sábado, 16 de abril de 2011

Reflexão do dia – FHC: ‘cabe às oposições se oporem ao governo’

Para recordar que cabe às oposições, como é óbvio e quase ridículo de escrever, se oporem ao governo. Mas para tal precisam afirmar posições, pois, se não falam em nome de alguma causa, alguma política e alguns valores, as vozes se perdem no burburinho das maledicências diárias sem chegar aos ouvidos do povo. Todas as vozes se confundem e não faltará quem diga – pois dizem mesmo sem ser certo – que todos, governo e oposição, são farinhas do mesmo saco, no fundo “políticos”. E o que se pode esperar dos políticos, pensa o povo, senão a busca de vantagens pessoais, quando não clientelismo e corrupção?

Diante do autoritarismo era mais fácil fincar estacas em um terreno político e alvejar o outro lado. Na situação presente, as dificuldades são maiores. Isso graças à convergência entre dois processos não totalmente independentes: o “triunfo do capitalismo” entre nós (sob sua forma global, diga-se) e a adesão progressiva – no começo envergonhada e por fim mais deslavada – do petismo lulista à nova ordem e a suas ideologias.

Fernando Henrique Cardoso. O papel da oposição. O Estado de S. Paulo, 14/4/2011.

Em busca de espaço:: Merval Pereira

O apoio formal dos Brics à pretensão de Brasil, Índia e África do Sul de participarem em termos permanentes do Conselho de Segurança da ONU reafirma o caráter simbólico dessa união de países que souberam, a partir de um acrônimo criado por uma consultoria econômica, tirar proveito político da importância crescente dos emergentes no novo mundo multipolar que está sendo desenhado nos últimos anos.

Os quatro países (Brasil, China, Rússia e Índia) detêm 40% da população e do PIB mundiais, além de representarem 28% da massa terrestre do planeta, e com o acréscimo da África do Sul amplia sua cobertura planetária.

É com esse cacife geopolítico que eles, na declaração conjunta da reunião no balneário de Sanya, ao sul da China, emprestaram apoio a uma reforma "abrangente" das Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança, "para assegurar maior eficácia, eficiência e representatividade de modo a que possa melhor enfrentar os desafios globais da atualidade".

De maneira explícita, China e Rússia reiteram "a importância que atribuem a Brasil, Índia e África do Sul em assuntos internacionais e compreendem e apoiam sua aspiração de desempenhar papel mais protagônico nas Nações Unidas".

O Brasil nunca esteve tão próximo de conseguir fazer parte do Conselho de Segurança da ONU quanto em 1945, quando da criação daquele organismo internacional ao final da Segunda Guerra Mundial.

O presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt instruiu sua delegação na reunião de Dumbarton Oaks a sugerir que o Brasil fosse considerado como o sexto membro permanente, pois o país era visto em Washington como parceiro confiável e "aliado fiel".

Roosevelt, que já havia empenhado pessoalmente em favor da China, vencendo as objeções de Churchill e Stalin, era quem melhor poderia levar adiante sua intenção de criar mais uma cadeira permanente, mas sua morte, pouco antes da Conferência de São Francisco, eliminou em definitivo essa possibilidade.

O estudo da Goldman Sachs sobre os Brics, que seriam as economias emergentes que estariam no topo da economia mundial dentro de 40 anos, dá um destaque especial ao fato que o crescimento econômico também depende de instituições sólidas e estáveis, sem se referir especificamente à necessidade de o país ser uma democracia.

A China poderia ser aprovada nesse quesito, pois é uma ditadura que mantém um ambiente político estável. Mas representa um risco de longo prazo grande, que até pouco tempo atrás não era levado muito a sério.

O crescente anseio da classe média emergente por mais direitos, as pressões contra as agressões ao meio ambiente, mais proteção trabalhista, e a inflação são pontos de interrogação no desenvolvimento chinês.

O mesmo problema enfrenta a Rússia, com seu hiperpresidencialismo que faz aumentar a insegurança para os investimentos estrangeiros diante das inexistentes garantias jurídicas no país.

Outra condicionante, segundo o estudo da Goldman Sachs, é a abertura econômica, que desfavorece a Índia, o país mais fechado dos quatro.

Mas não favorece muito o Brasil. Na comparação do Brasil com a China, a economia brasileira é menos aberta. Brasil e Índia, devido ao baixo índice educacional e à falta de infraestrutura, crescerão em velocidade menor que Rússia e China nos próximos 20 anos, segundo o estudo.

Se forem superados esses problemas estruturais com a realização das reformas necessárias à modernização de suas economias, os quatro países que formam o Bric estarão crescendo à mesma velocidade.

O historiador Neill Ferguson, de Harvard, acredita que, se China e Rússia permanecerem estados de partido único, serão mais cedo ou mais tarde superados por Brasil e Índia, que ele classifica de "tartarugas democráticas", devido à lentidão do processo democrático em relação aos governos ditatoriais. Um processo lento, mas mais sólido de construção de uma sociedade.

Há, desde a primeira reunião, realizada em Yekaterinburgo, na Rússia em 2009, uma preocupação grande que esse movimento não seja entendido como de oposição aos Estados Unidos, e a própria presidente brasileira Dilma Rousseff ressaltou esse aspecto de neutralidade do grupo.

Mas, como deixaram claro no comunicado, os Brics mais a África do Sul compartilham "a visão que o mundo está passando por amplas, complexas e profundas mudanças, marcadas pelo fortalecimento da multipolaridade, pela globalização econômica e pela crescente interdependência" e estão em busca de seu lugar.

O professor de História Contemporânea da UFRJ Francisco Carlos Teixeira, em palestra sobre os Brics registrada aqui na coluna, ressalta que os Estados Unidos continuarão a ser o centro de elaboração do capitalismo liberal, baseado na inovação e nos novos métodos de organização de empresas e trabalho, mesmo que a China, "com seu liberalismo econômico e autoritarismo político", transforme o Triângulo do Pacífico, formado por ela, Japão e a Austrália, no eixo econômico mais rico do mundo.

Na visão de Teixeira, o equilíbrio institucional interno é forte no Brasil e na Índia, mas ainda está em construção na Rússia.

O desenvolvimento tecnológico e a capacidade de inovação são fortes na Índia e na Rússia, e estão em construção no Brasil.

A capacidade de evitar o isolamento político e estratégico, ou "soft power", é forte no Brasil e na Índia, e fraco na Rússia.

O jornal inglês "Financial Times" escreveu recentemente que os Brics são "um acrônimo em busca de um propósito".

De fato, como vimos, os países do grupo têm mais diferenças que proximidades. Mas os une o símbolo político em que se transformou a sigla, nesse momento de transição, em que o poder planetário está sendo redividido.

