sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Reflexão do dia – Tibério Canuto

"Antes mesmo de ser montado o novo governo, Dilma foi pedir socorro a Lula eele teve que operar às sombras para viabilizar a 'pacificação dos aliados'.A lulodependência de Dilma pode ser maior do que imaginávamos. Lula podevirar uma sombra permanente da nova presidente, como se o seu espectrocontinuasse a pairar sobre o Palácio do Planalto. Se ele agiu assim noprimeiro abalo entre partidos aliados, nada indica que passará ao largo casoocorra uma crise mais grave. Poderemos viver, guardadas as devidasproporções, uma 'kirchnerização' do Planalto, da época recente em que NéstorKirchner estava vivo."


(Tibério Canuto, blog Pitacos, 18/11/2010)

Múltiplas visões :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Os dois scholars chineses que participam da Conferência da Academia da Latinidade, que está sendo realizada este ano no Rio, na Universidade Candido Mendes, Tong Shijun, vice-presidente da Academia Social de Ciências de Xangai, e Wang Ning, professor das Universidades de Xangai e de Tsinghua, trataram a questão democrática como uma consequência da modernidade, mas defenderam a tese de que não existe um modelo único de modernidade, assim como pode haver múltiplas democracias.

O modelo de modernidade chinês seria uma alternativa ao conceito globalizado de modernidade e daria margem à existência de diversos tipos de democracia.

Na sua palestra, o professor da Universidade de Xangai Wang Ning definiu as diversas características das modernidades chinesas, uma das quais é ser o contrário do modelo ocidental, que seria centralizado.

O modelo chinês sofre intervenções também da periferia, com seu centro monolítico se dividindo em diversos centros. Isso é explicável pelo fato de que a China vem se desenvolvendo de maneira assimétrica.

Em Pequim, Xangai, Shenzhen e em outras cidades costeiras, surgem sintomas pós-modernos, como se essas cidades fossem metrópoles ocidentais desenvolvidas.

Mas várias cidades médias no interior do país ainda estão em processo de modernização.

Outra característica chinesa é que a modernidade pode ser paradoxal.

No plano doméstico, ainda está por ser construída, mas em termos internacionais já é uma realidade.

O processo de globalização permitiu à China uma mudança rápida rumo ao desenvolvimento, mas a globalização não se completa se não for assimilada localmente.

Nesse contexto, o professor Wang Ning admite que economicamente a China tem que observar as regulamentações da Organização Mundial do Comércio (OMC) e de outras instituições globalizadas das quais participa; mas, política e culturalmente, a China ainda tem suas idiossincrasias próprias e únicas tradições e condições, e, por isso precisa atuar nos dois campos, local e global.

O professor acha que a reconstrução da modernidade chinesa, embora desigual e diversificada, servirá como grande contribuição para a realização de um projeto global que ainda está incompleto.

Complementando esse pensamento, o professor Tong Shijun parte do princípio de que a democracia é uma forma de convivência em sociedade que pode ser definida como o exercício de uma "autonomia responsável" pelo cidadão.

Sendo assim, se existem "múltiplas modernidades", a democracia, como um elemento fundamental da modernidade, pode também ser decupada em múltiplas facetas, de acordo com as condições particulares de cada nação.

Ele usa a definição do filósofo chinês Feng Qi, que dizia que toda ação moral deve observar dois princípios básicos: o da razoabilidade e o do livre-arbítrio, que definiriam a "autonomia responsável".

Mas esses dois princípios recebem diferentes prioridades no Ocidente e na China, ressalta o professor Shijun, o que justificaria a existência de "múltiplas democracias".

Uma das maiores tarefas dos chineses nos tempos modernos tem sido, ressalta Feng Qi, aprender com o Ocidente o respeito pela livre escolha individual, ao mesmo tempo em que valoriza o papel positivo da tradição que leva a que o cidadão baseie seu livre-arbítrio no critério da razoabilidade, que para os chineses tem precedência sobre a vontade individual.

Essas "condições particulares" de cada nação é que justificariam o modelo de "múltiplas democracias".

O professor Tong Shijun diz que na China, por exemplo, há a tradição de respeitar o professor e valorizar a educação, e o modelo professor-aluno tradicionalmente é muito influente na sociedade.

Uma boa consequência disso é que pessoas mais bem educadas e com experiências ricas podem mais facilmente ganhar o respeito de outras pessoas, e a maioria das pessoas pode mais facilmente ser convencida de que deve ouvir aqueles que são mais sábios e virtuosos.

Na China, o nível de democracia em uma comunidade tende a ser medido pelo grau de atendimento dos reais interesses do cidadão e pela eficiência de seus líderes nesse atendimento, muito mais do que pelos procedimentos formais através dos quais os interesses da população são encaminhados.

As diversas formas de decisão coletiva estão em discussão na China, destaca o professor Tong Shijun, e também o interesse individual pela sua comunidade e o nível de confiança que os cidadãos têm em suas próprias opiniões.

Ele ressalta que nos últimos anos existe um grande empenho para que se adote no país uma forma de "democracia socialista com características chinesas", embora essa ainda seja uma questão em debate.

Assim como se debatem experimentos como a "democracia intrapartidária" ou a "democracia consultiva", que seria a democracia direta.

O papel de Palocci:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

No início da semana o presidente Luiz Inácio da Silva e a presidente eleita Dilma Rousseff tiveram uma longa conversa sobre a montagem do futuro ministério. Repassaram nomes, revisaram critérios, fizeram algumas escolhas e mantiveram o que foi tratado ali sob reserva.

Ela permanece "fechada em copas" - como diz um interlocutor constante do eixo São Paulo-Brasília - e ele respeita o estilo. Bem diferente da armação das equipes de Lula nos dois governos, quando as informações eram compartilhadas sem muita cerimônia.

Até agora o que se ouve são versões, expressões de desejos, tentativas de pressão. A partir daquela conversa entre Lula e Dilma, as definições começarão a ser ventiladas com um grau razoável de confiabilidade.

Antônio Palocci, por exemplo, já foi citado para integrar a equipe econômica, para comandar a pasta da Saúde e para ocupar o Ministério das Comunicações. É "escalado" até como alvo de José Dirceu, que estaria trabalhando para ver Palocci longe do Palácio do Planalto.

Mas e ele, onde gostaria de ficar? Note-se que Palocci hoje é, depois de Lula, talvez a pessoa com maior ascendência sobre Dilma Rousseff.

Recentemente o ex-ministro da Fazenda, até outro dia cabeça da campanha e agora comandante-chefe do processo de transição, revelou a um conselheiro o que de fato o deixaria satisfeito: a Casa Civil desidratada de algumas funções de gerência, como a administração do PAC, ou a Secretaria-Geral da Presidência, recuperada em algumas funções que exercia à época do governo Fernando Henrique Cardoso, acrescida de tarefas hoje na jurisdição da pasta das Relações Institucionais.

Funções políticas de intermediação com o Congresso e com os demais ministérios. O que Dirceu tirou da secretaria-geral, deixando Luiz Dulci praticamente reduzido a redator de discursos presidenciais nunca lidos, Palocci gostaria de recuperar e acrescentar a elas a interface com o empresariado.

O essencial para ele seria estar no palácio: ficaria acima da disputa de cargos dos partidos da coalizão, um patamar sem acesso aos assentos do Planalto; reforçaria o grupo mais próximo da presidente, e de certa forma ficaria longe de vidraças passíveis de ser mais atingidas na hora do tiroteio.

Registre-se que Palocci ainda não está politicamente absolvido do caso da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Agora mesmo o PT teve de desistir de lançá-lo candidato ao governo de São Paulo porque as pesquisas indicavam rejeição ainda por causa do escândalo.

A expectativa é que a passagem de Palocci pelo governo Dilma sirva também para "fechar" o episódio e polir a imagem dele de modo a deixá-lo eleitoralmente zerado. Seja para a prefeitura paulistana em 2012, o governo paulista em 2014 ou para a sucessão de Dilma.

"É pejorativo". O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, diz que não houve revés algum no "blocão" de deputados governistas para atuar em conjunto no Congresso. Ao contrário, "agora quando falar com o governo, Michel Temer fala em nome de mais de 200 deputados", informa.

Segundo ele, o bloco será formalizado no início da próxima legislatura, em fevereiro. Henrique Eduardo, aliás, não viu razão para tanta reação. "Não houve intenção de pressionar", garante.

"Apenas resolvemos organizar a base que estava se desentendendo por causa de cargos. Governo de coalizão funciona assim, não sei por que chamam de fisiologismo, é pejorativo."

Afinal, acrescenta, ninguém quer expandir, só manter os territórios atuais. "A presidente não podia encontrar um campo conflagrado. Agora entregamos a ela o tabuleiro de xadrez com as peças postas. Ela joga como achar melhor."

Muito embora o líder considere mais prudente ela jogar conforme espera o PMDB, preservando os atuais espaços. "Dilma precisará de uma base mais unida e fiel que Lula porque está construindo sua trajetória agora, junto conosco."

