sábado, 21 de maio de 2011

Opinião – Raimundo Santos

Muito vem se discutindo sobre a crise identitária e programática dos partidos, principalmente a do PSDB. Já se chegou a dizer que há risco de não se ter oposição durante o governo Dilma. O oficialismo atual surpreende, se comparado com o apoio conquistado pelo Presidente Lula em campanha permanente. A crise do PSDB está sendo associada aos motivos os mais diversos, desde às derrota e idiossincrasias dos candidatáveis da próxima eleição presidencial, Aécio e Serra, até a luta interna que estaria esmaecendo sua presença propositiva na cena política.

No entanto, chama a atenção o que nos diz Ferreira Gullar, cujas opiniões sobre a conjuntura não nos têm faltado nos últimos tempos da Era Lula. Aludindo ao PSDB, o poeta escreveu na sua crônica “E o lobo virou cordeiro”, publicada pela Folha Ilustrada no domingo, dia 8 de maio de 2011: “Uma visão simplista atribuiria tudo isso ao carisma e à sagacidade política de Lula quando, na verdade, se trata de coisa bem mais complexa, conforme entendo. Se Lula mudou de retórica e de visão social, aderindo às ideias do adversário, foi porque a visão e os projetos deste é que correspondiam às necessidades reais do país. As mudanças que ele introduziu, por serem necessárias, tornaram-se irreversíveis. E, assim, o PT virou PSDB, como um lobo que se metesse em pele de cordeiro. Com a diferença de que, se o lobo da fábula continuou lobo, o lobo Lula virou cordeiro mesmo. E Dilma, mais ainda, se não quiser fracassar. Daí por que o PSDB tem dificuldade de fazer oposição, pois seria como opor-se a si mesmo.”

Raimundo Santos, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ)

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Fraudes e descontrole no Ecad prejudicam músicos
Procurador pede que Palocci revele clientes
Um desvio de R$ 615 milhões em Campinas
PM começa a ocupar Alemão em agosto

FOLHA DE S. PAULO

Em 2 meses, após a eleição, Palocci faturou R$ 10 mi
Governo define tática para evitar paralisia
Segurança aérea ficou nas mãos de inapto, diz instrutor a juiz

O ESTADO DE S. PAULO

Oposição se articula para criar CPI sobre Palocci
Procurador dá 15 dias de prazo
Operação contra fraudes prende 12 em Campinas
Metalúrgicos fazem greve por fatia nos lucros

ESTADO DE MINAS

PIB menor, inflação maior
Minas quer compensação a região pobre

CORREIO BRAZILIENSE

Base aliada é contra o teto para reajuste

ZERO HORA (RS)

Procurador dá 15 dias para Palocci se explicar
Tarso credita aos “que ganham mais” a reação à reforma

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Começa a Via Mangue
Vitória cresce e vira "terra das oportunidades"
Auditores x técnicos no TCE
Gurgel pede explicações ao ministro

Procurador pede que Palocci revele clientes

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deu prazo de 15 dias para o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, prestar esclarecimentos sobre sua evolução patrimonial e sobre a atuação de sua empresa de consultoria, a Projeto. Atendendo a requerimentos de partidos de oposição, Gurgel quer saber quem eram os clientes da empresa.

Palocci tem 15 dias para se explicar

CONSULTORIAS

Procurador-geral quer saber quem eram os clientes da consultoria do hoje ministro

Demétrio Weber

A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ontem esclarecimentos ao ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, sobre sua evolução patrimonial e sobre a atuação da empresa de consultoria Projeto, da qual o ministro é dono. O procurador-geral, Roberto Gurgel, fixou prazo de 15 dias para que Palocci responda ao documento, entregue no Palácio do Planalto, no fim da tarde. A assessoria do ministro informou que a resposta será encaminhada na semana que vem.

Segundo a assessoria de Imprensa da Procuradoria-Geral da República, Gurgel encaminhou a Palocci representações feitas esta semana pelo PPS e por líderes no Senado dos partidos de oposição: PSDB, DEM, PPS e PSOL. Nos dois casos, a oposição cobrou esclarecimentos sobre a compra de um apartamento de R$6,6 milhões e um escritório de R$882 mil em São Paulo, através da Projeto.

Gurgel solicita documentos, entre eles cópia da relação de bens que Palocci entregou à Comissão de Ética Pública da Presidência da República, e informações sobre a inclusão dos imóveis na sua declaração de Imposto de Renda. Segundo a Procuradoria-Geral da República, o pedido de esclarecimento não constitui procedimento de investigação, mas apenas uma oportunidade para que o ministro se manifeste sobre o teor das representações. Em tese, somente após a resposta de Palocci, Gurgel decidirá se abre inquérito ou outro procedimento.

Ontem, o jornal "O Estado de S. Paulo" noticiou que Palocci pretendia enviar espontaneamente os esclarecimentos a Gurgel, o que poderia ocorrer ontem mesmo. Até o fim da tarde, porém, a PGR não tinha recebido qualquer comunicado de Palocci. O pedido de Gurgel chegou ao Planalto pouco antes das 18h.

Segundo a "Folha de S. Paulo", a Projeto teria tido um faturamento de R$20 milhões no ano passado. A empresa foi criada em 10 de agosto de 2006, durante a campanha eleitoral, com o nome de Projeto - Consultoria, Planejamento e Eventos Ltda. Palocci, com 99% do capital social, tinha como sócia a mulher, Margareth, com 1%. Dois meses depois, ele foi eleito deputado federal por São Paulo. Em 8 de dezembro daquele ano, o nome da empresa foi alterado para Projeto - Consultoria Financeira e Econômica Ltda. E Margareth deu lugar a Lucas Novaes na sociedade.

A representação do PPS, assinada pelo líder na Câmara, deputado Rubens Bueno (PR), lista seis perguntas: 1) Quem eram os clientes dessa empresa?; 2) Quanto a empresa faturou no período em questão?; 3) Quais eram os serviços de consultoria prestados pela empresa?; 4) Se o ministro detinha 99,9% do capital social, por que não optou por fazer a retirada de lucro e registrar os imóveis em seu próprio nome, ou seja, como pessoa física?; 5) Como o ministro encontrava tempo para administrar a empresa, se exercia o mandato de deputado federal, e seu sócio minoritário reside nos Estados Unidos?; 6) A escolha da área de atuação da empresa (consultoria financeira e econômica) tem alguma relação com o fato de o então deputado federal Antonio Palocci ter sido, àquela época, membro da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara?

FONTE: O GLOBO

Em 2 meses, após a eleição, Palocci faturou R$ 10 mi

Valor é mais da metade da receita da consultoria no ano; quitação de contratos explica concentração, diz empresa

O faturamento da empresa de consultoria do ministro Antonio Palocci superou R$ 10 milhões entre novembro e dezembro de 2010, informa Catia Seabra.

À época, a presidente Dilma Rousseff já estava eleita e o atual ministro da Casa Civil coordenava a equipe de transição de governo.

Empresa de Palocci faturou R$ 10 mi em apenas dois meses

Receita obtida por consultoria em 2010 se concentrou no período entre o fim da campanha e a posse de Dilma

Assessoria atribui movimentação intensa a quitação de contratos depois da mudança da atividade da Projeto

Catia Seabra

BRASÍLIA - O faturamento da consultoria do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, no ano passado superou R$ 10 milhões em novembro e dezembro, os dois meses que separaram a eleição da presidente Dilma Rousseff e sua posse.