FONTE: O GLOBO

Negócios, o negócio de Dilma:: Clóvis Rossi

Diplomacia de Dilma tem como foco a economia; questões políticas foram no máximo tangenciadas

A presidente Dilma Rousseff completou 100 dias de governo tendo já lidado diretamente com os líderes das duas maiores potências econômicas do planeta, Estados Unidos e China.

Dilma parece sinalizar a intenção de ter como eixo de sua diplomacia aquilo que muitos analistas chamam de G2, países que talvez não tenham peso suficiente para resolver todos os problemas do nosso planeta, mas sem os quais eles jamais serão resolvidos.

A característica central de ambos os contatos foram negócios. Com Barack Obama, a presidente, ainda que gentilmente, não deixou de criticar as barreiras que os Estados Unidos adotam e que prejudicam produtores brasileiros.

Ela mencionou igualmente a política monetária frouxa, que leva a uma inundação de dinheiro no planeta, que toma a direção de países como o Brasil.

A consequência inescapável é a apreciação da moeda e dificuldades para as exportações.

Na China, Dilma adotou idêntica atitude, também gentilmente. Fez ver aos chineses que o Brasil não pode continuar a ser apenas exportador de produtos primários. Obteve a promessa de que os chineses estimularão suas empresas a importar produtos de mais valor do Brasil.

A diferença entre os dois países é espantosa, nas contas do ministro Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia): o preço médio da tonelada exportada pela China supera os US$ 3.000, ao passo que a do Brasil fica em magros US$ 163.

O problema com a queixa do Brasil é a de que o próprio empresariado admite que não dá para exportar mais manufaturas. Talvez por isso, o foco da viagem passou a ser atrair o "ouro de Pequim", a fantástica pilha de dinheiro que os chineses têm para aplicar no exterior.

Embora não tenha sido resultado direto da visita, já funcionou: a Foxconn anunciou espetaculares US$ 12 bilhões em seis anos para, entre outras coisas, construir uma "cidade inteligente" em local já escolhido mas ainda não anunciado. Serão 100 mil "habitantes" (trabalhadores), dos quais 20 mil engenheiros.

É o tipo de investimento que cria valor agregado como quer o governo -e, de resto, como é necessário.

Que o foco da diplomacia com Dilma é negócios, fica também evidente nos discursos que ela fez na China. Iguais praticamente aos que fazia ao lado de seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva em inúmeros seminários empresariais mundo afora. Lula até se orgulhava de ser um "mascate" vendendo o Brasil por aí.

Esse tipo de diplomacia -agora rebatizada para diplomacia de resultados- está longe de ser novidade. A atividade dos governantes é, em grande medida, servir de ponta de lança para negócios. O resultado, no entanto, será tanto melhor quanto maior for a capacidade empresarial de de fato realizar negócios.

O único senão do foco até aqui prioritário para Dilma é que acaba colocando no assento traseiro o empenho, muito forte nos dois últimos anos de Lula, de envolver-se ativamente em temas políticos (Irã, Oriente Médio, por exemplo).

Dilma, em todas as suas falas até agora no máximo tangenciou questões políticas, concentrando-se na economia e nos negócios. Suspeito que ganhará aplausos dos que criticaram o voluntarismo do governo anterior, mas, se você quer a minha opinião, acho que uma coisa não deveria excluir a outra.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Desconectados :: Fernando Rodrigues

Está na praça uma informação alarmante a respeito do futuro dos políticos e dos partidos brasileiros. A arrecadação de doações via internet na eleição de 2010 somou apenas R$ 736 mil.

Trata-se de uma cifra desprezível. Para ser mais exato, equivale a 0,022% do total geral de R$ 3,3 bilhões em doações recebidas no ano passado pelos políticos, seus comitês eleitorais e partidos.

O quadro piora quando se observa que quase a metade do arrecadado via web entrou nos cofres de apenas duas candidatas, Marina Silva (PV), com R$ 170,5 mil, e Dilma Rousseff (PT), com R$ 180 mil.

Outra informação para dimensionar o grau de desconexão dos políticos é o número diminuto de doadores on-line. Marina teve 19,6 milhões de votos, mas só 3.095 doações via web. A desproporção cresce com Dilma: 55,8 milhões de votos (no segundo turno) e meras 2.032 doações por meio da internet.

Não há dados sobre José Serra (PSDB). O tucano nem sequer tentou arrecadar doações via web.

Esses dados ilustram a eleição do ano passado, mas remetem a um cenário similar em pleitos futuros. Nada no comportamento de políticos e de partidos indica alterações relevantes já para 2012.

A participação de eleitores fazendo pequenas doações é um subproduto positivo da era da internet. O cidadão que dá R$ 10 ou R$ 50 tende a se lembrar do nome do político por muito tempo. Cobrará mais no caso de seu candidato ser eleito. O exercício da cidadania ganha em qualidade. Melhora a democracia.

Os políticos reclamam que a lei no Brasil os impede de fazer um processo permanente de arrecadação via web. Não é verdade. Os candidatos estão proibidos. Os partidos, não. Mas poucas agremiações hoje têm coragem de, na TV, pedir dinheiro aos eleitores.

Preferem ficar na zona de conforto do Congresso, discutindo reforma política e financiamento público. Desconectados da vida real.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lá vem o Patto! :: Urbano Patto

Participei na última quarta-feira de um almoço/palestra promovido pela Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos, regional Vale do Paraíba, em São José dos Campos. A platéia era composta principalmente de empresários e autoridades públicas e o conteúdo da palestra foi uma contundente e bem fundamentada crítica à política industrial do país e ao sistema financeiro, revelando as entranhas dos números e indicadores de crescimento econômico, tais como criação de empregos e crescimento do PIB.

Mostrou-se ali, com números sobre números - oficiais, que como diz o ditado, o diabo mora nos detalhes, ou seja, mesmo tendo havido crescimento da economia nos últimos anos, belos e vistosos números do PIB e de geração de empregos, eles se deram com a diminuição dos setores industriais que agregam valor aos seus produtos com tecnologia, conhecimento, inovação e educação e, por outro lado, com o aumento da produção e venda de bens primários, princpalmente, agrícolas e minerais.

Os números contam que na últimas duas décadas houve e continua em andamento uma rápida e profunda regressão a um modelo econômico quase colonial: exportamos celulose e importamos papel; exportamos minério de ferro e importamos aço; somos os maiores exportadores mundiais de café em grão, mas é a Alemanha, que não planta café, a maior exportadora mundial de café industrializado; produzimos soja com eficiência e produtividade recorde, mas quem vem instalar indústria para produzir óleo de soja e enviar para a China, são os próprios chineses.