Democracia brasileira perde a inocência:: Cristian Klein

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Não faz muito tempo, a negociação de cargos e ministérios era um assunto quase sigiloso na política brasileira. Um tabu. Caciques partidários saídos de longas reuniões se esquivavam das perguntas e, quando sem opção de fuga, negavam de pés juntos que haviam pedido ou oferecido apoio em troca de postos no governo. Era feio, imoral. Não combinava com os bons costumes. A prática política elevada, supostamente de padrão americano ou europeu, seria puritana e avessa a barganhas. "Não houve qualquer menção a cargos. Conversamos sobre nosso programa de governo" era a resposta de praxe, carregada de desfaçatez.

Nada tão diferente do atual cenário em que se discute a composição do futuro ministério da presidente eleita Dilma Rousseff. Pastas e cargos são pedidos e exigidos sem a menor cerimônia, à luz dos holofotes. O PMDB, que saiu da urnas menor do que entrou, propõe que cada partido mantenha seu quinhão. O PSB, que saiu maior, quer espaço de acordo com seu novo peso. O PT, dono da caneta, é pressionado pelos aliados a quebrar a cabeça para dividir o butim.

O noticiário é invadido pela avidez de quem tem o mapa da mina na mão: o Ministério dos Transportes é joia da coroa; o Turismo vai ser turbinado com verbas para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016; se fulano for confirmado "não ponham na conta do partido", é ministério de porteira aberta ou fechada?

Ou seja, discute-se tudo, ou quase tudo, às claras. O que há algum tempo pareceria um despudor de cenas explícitas de fisiologismo foi naturalizado. Perdeu-se a vergonha. Como isso aconteceu?

Dois fatores podem explicar a mudança de comportamento, que reflete, necessariamente, a aceitação ou, no mínimo, a resignação da sociedade civil ou, pelo menos, dos atores identificados como formadores da opinião pública.

O primeiro, mais estrutural, tem a ver com o crescimento e o amadurecimento da democracia brasileira e a percepção sobre como ela funciona. Não há mais uma visão idealizada. Ao estado de ingenuidade do período inicial da redemocratização seguiu-se a perda da inocência.

O segundo foi o choque de realidade que relativizou a negociação de cargos e a pôs em seu devido lugar, como um mal menor, ou melhor, como algo inerente a qualquer governo de coalizão: o escândalo do mensalão de 2005.

Diante e depois do episódio de cinco anos atrás - e dos demais que se seguiram, como o mensalão de Brasília, no ano passado - barganhas por cargos e espaço político passaram a ser vistas não só como merecedoras de condescendência, mas até de incentivo. Seriam vitais para o equilíbrio e o bom funcionamento do sistema.

Há muitas tentativas de se explicar como o mensalão eclodiu na democracia brasileira, tal como uma doença. Para além das óbvias justificativas de ordem moral, baseadas na natureza humana - como a ganância, a índole corrupta -, desequilíbrios no mercado político teriam estimulado a prática.

A necessidade do PT de financiar campanhas de uma multiplicidade de candidatos que se tornaram competitivos, acima do que o partido estava acostumado, em meio à perspectiva da eleição de Lula em 2002, já foi apontada como uma das razões para a disseminação do dinheiro não contabilizado do caixa dois.

Há quem argumente, como os cientistas políticos Timothy Power e Carlos Pereira, que o mensalão foi provocado por uma espécie de disfuncionalidade no presidencialismo de coalizão liderado pelo PT. O partido, ao não aceitar compartilhar cargos e ministérios de modo proporcional ao peso das bancadas dos aliados, teve de recompensá-los de outra forma, mais "heterodoxa". A melhor comparação seria a de uma falha no mercado político, devido à suposta tendência monopolista do PT ao chegar ao poder. O partido estava supervalorizado, e o mercado político, como qualquer outro, corrigiu o preço do apoio.

"Dilma estará sob grande pressão das facções internas do PT, mas terá que construir um ministério mais proporcional, especialmente com o PMDB", afirma Pereira, professor da FGV e pesquisador do Brookings Institution, de Washington.

Negociações políticas invariavelmente implicam em cargos. Sem eles nada, ou muito pouco, é possível fazer, mesmo com a melhor das intenções. É verdade que há espaço para influenciar os rumos das políticas públicas mesmo sem ser detentor de uma cadeira de comando. A oposição pode pressionar. Há, fora da política institucional, espaço para ONGs, movimentos sociais, variados lobbies e intermediação de interesses. Mas a política profissional vive de cargos e sinecuras.

Com uma dose de realismo que apresenta a maquinaria política como se fosse geometria, os cientistas políticos Kaare Strøm e Wolfgang Müller fizeram famosa formulação sobre o assunto, no livro "Policy, Office, or Votes?: How Political Parties in Western Europe Make Hard Decisions" (1999).

Cargos, políticas públicas e votos são como vértices de um triângulo. Um sustenta o outro. Políticos precisam de cargos para implementar políticas públicas que lhe darão votos. Precisam de votos para terem cargos e fazer políticas públicas. E não podem abrir mão de realizarem políticas, sob pena de serem punidos, ficando sem votos e, logo, cargos.

É um circuito que se alimenta. O tamanho do ministério - o seu orçamento, o número de postos - é critério importante. Mas também se a área de atuação poderá manter e aumentar a base de sustentação do partido.

"Não é à toa, por exemplo, que o Ministério do Trabalho interesse tanto ao PDT, ligado aos sindicatos. Já o PMDB pode contentar seus financiadores de campanha ao dirigir uma Pasta como Transportes", afirma Argelina Figueiredo, professora do Iesp-Uerj e especialista nas relações Executivo-Legislativo.

O apetite, contudo, não pode ser maior do que o estômago. Difícil tachar o PSB de fisiologista porque está pedindo mais um ministério ou uma pasta de maior porte que a de Ciência e Tecnologia. O partido cresceu em relação aos outros sócios da coalizão vencedora.

Por outro lado, legendas como o PTB, que apoiou a oposição na disputa presidencial, e o PP, que se manteve neutro mas quase pulou a cerca, têm seu cacife ameaçado. O peso da bancada conta, mas não é tudo. Lealdade também.


Cristian Klein é repórter de Política.

Blocão indigesto:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Na convenção do PT que oficializou a candidatura de Dilma Rousseff, em junho, Lula, ao discursar, olhou para a futura presidente e para Michel Temer e disse que desejava a ambos a "mesma sintonia", a "mesma confiança total e absoluta" que ele e José Alencar tiveram a sorte de partilhar.

A frase, na ocasião, passou batida, mas registrei a cena no caderninho. Lula sabia com quem (e de que) estava falando. Soava como uma mistura de alerta e de ironia.

Confiança e sintonia são ingredientes ausentes da relação entre Dilma e Temer. Há, entre eles, uma dieta magra, uma tolerância desprovida de qualquer tempero, inversamente proporcional ao apetite que os mantém juntos à mesa.

Temer apoiou Alckmin em 2006. Era, até anteontem, um quase-tucano antipetista.

Lembre, também, que Dilma, no segundo turno, questionada por William Bonner no "JN" sobre as acusações de Ciro Gomes -"o PMDB é um ajuntamento de assaltantes" e Temer "o chefe dessa turma"-, se esforçou para salvar Ciro de si mesmo e simplesmente se esqueceu de defender no ar o partido e o vice.

É à luz desse histórico, nesse ambiente de respeito, de confiança e de sintonia, que deve ser vista a articulação do "blocão". Juntando-se à direita fisiológica na Câmara, gente da sua laia, o PMDB quis mandar um recado intimidador ao PT e à presidente eleita: continuamos iguais, temos fome, nem pense em diminuir nossa "Bolsa Poder".

É inimaginável que o deputado Henrique Eduardo Alves, pivô da opereta parlamentar, tenha atuado à revelia de Michel Temer. A questão parece ser só de divisão de tarefas: dublê de vice e de presidente do PMDB, Temer faz o "bom policial".

O "blocão" foi desativado, com a ação direta de Lula. Mas a manobra reitera a chantagem como método e deixa como saldo a dessintonia e a falta escancarada de confiança entre os aliados. Resta a dúvida: que padrão de relacionamento Dilma vai estabelecer com esse PMDB?

A luta continua:: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

CARTAGENA - Como alertara Ignacy Sachs à Folha.com, o mundo está sentado sobre duas bombas-relógios: os EUA e a China.

Com um argumento comercial, Celso Amorim analisa que os problemas brasileiros estão muito mais nos EUA que na China: o Brasil deve fechar o ano com um saldo positivo de cerca de US$ 7 bi com a China e com um deficit de US$ 5 bi com os EUA -o maior superavit norte-americano no mundo. Este, porém, é um corte de momento. A médio e longo prazo, o que se vê é um leão perdendo os dentes e um tigre cada vez mais voraz.

Os EUA são ainda uma potência, inequivocamente, mas exportaram uma crise financeira para todo o mundo e perderam 10 milhões de empregos em três anos. Seu futuro aponta para o declínio.

Na outra mão, a China continua em ascensão e atordoa pelo equilíbrio esquizofrênico entre economia e política e por sua ocupação de espaços sem limites. Exemplo: invadiu a África, rica em petróleo e minérios e pobre de todo o resto. Ali o acesso é fácil, e o lucro, garantido.