Palocci foi o principal coordenador da campanha de Dilma e chefiou a equipe que organizou a transição para o novo governo nesse período. Dilma anunciou sua escolha como ministro da Casa Civil no dia 3 de dezembro.

O valor obtido nos últimos dois meses do ano pela empresa de Palocci, a Projeto, representa mais da metade de sua receita no ano passado. A consultoria faturou R$ 20 milhões em 2010, segundo duas pessoas que examinaram seus números e foram ouvidas pela Folha.

Sem confirmar os valores, a assessoria da empresa atribuiu a intensa movimentação do fim do ano ao cancelamento de vários contratos após a decisão de Palocci de mudar a Projeto de ramo e encerrar suas atividades como consultor, antes de assumir o comando da Casa Civil.

Palocci abriu a Projeto em julho de 2006 e manteve sua atividade empresarial nos quatro anos em que exerceu o mandato de deputado federal e durante a campanha eleitoral do ano passado.

Como a Folha revelou ontem, o desempenho da Projeto no ano passado representou salto significativo em comparação com os R$ 160 mil faturados em 2006, quando a empresa abriu as portas.

O faturamento da Projeto em 2010 põe a consultoria de Palocci em pé de igualdade com as maiores empresas do ramo no país. A LCA Consultores, que hoje lidera o setor, faturou pouco mais de R$ 20 milhões no ano passado.

Entre as empresas que contrataram Palocci nos últimos anos estão a construtora WTorre e a operadora de planos de saúde Amil, como a Folha informou ontem.

Palocci multiplicou seu patrimônio com a ajuda da consultoria, adquirindo em São Paulo um apartamento de R$ 6,6 milhões em dezembro de 2010 e um escritório de R$ 882 mil em 2009.

Os imóveis foram registrados em nome da Projeto, que em dezembro deixou de ser uma consultoria e virou uma administradora de imóveis. A Casa Civil afirma que o apartamento e o escritório são os únicos imóveis administrados pela empresa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Oposição se articula para criar CPI sobre Palocci

Intenção é saber se houve tráfico de influência, mas investigação depende de apoio de governistas

A oposição começou a se mobilizar para tentar criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito que investigue a antiga consultoria do ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. A intenção é quebrar os sigilos fiscal e bancário da empresa e verificar se houve tráfico de influência. O requerimento de criação da CPI questiona o papel de Palocci como um dos coordenadores de campanha de Dilma Rousseff à Presidência ao mesmo tempo que houve “extraordinário crescimento patrimonial" de sua empresa. Para tirar a CPI do papel, porém, a oposição precisa do apoio de parte da base governista. São necessárias 171 assinaturas na Câmara e 27 no Senado, enquanto a oposição tem menos de 100 deputados e somente 18 senadores. Para o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), "não há motivo nenhum para nenhuma CPI".

Oposição propõe CPI para investigar conexões de Palocci com empresas

PSDB defende investigação sob alegação de que governo impede a convocação do ministro; movimentação financeira da Projeto, em 2010, abre suspeitas sobre elo com eleição

Eduardo Bresciani

BRASÍLIA - A crise que atingiu o braço direito da presidente Dilma Rousseff ganhou decibéis com o início de uma mobilização da oposição para criar uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI) que investigue negócios da empresa de consultoria do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.

A intenção é quebrar os sigilos fiscal e bancário da empresa de consultoria do ministro, a Projeto, e verificar se houve tráfico de influência. Sem a ajuda de partidos da base aliada, a oposição não terá número suficiente de assinaturas para criar uma CPI. A exposição do sigilo do ministro revelaria contatos com boa parte do PIB nacional, o que tem deixado o mercado inquieto.

A proposta de tentar uma CPI mista de deputados e senadores sobre o caso surgiu no PSDB, partido da oposição que vinha atuando de forma mais discreta no caso. O requerimento de criação da CPI avança ainda para um questionamento sobre o papel de Palocci como um dos coordenadores de campanha da presidente Dilma Rousseff ao mesmo tempo que prosperava o faturamento de sua empresa.

Conforme o Estado publicou nesta sexta-feira, 20, o próprio ministro, em informações que pretende enviar à Procuradoria-Geral da República, admite que a maior parte da movimentação financeira da empresa Projeto ocorreu após a eleição de 2010.

Os líderes tucanos na Câmara, Duarte Nogueira (SP), e no Senado, Alvaro Dias (PR), conversaram com o presidente do partido, deputado Sérgio Guerra (PE), e decidiram começar as articulações. DEM, PPS e PSOL já manifestaram apoio à ideia.

Para tirar a proposta do papel, a oposição precisa recolher 171 assinaturas na Câmara e 27 no Senado. Juntos, os partidos oposicionistas somam menos de 100 deputados e 18 senadores.

Blindagem. Duarte Nogueira afirma que a oposição decidiu partir para essa iniciativa diante da ação do governo de blindar o ministro. "Nós, da oposição, fizemos ações em todas as frentes e chegamos ao absurdo de o governo impedir todas as comissões da Câmara de funcionar. Ninguém aguenta mais o silêncio ensurdecedor do ministro e do Palácio do Planalto."

A ementa do requerimento de CPI cita o "extraordinário crescimento patrimonial da empresa Projeto", pede que seja investigado se houve "a percepção de vantagens indevidas" ou o "patrocínio de interesses privados perante a órgãos do governo federal" e avança até sobre a possível "relação desses fatos com a campanha presidencial de 2010".

O líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), destaca as possibilidades que se abrem com a nova estratégia da oposição. "A CPI tem instrumentos que outras comissões não possuem. Podemos quebrar sigilos, obter informações rapidamente do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da Receita."

O oposicionista destaca que o fato de o faturamento da empresa ter se concentrado no ano passado faz com que as suspeitas deixem de ser exclusivamente sobre o ministro. "A coincidência do êxito da empresa com o período eleitoral leva suspeitas sobre a campanha presidencial."

Paralisia. O discurso da oposição para sensibilizar alguns governistas já está ensaiado. "Daqui a pouco a crise se agrava de um jeito que pode paralisar o governo. Queremos que essa crise tenha um fim e isso só acontecerá se esclarecendo os fatos", diz o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR). O PPS tem pronto também outro requerimento pedindo uma investigação somente na Câmara.

Entre os governistas mais alinhados com o Planalto, porém, a intenção é dar o assunto por encerrado. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou nesta sexta que não vê motivo para uma CPI. "Acho que não há motivo nenhum para nenhuma CPI, uma vez que até agora não vi no debate nenhum crime a ser levantado e nenhuma contravenção que se pudesse investigar."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O que o ministro oferecia – Editorial – O Estado de S. Paulo

O então deputado federal e ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci faturou muito mais do que os cerca de R$ 7,5 milhões gastos com os dois imóveis comprados em nome da Projeto, a empresa de consultoria que abriu em 2006 e transformou em administradora de bens no final de 2010, dias antes de assumir a Casa Civil da presidente Dilma Rousseff, de quem tinha sido coordenador de campanha. Nesse período, portanto, ele multiplicou o seu patrimônio declarado por muito mais do que 20 vezes.

