebendo propina]. O Lula foi preservado nessa coisa toda, e sem ele como é que fica?

Valor: O senhor aposta numa campanha pela biografia, mas não acha que o governo vai se pautar por temas como Bolsa Família, crédito popular, valorização do salário mínimo?

González: Mas para cuidar disso aí você prefere esse cara aqui ou essa mulher [Dilma] que ninguém conhece? Tudo isso vai continuar e vai melhorar porque onde esse cara [Serra] põe a mão dá certo. Veja só, como ministro: 300 hospitais reformados. Como deputado: tirou o seguro-desemprego do papel. Como ministro da Saúde: fez os genéricos. Como governador: fez três vezes mais metrô que todo mundo. Onde ele põe a mão dá certo. Vai dar certo com aposentadoria, com salário mínimo, água encanada porque ele é um realizador, tem credibilidade, melhora a vida das pessoas por onde passa. E do lado de lá? Quem é? Ninguém sabe.

Valor: E o PAC e o pré-sal?

González: Eles vão mostrar o PAC, nós vamos mostrar que o PAC não existe. Está tudo parado. A vantagem da campanha política é que o contraditório é exercido todos os dias. Cada um fala o que quer, ouve o que não quer e o eleitor julga. Por isso a campanha não é publicitária, é jornalística. Quanto tem para o pré-sal? São 5 bilhões de barris a US$ 40 dólares o barril. US$ 200 bilhões. Por que não põe US$ 100 bilhões na saúde agora? Ah, não existe? Pensei que tivesse. Não estão falando que a Petrobras está sendo capitalizada com 5 bilhões de barris?

Valor: A aposta, então, é que na disputa entre biografias o Serra leve?

González: O Serra é o favorito, tem grandes chances de ganhar. A Dilma passou a ter problemas com a entrada do Ciro [Gomes] e da Marina. Será uma surpresa se ela decolar. O governo acha que vai ser um plebiscito Lula versus não-Lula, ou Lula versus FHC, mas nós não vamos deixar. Não é isso. É a biografia do Serra contra a da Dilma. E daí o nosso japonês é melhor do que o japonês dos outros. Serra foi deputado constituinte, senador, secretário de Estado, ministro duas vezes, prefeito, governador. Tudo o que ele fez alicerça o que vai prometer. Isso dá credibilidade, confiança. E é uma figura nacional.

Valor: Como contrabalançar o Norte e o Nordeste?

González: Uma questão central na campanha é que Serra não pode perder Sul e Sudeste. Não é à toa toda essa movimentação em São Paulo. Eles não são trouxas, precisam de alguém que tire votos do Serra aqui. Uns cinco, seis pontos. Todo esse jogo com o [Gabriel] Chalita é entre PSB e PT porque tem que tirar uns 4 milhões de votos do Serra aqui. O Nordeste é fundamental, é importante, mas acho que nunca se pode perder suas cidadelas. O negócio é que não se pode perder de muito lá e ganhar bem aqui. Serra é tido no Nordeste como o melhor ministro da Saúde que o Brasil já teve.

Valor: O PMDB é crucial?

González: Se o PMDB for para o governo nos prejudica bastante porque tempo de TV é importante.

Valor: O fato de o PMDB ter as maiores bancadas no Congresso e o maior número de prefeitos não é importante também?

González: Não. Isso não é garantido, pois ninguém sabe se eles vão ajudar mesmo. Alguns só ajudam se receberem recurso material, outros até ajudam adversários. O PMDB de Pernambuco é diferente do de Goiás, que é diferente do Rio. Há a possibilidade remota, mas existente, de eles fecharem com o Serra. Aí nossa chance aumenta muito. A possibilidade em que acredito: o PMDB não vai para ninguém. Aí zera e a eleição fica polarizada entre Serra e Dilma. Mas até o início da campanha ela vai sofrer com matérias que ela não emplaca. Alguém do PT em off criticando, dizendo que o gênio dela é ruim, que ela briga com todo mundo. Só bastidores. Ela vai sofrer com isso.

Valor: E o Ciro?

González: Não emplaca. Primeiro porque não vai ter tempo de TV. Vai ter PSB e mais o tempo igualitário, que vai dar uns dois minutos e meio. Sabe qual a leitura do público? ´Aquele pequenininho lá não vai governar porque não consegue agregar. Tem dois que são pra valer e dois nanicos´. Segundo porque ele é verborrágico e alguém vai provocá-lo. Pode ser o Serra ou até mesmo a Dilma, porque pode se travar uma disputa entre ela e o Ciro pelo segundo lugar. Para nós é o melhor cenário. Isso se o Ciro não tiver cometido nenhum deslize verborrágico, o que eu não acredito.