Até aqui, o Brasil se relaciona alegremente com a China nos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), satisfeito com os fantásticos superavits comerciais. Mas há o reverso da moeda: onde produtos chineses sobem, os brasileiros tendem a cair.

E a China está para dar mais um passo na sua estratégia de potência: até aqui, tem sido o oportuno comprador de matérias-primas; a partir de agora, vai passar não apenas a importar produtos mas a exportar fábricas. Vai comprar seus próprios produtos industrializados.

Já na primeira entrevista após a vitória, Lula e Dilma criticaram a "guerra cambial" dos EUA e da China. A crítica, que não é só do Brasil, não levou a nada concreto em Seul. Mas foi uma sinalização.

Os demais ricos e os emergentes vão se articular para impedir uma neobipolaridade mundial, agora entre os EUA e a China, com o resto pagando o pato. A luta continua.

Estratégias para um ajuste fiscal :: Paulo R. Haddad

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Quando um país precisa realizar um processo de ajuste fiscal, há algumas estratégias que têm sido concebidas para a sua implementação.

Há um tipo de estratégia que se poderia denominar de conformista ou convencional, em que se buscam trajetórias político-administrativas com menor intensidade de tensões e conflitos. Trata-se de promover cortes lineares nos diferentes programas, projetos ou atividades na escala necessária para atingir a meta fiscal, ou de atingir essa meta por meio de um aumento da carga tributária que trará os recursos necessários para a tesouraria do governo. Essa tem sido a estratégia mais praticada pelas autoridades econômicas brasileiras ao longo das últimas décadas, que respondem aos desequilíbrios orçamentários resultantes de uma aceleração nos gastos públicos por meio de uma repressão fiscal, via contingenciamento dos recursos programados, ou por meio de uma elevação da carga tributária (um novo imposto ou contribuição parafiscal, novas alíquotas dos tributos e taxas).

Uma estratégia mais avançada técnica e politicamente é a reprogramação dos gastos públicos por meio da formulação de um Orçamento de Base Zero. A função de reprogramação orçamentária consiste na desativação, na reordenação e na integração de programas e projetos que diferentes instituições do setor público vêm executando, de forma a redirecionar os recursos correspondentes a esses programas e projetos segundo as diretrizes propostas por novas estratégias de desenvolvimento. Até mesmo os gastos em programas com receitas vinculadas poderiam ser reestruturados em nível mais desagregado das características dos seus projetos e atividades.

Um orçamento plurianual de investimentos pode ser uma alternativa para orientar a reestruturação dos gastos públicos ao longo do tempo, por meio de mudanças nos orçamentos anuais. Normalmente, há uma forte tendência para que os orçamentos de cada ano sejam uma reprodução da estrutura de gastos do ano anterior, com pequenas alterações quanto à introdução de novas atividades ou projetos. Dessa forma, repete-se hoje o que se fazia ontem, e com grande chance de ser feito amanhã o que se propõe para hoje, sem uma perspectiva crítica da composição das despesas de custeio e de investimento, e de sua relação custo-benefício para a sociedade.

Como por trás de cada real de despesa pública há sempre um conjunto de interesses legítimos ou velados, regionais, locais, empresariais e burocráticos, as dificuldades podem ser tão intensas para realizar um Orçamento de Base Zero que talvez seja politicamente recomendável não mexer neste vespeiro.

Para uma estratégia intermediária entre uma solução preguiçosa de cortes lineares ou de aumentos questionáveis da carga tributária anticrescimento econômico e a solução radical do Orçamento de Base Zero seria a estratégia de jogos diferenciados de expansão dos diferentes componentes dos gastos públicos. Alguns desses componentes seriam desinflados por meio de taxas de crescimento negativas ou nulas; outros, ajustados apenas pelas taxas de inflação previstas, com crescimento real nulo; e, finalmente, áreas e setores prioritários teriam gastos públicos com taxas positivas e diferenciadas de crescimento.

Nessa estratégia, será possível costurar as metas do plano de desenvolvimento de médio e de longo prazos com os recursos orçamentários anuais e plurianuais. Por exemplo: é evidente que os recursos disponíveis (financeiros, materiais, institucionais, etc.) para áreas do governo federal que lidam com as crescentes e inquietantes questões do meio ambiente no País estão visivelmente subdimensionados para que essas áreas possam enfrentar os desafios dos processos da degradação dos ecossistemas e de desastres ecológicos emergentes para as atuais e futuras gerações. Da mesma forma, há diversos tipos de despesas públicas que, pela sua ineficiência e ineficácia, deveriam desaparecer ao longo do tempo, embora ganhem sobrevida impulsionadas por interesses menores das políticas clientelísticas.


Professor do IBMEC/MG, foi Ministro do Planejamento e da Fazenda do Governo Itamar Franco

Meirelles convidado :: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, foi convidado para permanecer no cargo. Segundo fontes do governo, o convite não foi feito em caráter provisório, de ficar só alguns meses. A conversa está em andamento, ele está inclusive fora do país, mas Meirelles só permanecerá se tiver garantias de ter a mesma autonomia que teve nos oito anos do governo Lula.

Logo no início do novo governo, o Banco Central pode ter que subir juros: a inflação está subindo aqui dentro e está aumentando muito os preços das commodities no mundo, indicando que pode estar se formando uma bolha. O Copom teria que elevar os juros para garantir o cumprimento da meta de inflação. Isso será um teste para o compromisso da presidente eleita, Dilma Rousseff, de defender a estabilidade como tem dito.

Fontes que acompanham a formação do novo governo garantem que o convite feito a Henrique Meirelles não foi por um tempo determinado. Mesmo se a intenção da presidente eleita for a de mantê-lo apenas pelo tempo de transição, o convite não foi feito nesses termos. Foi convidado a permanecer. O que está sendo conversado é que tipo de organização a presidente quer dar à área econômica. Há pressões para que Dilma mude a forma de atuação da equipe que vigorou até agora e que o Banco Central e o Ministério da Fazenda passem a atuar de forma conjunta na tomada de decisões. Se for isso, é o mesmo que decretar o fim da autonomia. Não existe meia autonomia, nem conciliação de posições no combate à inflação.

O assunto ficou em suspenso para conversas futuras, até porque Meirelles viajou para Frankfurt onde participou ontem de uma reunião de um grupo restrito de banqueiros centrais para discutir a crise mundial. Estão no encontro o presidente do Fed, Ben Bernanke, o presidente do Banco Central Europeu, Jean Claude Trichet, e o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Khan, além do presidente do Banco Central do Brasil. Durante a crise financeira que atingiu o mundo em 2008, o BC brasileiro ganhou mais projeção por ter sido apontado como um exemplo na administração de crises. Até o episódio Banco PanAmericano está sendo considerado no exterior um exemplo de como lidar com as incertezas do mercado financeiro, ainda que o problema não tenha derivado da crise.

O Banco Central no governo Lula enfrentou momentos de teste de autonomia várias vezes. Uma delas foi logo no início do primeiro mandato quando os juros foram elevados por duas reuniões seguidas, em uma delas a taxa subiu um ponto percentual. Outro momento decisivo foi no lançamento do PAC, anunciado como a garantia de aumento do ritmo de crescimento no segundo mandato. Na primeira reunião após o lançamento do PAC, o Banco Central subiu novamente os juros. Mesmo com todas as pressões e críticas, o presidente Lula não desautorizou o BC.

Será assim no governo Dilma? Não se sabe. O pensamento da presidente eleita é desconhecido nessa área, como de resto em várias outras áreas. A campanha não ajudou a esclarecer o que a presidente pensa a respeito de temas como política monetária, política cambial, relação de política fiscal com taxa de juros. Até agora ela tem feito as declarações previsíveis, do tipo: "vou manter o tripé macroeconômico", referindo-se ao trio superávit primário, metas de inflação e câmbio flutuante. Ou do tipo: "meu compromisso é com a manutenção da estabilidade", que não ajuda em nada porque ninguém em sã consciência diria que não manteria a estabilidade da moeda.

A confirmação do ministro Guido Mantega na Fazenda aumenta a incerteza em relação a esses compromissos. Se no Banco Central o governo Lula manteve a coerência de respeito à autonomia, no Ministério da Fazenda houve três fases. A primeira foi a de Antonio Palocci, de rigor fiscal e reformas microeconômicas. A segunda fase foi a do começo de Guido Mantega com afrouxamento fiscal e alguns retrocessos. A terceira é a iniciada na crise de 2008/2009 de aumento mais acelerado dos gastos, benefícios a setores escolhidos, perda de consistência e credibilidade dos indicadores fiscais com as manobras contábeis no superávit primário, e incentivo ao aumento da participação dos bancos estatais no mercado bancário e de crédito.

O fato de Meirelles ter sido convidado não significa que ele ficará. Fontes que participam das conversas de preparação do novo governo dizem que dificilmente ele aceitaria retroceder a uma situação em que o Banco Central teria que receber orientações sobre como conduzir a política monetária ou como perseguir a meta de inflação.