Palocci se recusa a falar em números, a identificar clientes e a descrever a natureza dos serviços que lhes prestou. Mas o texto produzido por sua assessoria para orientar os líderes da base parlamentar do governo na sua defesa - e que, por inadvertência, foi amplamente difundido - argumenta que, "no mercado de capitais e em outros setores, a passagem por Ministério da Fazenda, BNDES ou Banco Central proporciona uma experiência única que dá enorme valor a esses profissionais no mercado", citando ex-autoridades da área que prosperaram na iniciativa privada.

Qual será o valor de mercado de quem tem a oferecer, além da "experiência única", a credencial de ter permanecido como protagonista de primeira grandeza na esfera das decisões do governo? Palocci sabia não apenas como funciona o poder, mas que rumos o poder tencionava tomar em matérias de interesse direto do empresariado e do sistema financeiro. O escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro que testemunhou as visitas do então titular da Fazenda a uma mal-afamada casa de Brasília custou-lhe o posto, mas não o prestígio.

Enquanto dava lá as suas disputadas consultorias - a carteira de clientes da Projeto incluía pelo menos 20 formidáveis corporações -, ele continuava a ser interlocutor privilegiado do presidente Lula e da elite lulista, no Executivo, na administração indireta e no Congresso. Quando chegou a hora, tornou-se fiador da candidata Dilma Rousseff junto ao grande capital. Dizer, como o aide-mémoire que vazou para todos os lados, que 237 parlamentares exercem atividade econômica é querer jogar areia nos fatos. O deputado Palocci esteve longe de ser mais um.

Relator do projeto social do pré-sal e da proposta de prorrogação da CPMF, presidente da comissão da reforma tributária e membro da comissão do Orçamento, lembra a colunista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor, além de diretamente envolvido na regulamentação da previdência complementar, ele estava em posição de antecipar tendências aos seus consulentes, um certo número dos quais há de ter contribuído para a sua campanha, e de levar em conta os seus interesses. Não está claro em que medida isso estava no cerne de suas consultorias - se é que estava. Mas os ganhos da Projeto são compatíveis com oportunidades dessa magnitude.

Significativamente, talvez, a firma não tinha nome na praça, ao contrário de congêneres como a LCA e a Tendências (de que é sócio o ex-ministro Mailson da Nóbrega, citado como exemplo de sucesso na nota da Casa Civil). Segundo a Folha de S.Paulo, profissionais do setor "nunca ouviram falar da atuação da empresa de Palocci". O jornal equipara o faturamento da Projeto ao daquelas com uma centena ou mais de clientes - um número bem maior que os do ministro - e dezenas ou uma centena de funcionários. O quadro de pessoal da Projeto é desconhecido.

Em documento enviado à Procuradoria-Geral da República para se antecipar a um eventual pedido de esclarecimento sobre os seus negócios, conforme revelou o Estado, Palocci cita apenas o seu sócio (com 1% do capital da consultora) Lucas Martins Novaes. Por ser ele economista, o ministro - médico de formação - podia ter uma empresa de "prestação de serviços, palestras, análise de mercado". A explicação é supérflua. Obviamente, nenhuma empresa capaz de pagar o que a Projeto cobrava iria preteri-la em razão das origens profissionais do seu sócio titular.

Nem ele deve tê-la criado para lavar "recursos não contabilizados", como diriam os seus companheiros petistas ao tempo do mensalão. A lógica dos fatos indica que o ilícito que se poderia atribuir a Palocci, levando às alturas o seu patrimônio, chama-se tráfico de influência.

Crise e oportunidade :: Fernando Rodrigues

O Brasil avança há alguns anos como um aspirante a "global player". A democracia é estável. A moeda, de verdade. Aí sempre vem um escândalo e nos alerta sobre como o país tem uma base institucional atrasada.

O "patrimoniogate" de Antonio Palocci é um desses episódios. Deputado federal de 2007 a 2010, ele foi um próspero consultor de empresas. Não há lei ou regra no Brasil que impeça as duas atividades concomitantes. Se pode ter dois empregos, por que não três?

Em 2010, dava expediente na Câmara, era consultor e também ajudava a arrecadar fundos para Dilma Rousseff. Pelo menos uma empreiteira -com interesse no governo- foi cliente de Palocci e doadora da campanha presidencial petista.

E daí? Daí, nada. O ministro e o governo preferem permanecer em eloquente silêncio. É um direito inalienável. A resposta básica oferecida é a do legalismo: todas as atividades estão em conformidade com a norma vigente. Todos os impostos foram recolhidos.

O desfecho do imbróglio é indecifrável. A tática Armando "nada a declarar" Falcão será confrontada com fatos novos. Apesar dessa incerteza sobre o que vem por aí, a crise é uma excelente oportunidade para o Congresso e o Executivo refletirem sobre disciplinar o comportamento de agentes públicos.

Para começar, deputados e senadores podem exercer seus mandatos e prestar consultoria a empresas? Existem 273 nessa situação. Há um evidente conflito de interesses na praça. O ministro da Casa Civil transformou-se no epítome de algo generalizado e tolerado há décadas na política nacional.

Se Palocci prefere ficar em silêncio, joga-se o jogo. Ele estará na cadeira enquanto Dilma o desejar no cargo. Já a presidente da República pode responder de outra forma. Nada a impede de apresentar um projeto que no futuro elimine o vácuo institucional hoje preenchido por toda sorte de "consultoria".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Decisões paulistas:: Merval Pereira

A divisão interna do PSDB está impedindo que o partido dispute com chances a prefeitura de São Paulo, pela primeira vez em muitos anos. Mesmo tendo chegado apenas uma vez ao poder, com José Serra em 2004, o partido, que assim como o PT tem sua base no estado, sempre disputou a prefeitura com seus nomes mais destacados, como foi o caso de José Serra em 1988, 1996 e 2004, e de Geraldo Alckmin em 2000 e 2008.

Anteriormente, ainda no PMDB, Mario Covas fora prefeito em 1983, e Fernando Henrique Cardoso fora candidato à prefeitura em 1986, tendo perdido para Jânio Quadros por pouco mais de 1% dos votos.

Como se vê, todas as principais lideranças tucanas passaram pelo teste da disputa da prefeitura paulistana antes de chegar ao governo estadual ou, no caso de FH, à Presidência da República.

O candidato natural neste momento é o ex-governador e ex-prefeito José Serra, mas dificilmente ele aceitará a tarefa, pois essa decisão representaria abandonar o sonho de ainda disputar a Presidência da República em 2014.

Se elegendo prefeito paulistano em 2012, seria impossível a Serra repetir a manobra de renunciar ao cargo para disputar a Presidência um ano depois, como fez em 2006 para ser governador de São Paulo.

Serra só aceitará disputar a prefeitura se se convencer de que não terá a mínima chance de disputar a Presidência, ou pelo PSDB ou, numa manobra mais radical, pelo PSD, que o seu aliado Gilberto Kassab está organizando.

O mais provável, neste momento, é que ele permaneça dentro do PSDB tentando marcar seu espaço político, jogando em eventuais erros do senador Aécio Neves que possam inviabilizar sua candidatura, que parece ser a natural dentro do partido.

Serra pode jogar com o tempo, pois tem a chance de decidir encerrar sua carreira política como senador, na eleição de 2014, e não precisa antecipar uma decisão em 2012.

Se fosse o candidato a prefeito de São Paulo, Serra uniria o PSDB paulista e teria o apoio do partido de Kassab, tornando-se o favorito na disputa, contra possivelmente um candidato do PT - a senadora Marta Suplicy ou o ministro Aloizio Mercadante - e o candidato do PMDB, o deputado federal Gabriel Chalita, que está de saída do PSB.