Valor: E a Marina?

González: É uma candidata interessante, bacana, com história bacana, com aura de seriedade. A única coisa que a prejudica neste momento é o pouco tempo de TV. É pouco para expor as ideias, convencer, seduzir e apaixonar. O eleitor também avalia a capacidade de fazer alianças pelo tempo de TV. A tradução do pouco tempo é esse: o cara não tem força. Ela tende a murchar também.

Valor: Aqui em São Paulo o PSDB faz sucessor sem atropelos?

González: São Paulo sempre é uma eleição complicada. É um lugar com opinião pública forte, gente informada, urbanizada, antenada. Mas acho difícil para a oposição mesmo porque não sei quem é o candidato.

Valor: O Palocci pode ser competitivo em São Paulo?

González: Será um erro se ele sair. Tem uma série de coisas de quando ele foi prefeito de Ribeirão Preto que ainda não foram resolvidas, assim como o caso do caseiro Francenildo que também não foi resolvido na opinião pública.

Valor: E a disputa entre os tucanos? Alckmin lidera as pesquisas, mas o meio político prefere Aloysio Nunes Ferreira, com dois pontos nas pesquisas. É difícil alavancar o Aloysio?

González: Você pergunta o que é mais difícil, não a minha preferência. Mesmo porque, essa é uma questão partidária e não me caberia opinar. Mas é óbvio que é mais difícil pegar alguém com 3 ou 5 pontos e lutar morro acima para levar a 20, 25 pontos e forçar o segundo turno do que pegar um candidato com 50 pontos, ex-governador do Estado.

Valor: O que é mais determinante ao voto?

González: Tem uma tese do professor João Albuquerque, da USP, defendendo que 15% votam por identificação, o mesmo percentual, por oposição e 70% por expectativa de benefício futuro. A questão central é como se cria uma identificação com o candidato e se desperta no eleitor a confiança de que ele é capaz de melhorar sua vida.

Valor: A internet vai ser importante em 2010?

González: A cada eleição a internet fica mais importante. E, em 2010, pode até ser a ferramenta mais comentada, pelas novidades que trará. Mas não acredito que será a mais importante. Nas condições de 2010, acho que a TV ainda será mais importante do que a internet, por mais amplas e diversificadas que sejam as ações na internet e por mais tradicionais que sejam na TV. Mário Covas dizia que se ele tivesse pouco dinheiro pagaria advogado e programa de TV e depois contrataria o resto. Se fosse para hierarquizar os veículos que eu usaria, diria que o mais importante é o horário eleitoral, free media [presença dos candidatos no rádio, TV, jornais e revistas], programa eleitoral no rádio e, por fim, a internet.

Valor: Por que?

González: Pela abrangência. O Brasil tem pouco mais de 131 milhões de eleitores. A televisão chega a praticamente todos. Existem 57 milhões de domicílios no Brasil. Há pelo menos um aparelho de TV em 95% desses domicílios - 170 milhões de brasileiros a assistem diariamente. Estima-se que haja até 60 milhões de internautas, com 11 milhões de conexões em banda larga. Ou seja: a televisão chega a muito mais gente. Outra questão é a distribuição geográfica. A TV chega a todo o país de maneira mais uniforme: 96% dos domicílios urbanos têm TV. Na zona rural a presença cai, mas ainda é alta: 78% das residências rurais têm TV. Essa presença avassaladora e bem distribuída não acontece, ainda, com a internet. A internet está mais presente nas regiões Sul e Sudeste, com 60% dos internautas. Mas as regiões Norte e Nordeste que têm, juntas, 34% do eleitorado, só têm 22% dos internautas.

Valor: Essa concentração da internet no Sul e Sudeste favorece alguma candidatura?

González: Acho que a internet vai servir de maneira distinta às candidaturas. Serve mais ao PT do que ao PSDB. Como o PT tem mais dificuldade no Sul e no Sudeste, onde a internet tem mais penetração, o instrumento vale mais. Da mesma forma, se o corte for cidade grande versus cidade pequena, o PT tem mais dificuldade nas capitais e cidades grandes. O PSDB tem mais dificuldade nos grotões. Desse ponto de vista, o que o PSDB precisa é de carro de som nas pequenas cidades. Além disso, a televisão é um veículo impressionista. É um veículo de emoção, que surpreende o telespectador em sua casa. Nessas características essenciais, é insubstituível.