A situação internacional está se complicando visivelmente. Ontem, houve uma rara boa notícia: o sucesso da oferta inicial de ações (IPO) da General Motors, empresa estatizada durante a crise americana. Mas na Europa os sinais são de agravamento da crise. No front irlandês os bancos estão enfrentando uma corrida e é por isso que o governo admitiu precisar de socorro.

O dólar em queda livre, muita liquidez, uma crise de confiança em relação a bancos de alguns países europeus e a formação de bolha no mercado de commodities são confusão suficiente. Se não houver melhora a tempo, é com este pano de fundo que a nova presidente assumirá.

Sereias da democracia direta:: Editorial – O Globo

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou proposta de emenda constitucional permitindo que a realização de plebiscitos e referendos sobre temas de interesse nacional possa ser sugerida por iniciativa popular. A proposta, do senador Sérgio Zambiasi, causou polêmica entre os próprios integrantes da CCJ. O presidente da Comissão, senador Demóstenes Torres, mostrou-se preocupado com a possibilidade de a iniciativa diminuir a função parlamentar. Alertou ainda para o risco da promoção de referendos populares, o que poderia levar à revogação de leis aprovadas pelo Legislativo, provocando "insegurança jurídica terrível no país".

Pela Constituição, projetos de lei de iniciativa popular já podem ser encaminhados ao Congresso. A PEC aprovada agora estende essas prerrogativas a plebiscitos e referendos.

As preocupações do presidente da CCJ, partilhadas por senadores como Antônio Carlos Magalhães Junior, Valter Pereira e Romero Jucá, são perfeitamente cabíveis. O regime democrático, para funcionar, depende de uma delicada engenharia. Não por acaso, fez escola a sábia organização proposta por Montesquieu, em que há um corpo legislativo, um poder executivo e um judiciário que fiscaliza os outros. Mesmo com esses cuidados, a manobra é delicada e requer perícia.

Plebiscitos podem ser usados - e já foram - em momentos críticos da vida nacional. O mais famoso deles foi o que, no início dos anos 60, derrubou o sistema parlamentarista que emergira em consequência da renúncia de Jânio Quadros. Mas ali mesmo já se poderia verificar a dificuldade do processo: coube ao Executivo, interessado no presidencialismo puro, comandar uma campanha de cunho emocional que acabou condicionando a decisão popular.

Governos autoritários nunca deixaram de estar atentos a essas nuances. O regime chavista, na Venezuela, tem feito uso desses atalhos para ir cerceando a natureza democrática do regime. A opinião pública é sensível a climas passageiros, a mensagens de caráter populista.

Exatamente por isso existe o Congresso, que, eleito com intervalos razoáveis de tempo, não está tão sujeito a manipulações, inclusive porque tem a sua própria esfera de atuação.

Na PEC agora aprovada pela CCJ do Senado, fica estabelecido que propostas de plebiscito ou referendo devem ser encaminhadas ao Congresso, e dependem desse aval para chegarem ao eleitor (até agora, iniciativas desse tipo deviam partir do próprio Congresso). Aberto esse caminho, entretanto - que o relator da proposta, senador Antônio Carlos Valadares, define como "uma homenagem à democracia direta" -, alarga-se imensamente a abertura para os movimentos emocionais, sem esquecer a possibilidade (ou a probabilidade) de que esses movimentos tenham como origem o próprio Executivo, ou a parceria entre o Executivo e esta ou aquela corrente de opinião. Que condições teria o Congresso, nesse caso, de ignorar reivindicações apresentadas como "causas populares"?

É o caminho que descobriram, e vêm praticando, autocratas como o coronel Chávez. O que, como se sabe, não tem feito nenhum bem à Venezuela.

O voo dos tucanos para a oposição

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Tucanos acertaram que farão "oposição dura" ao novo governo e à presidente Dilma Rousseff

Christiane Samarco

BRASÍLIA - Com oito anos de atraso e a 43 dias do término do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o PSDB decidiu nesta quinta-feira, 18, que vai, enfim, bater no atual presidente. Na primeira reunião da Executiva Nacional do partido depois da derrota de José Serra na eleição presidencial, os tucanos também acertaram que farão "oposição dura" ao novo governo e à presidente Dilma Rousseff.

"Se em algum momento alguém do partido não fez a crítica devida a Lula, fará agora", anunciou o presidente nacional da legenda, senador Sérgio Guerra (PE), ao observar que a "atitude" de Lula na campanha "não foi democrática nem legal". Como a oposição minguou no Congresso, Guerra afirma que ela terá de ser "necessariamente" mais combativa.

O tucanato está convencido de que também contribuiu para a derrota a falta de militância. "Temos 30 mil filiados no Rio de Janeiro, mas se precisamos de militantes para trabalhar não juntamos 30", confessou Márcio Fortes, que já presidiu a legenda e participa da atual direção como membro do conselho fiscal.

O partido estima que tem 230 mil filiados, mas não sabe exatamente quem são nem onde estão. "É um cadastro morto, fictício", admitiu Guerra.

Precisamente por isso, as eleições prévias para escolher o candidato a presidente nunca foram cogitadas com seriedade no PSDB. A despeito da disputa interna entre Serra e o agora senador eleito Aécio Neves, o tucanato sabia que o partido não estava organizado para realizar prévias entre filiados.

Agora, no entanto, a meta é chegar à eleição municipal de 2012 com o candidato à eleição presidencial de 2014 escolhido. E, para que isso se torne possível, o partido terá de ser reestruturado a partir dos municípios. O objetivo é refazer e ampliar o cadastro de filiados até 20 de março, quando haverá eleição para os diretórios municipais. As eleições dos diretórios regionais e nacional também já estão agendadas para 17 de abril e 29 de maio.

PSDB quer lançar presidenciável já em 2012 e sem parceria com DEM

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Raquel Ulhôa De Brasília

A cúpula do PSDB quer um plano de reestruturação partidária que reforce suas bases nos municípios e resulte no lançamento de uma pré-candidatura consensual a presidente já em 2012, quando se pretende que o escolhido comece a circular pelo país. De preferência, sem a parceria do Democratas na chapa. Os tucanos torcem para que o DEM firme-se como um partido de direita - como seus próprios dirigentes têm defendido -, e lance candidato próprio em 2014, para uma aliança apenas em eventual segundo turno.

Sem a presença dos ex-governadores José Serra e Aécio Neves, eleito senador por Minas Gerais, a Comissão Executiva Nacional do PSDB reuniu-se ontem pela primeira vez após as eleições. Decidiu-se que o partido precisa se reorganizar, se democratizar, recadastrar seus filiados e mobilizar militantes nos municípios, mas precisa também de uma atuação mais firme como oposição.

"O eleitorado que votou com a gente exige do partido mais identidade, transparência e firmeza. Se em algum momento não foi feita crítica ao presidente Lula, será feita agora", disse o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), eleito deputado federal. A convergência com o DEM na atuação no Congresso será "compulsória", segundo ele. No mais, os dois partidos vivem "processos diferentes", diz.

As convenções municipais, estaduais e nacional, para a troca dos comandos partidários, foram marcadas para março, abril e maio, respectivamente. Segundo os participantes da reunião de ontem, a tendência atual é que Guerra seja mantido na presidência. "Nas eleições, ele foi muito importante na interlocução entre Aécio e Serra e para aparar arestas dentro do partido", disse a senadora Marisa Serrano (MS), vice-presidente do PSDB.

A questão da eleição do novo comando partidário, no entanto, não esteve na pauta de ontem. A determinação é evitar qualquer assunto que possa dividir o partido. Os tucanos não acreditam que Serra queira assumir o cargo. Aliás, não se sabe ainda qual o papel que o ex-governador terá no partido - descartam uma nova candidatura a presidente. Hoje, o favorito para disputar a Presidência da República em 2014 é mesmo Aécio.

Até lá, no entanto, o partido precisa ser "repensado", alertou na reunião o deputado Valter Feldman (SP). "Falta o debate de ideias e caminhos", disse. O presidente do Instituto Teotonio Vilela (ITV), Luiz Paulo Veloso Lucas, afirma que o eleitorado que votou em Serra quer que o PSDB aponte os erros do governo Lula. Segundo ele, um plano audacioso será lançado para fazer o partido crescer e as prévias "serão organizadas e passarão a ser instância decisória daqui para a frente".

O governador reeleito de Alagoas, Teotonio Vilela, vai reunir os governadores tucanos para discutir uma pauta conjunta, como a posição a ser tomada com relação à criação de novo imposto para financiar a saúde. "Que a saúde de Alagoas ganharia com a CPMF, ganharia. Mas minha posição vai ficar em sintonia com a dos outros governadores", disse Teotonio. Embora interesse ao Estado, ele reconhece que, se o PSDB apoiar a recriação de um imposto sobre movimentação financeira, será uma incoerência, já que a derrubada da CPMF foi uma das maiores vitórias da oposição no Congresso.

Uma das providências para fortalecer a sigla será recadastrar os filiados. No papel, o PSDB tem 230 mil filiados. Mas o número está longe da realidade, segundo os próprios dirigentes.