Para enfrentar Serra, é até possível que PT e PMDB cheguem a um acordo, fazendo uma composição partidária. O ex-presidente Lula chegou a pedir ao presidente do PMDB que não lançasse a candidatura de Chalita, para permitir um acordo com o PT.

O PMDB, no entanto, considera que, em caso de uma composição, o cabeça de chapa tem que ser Chalita, com o PT dando a vice.

Se José Serra não aceitar ser candidato, aí mesmo é que os dois partidos apresentarão chapas diferentes, com acordo de apoio no segundo turno, pois as chances de vencer aumentam.

O PSDB não tem candidato alternativo forte para substituir Serra, e qualquer um da estrutura regional poderá surgir desse impasse. O deputado federal do DEM Rodrigo Garcia, que assumiu uma secretaria no governo Alckmin recentemente, pode ser o escolhido.

Essa indefinição fortalece a possibilidade de que o verdadeiro candidato do governador Geraldo Alckmin seja Chalita, que mesmo tendo saído do PSDB continua muito ligado ao governador tucano, que o considera "um predestinado".

Chalita, aliás, deixou o PSB por não ter garantias de que seria candidato à prefeitura.

Já o prefeito Gilberto Kassab tem várias alternativas para a disputa, embora seu partido não tenha tempo de televisão e precise fazer alianças políticas para suprir essa deficiência.

Por isso mesmo o ex-deputado Eduardo Jorge, do PV, secretário municipal de Meio Ambiente, é uma dessas alternativas, sendo a outra o vice-governador Guilherme Afif, que deixou o DEM para seguir Kassab no PSD.

Esse quadro partidário confuso e indefinido por parte dos que detêm o poder no estado - PSDB e futuro PSD - começou a se delinear na disputa da prefeitura em 2008, quando o ex-governador Alckmin teimou em disputar a eleição contra Kassab, então do DEM, que havia assumido o cargo com a saída de Serra para disputar e vencer o governo de São Paulo.

Kassab, que já detinha a máquina municipal, contou com o apoio da máquina estadual e derrotou Alckmin, que era o candidato oficial do PSDB, mas não tinha o apoio do governador.

Mesmo fenômeno que pode acontecer na próxima eleição, com o governador Geraldo Alckmin dando um apoio "branco" a Gabriel Chalita do PMDB, não por divisão política, mas por não haver um candidato forte nas hostes do PSDB.

Mesmo tendo sido convidado por Serra para fazer parte de seu secretariado depois da derrota, o grupo de Alckmin e o de Serra dentro do governo paulista nunca mais se entenderam, embora entre os dois a relação política esteja normalizada.

Essa relação, porém, limita-se à compreensão da importância política de um e outro, e não se espalha entre os dois grupos, que vivem às turras.

Essa disputa abre condições de o PT reassumir a prefeitura da capital paulista, que já comandou em 1989, com Luiza Erundina, e em 2001, com a atual senadora Marta Suplicy.

Ganhar a prefeitura de São Paulo é parte de um plano estratégico do PT coordenado pelo ex-presidente Lula para tomar o comando político do PSDB, que está no poder estadual há 16 anos seguidos, tendo iniciado sua hegemonia em 1995 com a eleição de Covas.

A reorganização da direção partidária está se encaminhando para definir quem tem mais força política, com o grupo do senador Aécio Neves empenhado em manter suas posições: deve reeleger o deputado Sérgio Guerra na presidência e pretende manter na secretária-geral o deputado mineiro Rodrigo Castro. O grupo serrista está lançando a candidatura do ex-governador Alberto Goldman.

E até mesmo a direção do Instituto Teotonio Vilela entrou na disputa, com o ex-senador Tasso Jereissati tendo o apoio dos senadores do partido com exceção de Aloysio Nunes Ferreira, que apoia José Serra.

A situação do PSDB no estado continua sendo bastante forte devido ao controle da máquina pelo grupo do governador Geraldo Alckmin, que é o favorito para se reeleger em 2014, mas a disputa da prefeitura e a da direção nacional do partido devem explicitar as fraquezas tucanas, que, se não forem superadas, certamente retirarão do partido a possibilidade de disputar a sucessão de Dilma com algum sucesso.

FONTE: O GLOBO

Bom de comunicação :: Sergio Amaral

O governo Barack Obama mostrou competência na busca e captura de Osama bin Laden. Demonstrou igual competência na comunicação desse momento à opinião pública norte-americana e internacional.

Na verdade, Obama já exibira a qualidade de sua comunicação na campanha eleitoral. Seu site foi, possivelmente, o melhor já produzido pela comunicação política. A mensagem enviada pela internet a milhões de eleitores instilava a cada dia, num tom intimista e mobilizador, os motes da campanha: nós somos diferentes, não somos o establishment de Washington, não recebemos o dinheiro dos bancos de Wall Street e juntos poderemos mudar este país. Yes, we can.

No dia da posse, quando todos esperavam a imagem solene do novo presidente, a mídia mundial estampou, em primeira página, uma foto inusitada. Horas antes de fazer o juramento de posse, Obama, de jeans, no segundo degrau de uma escada, pintava a parede de um quarto, numa casa simples. Na sua singeleza, a foto era cheia de significado. Era como se Obama dissesse: vocês podem pensar que, quando eu assumir o poder, morar na Casa Branca, perto dos ricos e poderosos, serei diferente; estão enganados; o que eu sou e continuarei a ser é um organizador de comunidades; continuarei junto do meu povo.

No plano externo, a atenção de Obama para com a comunicação traduziu-se numa ênfase na diplomacia pública. Comenta a imprensa francesa que, por ocasião de sua visita à França, em junho de 2009, Nicolas Sarkozy teria manifestado frustração com os 20 minutos reservados ao encontro entre os dois presidentes. Obama passou a maior parte do tempo em Paris em visitas a monumentos históricos, acompanhado por sua família. Pouco antes, no Egito, o pronunciamento dirigido ao mundo islâmico foi feito na Universidade do Cairo. No Rio de Janeiro, o discurso na Cinelândia, um lugar insólito para um chefe de Estado, estava programado para ser um dos pontos altos de sua visita, o encontro com a população brasileira.

A comunicação do governo Obama atingiu a sua melhor qualidade com a estratégia montada para a divulgação da morte de Bin Laden. A foto estampada em primeira página em quase toda a imprensa mundial, na segunda-feira, um dia após a morte de Bin Laden, é um convite ao leitor ou ao espectador para compartilhar com a cúpula do governo o momento decisivo da operação.

É a cena do presidente, do vice-presidente, de ministros e seus assessores reunidos na "sala de situação" para acompanhar a transmissão por vídeo da invasão da casa onde se encontrava Bin Laden. O único em ação é o general Webb, vice-comandante das operações especiais, que, supõe-se, mantinha o contacto com coordenadores da invasão. Todos os demais estavam quietos e muito atentos. Obama não aparece ao centro da foto, como costumam ser fotografados os presidentes. Está num canto, silencioso e concentrado. Hilary Clinton, chefe da diplomacia americana, com mão à boca, dá a nota de apreensão. É como se dissesse: se isto não der certo, estamos perdidos.

