quarta-feira, 29 de junho de 2011

Muito além de obras: Delta também tem contratos com a Cedae, sem licitação, para medição de consumo de água

Carla Rocha, Elenilce Bottari, Fabio Vasconcellos e Ruben Berta

RIO - Uma das campeãs em obras no estado, a Delta Construções não limita seus ganhos a construções. Em maio de 2004, em parceria com outra empresa, a empreiteira assumiu quase 80% do sistema de medição de consumo de água da Cedae. Os novos hidrômetros - que causaram dor de cabeça a muitos consumidores, principalmente em 2006 - renderam até hoje pelo menos R$ 377 milhões em contratos para o consórcio Novoperação, formado pela Delta e pela Emissão Engenharia e Construções. Após seis anos estendendo o contrato com termos aditivos - prazo máximo permitido por lei -, o estado contratou, a partir de maio do ano passado, sem concorrência e sob a alegação de emergência, o mesmo grupo por mais um ano. Somente sem licitação foram R$ 49,8 milhões do total de R$ 377 milhões. Os serviços incluem a instalação e a leitura de hidrômetros.

Após contrato, empresas se uniram

Um segundo consórcio está com os 20% restantes do serviço desde maio de 2004: o Acqua Rio, formado pela GMF (Gestão de Medição e Faturamento) e pela Sanear. Até hoje, essas empresas receberam R$ 104 milhões em contratos, sendo R$ 15,4 milhões sem licitação desde maio de 2010. O detalhe é que, em junho de 2004, um mês após o início dos serviços para a Cedae, as quatro empresas que formam os consórcios se uniram, formando uma quinta: a Desg. A sociedade foi desfeita em agosto de 2006 na Junta Comercial.

Como o contrato feito com a Delta foi assinado em 24 de maio de 2004, esgotou-se em 24 de maio de 2010 o prazo "para casos excepcionais" da Lei de Licitações, de seis anos de prorrogação. Em nota enviada ao GLOBO, a Cedae chegou a informar que lançou um novo edital de concorrência para o serviço somente em 1 de junho de 2010. Depois da nota, no entanto, o presidente da Cedae, Wagner Victer, informou que o lançamento ocorreu em 25 de março de 2010.

A alegação da Cedae para a contratação dos consórcios sem licitação por um ano foi que o TCE pediu para analisar o texto do edital, o que só foi concluído em maio deste ano. Segundo a companhia, o serviço não poderia ser interrompido. O TCE confirmou que pediu mudanças no edital, mas informou que ainda está analisando se as dispensas de licitação foram regulares. Atualmente, há uma concorrência em andamento.

O presidente da Cedae frisou que, quando chegou ao cargo, conseguiu desconto de 10% nos contratos. E que, no ato de dispensa de licitação, foram concedidos mais 5%. Sobre o novo edital ter sido elaborado em cima do fim do prazo máximo permitido, ele alegou que é um texto complexo.

- Hoje, mesmo com a dispensa de licitação, pagamos menos que São Paulo e Santa Catarina. E no edital que elaboramos uma empresa não poderá levar mais do que um dos três lotes - disse Victer, admitindo, porém, que a Delta está concorrendo sozinha desta vez e que sua ex-sócia poderá concorrer separadamente.

A Delta alegou que se associou às empresas do Acqua Rio para haver "padronização de procedimentos". Sobre seu conhecimento na área de medição de consumo, a empresa informou que, "com o objetivo de diversificar sua atuação na área de serviços contínuos (...), se associou à Emissão Engenharia e Construções, que já tinha experiência neste (...) trabalho".

O serviço de medição de consumo perturbou o sono de cariocas como a moradora de Brás de Pina Ana Maria Ribeiro, que chegou a receber contas de água de R$ 8 mil em 2006:

- Como houve erro de leitura, foi preciso fazer um cálculo do consumo médio para fechar um acordo.

As relações da Delta com a Cedae estão na mira da Alerj. O deputado Marcelo Freixo (PSOL) encaminhou representações ao Ministério Público e ao TCE pedindo investigações:

- Cabe investigar todas as alterações e prorrogações de contrato.

TCE: Delta tem 51 procedimentos irregulares em obras de 2002 a 2007

O Tribunal de Contas do Estado concluiu na terça-feira um levantamento sobre os processos que envolvem a Delta Construções e que já foram julgados pelos conselheiros. Segundo o órgão, os técnicos encontraram 51 procedimentos (entre contratos e termos aditivos) irregulares, cujas obras foram realizadas pela empreiteira.

Todos os procedimentos são relativos ao período de 2002 a 2007, e apenas a obras realizadas no interior do estado. O TCE alegou que os procedimentos que deram entrada após 2007 - portanto já no governo Cabral - estão em análise e ainda não foram a julgamento. Como O GLOBO mostrou na semana passada, no período de 2007 a 2010 a Delta Construções ganhou contratos que somam R$ 1 bilhão no estado. A empresa pertence ao empresário Fernando Cavendish, que comemoraria seu aniversário num resort no Sul da Bahia com o governador Sérgio Cabral, no último dia 17.

De acordo com o levantamento feito pelo TCE, dos 51 procedimentos irregulares encontrados, que somam mais de R$ 7 milhões, 24 foram assinados com a prefeitura de Angra dos Reis. Um dos contratos foi para a implantação do sistema de esgotamento, drenagem e pavimentação de ruas da cidade. A obras custaram cerca de R$ 3,6 milhões e foram autorizadas em março de 2002. O TCE não detalhou a irregularidade encontrada no contrato. Os termos aditivos a esses contratos também foram considerados ilegais pelo tribunal.

São Gonçalo é a segunda cidade com o maior número de obras da Delta que o TCE encontrou irregularidades. Foram 12 procedimentos. Um deles foi o contrato de 28 de 2002, cujo objetivo era a prestação de serviço de engenharia para a recuperação e implantação de drenagem e pavimentação de ruas no valor de R$ 1 milhão.

A morosidade do TCE para julgar os procedimentos explica em parte a ausência de processos envolvendo a Delta após 2007. Somente os processos da construtura em Angra levaram sete anos para serem apreciados pelos conselheiros. No caso de São Gonçalo, o TCE levou quatro anos para definir se eram ou não irregulares os procedimentos.

FONTE: O GLOBO

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