Valor: O que o senhor achou da reforma eleitoral recém-aprovada?

González: Lamentável. O Congresso perdeu a oportunidade de limpar as regras eleitorais, de deixar o pleito mais livre. Por exemplo: não se pode usar imagem externa nas inserções ao longo da programação, nos comerciais. Mas se pode usar imagem externa nos programas grandes, em bloco. Qual o motivo?

Valor: Quais são os outros problemas da reforma?

González: A reforma instituiu um "liberou geral" nas coligações. Agora é possível, na mesma circunscrição eleitoral, fazer coligações que se contradizem. Essa emenda do "liberou geral" para as coligações atende a estratégia governista. Nos últimos anos, prevaleceu a norma que impedia o uso de um espaço eleitoral no rádio e na TV por um candidato a outro cargo. Mesmo assim, em 2006 Lula "invadiu" grande parte das campanhas estaduais, principalmente onde o candidato a governador do PT era fraco. Foi parcialmente punido por isso, com perda de tempo de TV. Nem todas as "invasões" foram descobertas a tempo de se acionar o TSE. Na eleição de 2010, as campanhas estaduais estão autorizadas a veicular "imagem e voz" do candidato a presidente, ou de militante político nacional. Traduzindo: é a licença para Lula e Dilma" invadirem" os tempos de propaganda de candidatos a governador, senador e deputados. Vai ser uma festa. Infelizmente, a oposição deixou passar. Vamos ver o que o TSE diz sobre o assunto.

Ciro sofre ataque especulativo do PT

Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Partido de Lula ameaça governadores do PSB com rompimento de alianças regionais e endurece jogo para que legendas aliadas não fechem com socialista

Desde que ultrapassou a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), nas pesquisas de opinião, o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) sofre um ataque especulativo dos petistas para desistir da candidatura a presidente da República. Além de pressionar os governadores da legenda — Eduardo Campos (PE) e Cid Gomes (CE), candidatos à reeleição, e Vilma Maia (RN) — com a ameaça de romper as alianças regionais, o PT força a barra com os partidos aliados para não aderirem à candidatura do socialista.

Na única conversa da cúpula do PSB com Luiz Inácio Lula da Silva sobre a sucessão de 2010, Ciro reiterou que pretende disputar a Presidência. Lula enfatizou que prefere uma eleição plebiscitária, com uma candidatura única da base contra a oposição, mas disse que não pretende pedir a retirada da candidatura de Ciro, porque foi candidato quatro vezes e entende a posição de seu ex-ministro.

Segundo o líder do PSB no Senado, Renato Casagrande (ES), Ciro não pretende ser candidato a governador. “Ele transferiu o domicílio eleitoral para São Paulo com o objetivo de manter o diálogo com o PT.” Essa mudança, porém, manteve as esperanças do Planalto de deslocar a candidatura de Ciro para o governo paulista e levou à intensificação das pressões do PT sobre o PSB. O ex-ministro José Dirceu, uma espécie de eminência parda nos bastidores da sucessão de 2010, tentou convencer o governador Cid Gomes a patrocinar a retirada da candidatura de Ciro e ouviu um sonoro não: “Só trato das eleições a partir de março do ano que vem”, disse-lhe o irmão de Ciro.

A resposta do PT veio a galope, numa entrevista da prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, à imprensa local. Ela ameaçou se lançar candidata contra a reeleição de Cid Gomes se Ciro não retirar a candidatura. O recado serve também para Eduardo Campos, que precisa do apoio do PT para enfrentar a candidatura do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB). O ex-prefeito do Recife João Paulo, que integra o secretariado de Campos, é uma carta na manga do PT para forçar Campos a operar a remoção de Ciro.

Confusão


O problema é que o PT está à beira de um ataque de nervos por causa do crescimento de Ciro, sem contar com a confusão na seção paulista da legenda. A ex-prefeita Marta Suplicy (PT), por exemplo, lidera a mobilização contra a candidatura de Ciro em São Paulo, em franca oposição à tese de Lula. “Essa discussão somente serviu para alavancar a candidatura a Ciro, prejudicando Dilma, não resolve nosso problema em São Paulo”, critica o deputado Carlos Zaratinni (PT-SP), aliado de Marta Suplicy.