Justiça afasta da Anatel indicado de Lula

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Sindicalista José Zunga, amigo do presidente, é funcionário da Oi; membro da agência não pode ter vínculo com teles

Desde 2008, Zunga é "representante da sociedade civil"; ele levou filho de Lula a Portugal Telecom

Andreza Matais e José Ernesto Credendio

BRASÍLIA - A Justiça Federal determinou à Anatel o afastamento imediato do sindicalista José Zunga Alves de Lima do conselho consultivo da agência.

Zunga foi indicado ao cargo em março de 2008 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem é amigo pessoal, como representante da "sociedade civil" mesmo sendo funcionário da Oi.

Segundo a ação do Ministério Público Federal, houve irregularidade na nomeação de Zunga, uma vez que a agência tem como atribuição administrar conflitos de interesse entre empresas e usuários, tarefa que exige autonomia e independência em relação ao mercado.

Como houve recurso da Anatel e do sindicalista, Zunga continua no cargo até a decisão final da Justiça. Na época da nomeação, ele era assessor técnico do Projeto Educação Digital da então BrT (Brasil Telecom).

O conselho consultivo da Anatel é uma exigência da Lei Geral das Telecomunicações, de julho de 1997, e tem a atribuição de opinar, antes do encaminhamento ao Ministério das Comunicações, sobre os planos de outorgas e de metas para universalização de serviços e outras políticas do setor. Não há remuneração.

O órgão é composto por 12 integrantes, divididos entre representantes do Executivo, do Senado, da Câmara dos Deputados, da sociedade, dos usuários e das concessionárias de telefonia.

Oficialmente, o nome de Zunga foi indicado em lista tríplice encaminhada a Lula pelo Instituto Observatório Social de Telecomunicações, na cota de representantes da "sociedade civil". A ONG é presidida por ele mesmo.

O sindicalista tomou posse quando o conselho discutia mudanças no Plano Nacional de Outorgas, proposta aprovada em novembro de 2008. Foram essas mudanças que deram amparo à polêmica fusão Oi-BrT.

Amigo de Lula e personagem ativo da campanha de Dilma Rousseff, Zunga costuma atualizar o presidente sobre assuntos da Anatel.

GAMECORP

Em agosto de 2009, o sindicalista chegou a acompanhar Fábio Luis Lula da Silva, filho do presidente, e dois sócios dele à sede da Portugal Telecom. Foram conhecer possíveis novos negócios da Gamecorp, empresa de Fábio Luis, na internet.

A Anatel foi notificada da decisão judicial em 6 de outubro, três dias depois do primeiro turno da eleição.

A Folha apurou que a agência tratou o assunto como sigiloso e decidiu ingressar somente na semana passada contra a decisão para evitar mais desgastes à campanha de Dilma, que já sofria abalos naquela ocasião.

A Justiça determinou ainda que, a partir de agora, União e Anatel devem exigir de todos os candidatos ao conselho consultivo "comprovação de que não são sócios nem possuem vínculos empregatícios com empresas de telecomunicação".

Mantega aceita convite de Dilma e fica na Fazenda

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Conforme a Folha antecipou, presidente eleita atendeu a Lula e manteve ministro no cargo; petista tenta definir chefia do BC

O ministro Guido Mantega aceitou continuar à frente do Ministério da Fazenda depois de ser convidado pela presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), conforme a Folha antecipou. O convite para a permanência foi feito ontem de manhã, em reunião na Granja do Torto que durou duas horas e meia.

A decisão de deixar Mantega no comando da economia tem influência direta do presidente Lula, que pediu sua permanência antes mesmo do primeiro turno e reforçou a recomendação na terça. O ministro vai ter de encontrar formas de amenizar o impacto da forte entrada de dólares no país.

Nos próximos dias, Dilma priorizara a busca de presidente para o Banco Central. A eleita quer fechar a equipe econômica e evitar especulações do mercado; até definir a chefia do BC, não fará anúncio oficial.

Mantega aceita convite de Dilma e ficará na Fazenda

Acerto foi feito ontem pela manhã durante reunião na Granja do Torto

Anúncio oficial do time econômico será feito de uma só vez e depende de presidente eleita achar nome para comandar BC


Natuza Nery e Sheila D’Amorim

BRASÍLIA - O ministro Guido Mantega aceitou continuar à frente do Ministério da Fazenda depois de ser convidado pela presidente eleita, Dilma Rousseff, como a Folha revelou ontem, com exclusividade. O convite foi feito ontem, após reunião que durou duas horas e meia.

A decisão de deixar Mantega no comando da economia do país tem influência direta do presidente Lula, que pediu pela permanência do auxiliar antes mesmo do primeiro turno e reforçou a recomendação na terça-feira.

Nos próximos dias, a petista concentrará energia na busca de um presidente para o Banco Central (a manutenção de Mantega no gabinete reforça as chances de Luciano Coutinho seguir no BNDES).

Quer resolver o time econômico e evitar especulações do mercado financeiro, que é sensível a esse tipo de indefinição. Até encontrar um nome, não fará anúncio oficial.

Um dos desafios imediatos de Mantega é encontrar formas para amenizar o impacto da forte entrada de dólares no país e uma consequente valorização do real -lógica nociva à competitividade das exportações brasileiras.

Com a Fazenda resolvida, o BC é o único nó da equipe econômica do novo governo.

Segundo a Folha apurou, Dilma ainda não encontrou um nome ideal para o comando posto. Uma possibilidade é optar por uma solução caseira: manter Henrique Meirelles no cargo ou promover Alexandre Tombini (diretor de Normas do BC), encaixando Meirelles em outro ministério, como ele deseja.

Dilma também analisa nomes do setor privado. Dois já circularam na equipe de transição: Octavio de Barros, diretor do Bradesco, e Fábio Barbosa, presidente da Febraban e do Santander.

Lula sugeriu em ao menos duas oportunidades a permanência de Meirelles, mas Dilma é resistente à ideia. Ela tem dito a interlocutores que quer trocar a chefia da autoridade monetária.

O certo é que formalizará o time econômico de uma só vez, incluindo o titular do Ministério do Planejamento. Há hoje dois fortes cotados: Nelson Barbosa (secretário de Política Econômica da Fazenda) e Miriam Belchior (da Casa Civil). A pasta deve receber a gestão do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Mantega iniciará em janeiro seu novo ciclo na Fazenda tendo de mexer em algumas áreas. Na hipótese provável de perder Barbosa, tido como um dos principais formuladores da pasta, terá de achar substituto à altura.

Precisará ainda ocupar a Secretaria do Tesouro, hoje sem um sucessor natural, e a Receita Federal, cujo titular, Otacílio Cartaxo, está desgastado com os vazamentos de dados sigilosos de pessoas ligadas ao PSDB na eleição.

Se a dobradinha Mantega-Meirelles continuar, Dilma terá cedido a Lula e manterá a rivalidade que dominou o segundo mandato. A diferença é que, já no início do governo, a área econômica se confrontará com desafios importantes, como conciliar o crescimento com um ajuste nas contas públicas.

Em homenagem no Rio, a economista Maria da Conceição Tavares elogiou ontem a permanência de Mantega no cargo. Destacou, porém, que no governo de Dilma haverá mais ingerência sobre a política econômica.

"Não importa quem será o ministro da Fazenda. Ela [Dilma] pode operar por cima e propor as medidas cabíveis", afirmou.

Colaborou Márcio Falcão, de Brasília

Nomeação ainda não define como será a política econômica

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Vinicius Torres Freire

Guido Mantega no comando do Ministério da Fazenda do governo Dilma Rousseff pode dar a impressão de que tudo ficará como dantes no quartel da economia, mas ainda não é possível dizê-lo.

É agora possível dizer apenas que a presidente eleita aprova mais uma política Mantega do que uma política Antonio Palocci. Mas não seria preciso ver Mantega reconduzido ao posto para afirmar tal coisa. Dilma entrou em conflito com o paloccismo quando ainda ministra.

Mas a recondução do ministro diz muito pouco sobre o futuro da política econômica de Dilma. A indefinição permanecerá até a presidente eleita tomar a decisão, crucial, do que fará a respeito do gasto federal. As demais políticas serão decorrência dessa decisão, da qual depende o futuro da taxa de juros, do câmbio e do investimento.

Em segundo plano, mas ainda importante, serão as decisões sobre o comando do Banco Central: nomes e modus operandi. Não se trata apenas de saber se Henrique Meirelles ficará na presidência do BC ou se será substituído pelo seu segundo, Alexandre Tombini, atual diretor de Normas. O nome apenas do novo presidente BC também não diz muito.

Meirelles aos poucos mudou o modo de gerir o BC e de escolher seus quadros. Em seu "primeiro reinado", teve diretores mais próximos do mercado ou daquilo que se entende como "economistas padrão". No terço final do governo Lula, Meirelles nomeou diretores mais pragmáticos. Por determinação de Lula, houve menos conflito político entre BC e Fazenda.

