quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Projeto de Sader para a Casa de Rui Barbosa é criticado

Intelectuais questionam ênfase no contemporâneo e na esquerda.

Miguel Conde

Pesquisadores e intelectuais brasileiros questionaram ontem o projeto do novo presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa, o sociólogo Emir Sader, de promover na instituição debates e pesquisas com “uma reflexão mais contemporânea sobre o Brasil”, como ele disse em entrevista ao GLOBO publicada no ultimo sábado. A relação de autores que Sader pretende levar para debates e palestras no espaço também foi criticada, por incluir apenas nomes de esquerda.

- É um tanto irônico, se você pensar que Rui Barbosa é um dos íncones do liberalismo brasileiro – diz o historiador José Murilo de Carvalho, professor da URFJ que esteve por 12 anos vinculado à Casa – Propões-se ali a reunião de um grupo com um alinhamento ideológico muito claro e aliás perfeitamente legítimo, mas o estranho é que o liberalismo não apenas fique de fora, mas seja totalmente antagonizado. Esse desequilíbrio completo me causou estranheza, assim como a falta de qualquer mensão à obrigação legal da Casa, que é preservar e difundir a obra de Rui Barbosa.

Professor da UERJ, conhecido pelos artigos e livros de crítica ao capitalismo, Sader disse na entrevista que pretende levar à Casa “todas as vozes, mas sobretudo aquelas que não tem espaço hoje para expressar seu ponto de vista” na mídia tradicional. Ele defendeu ainda que o governo adote políticas culturais “que consolidem na cabeça das pessoas as razões pelas quais o Brasil está melhor”.

O historiador Jorge Luiz Ferreira, professor da UFF, diz que a intenção de fazer debates sobre temas mais contemporâneos na Casa pode desvirtuar a identidade da instituição.

- A Casa de Rui Barbosa tem a missão de trabalhar com o estudo e a preservação dos documentos da Primeira República, área em que seus pesquisadores têm produzido há décadas trabalhos originais que se tornaram obras de referência reconhecidas internacionalmente. Claro que temas atuais podem ser debatidos, mas acho temeroso alterar o perfil de uma instituição que vem dando certo.

Crítico literário defende ideia

Mas a preocupação com o presente é coerente com a atuação do próprio Rui Barbosa, afirma o crítico literário Eucanaã Ferraz, professor da UFRJ:

- Rui Barbosa foi um homem ligadíssimo às questões políticas de seu tempo. Então que a Casa honre esse nome sendo uma instituição do seu tempo, eu não acho mau. Agora, concordo que o que já existe consolidado não pode ficar desprestigiado diante de uma nova orientação.

Para o cientista político Renato Lessa, há “intelectuais notáveis” entre os nomes citados por Emir Sader, mas o pluralismo prometido por ele “é muito restrito” políticamente. Ele disse ainda que a Casa de Rui Barbosa jê vem promovendo debates sobre o Brasil atual:

- Um problema do que ele disse é a ideia de que agora se vai dar a verdadeira pertinência da instituição, como se ela estivesse fora do tempo. A Casa de Rui Barbosa sempre fez debates atuais.Acaba de publicar um livro em parceria com a Fundação Getúlio Vargas sobre a República Brasileira, do qual eu mesmo participei com um artigo sobre a Constituição de 1988.

A própria noção do que é um tema contemporâneo é problemática, lembra o crítico literário Luiz Costa Lima, professor da UERJ:

- Nada mais contemporâneo, por exemplo, do que a discussão entre o fundamentalismo e o regime democrático. É um tema atual, mas que ao mesmo tempo pode nos levar à Grécia antiga. Propor uma discussão do contemporâneo simplesmente como aquilo que se dá neste instante me parece pobre.

Para a historiadora Mônica Grin, da UERJ, o debate com o presente deve vir por meio das pesquisas com o acervo da instituição:

- Fiquei extremamente preocupada com a fala do Emir Sader. Claro que o contemporâneo pode ser um tema da Casa, mas isso deve passar pelas pesquisas que são desenvolvidas ali a partir do acervo da fundação. Esse é o diálogo que precisa ser estabelecido.

FONTE: O GLOBO – SEGUNDO CADERNO, 8/2/2011

Um comentário:

  1. De minha parte, fiquei contente com a possibilidade de termos uma maior participação nos debates ploliticos atuais com os nomes que o /Emir /Sader citou.

    Por outro lado, vi claramente que os debates serão feitos com intelectuais de outros matizes ideolígicos, o que só faz enriquecer o projeto...

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