Enquanto Ciro não se decide, não faltam candidatos petistas sem o respaldo de Lula. O mais carismático é o senador Eduardo Suplicy. Mas também são pré-candidatos o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e o prefeito de Osasco, Emídio de Souza. O ministro da Educação, Fernando Haddad, e o ex-presidente da Câmara dos Deputados Arlindo Chinaglia, aparentemente, desistiram da candidatura. Lula, porém, avalia que nenhum deles resolve o problema eleitoral de Dilma em São Paulo. A solução é Ciro Gomes disputar o Palácio dos Bandeirantes.

Estrelas do Senado correm risco de não se reeleger

Eugênia Lopes, Brasília
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Sérgio Guerra,Tasso, Renan e Mercadante estão entre os parlamentares que terão dificuldade para voltar à Casa

Como se não bastasse a crise que desmoralizou o Senado neste ano, as eleições de 2010 ameaçam tirar o brilho de antigas estrelas da política nacional, que enfrentam dificuldade para se reeleger. Os obstáculos atingem em cheio senadores de todos os partidos que estão sendo obrigados a fazer arranjos políticos para garantir, ao mesmo tempo, sua sobrevivência e a eleição nos Estados.

Na oposição, há casos emblemáticos como os dos senadores tucanos Sérgio Guerra (PE), atual presidente do PSDB, e Tasso Jereissati (CE), ex-presidente da sigla, que correm o risco de não voltar ao Senado. Os percalços eleitorais também abrangem senadores governistas, como Renan Calheiros (PMDB-AL), que provavelmente terá de encarar como adversários na corrida pelo Senado o ex-governador Ronaldo Lessa (PSB) e a candidata à Presidência pelo PSOL em 2006, Heloisa Helena.

O enfraquecimento de cabeças coroadas da política é mais visível no Nordeste, onde tradicionalmente os governadores são responsáveis pela eleição de senadores. Depois de governar Pernambuco por oito anos consecutivos, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), que tem mais cinco anos de mandato, é pressionado a sair candidato ao governo do Estado. O motivo é que a candidatura do peemedebista seria o caminho mais tranquilo para alavancar a eleição tanto de Sérgio Guerra quanto do ex-vice-presidente Marco Maciel (DEM-PE).

Com dificuldade para se reeleger ao Senado, os dois torcem para que Jarbas dispute o governo do Estado e, com isso, ganhem um palanque forte. Afinal, ambos terão como adversários o ex-prefeito de Recife, o petista João Paulo, e o deputado Armando Monteiro (PTB). Com mandato desde 1971, Maciel é o que tem mais "recall" junto ao eleitorado. Já o senador tucano é o que dispõe da maior estrutura partidária no Estado, mas sem o palanque de Jarbas enfrenta dificuldade de se reeleger para o Senado.

"Todos os candidatos de oposição serão mais competitivos se Jarbas for candidato ao governo", admite Guerra. O senador peemedebista prefere, no entanto, manter o suspense até o carnaval, data em que confidenciou a amigos que irá bater o martelo sobre sua candidatura. Se Jarbas resolver não entrar na disputa eleitoral, Guerra vai tentar seu quarto mandato de deputado. Para "guardar lugar", já lançou sua filha Helena Guerra à Câmara.

Governador do Ceará por oito anos, Tasso elegeu para o Senado quem bem entendeu durante a década de 90 e até 2002, quando ele e sua afilhada política Patrícia Saboya (PDT) conquistaram as duas vagas no Senado. Mas agora a situação é tão delicada que a ex-mulher do pré-candidato à Presidência pelo PSB, deputado Ciro Gomes, vai disputar uma vaga de deputada estadual. Na sua vaga de deputado pelo Ceará, Ciro pretende eleger Pedro Brito (PSB), ministro-chefe da Secretaria Especial de Portos. Tasso tenta obter o apoio velado de Cid Gomes (PSB), irmão de Ciro e atual governador do Ceará, para voltar ao Senado.

O cenário cearense ficou complicado depois que o ministro da Previdência, José Pimentel (PT), entrou na disputa por uma das duas cadeiras de senador. A outra é pleiteada pelo deputado Eunício Oliveira (PMDB), ex-ministro das Comunicações de Lula. Teoricamente, Cid apoiará as candidaturas de Eunício e Pimentel.

Ocorre que historicamente os Gomes sempre estiveram juntos de Tasso. "Na história política do Ceará nenhum governador se elegeu sem deixar de fazer os senadores", diz Oliveira, que aposta no apoio do governador para conquistar o Senado.