As notícias continuaram a sair ao longo dos dias seguintes, como se tivessem sido distribuídas em doses homeopáticas, de modo a manter o tema nas manchetes dos jornais e para que o governo continuasse a ser a fonte principal, se não exclusiva, das informações. A semana culminou, num toque de emoção, com a visita de Obama ao Marco Zero, em Nova York, para prestar homenagem às vítimas do 11 de Setembro e receber os agradecimentos emocionados de seus familiares. Nessa ocasião, não precisou sequer fazer um discurso. Bastou deixar que as imagens falassem por elas mesmas.

Numa época em que o tempo da atenção se reduz cada vez mais, em que os jovens são capazes de fazer três coisas ao mesmo tempo - estudar, ver televisão e escutar música -, a utilização da linguagem simbólica e da imagem em particular passam a ser a chave da comunicação política. Ainda mais quando os símbolos são transmitidos sem se fazerem notar. Uma foto, construída (como terá sido a da posse) ou não (como deve ser o caso da "sala de situação"), é um instrumento mais poderoso e convincente do que os longos, e muitas vezes enfadonhos, discursos; ou mesmo milionárias campanhas pagas, prontamente decodificadas como propaganda.

No plano internacional, o avanço da comunicação é ainda maior. A diplomacia pública já é praticada por vários países, especialmente os Estados Unidos, há varias décadas. Deverá tomar, progressivamente, espaço maior na política internacional.

A sociedade moderna vem-se vertebrando ante um Estado cada vez mais fraco. Tem um papel mais relevante na cena internacional, por meio de uma multiplicidade de atores. Até aí, todos os estudantes de Relações Internacionais bem sabem. Mas existe um aspecto novo, nem sempre percebido, que é o papel da sociedade na formação do que Habermas chama a opinião pública internacional. É internacional porque gestada e alimentada fora do controle e da esfera de ação ou manipulação dos Estados nacionais.

É essa opinião pública internacional que Obama e outros líderes ocidentais tinham em mente quando buscaram o apoio da Liga Árabe antes de atacar a Líbia.

Até há pouco, o governante precisava comunicar-se bem com a sua sociedade, para manter a popularidade ou conquistar apoio para suas políticas. No plano exterior, cabia à diplomacia preparar o terreno para superar conflitos ou construir o entendimento. Hoje isso continua necessário, mas não basta. É preciso também conquistar a opinião pública internacional para legitimar as ações, defender interesses ou promover a cultura. Muitas vezes será necessário visitar monumentos históricos, dar uma conferência na Universidade do Cairo e até mesmo, quem sabe, fazer um comício na Cinelândia.

Ex-Secretário de Comunicação Social da Presidência da República (governo FHC, 1995-98)

O "povo unido" despreza partidos:: Clóvis Rossi

A Espanha faz amanhã eleições autonômicas e municipais. O partido que governa o país desde 2004 (PSOE, Partido Socialista Operário Espanhol) vai tomar uma baita surra, a julgar por todas as pesquisas.

Mas essa não é a notícia. Notícia é exatamente o oposto: o nascimento, uma semana antes da votação, de um movimento que não acredita que eleições possam mudar as coisas e fazer cessar as causas pelas quais se dizem indignados (um dos nomes do movimento, também chamado de 15M, pela data em que nasceu, ou "Democracia Real Já").

A moçada (58% têm até 35 anos) ocupa as principais praças de 60 cidades espanholas e 14 no exterior, inclusive a vizinha Buenos Aires. Hoje haverá ato em frente ao consulado espanhol em São Paulo.

O movimento de massas chocou todo o establishment, de partidos políticos à mídia, passando pelos sindicatos e pelas ONGs.

Natural: é uma reprodução das rebeliões nos países árabes (inspiração não negada pelos organizadores), mas que ocorre em um dos países mais democráticos do planeta, com amplo espaço para reivindicações, protestos e com um calendário inabalável de eleições, o modo convencional de mudar políticas. O problema está justamente aí: o modo convencional não está funcionando, como o indica o nome oficial do movimento ("Democracia Real Já").

Desconfiança que vem de longe, como explica o assessor de comunicação Antoni Gutiérrez-Rubí, em artigo para "El Pais": "Três de cada quatro cidadãos têm opinião negativa ou muito negativa dos partidos e dos políticos" (agentes óbvios de qualquer democracia). Mais: "Ocupados com o poder -em mantê-lo ou conquistá-lo- renunciaram, demasiadas vezes, à legitimidade das ideias". (Você tem alguma dúvida de que ambas as frases se aplicam, na integralidade, ao Brasil?).

Da desconfiança em relação aos partidos diz bem um dos cânticos das praças de Espanha, uma nova versão para o clássico de esquerda "o povo unido jamais será vencido". Cantam agora "o povo unido funciona sem partidos". (Ouvir-se-á no Brasil em algum momento?).

Que há um ar de esquerda nos acampamentos montados em toda a Espanha, parece inegável.

Mas, escreve para o "Guardian" o jornalista Miguel-Anxo Murado, o movimento "em última análise representa a frustração daqueles que veem que, votem como votem, as políticas econômicas são ditadas pelos mercados".

(No Brasil de 2002/03, votou-se por Lula mas governou-se com políticas aprovadas pelos mercados. Deu certo, é verdade, mas dava certo também na Espanha, tanto que o PSOE ganhou a reeleição em 2008, ano em que a crise eclodiu e devastou o país, vítima hoje de obscenos 20% de desemprego).

Convém lembrar que, além das revoltas árabes, também em Portugal e na Grécia, há protestos nascidos longe dos canais usuais (partidos, ONGs, sindicatos).

É cedo para dizer se esses movimentos algo anárquicos terão permanência ou serão apenas um "happening" meio indignado, meio festivo. Mas que são um sopro de ar fresco, é inegável, de que dá prova um dos cartazes vistos na "Puerta del Sol" de Madri: "Abram o cérebro tão frequentemente como o zíper da calça" (não parece alusão ao episódio Strauss-Khan).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Os riscos do voto distrital :: Alberto Carlos Almeida

Diz o ditado que "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come". Caso o Brasil adote o sistema eleitoral distrital para a eleição de deputados federais, ou o equilíbrio federativo será colocado em xeque ou o PSDB precisará de muito mais votos do que o PT para obter maioria na Câmara. Os países que adotam o sistema eleitoral distrital - a Grã-Bretanha é o caso típico - procuram fazer com que os distritos tenham aproximadamente o mesmo número de eleitores. O Brasil tem hoje 135.804.430 eleitores e 513 deputados. Dividindo-se o primeiro número pelo segundo, os distritos eleitorais para deputado federal ficariam com aproximadamente 264.726 eleitores.

Em todos os países do mundo que adotam o sistema distrital há limites máximos e mínimos para a quantidade de eleitores por distrito. Mas a disparidade entre o menor e o maior não é grande nem está correlacionada com algum estado ou município. Como não há um parâmetro para o Brasil que permita estipular uma quantidade máxima e mínima de eleitores por distrito, o mais prudente é tomar como ponto de partida que o Brasil, se adotar esse sistema, será dividido em 513 distritos e cada um terá exatamente 264.726 eleitores. Fazendo-se isso, ficaríamos muito próximos de como o sistema funciona nos países que o adotam.