Houve também uma crítica feroz ao sistema financeiro e à sua total prevalência nos órgãos controladores e formuladores da política econômica, nas instituições políticas nacionais e na grande mídia, para os quais a solução de todos os males, agora também para a ameaça de renascimento do dragão da inflação, sempre é subir, e subir de novo, e outra vez subir os juros já mais altos do mundo.

Não se tratava de público ou de palestrantes do meio sindical trabalhista, de ONGs, de movimentos populares. Eram na sua imensa maioria empresários, capitalistas até o último fio de cabelo, que ainda vivem de tentar criar condições para se produzir coisas, máquinas e equipamentos, que produzem outras coisas, que as pessoas compram e usam, enfim, riqueza material concreta.

Pode até ser que para o imediatiatismo financeiro e para a obtenção de vantagens e vitórias momentâneas para alguns o quadro se mostre cor-de-rosa, mas a continuar nessa mesma toada não se sabe onde iremos chegar.

Urbano Patto é Arquiteto Urbanista, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional e membro do Conselho de Ética do Partido Popular Socialista - PPS - do Estado de São Paulo. Críticas e sugestões: urbanopatto@hotmail.com

FONTE: JORNAL DA CIDADE/ PINDAMONHANGABA

A grande confusão :: Míriam Leitão

A infraestrutura brasileira está perto do colapso. Falta tudo, inclusive o básico, o simples. As operadoras de celular prestam serviço cada vez pior. Os aeroportos entupidos e o descaso das companhias irritam brasileiros e desorientam os estrangeiros. O trânsito nas cidades é indescritível. Portos não funcionam. O governo investe errado. Basta sair de casa para ver.

Não é necessário mais um estudo do Ipea para saber que os aeroportos não ficarão prontos a tempo, basta circular. Eles permanecem congelados no tempo e nos problemas. Nem é pela Copa. É por nós e agora que eles precisam avançar. Joseph Blatter irritou as autoridades mas estava certo, e o governo agora usará o atraso como álibi para não cumprir os procedimentos em obras públicas. O PAC não era um supersistema gerencial que permitia ter o controle do andamento dos projetos?

Num país onde falta tudo, a maior obra de infraestrutura, que vai consumir mais da metade do orçamento para ferrovias dos próximos anos, é o polêmico trem-bala. Ele foi aprovado no Senado esta semana depois de um debate entre especialistas de diversas áreas. Foram desde o BNDES até especialistas independentes, com análises técnicas do projeto. Ótimo momento para que os senadores entendessem em que estavam votando. Lá, foi dito que não há estudo de engenharia detalhado, portanto, não se sabe quanto a obra custará, de fato. O governo defende o absurdo de o Tesouro ser o garantidor de R$20 bilhões emprestados pelo BNDES. O Estado empresta, o Estado avaliza se o executor der o calote, o Estado será sócio, o Estado dará ainda um subsídio direto de R$5 bilhões. Tudo com o nosso dinheiro. A ideia em si de uma ligação por trem-bala entre Rio e São Paulo é sedutora. O diabo está nos detalhes, principalmente nos que nós não conhecemos porque fazer uma obra em que haverá escavações de rocha e indenizações sem um estudo detalhado é uma insensatez. Mesmo assim, a relatora Marta Suplicy (PT-SP) apresentou um parecer favorável à obra no dia seguinte desse debate em que foram apresentadas tantas dúvidas técnicas. Um detalhe revelador: a relatora não acompanhou o debate e a apresentação dos técnicos. Não se deu sequer ao trabalho de ouvir os riscos mostrados pelos especialistas sobre o assunto que relatou favoravelmente no dia seguinte.

Comportamento diferente teve a oposição e certos senadores da base do governo que acompanharam com atenção o debate. Ricardo Ferraço (PMDB-ES) é um desses que faz parte da base do governo, mas que ouviu tudo e fez uma comparação interessante: com uma fração, não mais que 10% do preço atual do trem-bala, poderia ser feito no seu estado o que se quer há décadas: a dragagem do porto de Vitória.

Há oito anos, no começo do período Paulo Hartung, o governo estadual tentou fazer a dragagem e foi impedido porque tinha que ser uma obra federal. O governo federal disse que faria e não fez. Lá, só podem entrar navios pequenos, e na maré cheia. Isso num estado que quer tirar o melhor proveito de sua vocação logística.

Fiz um programa sobre turismo na Globonews tentando entender o que mais - além do câmbio desfavorável - atrapalha o turismo brasileiro, porque o país no ano passado teve déficit de US$10 bilhões na balança de turismo e nos primeiros dois meses deste ano o déficit está aumentando. Um país com tantas belezas e com atrações para todo o tipo de turismo, o que nos atrapalha? André Coelho contou que a pesquisa de conjuntura de turismo que a Fundação Getulio Vargas faz com 80 presidentes de operadores de turismo acaba de mostrar aumento de faturamento no setor. Ele cresce puxado pelo aumento da classe C. Mário Moysés, da Embratur, disse que falta "conectividade", poucos vôos ligam o Brasil aos países dos quais podemos atrair turistas. Há poucos aeroportos de chegada e os grandes estão superlotados. Numa pesquisa feita pela FIPE, turistas que deixavam o país reclamaram, entre outras coisas, da falta de algo fácil de resolver: falta sinalização que eles possam entender. O turista se sente perdido no Brasil.

Quinta-feira tive um dia desses típicos de qualquer brasileiro quando precisa circular pelas cidades em horas de pico e pegar voos de ida e volta. Saí muito mais cedo de casa, contando com o trânsito caótico. No caminho, fui trocando de celular porque a TIM e a Vivo têm cada vez mais pontos cegos na cidade e a ligação caia. O celular de Alvaro Gribel, que é da Oi, também não pegava ontem na casa dele. A internet banda larga cai com frequência. Tenho reclamado com a TIM há um mês, sem solução, porque para falar no celular eu tenho que sair de casa; dentro de casa não há cobertura. O motorista de taxi me disse que ouve o mesmo de todas operadoras. Estamos retrocedendo.

No aeroporto, meu voo não aparecia na visor, o que me obrigou a ir duas vezes ao balcão de informação. Lá, soube de duas trocas de portão. Um estrangeiro se perderia, pensei. Quando cheguei à aeronave, um estrangeiro estava sentado no meu lugar. Fui conferir o bilhete dele e o assento estava certo mas ele estava num voo para Vitória, quando seu ticket era para Guarulhos.