Seja nomeado Meirelles, Tombini ou um terceiro, importa muito saber que tipo de pressão haverá do governo sobre o BC e que tipo de coordenação haverá entre Fazenda e autoridade monetária.

E coerência na política econômica foi coisa que quase inexistiu nos anos Lula, o que custou caro ao país.

Dilma convida, mas Meirelles só fica com autonomia no BC

DEU EM O GLOBO

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, foi convidado a permanecer no cargo no governo Dilma, informa Miriam Leitão em sua coluna. A conversa está em andamento, mas Meirelles, que se encontra em Frankfurt em reunião sobre a crise mundial, já avisou que só permanecerá se a instituição que dirige tiver a mesma autonomia com que atuou nos oito anos de governo Lula. No início do próximo ano, o BC pode ser obrigado a subir juros para cumprir a meta de inflação, e isso será um teste para as promessas da presidente eleita, Dilma Rousseff, de defesa da estabilidade. A confirmação de Guido Mantega na Fazenda aumenta a incerteza em relação a esses compromissos. Há pressões para que Dilma mude a forma de atuação da equipe que vigorou até agora, e para que BC e Fazenda passem a atuar de forma conjunta – o que significaria o fim da autonomia. Nessa hipótese, Meirelles recusaria o convite. Já estão definidos pelo menos outros cinco nomes da equipe de Dilma, ainda com postos a decidir: Antonio Palocci e Paulo Bernardo, que ficariam no Planalto; José Eduardo Cardozo, que assumiria a Justiça; e Aloizio Mercadante e Gilberto Carvalho.

O núcleo duro de Dilma

Presidente eleita mantém Mantega e define cinco nomes do PT para o governo

Maria Lima, Gerson Camarotti e Martha Beck

Além da permanência do ministro da Fazenda, Guido Mantega, acertada na viagem de volta da Coreia do Sul, a presidente eleita Dilma Rousseff já definiu que pelo menos outros cinco nomes do PT vão integrar a linha de frente de seu governo, com cargos de ministros. Em encontro de mais de duas horas ontem na Granja do Torto, Dilma e Mantega discutiram nomes para o segundo escalão da Fazenda. Na lista dos petistas já com cargos assegurados no novo governo estão o deputado Antonio Palocci (PT-SP), que vai ocupar função de destaque no Palácio do Planalto, e o ministro Paulo Bernardo (Planejamento), que também irá para o Planalto. O deputado José Eduardo Cardozo (SP) será ministro da Justiça. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho serão ministros, mas sem pastas ainda definidas.

Esse núcleo duro do governo Dilma foi construído em sintonia com o presidente Lula, na semana passada, quando ainda estavam na Coreia do Sul, junto com Mantega, para a reunião de cúpula do G-20. E também esta semana em um encontro de mais de três horas no Palácio da Alvorada, do qual também participou Palocci. Embora nem todos os cargos estejam definidos, esses nomes já foram escolhidos.

Pela primeira vez, três semanas da eleição, Dilma disse a interlocutores que Palocci vai acompanhá-la no Planalto. Não há mais resistências ao nome dele, que chegou a ser visto no primeiro momento como uma possibilidade de "sombra" para a presidente eleita. Ainda não há definição do cargo de Palocci, mas pode ser o comando da Secretaria Geral da Presidência.

Palocci e Paulo Bernardo ficam no Planalto

Para fazer dobradinha com Palocci, Dilma puxará Paulo Bernardo. Para seu lugar no Planejamento, Dilma pode indicar Miriam Belchior, coordenadora do PAC. Mantendo o PAC no Planalto, como é hoje, Mercadante iria para o Planejamento. E Miriam não seria ministra. O senador pode ir também para os ministérios da Educação ou de Ciência e Tecnologia.

Já Gilberto Carvalho exercerá o papel de interlocutor com os movimentos sociais, hoje ocupado pelo secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, mas não necessariamente neste cargo. Sua permanência no Planalto foi uma das primeiras sugestões de Lula a Dilma, depois da defesa que fez de Guido Mantega.

Lula já tinha antecipado em Seul que Mantega ficaria, quando, em entrevista, cometeu o ato falho de dizer que o titular da Fazenda estaria na próxima reunião do G-20, que só vai ocorrer no próximo ano. Com Mantega no cargo, Dilma, na prática, terá o comando da Fazenda e influência direta nas escolhas dos principais cargos do ministério.

Após o longo encontro da Granja do Torto, o ministro da Fazenda manteve silêncio sobre o convite de Dilma. De volta ao ministério, se limitou a dizer a assessores que ela pediu uma avaliação sobre a economia em geral e sobre o comportamento das receitas e das despesas. Questionado sobre a transição de governo e sobre se o ministro da Fazenda Guido Mantega permaneceria na nova equipe, o ministro Paulo Bernardo disse que "não era ninguém para dar palpite", e que não tinha nenhuma expectativa de continuar no governo de Dilma.

- Eu acho que ela deveria renovar o máximo possível. Afinal, é um outro governo. Se têm ministros que acham que têm direito adquirido de permanecer, tudo bem. Mas então ela não vai poder escolher ninguém - disse o ministro, que completou dizendo que "ficaria contente" se recebesse um convite para ficar.

- O que não quer dizer que eu aceite.

Assessores do ministro, no entanto, consideram sua permanência como certa. Mantega, que não costuma fugir da imprensa, preferiu entrar no ministério pela garagem.

Na primeira grande reunião temática da transição, em que escolheu as políticas sociais como tema, Dilma reafirmou o compromisso de aumentar em mais de 1 milhão de famílias os beneficiários do Bolsa Família.

- Resolvemos começar o trabalho da transição pela erradicação da miséria, porque é nosso compromisso fundamental. O grande desafio é dar um salto em cima da herança bendita. A herança bendita tem sempre um grande peso e deve ser honrada - afirmou Dilma, segundo assessores, em discurso na reunião.

Nos bancos estatais, sem trocas bruscas

DEU EM O GLOBO

Dilma deve manter, a curto prazo, presidências do BB e da Caixa, para evitar disputas

Patrícia Duarte e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA. Envolvida com a definição do primeiro escalão da equipe econômica, a presidente eleita, Dilma Rousseff, também já está tratando da sucessão nos bancos estatais, mas com a estratégia de evitar mudanças bruscas a curto prazo. O objetivo é tirá-los, pelo menos por enquanto, da disputa política por esses cargos que envolve, sobretudo, os dois principais partidos da base governista: o PT e o PMDB. Com isso, está praticamente acertada a permanência de Maria Fernanda Coelho na Presidência da Caixa Econômica Federal (CEF) e de Aldemir Bendine na Presidência do Banco do Brasil (BB), mesmo que temporariamente.

Maria Fernanda tem a simpatia do presidente Lula e de Dilma e deve ficar no comando da CEF por tempo indeterminado. A recente compra de 35% do capital total do Banco PanAmericano, controlado pelo Grupo Silvio Santos e que quase quebrou por causa de um rombo de R$2,5 bilhões, incomodou o alto escalão do governo, mas não a ponto de enfraquecer a executiva, que assumiu a CEF em março de 2006. A avaliação que a equipe da presidente Dilma faz é de que Maria Fernanda, com excelente trânsito no PT, tem realizado um bom trabalho.

Já no BB, a permanência de Bendine à frente da maior instituição financeira do país, com ativos que encostam em R$800 bilhões, ganhou mais força nos últimos dias. Mesmo que ela seja por tempo determinado, a tendência é que ele fique no cargo no início do governo Dilma.

A estratégia de "poupar" os bancos estatais, pelo menos por enquanto, teria também a aprovação do ministro Guido Mantega (Fazenda), que deve permanecer no cargo. Foi ele, inclusive, que colocou Maria Fernanda e Bendini na presidência dos bancos.

Dilma tem dito que não quer "imagem de governo velho"
Determinada a acelerar investimentos, a presidente eleita está definindo postos-chave da área econômica tendo como base perfis mais desenvolvimentistas. Mesmo mantendo nomes do governo Lula, Dilma tem dito a interlocutores que "não quer ficar com a imagem de governo velho". As mudanças ocorrerão principalmente para atender a seu pensamento mais voltado ao desenvolvimento e que não combina com nomes da equipe atual - que privilegiam propostas de contenção de gastos.

Além de definir o comando dos bancos oficiais e de estatais, com destaque para a Petrobras, Dilma quer influenciar na provável troca de comando na companhia Vale. Segundo interlocutores, ela gostaria de ter na empresa - que é privada, mas tem forte participação de fundos de pensão de empresas estatais - alguém com "trânsito em Brasília". O PT, claro, luta para influenciar numa eventual troca de comando da Vale, o que ocorreria em negociações políticas dos fundos de pensão.

Na bolsa de apostas no governo e na equipe de transição, Luciano Coutinho, atual presidente do BNDES, por exemplo, seria um nome bem visto para um posto na Vale. Mas ele deverá ficar no banco porque há temores que o PMDB brigue pela vaga se ele sair do cargo, já que Coutinho é ligado ao partido.