Homem forte no Senado do governo Lula, Renan também se prepara para enfrentar uma eleição dificílima. Com a provável candidatura da senadora Marina Silva (PV-AC) à Presidência, Heloísa Helena teria desistido de tentar disputar a sucessão presidencial. A expectativa é que obtenha "um caminhão de votos" na eleição para o Senado. A candidatura do ex-governador Lessa também é forte: quase se elegeu em 2006 para o Senado. Perdeu para Fernando Collor de Mello (PTB).

Depois de chegar ao Senado com mais de 10 milhões de votos, o líder do PT, senador Aloizio Mercadante (SP), não deverá ter reeleição fácil. A situação dele se agravou depois que o vereador Gabriel Chalita migrou do PSDB para o PSB para disputar uma das vagas por São Paulo. Com a aliança entre o PSDB e o PMDB em torno da candidatura ao Senado do ex-governador Orestes Quércia, Mercadante estaria contando em ser o "segundo voto" dos tucanos. Mas agora o "segundo voto" deve migrar para Chalita.

Retorno de Zelaya trava pacto em Honduras

Ana Flor e Fabiano Maisonnave
Enviados Especiais a Tegucigalpa
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Apesar de entendimentos pontuais entre emissários do governo interino e do deposto, divergência sobre restituição empaca acordo

Substituição de negociador no time de Zelaya indica que ele desistiu de Constituinte, mas grupo de Micheletti espera mostra mais enfática

Um dos principais negociadores do governo interino de Roberto Micheletti disse ontem que há poucas chances de que um acordo que dê fim à crise política seja concluído hoje, em contraste com o que esperam envolvidos nas conversas mais otimistas.

Segundo o negociador, o único ponto em que há poucas chances de acordo é o mais nevrálgico: o retorno do presidente deposto Manuel Zelaya ao poder. A avaliação é que Zelaya continua pedindo muito, sem dar garantias. Entre as exigências consideradas descabidas está a volta à Presidência com poderes semelhantes ao de antes do golpe de 28 de junho.

O negociador também critica a falta de comprometimento do time de Zelaya com a ideia de descartar uma Constituinte. Oficialmente, o grupo do presidente deposto disse que não insiste mais no processo de mudança da Constituição.

Na sexta, quando as conversas entre os dois grupos foram suspensas para que, no feriado, houvesse consultas privadas, os negociadores se diziam otimistas. Chegaram a comemorar o consenso sobre 60% dos pontos do Acordo de San José, texto-base do diálogo. "Porcentagem é relativo", disse ontem um negociador de Micheletti.

Para ele, se não há acordo sobre o ponto principal -a volta de Zelaya- todo o resto fica comprometido. O grupo de Micheletti aposta que um processo prolongado de negociações possa desgastar a força -já reduzida- de Zelaya.

Um dos negociadores do presidente deposto, Victor Meza, disse ontem que os dois pontos finais do acordo devem ser negociados entre hoje e amanhã.

O prazo dado por Zelaya para um acordo termina na quinta. Mesmo assim, o deposto não afirmou o que fará caso não se chegue a um consenso até lá.

John Biehl, representante da OEA (Organização dos Estados Americanos) nas conversas, afirmou que não pode prever se haverá acordo, mas disse que outras formas para resolver a volta de Zelaya estão na mesa. Para o time de Micheletti, o ideal seria uma terceira pessoa assumir o poder. Segundo seus negociadores, poderia haver acordo se deposto voltasse sob um gabinete pré-definido.

Zelaya trocou ontem o delegado que representa a incipiente esquerda hondurenha da mesa de negociações com o governo interino. Com a decisão, que será formalizada hoje, sai o líder sindical esquerdista Juan Barahona, que nunca tira um boné do Che Guevara, para entrar o advogado e empresário Rodil Rivera Rodil, um moderado das filas do Partido Liberal fiéis ao presidente deposto.

A mudança mostra que Zelaya está disposto a ceder na convocação de uma Constituinte, um dos pontos mais importantes da crise, mas sem comprometer a Frente Nacional da Resistência (FNR), que reúne dezenas de organizações esquerdistas e planeja continuar impulsando uma nova Carta.

Zelaya tem adotado o discurso de que a convocação não foi feita por ele, mas "pelo povo", e que, portanto, o processo não está em suas mãos. Ou seja, mesmo que ele desista, a proposta continua via FNR, que se encaminha para se transformar em partido político.