Na volta, encontrei filas gigantes para táxi no aeroporto Santos Dumont. Fui salva por uma carona do professor Antônio Barros de Castro, que definiu tudo numa frase brilhante: "A China não sabe não crescer, e nós não sabemos crescer." Assim, cada vez mais caótico, tomando decisões insensatas e negligenciando tarefas simples, o Brasil aguarda os grandes eventos internacionais.

FONTE: O GLOBO

Estratégia de saída:: Celso Ming

Ontem, em Washington, o presidente do Banco Central do Brasil, Alexandre Tombini, advertiu que é preciso estar preparado para o tranco que acontecerá quando for deflagrada a estratégia de saída dos grandes bancos centrais do planeta.

Estratégia de saída é a reversão da atual abundância de recursos que zanza por aí. Resumidamente, desde o início da crise, os bancos centrais passaram a despejar um volume nunca visto de dinheiro nos mercados. Como esta Coluna ontem relembrou, por decisão de seu presidente, Ben Bernanke, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) sozinho bombou US$ 2,3 trilhões com objetivo de manter os fluxos do crédito, o consumo, a atividade econômica e o emprego. Esse é o fator, avisam governantes e analistas, que está provocando inundação de dólares nas economias emergentes e a disparada dos preços do petróleo e demais commodities.

Como a inflação está subindo, não só nos emergentes, mas também nos países industrializados, pode estar perto o dia em que os grandes bancos centrais deem meia volta. Além de revender os títulos que hoje estão em seu poder, deverão puxar os juros para cima. O efeito é o inverso do que foi produzido pela política de afrouxamento mantida até agora e que ainda vai se prolongar provavelmente até meados de 2012.

Mas, afinal, o que seria, para uma economia como a do Brasil, preparar-se para esse tempo de escassez de capitais?

O primeiro efeito poderia ser complicações para se reabastecer de capitais externos caso o Tesouro, uma empresa ou um banco precisassem disso. O outro efeito esperado seria um tombo nas cotações das commodities e eventual queda das exportações brasileiras.

Mas não há certeza de que essa estratégia de saída implique tanta coisa ruim. Primeiramente, nem o Fed nem os outros bancos centrais vão partir instantaneamente da abundância para a escassez. Isso vai ter uma fase de transição, provavelmente longa. Como nenhum país rico suportará um ambiente de forte escassez, é improvável que os bancos centrais sejam tão esfoladores quanto alguns vêm dizendo. Os Estados Unidos, por exemplo, têm uma dívida pública que vai para US$ 11 trilhões. Não pode se deixar asfixiar pela falta de tomadores para seus títulos.

Em segundo lugar, ninguém está em condições de avaliar quanto da disparada dos preços das commodities se deve ao jogo dos investidores nas bolsas de futuros. Muito provavelmente, esse efeito está exagerado. O movimento de fundo é o aumento da demanda de matérias-primas e de alimentos por parte dos emergentes, especialmente dos asiáticos, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) avalia em relação ao petróleo. Se os dirigentes do Grupo dos 20 (G-20) querem mais transparência do mercado de commodities, então está claro que nem eles próprios sabem dizer o quanto dessa alta provém da dinheirama espalhada pelos mercados (que pode encolher em alguma proporção) e o quanto provém de aumento do consumo (situação que não deve se reverter).

Em todo o caso, se houver esse efeito escassez, o Brasil parece mais do que preparado. Há reservas externas de US$ 320 bilhões que podem ser revendidas no mercado de câmbio e, se os preços das commodities caírem, ficará mais fácil baixar os juros.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

BC indica que alta dos juros não vai terminar tão cedo

Tombini diz que o País está ‘meio de um ciclo de aperto monetário’; para analistas, taxa deve ir a 12,25%

A menos de uma semana da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, sinalizou que o ciclo de aumento da taxa básica de juros não terminará tão cedo quanto o imaginado pelo mercado. A maioria dos analistas prevê alta de 0,5 ponto porcentual, dos atuais 11,75% para 12,25%. Tombini indicou ainda que o BC e o Ministério da Fazenda já estão se preparando para um período de saída de capitais, motivado pelo aumento dos juros nos EUA e na Europa. “Estamos no meio de um ciclo de aperto monetário. Já subimos os juros em 300 pontos básicos e temos mais trabalho a fazer”, afirmou Tombini em palestra em Washington. O FMI advertiu ontem que o superaquecimento e a inflação ameaçam o Brasil e outros países latino-americanos.

Tombini indica que vai elevar os juros

Palestra do presidente do BC em Washington estimulou analistas a elevar apostas a 0,5 ponto porcentual na reunião do Copom da próxima semana

Denise Chrispim Marin e Luciana Antonello Xavier

A menos de uma semana da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, sinalizou que o ciclo de aumento da taxa básica de juros, a Selic, não terminará tão cedo quanto imagina o mercado. A maioria dos analistas independentes prevê alta de 0,5 ponto porcentual - de 11,75% para 12,25% - como a última alta do período pós-crise internacional.

Tombini indicou ainda que o BC e o Ministério da Fazenda já estão se preparando para um período de saída de capitais, motivado pelo aumento dos juros nos Estados Unidos e na Europa. A fala do presidente do Banco Central estimulou parte dos analistas ainda crentes em um aumento de 0,25 ponto porcentual na Selic, na semana que vem, a elevar suas apostas a 0,5 ponto e contribuiu para uma baixa nas ações do setor bancário e nos papéis do varejo e das empresas de construção no fim da manhã.

"Estamos no meio de um ciclo de aperto monetário. Já subimos os juros em 300 pontos básicos e temos adiante mais trabalho a fazer", afirmou, em palestra em um seminário sobre as perspectivas econômicas para a América Latina, promovido pelo Brookings Institution. "É nosso dever assegurar a estabilidade financeira e a inflação dentro da meta", completou Tombini.

À plateia, Tombini explicou sua preocupação com os riscos inflacionários e com uma futura instabilidade financeira, decorrentes do intenso fluxo de capital no Brasil. O compromisso do BC, a rigor, é convergir a inflação ao centro da meta de 4,5% em 2012 - o que significa derrubar o indicador atualmente próximo ao teto, de 6,5%. Em consonância com o Ministério da Fazenda, criticou a excessiva liquidez resultante da política monetária das economias desenvolvidas. Em especial, dos EUA, onde os juros básicos estão próximos a zero desde dezembro de 2008 e onde a política de recuperação está assentada na emissão de dólares.

Tombini justificou as medidas macroprudenciais adotadas pelo governo para moderar o fluxo de capitais e o crescimento do crédito, sem as quais o trabalho do BC correria o risco de ser inteiramente "desfeito". Citou a cobrança de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) das aplicações em renda fixa, as compras com cartão de crédito e os empréstimos tomados por companhias no exterior. Conforme indicou, a vigência dessas medidas está associada à retomada mais vigorosa da economia nos países desenvolvidos.