Contudo, se isso for realizado, o Estado de São Paulo, que hoje tem 70 deputados, passaria a ter 114. A adoção do sistema distrital seguindo o parâmetro de equidade do número de eleitores levaria 17 estados a perderem cadeiras na Câmara dos Deputados. Roraima, que hoje tem oito deputados, passaria a ter somente um. O Acre e o Amapá perderiam seis deputados cada. Rondônia e Tocantins perderiam quatro deputados cada. Bahia, Rio de Janeiro e Sergipe perderiam três cada. Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul e Paraíba perderiam dois deputados cada. Distrito Federal, Paraná, Alagoas, Pernambuco e Piauí perderiam um cada. Outros cinco estados nem ganhariam nem perderiam deputados e somente cinco estados aumentariam sua bancada: Pará, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e Minas Gerais ganhariam um deputado cada um e São Paulo ganharia mais 44 deputados.

A perda de cadeiras é uma grande ameaça para qualquer deputado dos 17 estados eventualmente prejudicados pela adoção do voto distrital. Assim, se essa proposta de mudança for adiante, será muito pequeno o incentivo que os deputados desses estados terão para votar a favor do novo sistema. (A propósito, o estado de Delaware, nos Estados Unidos, tem um deputado e dois senadores). Roraima ficaria com um deputado e três senadores, Acre e Amapá também teriam mais senadores do que deputados. Seria algo inteiramente esdrúxulo para nosso sistema político. Adicionalmente, o equilíbrio federativo está baseado na sub-representação do Estado de São Paulo. Modificando-se isso, entraríamos no terreno do inteiramente desconhecido. Pode ser que nosso sistema não seja perfeito, mas é o que funcionou em nossas experiências democráticas, entre 1946 e 1964 e a partir de 1982. Aceita-se que São Paulo tenha muito poder e possa conduzir a política econômica, mas, por outro lado, não se concedeu a São Paulo a quantidade de deputados federais proporcional ao tamanho de seu eleitorado. Aliás, essa decisão foi tomada pelos constituintes de 1946, para limitar o enorme poder exercido por São Paulo durante o período que ficou conhecido como Primeira República (1899-1930).

A outra opção para a adoção do sistema distrital é manter todos os estados com o mesmo número de deputados que têm hoje. Nesse caso, o arranjo federativo não seria colocado em xeque, mas o grande prejudicado seria o PSDB. Mantendo-se São Paulo com 70 deputados, o estado seria dividido em 70 distritos, cada qual com em torno de 432.877 eleitores. Por outro lado, tomando-se os nove estados do Nordeste, tem-se o total de 151 deputados. Nesse caso, cada distrito, nessa região, teria aproximadamente 243.231 eleitores. Eis aí o grande problema para o PSDB.

O PT é mais forte do que o PSDB no Nordeste. Em São Paulo, o PSDB é mais forte do que o PT. Os mapas das duas últimas eleições presidenciais não deixam dúvidas quanto a isso. O sistema distrital leva o país que o adota a ter dois grandes partidos e, muito eventualmente, um terceiro partido pequenininho (isso será assunto de nosso próximo artigo). O sistema distrital destruiria o pluripartidarismo e faria com que o Brasil se tornasse um país bipartidário (ou praticamente isso). Veja-se a disputa entre democratas e republicanos nos Estados Unidos.

Creio que apenas dois partidos grandes sobreviveriam: PT e PSDB. O PMDB tenderia a ser drasticamente reduzido. Dentre esses dois grandes partidos, o PT teria uma votação mais forte no Nordeste e o PSDB, em São Paulo. É aí que reside o problema do PSDB. Mantido o atual número de deputados por estado, o PSDB precisaria de muito mais votos para eleger um deputado. O PT precisaria, para eleger 20 deputados no Nordeste, de 2.432.333 votos (50% +1) e o PSDB, para eleger 20 deputados em São Paulo, precisaria de 4.328.791 (50% +1). Esse risco não é algo teórico. O favorecimento de um partido em detrimento de outro já acontece atualmente na Grã-Bretanha. O Partido Trabalhista precisa de menos votos do que o Conservador para ter maioria no Parlamento.

As últimas duas eleições britânicas revelam que o sistema distrital favorece bastante o Partido Trabalhista, justamente porque os distritos em que ele vence têm menos eleitores do que os distritos do Partido Conservador. Os trabalhistas são mais fortes nos lugares onde os distritos têm menos eleitores: 65.498 eleitores por distrito na Escócia e 56.545 eleitores por distrito no País de Gales. O partido conservador é mais forte na Inglaterra, onde o número médio é de 71.882 eleitores por distrito. O resultado dessa assimetria é que os conservadores precisam derrotar os trabalhistas com margem de 11% dos votos totais para ter maioria de cadeiras no Parlamento e os trabalhistas precisam apenas de uma vantagem de 3% para conseguir a mesma coisa. Em 2005, os trabalhistas conseguiram maioria de 67 cadeiras, com somente 35,2% dos votos totais. Em 2010, porém, os conservadores não conseguiram a maioria, mesmo tendo 36,1% dos votos totais.

Adotando-se esse sistema no Brasil e mantendo-se o número atual de deputados por estado, o PSDB seria nosso Partido Conservador e o PT, o Partido Trabalhista. O PSDB teria muito mais dificuldade para conseguir a maioria de cadeiras na Câmara do que o PT. É curioso, portanto, que haja no PSDB muitos deputados que defendam um sistema eleitoral que prejudica seu próprio partido e, provavelmente, seu próprio mandato. Creio que ainda não tenham se dado conta desse fenômeno.

Hoje, nosso sistema eleitoral, proporcional, não desconsidera tantos votos quanto o sistema distrital. No sistema distrital, apenas o candidato mais votado em um distrito é eleito. Pode acontecer que haja três candidatos, que o primeiro obtenha 45% dos votos, o segundo fique com 40% e um terceiro, com 15%. Se isso ocorrer, são aproveitados somente 45% dos votos. Os outros 55% dos eleitores daquele distrito não ficam com representação alguma. Isso não ocorre no sistema proporcional. Nesse caso, a tendência é que o partido com 45% dos votos eleja 45% dos deputados, o partido com 40% eleja 40% dos deputados e o partido com 15% dos votos fique com 15% dos deputados. Isso significa que, mesmo sendo mal votado no Nordeste, o PSDB acabaria elegendo deputados. O mesmo vale, eventualmente, para o PT em São Paulo. O resultado final é que não é nem mais nem menos difícil para esses dois partidos elegerem deputados por conta de sua força ou fraqueza regional. O partido elege mais deputados onde é forte e elege menos onde é fraco. O sistema proporcional é, portanto, mais equânime que o distrital.

A grande maioria das inovações institucionais tende a ser prejudicial para quem as adota. Com todos os seus defeitos, o sistema eleitoral proporcional é bem adaptado às condições brasileiras: certamente bem adaptado ao nosso pacto federativo e aos nossos partidos. O sistema eleitoral distrital não é nada adaptado ao Brasil, sua adoção acarretaria tensão no arranjo federativo, prejudicaria o PSDB - enfim, traria várias consequências negativas previsíveis e, o que é pior, imprevisíveis também. Os políticos não fizeram inovações institucionais durante nossas experiências democráticas, com exceção do breve período parlamentarista dos anos 1960. Não inovaram porque faz sentido não inovar. O melhor sistema político não é o melhor em abstrato, mas é o melhor nas condições históricas e culturais nas quais é adotado. O melhor não é o melhor ideal, mas é o melhor possível.