O BB também sempre foi alvo, desde o início do governo Lula, de disputa política entre o PT, e seus diversos grupos, e o PMDB. Mesmo com o plano pré-definido por Dilma, a briga nos bastidores pelo cargo continua. Bendine estaria trabalhando o nome do atual vice-presidente de Varejo, Alexandre Abreu, com perfil mais técnico, para sucedê-lo. Do outro lado, e com maior proximidade ao PT, vem o vice-presidente de Tecnologia, Geraldo Dezena da Silva.

OCDE quer fim de estímulos no Brasil

DEU EM O GLOBO

Entidade, preocupada com pressão inflacionária, prevê PIB de 7,5%

PARIS. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sugeriu que o Brasil suspenda os "estímulos fiscais o mais rápido possível" para evitar pressões inflacionárias. Segundo relatório divulgado ontem, a organização prevê que o país fechará o ano com um crescimento de 7,5% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), apesar da desaceleração da atividade econômica registrada a partir do segundo trimestre. A previsão anterior era de uma expansão de 6,5% do PIB este ano e de 4,3% em 2011, número que foi mantido agora.

A forte expansão econômica em 2010 se deve principalmente a estímulos governamentais, segundo a OCDE, que espera ainda um crescimento de 5% em 2012. Já quanto à inflação, a OCDE prevê que a taxa supere a meta de 4,5% nos próximos anos, com a retomada da atividade econômica e o fim dos efeitos da recente apreciação do real. O grupo prevê uma inflação de 5,6% este ano, 5,3% em 2011 e 5,1%, em 2012.

Apesar de a economia brasileira ter esfriado o ritmo após o primeiro trimestre, a OCDE espera que haverá uma retomada do crescimento, puxada pelo aumento da renda e a expansão do crédito, que sustentam o consumo interno. Além disso, projetos de infraestrutura devem trazer um estímulo a mais. Ao mesmo tempo, o Banco Central suspendeu o aperto monetário para evitar maior desvalorização do real. Isso agora deve ser melhor calibrado, sugere a OCDE para evitar risco inflacionário.

Para o resto do mundo, a OCDE manteve a projeção de crescimento de 4,6% em 2010, mas reduziu a projeção de 2011 de 4,5% para 4,2%. Os EUA devem crescer 2,7% este ano e não 3,2%, como previra antes. Os demais países desenvolvidos experimentarão expansões desiguais.

Bernardo: mínimo é decisão de Lula

DEU EM O GLOBO

Ministro insiste no valor de R$540, e centrais voltam a cobrar R$580

SÃO PAULO e BRASÍLIA. A decisão sobre o valor do salário mínimo em 2011 está nas mãos do presidente Lula, sinalizou ontem o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Em reunião com centrais sindicais, ele defendeu manter o critério de reajuste, com o mínimo em R$540. Os sindicalistas insistem em R$580.

Para o ministro, o critério atual (correção pela inflação mais crescimento do PIB de dois anos anteriores) é "vitorioso". As centrais, que pleiteiam R$580 por conta do PIB negativo em 2009 com a crise global, querem excepcionalmente para 2011 garantia de aumento real.

O ministro disse que não está em pauta alterar o critério e que é "arriscado" definir algo.

- Não temos pretensão de fazer isso. O presidente Lula disse que vai consultar a presidente eleita Dilma Rousseff. Se houver desejo de inflexão, como pretendem as centrais sindicais, vamos fazer as contas e examinar, mas a decisão é do presidente - afirmou Bernardo.

O presidente da CUT, Artur Henrique, justificou que "a grande maioria das categorias teve aumento acima da inflação". O ministro da Previdência Social, Carlos Eduardo Gabas, explicou que um aumento maior impacta as contas da Previdência. Nas negociações na Comissão Mista de Orçamento, o número articulado é R$560. O teto da área econômica é R$550, apesar dos discursos em contrário.

As centrais incluíram na pauta a correção da tabela do Imposto de Renda. Segundo o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva, os sindicalistas disseram que, sem correção, o aumento do mínimo poderá ser anulado pelo desconto no IR. Bernardo disse que o assunto precisaria ser analisado.

PSDB articula frente contra volta da CPMF

DEU EM O GLOBO

Presidente do partido diz que será preciso fazer uma "verdadeira oposição" e que polêmicas internas serão alvo de prévias

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Na primeira reunião da Executiva Nacional do partido após a disputa presidencial, o PSDB reafirmou ontem o propósito de usar sua força nos estados para consolidar uma agenda de oposição. A ideia é reunir na próxima semana os oito governadores tucanos, possivelmente em Alagoas, para discutir essa agenda e tentar fechar uma posição sobre a recriação da CPMF.

O grupo definiu também o calendário de reestruturação dos diretórios do partido, rumo às eleições de 2012, e sinalizou que, a partir de agora, decisões polêmicas serão resolvidas por meio de prévias. A Executiva decidiu ainda não dar trégua ao futuro governo Dilma Rousseff no Congresso, apesar de suas bancadas reduzidas na Câmara e no Senado.

- Vamos fazer uma verdadeira oposição. O eleitorado que votou conosco fez duras críticas ao governo e até ao presidente Lula. E essa gente exigirá de nós firmeza e transparência. Até por ter perdido vagas no Congresso, a oposição terá de ser mais combativa do que foi até agora - disse o senador Sérgio Guerra (PE), presidente do PSDB.

O governador reeleito de Alagoas, Teotonio Vilela, disse que mais verbas para a saúde seriam muito bem-vindas no seu estado, mas admitiu que seguirá a posição da maioria no PSDB:

- A CPMF será um dos assuntos de que vamos tratar. Quero ouvir melhor o partido e meus colegas governadores, para não ficar cada um para um lado. Que a saúde de Alagoas ganharia com a volta da CPMF, ganharia. Mas minha posição vai estar em sintonia com a dos demais governadores - disse Teotonio.

O governador alagoano admitiu a dificuldade que o PSDB teria para apoiar a volta da CPMF. A derrubada da contribuição em dezembro de 2007 é apontada como a única grande derrota imposta pela oposição ao governo Lula em oito anos. Ainda mais que uma das preocupações dos tucanos agora é manter sintonia com os 45% de eleitores que votaram Serra.

- Quase metade do eleitorado nacional se identificou conosco. Por isso, temos de fazer oposição e organizar o partido como algo permanente, sinalizando que ele é maior do que a eleição. Criar mais um imposto agora é igual a dar leite condensado para um doente diagnosticado com obesidade mórbida - afirmou o presidente do Instituto Teotonio Vilela (ITV), deputado Luiz Paulo Velozo Lucas (ES).

Os integrantes da Executiva Nacional anteciparam que futuras disputas, como a pela vaga de candidato à Presidência em 2014, deverão ser dirimidas por prévias.

- As prévias passarão a ser uma instância decisória daqui para a frente - confirmou Velozo Lucas.

Sindicatos pressionam por correção do IR

DEU EM O GLOBO

Sem ajuste, trabalhadores com aumento salarial entre 8% e 11% este ano perderão ganho, argumentam centrais

Karina Lignelli

SÃO PAULO. As centrais sindicais vão pressionar o governo pela correção da tabela do Imposto de Renda (IR). A reivindicação foi apresentada ontem, em reunião das centrais com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que discutiu a correção do salário mínimo em São Paulo.

Entre os anos de 2007 e 2010, a tabela do IR foi corrigida em 4,5% ao ano, mas termina este ano o compromisso do governo de repor parte das perdas provocadas pela inflação na renda dos trabalhadores que precisam acertar as contas com o Leão. A prorrogação ou não das correções deve ser incluída na pauta da equipe de transição do governo.

No encontro com Paulo Bernardo, ontem, os sindicalistas argumentaram que, se não houver correção da tabela do Imposto de Renda em 2011, os trabalhadores que tiveram reajustes salariais entre 8% e 11% este ano acabariam perdendo esse aumento.

De acordo com Miguel Torres, representante da Força Sindical e presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, muitos trabalhadores vão perder a isenção ou passar para uma faixa com alíquota maior para o desconto do Imposto de Renda.

- Pelo menos 29 milhões de trabalhadores ganham até três salários mínimos. Então, uma boa parte disso vai perder o aumento que foi conquistado nas negociações. Precisamos pensar num número que corresponda à nova realidade da inflação - disse Torres.

Ao final do encontro, Paulo Bernardo e o ministro da Previdência Social, Carlos Eduardo Gavas, comprometeram-se a retomar a discussão do tema nos próximos encontros que terão com as centrais sindicais.

Apesar de correções, defasagem é de 64,1%

Mesmo com as correções de 2007 a 2010, a defasagem da tabela ainda está em nada menos que 64,1% frente a 1995, segundo cálculos do Sindicato Nacional dos Auditores da Receita Federal (Sindifisco Nacional). Essa defasagem faz com que o contribuinte pague até 800% a mais de imposto do que pagaria caso a tabela tivesse sido integralmente corrigida desde 1995, calcula o Sindifisco. E, se a tabela não for corrigida em 2011, o IR a pagar será ainda maior.