"Chegará o momento em que as condições financeiras e monetárias começarão a se normalizar nos EUA e em outros países avançados", afirmou, referindo-se à perspectiva de o aumento de taxas de juros nesses mercados voltar a atrair boa parte dos capitais hoje direcionados para o Brasil. "No meio tempo, precisamos cuidar das pressões inflacionárias. É o que estamos fazendo."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Inflação de emergente preocupa

O crescimento da inflação na China e na Índia ameaça a recuperação global. Há o receio de que medidas desses países contra a alta de preços reduzam a demanda dos países desenvolvidos.

Nos 12 meses fechados em março, os preços ao consumidor na China subiram 5,4%, a maior taxa desde 2008. Na Índia, a inflação passou de 8,3% em fevereiro para quase 9%.

Inflação de emergentes é ameaça à reação global

Superaquecimento da economia leva países a endurecer sua política fiscal

FMI vai avaliar até que ponto aperto feito na Índia e na China pode causar desequilíbrio no comércio mundial

"Financial Times"

Dados divulgados ontem indicam que a inflação está crescendo na China e na Índia, destacando a ameaça à recuperação econômica global, diante do superaquecimento dos mercados emergentes e da alta dos preços das commodities.

Os preços ao consumidor na China subiram 5,4% em março, no acumulado de 12 meses -a maior alta desde 2008. Na Índia, a inflação foi de quase 9% em março, ante 8,3% em fevereiro.

Diante desses resultados, os emergentes estão endurecendo sua política fiscal, reduzindo, assim, uma fonte importante de demanda para as economias avançadas -que já enfrentam dificuldades por causa do desemprego e de cortes fiscais.

Responsáveis pelas políticas econômicas acreditam que o desequilíbrio é exacerbado pela ausência de coordenação de políticas.

Nos próximos meses, o Fundo Monetário Internacional vai avaliar até que ponto as políticas dos emergentes contribuem para o desequilíbrio comercial global e vai sugerir mudanças, como uma maior flexibilidade da moeda chinesa.

Julian Jessop, economista-chefe da Capital Economics, de Londres, disse que a inflação da China é movida pelos preços dos alimentos.

"O caso da Índia é um pouco diferente", disse. "Isso é visível nos números da inflação de base, que vêm subindo quase tão rapidamente quanto a inflação total."

As pressões exercidas pelos preços das commodities também são visíveis na Europa, onde o índice de inflação de março passou para 2,7%, o mais alto em dois anos, e nos EUA, que também viu alta de 2,7% no índice total de preços ao consumidor.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dilma dá aval ao BC para inflação além de 4,5%

Clóvis Rossi
Enviado especial a Boao (China)

A presidente Dilma Rousseff deu ontem o que pode ser lido como um aval indireto à controvertida política do Banco Central de aceitar uma inflação acima do centro da meta de 4,5% para evitar uma desaceleração excessiva do crescimento.

No Fórum de Boao para a Ásia, considerado "Davos" da Ásia, Dilma reafirmou que são fundamentais "o controle da inflação e a estabilidade fiscal", para depois deixar claro que ambas as condições não são um fim em si mesmo nem valor absoluto.

"Tem quer ter como objetivo criar condições para o crescimento e a inclusão social, sobretudo naqueles países em que parcelas enormes da população ainda vivem em situação de pobreza ou de pobreza extrema", disse.

O discurso da presidente partiu da análise das assimetrias na economia global.

Nela, inseriu de novo sua habitual queixa de que os Estados Unidos (não citados nominalmente) promovem uma política monetária frouxa que gera uma "expansão da liquidez", o que, por sua vez, "aprecia a moeda de vários países, sobretudo os exportadores de commodities".

POLÍTICAS RESTRITIVAS

Ela citou a seguir a adoção de "políticas restritivas tanto nos países emergentes para conter a inflação como nos países avançados para promover a consolidação fiscal".

A partir daí é que a presidente voltou ao cenário doméstico para "enfatizar que somos favoráveis ao controle da inflação e à estabilidade fiscal", desde que o objetivo final seja crescimento com inclusão social, que é "questão-chave para todos nós".

Dilma deu por sepultados "os consensos que se criaram na história recente. Sob a égide do mercado ou do Estado, mostraram-se frágeis como castelos de cartas".

Não receitou, no entanto, um novo consenso de qualquer natureza, até porque afirmou não buscar "modelos únicos nem tampouco unanimidades". A única receita é fácil de dizer, difícil de descobrir: "O mundo do século 21 requer criatividade".

O miolo do discurso de Dilma foi recheado com estatísticas sobre o crescimento do Brasil e suas perspectivas de investimento, tema que ela e seu antecessor, Lula, sempre destacam mundo afora.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Pai de advogado-geral da União obteve rádio

BRASÍLIA. A suspensão de licenças de rádio e TV por suspeita de irregularidades, anunciada em 28 de março pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, excluiu a Fundação Cultural MIR, dirigida por Reinaldo Ignácio Adams, pai do advogado-geral da União, ministro Luis Inácio Adams. Segundo reportagem publicada ontem pelo jornal "Folha de S.Paulo" , o próprio Paulo Bernardo autorizou a abertura de uma emissora FM educativa pela fundação dirigida por Adams. A portaria autorizando a concessão saiu no Diário Oficial da União de 31 de março, três dias após o anúncio da suspensão temporária das licenças.

Ao anunciar ontem que a concessão será mantida, o secretário de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, Genildo Lins de Albuquerque, disse que o parentesco é irrelevante e que desconhecia a ligação com o pai do chefe da AGU:

- Não foi dada concessão ao pai do ministro. Foi outorgada a uma fundação que tem convênio com uma universidade, que vai produzir informações.

FONTE: O GLOBO

Assembleia da Bahia homenageia invasores

Ministério Público anuncia investigação sobre doação de carne pelo governo ao MST, que ocupa prédio público

Biaggio Talento* e Paula Pitta*

SALVADOR. Os sem-terra que invadiram o prédio da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária (Seagri) da Bahia no início da semana e estão sendo presenteados com 600 quilos de carne por dia pelo governo do estado foram homenageados ontem pela Assembleia Legislativa baiana. Militantes do MST com facões foram autorizados a montar acampamento no plenário da Casa. O coordenador estadual do MST, Márcio Matos, disse que o grupo foi convidado pelo deputado estadual Marcelino Galo para uma sessão dedicada ao massacre de Eldorado do Carajás.

O Ministério Público da Bahia deve instaurar, na próxima semana, processo de investigação sobre a compra da carne e o patrocínio da infraestrutura para o acampamento de três mil integrantes do MST na Seagri.