A força do PSDB de São Paulo

A propósito da força do PSDB de São Paulo, acabou de ser eleito secretário-geral do partido um ilustre desconhecido de provavelmente a maioria dos leitores do Valor. A eleição de Gontijo para esse cargo mostra que as bases do partido são muito fortes em São Paulo. Não é preciso ser deputado estadual ou federal para ser escolhido para uma posição-chave na direção estadual do partido. Isso é uma grande lição de força e democracia que o PSDB fornece para a sociedade brasileira. Trata-se de um dirigente agregador, que veste a camisa do partido e faz um bom trabalho para fortalecê-lo. Foi reconduzido ao cargo para dar continuidade a isso.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo".

FONTE: VALOR ECONÔMICO (20/5/2011)

Lá vem o Patto! ::Urbano Patto

O Ministeriu da Educassão aprovô uns livro para serem uzado nas iscola de todu o paiz que dis que se o nobre leitor naum gostar do geito qui mim está iscrevendo é purcausa de qui é um grandissimo preconçeituoso linguistico.

Si o editor desse jornau ou do brogue senssurar o meu textu ou si augum leitor recramar vou carcarlhes ums proçessu por preconsseito, mais injuria e difamassão.

i naum dianta nem a presidenta do brasil pidir pra mim dizistir da assão.

Pur oje xega!

Urbano Patto é alfabetizado (cartilha Caminho Suave), Arquiteto Urbanista, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional e membro do Conselho de Ética do Partido Popular Socialista - PPS - do Estado de São Paulo. Críticas e sugestões: urbanopatto@hotmail.com

Tática do Planalto é descolar crise de Dilma

Visita de Franklin à presidente, porém, alimentou rumor de que ela busca reforço

Adriana Vasconcelos e Maria Lima

BRASÍLIA. Enquanto for possível, a intenção da presidente Dilma Rousseff é manter-se silenciosa e longe da crise com seu principal auxiliar, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, como vem fazendo há quase uma semana. Contra ele pesam suspeitas sobre suas atividades como consultor, que lhe permitiram comprar um apartamento de R$6,6 milhões e um escritório de R$800 mil em São Paulo, no ano passado. A estratégia do Palácio do Planalto é tentar descolar o tema do governo e, sobretudo, da presidente. Mas até governistas acham que Dilma tem levado a crise para sua agenda diária.

Avaliação feita por Dilma e seu entorno é que ela não deve mesmo se manifestar porque esse, até o momento, é um problema do ministro e tem de ser resolvido por ele. Enquanto não houver prova de que as atividades de Palocci como consultor produziram algum ato ilegal no governo, o assunto continuará tratado como uma questão pessoal do ministro.

Ninguém pense, porém, que Dilma jogará seu principal ministro aos leões, "até porque gosta muito dele e não acredita que tenha alguma coisa errada a ser explicada pelo governo", como disse ontem um interlocutor. As novas revelações sobre o faturamento da empresa do ministro - que ano passado teria chegado a R$20 milhões, de acordo com a "Folha de S.Paulo" - não mudam, pelo menos por enquanto, o comportamento de Dilma.

A opção do ministro de só se manifestar por notas tem incomodado a base governista, que se ressente de informações até para melhor defender Palocci no Congresso. Embora o clima seja de preocupação entre os aliados, a avaliação no Planalto é que até agora ele não foi atingido pela bala de prata, o golpe definitivo.

Por mais alto que tenha sido o faturamento da empresa de Palocci, o governo parte do pressuposto de que tudo foi declarado à Receita Federal, e que não há crime em enriquecer. Avalia ainda que há diferença entre fazer ilação sobre suposto tráfico de influência e comprovar, de fato, uma ação irregular de Palocci.

Alguns governistas, porém, consideram que Dilma cometeu um erro ontem ao receber o ex-ministro Franklin Martins no Alvorada, alimentando rumores de que ela busca reforço.

- Estão cometendo erros primários. O pior deles foi levar a sala da crise para dentro do Alvorada. Isso põe o problema no colo da presidente - criticou um líder governista.

A apreensão maior dos aliados é com a possibilidade de fatos novos. Ainda está muito fresco na memória o escândalo que derrubou Palocci do Ministério da Fazenda, no episódio da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa.

Por isso, senadores da base defendiam ontem que o Planalto entre logo em campo para barrar a iniciativa da oposição, que começará a coletar assinaturas para a instalação de CPI mista. Auxiliares da presidente, porém, apostam na força e no poder do governo para evitar que aliados descontentes assinem a CPI.

- É muito fácil ficar falando que está insatisfeito com o Planalto e vai assinar a CPI, mas na hora de pôr o nome numa lista pública a história é outra - comentou um ministro.

Franklin se reuniu ontem com Dilma por duas horas. Ele foi um dos principais assessores do ex-presidente Lula e seu conselheiro frequente em crises. No encontro com Dilma, não estava a atual ministra de Comunicação Social, Helena Chagas. Franklin já esteve várias vezes com Dilma; ao GLOBO, ele disse que a visita já estava agendada e que foi vê-la por serem amigos. Negou que tenham falado sobre Palocci.

FONTE: O GLOBO

Após ordem de Dilma, Temer e ministros defendem colega

Vice reitera confiança no titular da Casa Civil, enquanto Cardozo e Lupi dizem ver "mais fumaça que fatos" contra Palocci

Daiene Cardoso, Elder Ogliari e Evandro Fadel

A missão dada pela presidente Dilma Rousseff começou a ser cumprida. Um dia depois da ordem de contra-ataque às denúncias que atingem o titular da Casa Civil, Antonio Palocci, o vice-presidente Michel Temer e outros ministros do governo saíram ontem em defesa do petista, acusado de multiplicar seu patrimônio por 20 no período em que manteve uma "consultoria econômico-financeira", a Projeto.

Em São Paulo, depois de viagem oficial à Rússia, Temer manteve a posição de "confiança" no ministro, como havia dito no domingo. "Confiamos no Palocci e eu continuo com a mesma disposição de confiança absoluta no ministro Palocci", afirmou o vice-presidente, antes de dar uma palestra em evento do Instituto dos Advogados de São Paulo, no Jockey Club de São Paulo.

Ao contrário de Dilma, que em conversas ao longo da quinta-feira determinou "assertividade" nas respostas em defesa de Palocci e disse ver uma campanha de "difamação" nas acusações contra seu ministro, Temer evitou dar opinião nesse sentido. "Se é uma campanha ou não, não sei dizer", desconversou.

Ministros como José Eduardo Cardozo (Justiça), Miriam Belchior (Planejamento) e Carlos Lupi (Trabalho) aproveitaram seus compromissos públicos pelo País para defender o colega da Casa Civil. Em Porto Alegre, depois de almoçar com o governador Tarso Genro (PT-RS), Cardozo negou que o governo esteja blindando Palocci.

Para o ministro da Justiça, falta substância às acusações. "Não vi absolutamente nada de ilegalidade ou imoralidade", afirmou. "Há muita fumaça e poucos fatos colocados."

Questionado sobre a variação do patrimônio de Palocci, Cardozo reiterou que "o enriquecimento com causa não é punível no sistema brasileiro". "O que é punível é o enriquecimento sem causa", argumentou.

Mais lacônica, mas não menos enfática na defesa do colega, Miriam Belchior disse que "o ministro Palocci já deu esclarecimentos, adotou os procedimentos indicados pela Comissão de Ética e agora mandou informações à Procuradoria-Geral da República". Questionada pelos jornalistas se o governo está confortável com a situação, respondeu apenas que "sim".