Caso Celso Daniel: após 8 anos, a 1ª condenação

DEU EM O GLOBO

O primeiro dos sete acusados da morte de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André, em 2002, foi condenado a 18 anos de prisão. Marcos Roberto Bispo dos Santos dirigia um carro usado no crime. Para a acusação, a morte foi tramada por um assessor de Daniel que desviava verba para fins pessoais e para a futura campanha de Lula.

Réu é condenado pela morte de Celso Daniel

Oito anos depois do crime, primeiro acusado é julgado e recebe pena de 18 anos de prisão; defesa promete recorrer

Sérgio Roxo

ITAPECERICA DA SERRA (SP). Primeiro réu a ser levado a julgamento pela morte do então prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), em 2002, Marcos Roberto Bispo dos Santos, o Marquinhos, foi condenado ontem a 18 anos de prisão, em Itapecerica da Serra, na Região Metropolitana de São Paulo. Os sete jurados aceitaram a tese do Ministério Público de que o assassinato foi cometido por encomenda de um ex-assessor do prefeito. O ex-assessor desviava dinheiro da prefeitura para a campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva daquele ano, o que elevou a pena do acusado. A defesa prometeu recorrer.

Marquinhos, que segundo a denúncia do MP dirigia um dos carros usados para capturar Daniel em São Paulo, no dia 18 de janeiro de 2002, não compareceu. Ele é considerado foragido da Justiça. O prefeito foi achado morto com oito tiros em Juquitiba, cidade vizinha a Itapecerica da Serra, dois dias depois.

Como os jurados aceitaram as duas qualificadoras para o crime - o pagamento pelo assassinato e a impossibilidade de defesa da vítima - a pena mínima era de 12 anos; mas o juiz Antonio Hristov disse que elevou a condenação devido à grande repercussão do caso e pelo fato de o prefeito ter ficado mais de 24 horas em cativeiro, antes de morrer.

- A vítima era uma pessoa eminente, cotada para ser ministro de Estado (no governo Lula) - disse o magistrado.

No julgamento, o promotor Francisco Cembranelli afirmou que o prefeito foi morto por encomenda de Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, seu assessor, para que não tomasse providências contra a ação de uma quadrilha que praticava crimes de corrupção contra a administração municipal petista.

Oito pessoas faziam parte da quadrilha

Para Cembranelli, os recursos arrecadados por meio de extorsão a fornecedores da prefeitura se destinavam a contas pessoais de envolvidos, entre eles Sombra, e ao PT, que buscava financiar a campanha presidencial, "de grande porte que se avizinhava", de Lula.

O promotor frisou que Daniel "tinha conhecimento do esquema". Nomeado coordenador da campanha de Lula, ele, segundo o promotor, incomodou-se ao perceber que "algumas pessoas não possuíam ideologia partidária nenhuma" e usavam o dinheiro arrecadado para enriquecer. De acordo com Cembranelli, quando passou a estudar medidas para coibir a ação da quadrilha, o prefeito se tornou um "obstáculo" e por isso foi "engendrada uma trama macabra para liquidá-lo".

Na versão narrada pelo Ministério Público, Sombra acionou uma quadrilha para executar o crime, da qual Marquinhos fazia parte, além de, pelo menos, mais sete pessoas. Dessas, uma era menor, outra foi morta na cadeia e os outras cinco ainda devem ser levadas a julgamento, assim como Sombra. Marquinhos foi julgado isoladamente ontem porque foi o único réu a não recorrer da sentença que o mandou a júri popular.

Cembranelli disse acreditar que a decisão de ontem pode ajudar nos demais julgamentos, previstos para acontecerem a partir de 2012:

- A versão do Ministério Público, que é a verdadeira, começou a ser apresentada hoje à sociedade e o seu acolhimento, com a consequente condenação do acusado Marcos Bispo, mostra que o caminho é esse mesmo.

Sombra nega participação no assassinato do prefeito

Sombra, que está em liberdade, nega participação no crime. Um observador do escritório de Roberto Podval, advogado do ex-assessor de Daniel, acompanhou o julgamento de ontem.

A defesa de Marquinhos afirmou em plenário que não havia provas contra ele, e que a confissão feita pelo réu no inquérito da Polícia Civil foi obtida mediante tortura. Em juízo, Marquinhos mudou sua versão e negou participação no caso. O advogado dele, Adriano Marreiro dos Santos, contestou a argumentação do Ministério Público de que a presença do então deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT) nos depoimentos policiais reforçaria as confissões. O defensor disse que o réu Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira, o Bozinho, acusou Grenhalgh de participar das sessões de tortura.

Marquinhos já passou quase oito anos na cadeia, mas foi solto, ao conseguir liberdade provisória na Justiça. O juiz Hristov informou que ele não foi encontrado para ser intimado sobre o julgamento no endereço fornecido, ao receber o benefício.

Cabral critica nova proposta para pré-sal

DEU EM O GLOBO

O governador do Rio, Sergio Cabral, rechaçou "qualquer solução" para o rateio de recursos do pré-sal que fuja ao acordo de novembro de 2009 com o governo federal. Está em estudo uma fórmula para parcelar perdas do estado.

Governo do Rio critica nova proposta do pré-sal

Pelo Twitter, Cabral rechaçou projeto do governo federal de reduzir, em dez anos, arrecadação do estado com petróleo

Gustavo Paul

BRASÍLIA. O governo do Rio, principal produtor de petróleo do país, criticou duramente a proposta de alteração das regras de divisão das receitas de participações governamentais, que está em gestação na Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República. O governador do Rio, Sérgio Cabral, rechaçou, no Twitter, "qualquer solução" que fuja ao acordo sobre a alíquota dos royalties fechado em novembro de 2009.

Por esse acordo, Lula vetará as propostas em curso no Congresso, que redistribuem inclusive a arrecadação atual com o petróleo, e criará uma fórmula de divisão somente para os novos campos a serem licitados, deixando tudo que já foi a leilão como está.

Cabral contou que logo na manhã de ontem começou a se movimentar para derrubar a ideia de reduzir, em um período de dez anos, a parcela destinada aos estados confrontantes. A proposta foi antecipada ontem pelo GLOBO.

"Hoje (ontem) pela manhã enviei mensagem ao governador do ES (Espírito Santo), ao ministro Padilha (Relações Institucionais) e aos senadores do nosso estado.... repudiando qualquer solução que fuja ao acordo sobre a alíquota dos royalties, visando ao novo marco regulatório do petróleo", disse Cabral no Twitter.

Diante da reação fluminense, Padilha enviou um e-mail para Cabral e o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, além dos senadores de cada estado. Padilha disse que a proposta está sendo elaborada em nível técnico, no âmbito do Comitê de Articulação Federativa (CAF), ligado a sua secretaria, e com entidades municipalistas, mas que ainda não foi apresentada a ele.

- Não existe proposta do governo federal a respeito de royalties e não há intenção de apresentar nenhum projeto neste governo. Este vai ser um debate da próxima legislatura - disse o ministro ao GLOBO.

Para Dornelles, proposta é um "assalto parcelado"

O governador eleito do Espírito Santo, Renato Casagrande, também rechaçou qualquer proposta alternativa. Segundo ele, não se pode mexer na arrecadação dos campos já licitados:

- O ponto de partida é aquela proposta. A colocada agora (escalonar as perdas em dez anos) é complicada.

O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) também reagiu:

- A proposta pode ser chamada de assalto parcelado. É tão imoral e indecente, que não acredito que ela exista. A nota divulgada hoje pelo governador Cabral tem meu apoio integral.

Os deputados Hugo Leal (PSC-RJ) e Otávio Leite (PSDB-RJ) questionaram o fato de a proposta não mencionar recursos da União nessa redivisão.

- A União não abre mão de nada, e são os estados e municípios que têm de arcar com essa solução - reclamou Leal.

- É possível contemplar os demais estados e municípios sem afetar o Rio - disse Leite.

A proposta do grupo técnico será apresentada no dia 2 de dezembro na 58ª Reunião Geral da Frente Nacional de Prefeitos, em Belo Horizonte. No dia 7, ela será colocada na reunião ordinária do CAF. De acordo com uma fonte, a ideia é conseguir apoio da maioria dos governadores e prefeitos nas próximas semanas, para apresentá-la formalmente ao senador Romero Jucá (PMDB-RR), relator do projeto da distribuição de royalties.

A tramitação da proposta deverá sofrer fortes resistências também na trincheira da Justiça. A advogada Teresa Pantoja, diretora do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), entende que a nova proposta também é inconstitucional. Ela argumenta que, ao reduzir a participação dos estados e municípios confrontantes nos recursos do petróleo, estará quebrando o pacto federativo, segundo o qual nenhum estado pode ter suas receitas tradicionais prejudicadas.

Além disso, ela considera frágil o argumento de que a queda da participação será compensada pelo aumento da produção nos próximos anos. Os idealizadores da proposta apostam que a receita anual com participações governamentais para todos os entes federados passará de R$25 bilhões em 2011 para R$60 bilhões em 2025.

Um instante:: Ferreira Gullar

Aqui me tenho
como não me conheço
nem me quis

sem começo
nem fim

aqui me tenho
sem mim

nada lembro
nem sei

à luz presente
sou apenas um bicho
transparente