A promotora Eliete Rodrigues, do Grupo de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa, disse que o caso chama atenção:

 - Sabemos que a reforma agrária é de interesse público, mas as despesas de mobilização de uma organização privada como o MST, não - disse ela. - A obrigação do Estado é adotar providências para viabilizar a reforma, seja desapropriando terras ou dando assistência técnica às famílias nos assentamentos.

Para Eliete, não consta como obrigação do Estado pagar as despesas de uma entidade como o MST. Matos disse que os três mil sem-terra vão continuar acampados na Seagri enquanto não entrarem em acordo com o governador Jaques Wagner.

* Da Agência A Tarde

FONTE: O GLOBO

Insatisfação de aliados no Congresso atinge votações

Parlamentares reclamam da atuação dos ministros Luiz Sérgio e Palocci

Na votação da MP que trata do trem-bala, 63% dos senadores do PMDB votaram contra ou não compareceram à sessão

Catia Seabra e Natuza Nery

BRASÍLIA – A insatisfação da base aliada com o Palácio do Planalto extrapolou os bastidores e começa a se traduzir em votações no Congresso, transformando o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, em alvo das reclamações.

Há tempo descontentes com a retenção de emendas parlamentares e a lentidão na ocupação de cargos, deputados e senadores passaram também a reclamar do "descaso" do governo.

O PMDB, um dos principais sócios da aliança, já deu um recado na votação do trem-bala na última quarta-feira: 63% de seus senadores ou votaram contra ou não compareceram ao plenário para apoiar o Executivo.

No Planalto, a avaliação é de que o resultado seria pior se a votação fosse secreta.

Naquela noite, o ministro Luiz Sérgio (Relações Institucionais) não estava lá, tampouco telefonou para monitorar o trabalho do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Coube ao presidente interino, Michel Temer, conter a rebelião em seu partido.

O governo já detectou o clima ruim e busca medidas para debelar a potencial crise.

Para evitar que retaliações em plenário comprometam projetos estratégicos, como o do Imposto de Renda, promete solução para liberar emendas represadas, e fala em acelerar a nomeação para o segundo escalão.

PALOCCI ARTICULADOR

Apesar do título, Luiz Sérgio não é identificado como o articulador político do governo. O posto é, informalmente, dado a Palocci, já que todas as indicações para cargos passam por ele.

Ocorre que o chefe da Casa Civil assumiu o ministério com a incumbência de tocar apenas os grandes temas no Legislativo. No Congresso, a queixa é corrente: "o ministro que decide, não recebe; e o que recebe, não decide".

"Falei para o [senador Fernando] Collor: "a gente precisa dar uma estruturadinha na oposição"", brincou o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), após tensa reunião da bancada.

Em defesa de Luiz Sérgio, o líder do governo disse que sempre trata com ele a agenda legislativa. Mas admitiu que o ministro não telefone para acompanhar a votação do trem-bala.

Por intermédio de sua assessoria, o ministro das Relações Institucionais afirmou ter recebido 99 parlamentares da base no último mês.

O problema, apontam governistas, não é a quantidade de audiências, mas a falta de resultado.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Código Florestal pode livrar 95% de ilegais

Acordo para Código Florestal tira 95% das propriedades rurais da ilegalidade

Marta Salomon

A grande maioria das propriedades rurais do País (95%) - que detém uma parcela menor das terras - sairá da ilegalidade por meio da nova proposta de Código Florestal que o governo fechou internamente e agora negocia com o Congresso.

A proposta, acertada em reunião anteontem no Planalto, mas ainda não divulgada oficialmente em detalhes, vai permitir o uso de áreas de reserva legal e de proteção permanente para atividades consideradas de utilidade pública, interesse social e baixo impacto no meio ambiente.

O impacto da proposta que vinha sendo negociada nos bastidores havia três meses foi medido pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que ontem participou de encontro de povos da floresta na cidade de Parintins, uma ilha do Rio Amazonas. Ela defendeu a análise de situações excepcionais, que hoje não seriam consideradas ambientalmente regulares, de acordo com o código em vigor. A ideia é garantir que a maior parte dos proprietários - principalmente os pequenos - se enquadre na lei.

Calcula-se que haja no Brasil cerca de 870 mil quilômetros quadrados de áreas desmatadas fora das regras ditadas pelo Código Florestal. Nem toda essa extensão terá de ser recuperada com o replantio da vegetação nativa. A ministra não detém, no entanto, previsão do efeito da nova proposta sobre o total da área do passivo ambiental.

Uma das propostas acertadas no Planalto desobriga o produtor rural de registrar a área de proteção ambiental das propriedades em cartórios, conforme o Estado antecipou na última quarta-feira. O efeito da medida é que os produtores rurais que não têm o registro não serão mais multados, como previa decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, editado em dezembro de 2009. As autuações começariam em 12 de junho.

Os produtores terão de fazer, no entanto, o cadastro ambiental rural, que permitirá ao governo identificar o responsável por desmatamentos irregulares por meio de coordenadas geográficas.

Margens de rio. Izabella contou que a intenção do governo é negociar com o Congresso a nova proposta. O governo não abre mão de manter em 30 metros a extensão da área de proteção ambiental às margens dos rios mais estreitos nem de exigir a reserva legal em todas as propriedades rurais do País, num percentual que varia de 20% a 80% dos imóveis, dependendo do bioma. Mas o próprio governo concorda em reduzir para 15 metros a área de recuperação de proteção permanente em casos excepcionais.

O relator do projeto na Câmara, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), insiste em reduzir a área de proteção para 15 metros nas margens dos rios, e sua proposta dispensa áreas de até quatro módulos fiscais (de 20 hectares a 400 hectares, dependendo do município) da exigência de ter reserva legal, segundo a versão já aprovada por comissão especial da Câmara.

Como reivindicavam os ruralistas, a proposta do governo prevê o desconto das áreas de proteção permanente na reserva legal das propriedades. Se uma propriedade na Amazônia preserva a floresta em 80% de sua área, essa extensão considera a proteção às margens dos rios e encostas.

"Vamos negociar e o que não puder ser acordado, será decidido no voto", disse a ministra. O projeto de lei terá de ser votado na Câmara e no Senado, antes de ir à sanção presidencial.

Restam algumas lacunas a serem esclarecidas na proposta do governo, como a classificação de um determinado uso da terra de reserva legal ou área de proteção permanente como de interesse social, utilidade pública ou de baixo impacto ambiental.Tampouco está claro qual a autonomia dos Estados no enquadramento de propriedades já desmatadas como uma situação excepcional que merece ser regularizada.