Visita a EUA e Brasil: Cuba nega visto de saída para blogueira

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A blogueira Yoani Sánchez informou, em sua página no twitter, que não recebeu permissão do governo cubano para viajar aos EUA para receber o prestigioso prêmio de jornalismo Maria Moors Cabot, da Universidade Columbia, nem para vir ao Brasil, onde falaria no Senado e participaria do lançamento do seu livro "De Cuba, com Carinho" (Contexto). Em 2008, Havana impediu que a blogueira participasse na Espanha de outra cerimônia de premiação.

O samba antes e depois de Rildo

Lucas Nobile
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO / CADERNO 2
Publicado 12/10/2009

O veterano produtor, que impulsionou as carreiras de sambistas importantes, vem aí com novo álbum

A calmaria mora no não dito. O gaitista, produtor, arranjador e maestro Rildo Hora precisou de tempo para entender isso e fazer um "pacto com a generosidade", como ele mesmo define. Do alto de seus 1m90, o intempestivo e magro Rildo, que ganhou da amiga Beth Carvalho o apelido de "Comprido Hora", costumava bater de frente com artistas e gravadoras para impor suas ideias. E os arroubos de imperatividade não se restringiam apenas à profissão.

Nascido em Caruaru de uma família predominantemente branca e reacionária, recém-saído da adolescência, Rildo deixava crescer a vasta cabeleira "pixaim", que havia herdado do pai, só para provocar a ira das tias e avós. "Em 1968 eu me considerava um comunista. Hoje sou um órfão do Kremlim. Assim como o presidente Lula, aprendi a conviver com os contrários", diz Rildo, lulista convicto, que justifica seu principal hobby, a política, assistindo à TV Senado nas horas vagas.

Hoje, aos 70 anos - e mais de 50 de carreira -, Rildo se tornou uma espécie de Rei Midas do Samba e coleciona em sua cobertura no Corte do Cantagalo, no Rio de Janeiro, cerca de 150 discos de ouro e platina de diversos artistas com quem trabalhou, e 4 Grammys Latinos conquistados ao lado de Zeca Pagodinho (2001/02/ 03/ 06).

Consagrado como produtor e arranjador, ele ainda respira novos projetos que caminham na contramão dos enlatados do mercado. Sem abandonar os grandes nomes com quem trabalha no momento, como Zeca e Fundo de Quintal, Rildo se atualiza, dedicando seu tempo à produção de jovens artistas da cena independente. "Acredito na força de baixo para cima na cultura e estou muito sensibilizado em trabalhar com sangue novo. O segmento independente é muito interessante, lá não se fala a palavra "vender". É ele que vai dar a futura cara da música brasileira, com liberdade de expressão", comenta o produtor.

Mesmo com a estrada de uma longa carreira pavimentada pela produção e por arranjos de gravações antológicas, Rildo ainda faz questão de refrescar a memória do público, revelando mais duas de suas facetas: a de gaitista e a de compositor. A primeira ainda resiste com participações em discos e frequentes shows-solo que ele faz pelo Brasil. Foi com a gaita que Rildo conquistou os contemporâneos de bossa nova com registros singulares, como Batida Diferente, de Durval Ferreira, no seu disco de estreia, Samba Made in Brazil - Rildo Hora e o Clube dos 7, e impressionou os estrangeiros, como os jornais que o classificaram de "virtuoso da gaita" e o coreógrafo Mikhail Baryshnikov, em viagem à antiga União Soviética, em 1965.

E a segunda faceta está mais viva do que nunca, já que Rildo acaba de entrar em estúdio para gravar um disco com sua filha, a cantora Patrícia Hora, com lançamento previsto para o início de 2010. No repertório, composições inéditas antigas e recentes de Rildo com parceiros como Nelson Sargento, Luiz Carlos da Vila, Humberto Teixeira, Nei Lopes e Zélia Duncan, e a regravação de Anda, Sai Dessa Cama, parceria com Martinho da Vila.

Em relação à carreira de arranjador e produtor, Rildo não poderia estar mais contente, já que depois de um hiato de 25 anos ele voltará a trabalhar com Beth Carvalho. O disco, que começa a ser gravado apenas no próximo ano, terá no repertório sambas inéditos resgatados no imenso baú da "Madrinha do Samba".

Vale a pena ver o vídeo do Show Vozes do Choro.

As rosas não falam" (Cartola) por Rildo Hora (Gaita) e Nilze Carvalho (Voz) VOZES DO CHORO: Misael da Hora - Teclados Rildo Hora - Gaita Edu Krieger .

Clique o link abaixo

http://www.youtube.com/watch?v=411P7loFyhM