A proposta do governo também prevê a redução em 30% da área de reserva legal de propriedades localizadas em municípios que detenham pelo menos a metade de seu território ocupado por unidades de conservação.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cuba abre seu "congresso das reformas"

Reunião com mil delegados de cúpula será a 1ª em 14 anos; cubanos se animam com promessas de mudanças

Marcha que deve reunir milhares hoje nas ruas de Havana será o maior marco do aniversário de 50 anos do regime

Flávia Marreiro
Enviada especial a Havana (Cuba)

Uma grande marcha "militar" e "popular" comemorará hoje em Havana cinco décadas de socialismo em Cuba e marcará ao mesmo tempo o início da reunião do Partido Comunista convocada para tentar salvar o sistema cubano de um naufrágio.

A expressão dramática é do próprio ditador da ilha, Raúl Castro, que no fim do ano passado disse: "Corrigimos ou afundamos", para sintetizar os desafios de "atualizar" o modelo socialista que atravessa arrastada crise desde 1990.

Há exatos 50 anos, Fidel Castro declarou o "caráter socialista" da Revolução vitoriosa em 1959. A afirmação veio apenas um dia antes da fracassada Invasão da Baía dos Porcos por exilados cubanos treinados pela CIA.

A marcha de hoje em Havana, convocada por rádio e TV e até por alto-falantes na rua, comemorará também a "primeira derrota do imperialismo na América Latina" e será encerrada por jovens que afiançam o futuro da revolução, segundo a propaganda oficial.

Nas lojas estatais, cartazes feitos a mão "saúdam" o congresso, o primeiro em 14 anos. Estamos na comercial região de Centro Havana, e a nova paisagem se destaca: os vendedores ambulantes que aparecem aqui e ali, aproximando Havana e suas ruínas congeladas no tempo de qualquer cidade latina.

Alaine González, 33, há dez anos vende sorvete, mas só há três meses recebeu licença formal para trabalhar. "Perdi as contas de quantas multas paguei. Agora estou aqui no centro, tem dias que ganho US$ 20", comemora.

González é um símbolo dos 170 mil cubanos que, segundo o governo, pediram e receberam licenças para trabalhar por conta própria desde setembro, afrouxando as proibições então vigentes.

Vendedor de CD pirata também é uma das pouco menos de 200 atividades autorizadas, assim como vendedor de "alimentos ligeiros" e "reparador de colchões".

Reinel Herrera, 30, gritava a plenos pulmões seu novo ofício autorizado, a poucas quadras. "Faço colchões também. Mas ainda não permitem vender."

REFORMAS

O trabalho autônomo é uma das apostas do governo para amortecer o impacto do seu mais radical plano em décadas: o de demitir até 500 mil funcionários públicos em sete meses, enxugar o Estado e aumentar a produtividade.

O plano é um dos eixos que o Partido Comunista vai discutir de hoje a terça. No começo do mês, Raúl voltou ao tema, dessa vez para tentar desarmar seu dramatismo: afirmou que as reformas levarão "não menos que um quinquênio" e que não era fácil demitir em massa.

Há expectativa de que a cúpula de mil delegados do PC, a instância máxima formal em Cuba, decida também um cronograma para o fim da "caderneta de racionamento", cota de alimentos subsidiados que vigora desde os anos 60.

Outros pontos são a "flexibilização" do mercado imobiliário e de carros de fabricação após 1959 -intercâmbios legalmente congelados para compra e venda também há décadas.

"Não sei se sou otimista ou não. Tanto tempo estamos na mesma que não sei mais avaliar. Para mim, a vida começou agora. Perdi a conta das multas que paguei", diz o sorveteiro González.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

ENTREVISTA - Ophir Cavalcante: “Sem pressão popular não haverá mudanças”


Ophir- Presidente da OAB
Sérgio Montenegro Filho

É preciso aproveitar o momento de cidadania vivido pelo País e estimular a sociedade a lutar por mais participação direta. A tese é do presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Ophir Cavalcante. Especialista em direito trabalhista, procurador do Estado do Pará e professor da Universidade Federal Paraense, ele encampou de vez a briga pela reforma política no Congresso Nacional. Nesta entrevista ao JC, Ophir Cavalcante critica os atuais partidos políticos e adverte que deputados e senadores não aprovarão o projeto se não forem pressionados pela sociedade civil. Em 2010, Cavalcante assumiu a presidência nacional da OAB e passou a se dedicar à elaboração de uma proposta de reforma política, que a entidade submeterá aos movimentos sociais e, posteriormente, ao Legislativo.

JC – O senhor cobrou, na audiência pública da comissão, que as mudanças no sistema eleitoral sejam efetivadas ainda neste ano pelo Congresso Nacional. Depois de tantos anos se arrastando no Legislativo, o senhor acredita que a reforma política pode ser votada de uma forma rápida? Não seria o caso de se aprofundar mais as discussões?

OPHIR CAVALCANTE – Essa discussão já vem sendo travada há dez anos. E a Câmara e o Senado não podem mais frustrar a população. A presidente Dilma Rousseff, ao assumir, fez um discurso em que foi aplaudida de pé, em que defendeu as reformas política e tributária. Os presidentes do Senado e da Câmara tiveram o mesmo discurso. Ambas as casas criaram comissões para estudar a reforma política. E a grande maioria dos políticos diz que o sistema é ruim e precisa mudar. Com todo esse apelo, e a sociedade pressionando, não há outra alternativa, na visão da OAB, que não seja fazer a reforma política. Precisamos de um novo modelo porque o atual está esgotado.

JC – O senhor chegou a questionar a existência de duas comissões para tratar o mesmo assunto, uma na Câmara e outra no senado. Isso não gera dúvidas sobre a real disposição do Congresso Nacional de realizar efetivamente a reforma política?

OPHIR CAVALCANTE – Sem dúvida. E eu questionei isso lá. Se os parlamentares têm real interesse de resolver isso, não podem continuar no faz-de-conta, em promessas vãs. O Senado cria uma comissão para analisar a pauta em 45 dias, e a Câmara, com um prazo de 180 dias e uma pauta diferente, discutindo com a sociedade civil. Apesar desses movimentos, na prática a reforma parece não acontecer. Mas a OAB não acredita que os parlamentares desta nova legislatura vão incorrer no mesmo erro, na mesma promessa vã feita há dez anos, de fazer a reforma política.

JC – A maioria dos congressistas defende o status quo. Entende que as mudanças em uma reforma política prejudicariam suas chances de permanência no poder. Essa resistência é capaz de derrotar a reforma em votação no plenário. Como se vai quebrá-la?

OPHIR CAVALCANTE – Só vai sair reforma se a sociedade se engajar e houver pressão. É muito difícil sair essa reforma porque apesar do discurso de que todos querem, o dia a dia não nos faz crer que possa haver reforma a partir da vontade dos parlamentares.

JC – Até mesmo o movimento social se dividiu em relação à reforma. Hoje, parte das entidades está na Frente Parlamentar Mista em Defesa da Reforma Política, enquanto outra parte integra a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma. Essa divisão não reduz a pressão popular sobre o Legislativo?

OPHIR CAVALCANTE – É uma questão em que se precisa avançar, encontrar um ponto de consenso e trabalhar em conjunto. Senão, vamos incorrer no mesmo erro dos parlamentares ao fazer duas comissões.

JC – Como o senhor definiria o atual modelo eleitoral no Brasil?

OPHIR CAVALCANTE – Um modelo injusto, que privilegia o poder econômico e o poder político. É necessário que se reveja isso para garantir que novas pessoas interessadas possam participar. Mas qualquer modelo que se apregoa não vigorará se não houver uma reforma na lei orgânica dos partidos políticos, que hoje são, na verdade, clubes de amigos, clubes de caciques, com donos. Enquanto houver uma ditadura partidária, e não uma democracia dentro dos partidos, nenhuma reforma vai vingar no País. Porque praticamos uma democracia em que os partidos fazem a interlocução entre a sociedade e o parlamento. Não é uma democracia onde se admitam candidaturas avulsas, tudo passa pelos partidos. Mas como esses partidos são clubes fechados, de amigos – onde o diretório municipal é desfeito quando contraria a vontade do diretório estadual ou do diretório nacional – é preciso um novo modelo.

JC – A OAB chegou a enviar aos presidentes da Câmara e do Senado, meses atrás, um esboço de reforma política. Na época, porém, não houve tanto impacto como agora. O que mudou desde então?

OPHIR CAVALCANTE – O momento político. A sociedade, a partir do Ficha Limpa, que foi o início das reforma política, descobriu que pode contribuir, pressionar exigir dos parlamentares uma política mais séria, ética, comprometida com os valores republicanos e a democracia.

JC – Quanto daquele projeto elaborado pela OAB será reapresentado à comissão especial, a título de sugestão?

OPHIR CAVALCANTE – Estamos discutindo a questão internamente. Tínhamos uma proposta baseada na democracia participativa, do professor Fábio Konder Comparato, e esse modelo é o grande eixo das nossas proposições. Mas a OAB está atualizando e simplificando esse modelo para levar a discussão primeiro aos movimentos sociais, depois ao Congresso Nacional.

JC – Algumas entidades que integram o movimento pela reforma divergem sobre a ordem de importância dos temas. Para o senhor, o que demanda mais urgência na reforma política?

 OPHIR CAVALCANTE - Primeiro uma redemocratização dos partidos políticos. Vemos nos Estados Unidos e outras grandes democracias do mundo os referendos e plebiscitos. No Brasil, tivemos poucos e a duras penas, como o das armas e o do sistema de governo. Há temas importantes em tramitação no Senado e na Câmara que precisam da participação popular para ser decididos. A gente precisa incentivar esses mecanismos, o povo precisa conhecer melhor seu poder, que é o da participação direta.

JC – Na primeira audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, houve cobranças por uma maior participação popular. O senhor considera possível se criar essa cultura, com plebiscitos e referendos no Brasil? Mesmo com o eleitor acostumado a ser representado de forma indireta, pelo Legislativo?

OPHIR CAVALCANTE – Porque o povo nunca experimentou outro modelo. Precisamos mudar isso.

JC – Há a questão da falta de transparência dos partidos políticos, que teoricamente devem funcionar também como representantes da participação popular no poder. Isso não se deve ao excesso de siglas registradas no País?

OPHIR CAVALCANTE – Sem dúvida. Por isso que a OAB defende, por exemplo, o fim das coligações proporcionais. Isso acabaria com o aluguel de partidos e ainda baratearia o custo das campanhas.

JC – Dois aspectos são vistos como mais delicados no debate da reforma política: a questão do voto distrital misto e as listas pré-ordenadas de candidatos. É possível implantar tais dispositivos num país que há tanto tempo convive com os currais eleitorais?

OPHIR CAVALCANTE – Possível é. Basta ter vontade política para fazer. Se criou alguns tabus em relação à divisão por distritos. Alguns apontam argumentos importantes, como o de que um distrito em São Paulo seria diferente de um em Roraima, em termos de participação. Mas é possível sim. Até porque a representação é proporcional a cada Estado, à sua população. Agora, há questões locais que terão que ser superadas. Há municípios que são inimigos, têm rixas, rivalidades. Um quer ser mais desenvolvido que o outro, e não vão querer estar no mesmo distrito. Mas isso é uma questão cultural que precisa ser resolvida.

JC – Da mesma forma, pairam dúvidas da sociedade civil sobre o financiamento público das campanhas. Há quem diga que seria injusto tirar dinheiro de setores carentes como saúde e educação para bancar campanhas eleitorais. E o que dizer dos questionamentos de que, mesmo com dinheiro público, alguns candidatos de maior poder econômico poderiam continuar lançando mão do conhecido caixa dois?

OPHIR CAVALCANTE – Há pesquisas que mostram que um voto, com o financiamento público das campanhas, custa sete reais, enquanto no financiamento privado, custa 120 reais. E a que custo esse voto é dado? Muitas vezes paga o preço da corrupção, caixa dois, envolvimento de empresas, ainda que legalmente, para depois cobrar através de dispensa de licitações, ou de licitações dirigidas. E o atual modelo impede que novas vocações sejam implementadas na política brasileira. O que se quer é dar mais transparência e representatividade, sem contar que hoje o número de candidaturas impede que se faça uma efetiva fiscalização das contas. Se faz por amostragem, mas não há estrutura para tanto. Se nós reduzirmos isso para fiscalizar os partidos, fica mais fácil.

JC – Quanto ao discurso de que o financiamento público tiraria verbas de saúde e educação?

OPHIR CAVALCANTE – Isso é o discurso do “quanto pior, melhor”. Como chamamos entre os advogados, “ad terroris”, feito para amedrontar. Na verdade, há outras fontes de recursos. Eu até falei isso no Parlamento: me diga se é justo uma assembleia legislativa receber um orçamento quase igual ao que recebe um tribunal de Justiça. Acontece em muitos Estados da Federação. Há lugares que estão recebendo muito mais orçamento que outros, e não precisa tirar da saúde e da educação não. Esse é um dinheiro imexível.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

As sem-razões do amor::Carlos Drumonnd de Andrade

Eu te amo porque te amo, Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.


Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.


Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.


Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.