"Barulho". Para o ministro do Trabalho, as acusações contra Palocci não passariam de "barulho" da oposição para desestabilizar o governo. "A oposição sempre fez esse trabalho. O tom da oposição é criar barulho", avaliou Carlos Lupi.

Segundo o ministro, o chefe da Casa Civil já respondeu às acusações. "Tudo que ele tem está declarado no Imposto de Renda, a empresa dele é registrada, tem CGC", alegou.

Lupi afirmou que qualquer pessoa que exerça cargo público "sempre tem essas dificuldades de ter sua vida vasculhada, investigada". "Cada um de nós tem que saber responder, cada um de nós tem que ter competência para isso", frisou. O ministro esbanjou confiança no fim da crise política. "Não é marola que vai fazer a gente desistir."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Governo acena com cargos para evitar que base apoie investigação

Pendências na distribuição de cargos do segundo escalão para aliados deve, finalmente, ser resolvida para conter crise política

Vera Rosa e Tânia Monteiro

BRASÍLIA - Na tentativa de esvaziar a ameaça de uma CPI para investigar as atividades do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, o governo já acena com cargos para acalmar a base aliada. A ideia é que a partir da próxima semana o quebra-cabeça do segundo escalão comece a tomar forma final.

A oposição não tem votos suficientes para abrir uma CPI mista, reunindo deputados e senadores, mas já está atrás dos insatisfeitos da base aliada. É "suprapartidário" o grupo dos descontentes com a demora da presidente Dilma Rousseff em definir presidências e diretorias de estatais, autarquias e bancos oficiais. O time reúne parlamentares do PT ao PMDB, passando pelo PSB, PC do B e PR.

Na prática, tanto o PSDB como o DEM sabem que há poucas chances de conquistar assinaturas suficientes para instalar a CPI agora, mas já começaram a "mapear" os queixosos, principalmente dos partidos menores da base. Cauteloso, o governo quer, por sua vez, adoçar a boca dos aliados para também barrar qualquer convocação de Palocci em comissões do Congresso.

Disputados. Na lista dos cargos cobiçados pelos aliados estão as presidências de instituições financeiras - como o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco da Amazônia (Basa) - e da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), além de várias diretorias. As mais citadas estão na própria Chesf, Itaipu, Departamento de Obras contra as Secas (Dnocs), Eletronorte, Eletrosul, Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e Sudene.

"Nós vamos dar toda a força para Palocci e enfrentar essa luta política. É claro que há desgaste e temos preocupação com os desdobramentos políticos do caso, mas a recomendação é para que ninguém pare de trabalhar", afirmou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

No Palácio da Alvorada, Dilma recebeu o ex-ministro Franklin Martins, que comandou a Comunicação Social do governo Lula no segundo mandato. O governo nega que Franklin tenha sido chamado para ajudar a traçar a estratégia do contra-ataque no caso.

Embora a situação do ministro da Casa Civil esteja cada vez mais delicada, o discurso do Planalto é o de que não há fato determinado para a abertura de uma CPI. Nem mesmo a revelação de que a consultoria Projeto - de propriedade de Palocci - tinha como clientes empresas que mantinham negócios com o governo abalou a defesa do ministro mais poderoso da equipe, braço direito de Dilma.

"Meu Deus do céu, se você for selecionar empresas no Brasil que têm negócios com o governo vai observar que são praticamente todas", disse Carvalho. "Isso não prova nada. Palocci não tem problema na Comissão de Ética, na Receita e nem na Procuradoria-Geral da República. Então, nenhuma das acusações até agora vai além da questão política."

Para Entender

1. Denúncia

Em quatro anos, Antonio Palocci teria multiplicado por 20 seu patrimônio. Em 2010, ele comprou, por meio de sua empresa de consultoria, a Projeto, um apartamento de luxo por R$ 6,6 milhões. Em 2009, comprou um escritório no valor de R$ 882 mil (foto).

2. Defesa

O ministro Palocci declara que relatou os bens a Comissão de Ética da Presidência da República. Também afirma que alterou o objeto da sociedade (de consultoria para administradora de imóveis) para que não houvesse conflito com seu cargo. Oposição começa a se movimentar. DEM e PPS pedem explicações. PSDB, até o momento, é o mais contido partido de oposição.

3. Blindagem

Planalto monta operação de guerra para blindar Palocci. Na segunda-feira, a presidente Dilma reúne-se com a coordenação do governo e afirma que a denúncia faz parte de um jogo político. Dois dias depois, a governo consegue impedir a convocação de Palocci para prestar depoimento sobre o caso na Câmara.(foto)

4. Esclarecimento

Comissão de Ética Pública decide que não vai investigar a evolução patrimonial de Palocci e dá o caso por encerrado. PSDB protocola no Conselho de Atividades Financeiras (Coaf) pedido de esclarecimentos sobre as eventuais movimentações bancárias suspeitas da Projeto.

5. Explicações

Casa Civil envia um e-mail para líderes do Congresso defendendo Palocci das acusações. O texto cita outros ex-ministros da área econômica, especialmente do governo de Fernando Henrique Cardoso, que multiplicaram seu patrimônio depois de passarem pelo governo. O texto irrita o PSDB e Palocci pede desculpas aos tucanos. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, diz que pedirá informações ao ministro

6. Nova denúncia

Estado revela que o Coaf enviou, há seis meses, relatório a PF comunicando uma movimentação financeira atípica envolvendo a Projeto e uma empresado ramo imobiliário que estava sob investigação.

7. Negócios

Reportagem do Estado mostra que Palocci teve negócios com 20 empresas e que rendimento foi concentrado em novembro e dezembro de 2010. Um dos negócios, segundo a Folha, seria com a WTorre e o faturamento da empresa no ano passado pode ter superado R$ 20 milhões.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Resenha de 'Sobre a revolução', de Hannah Arendt

Sobre a revolução, de Hannah Arendt. Tradução de Denise Bottmann. Editora Companhia das Letras, 416 pgs. R$ 55

Por Eduardo Jardim

O livro “Sobre a revolução”, dedicado por Hannah Arendt a Gertrud e Karl Jaspers e publicado em 1963, pouco mais de dez anos depois de “Origens do totalitarismo” (1951), é um marco na literatura política do século XX. Ele faz parte do período mais rico da trajetória intelectual da filósofa, quando foram escritos também “A condição humana” (1958), e a coletânea de ensaios “Entre o passado e o futuro” (1961). “Sobre a revolução” indaga sobre o significado e o legado das duas revoluções fundadoras da história política moderna — a francesa e a americana.

O livro inicia indicando os traços comuns aos dois eventos, que permitem chamá-los de revolucionários. Nos dois casos ocorreram mudanças radicais no curso dos acontecimentos e ambos foram marcados pela violência. Além disso, os dois estampam o pathos da novidade — o que supõe uma compreensão linear do tempo tipicamente moderna. Porém, nem a mudança nem a violência são em si mesmas revolucionárias. A primeira só é revolucionária quando instaura um novo início. A segunda apenas quando, além de libertar da opressão, constitui o reino da liberdade e cria uma forma totalmente nova de governo republicano. Assim, duas forças atuam nas revoluções que são dificilmente conciliáveis. De um lado, estes eventos são pura espontaneidade e encarnam a experiência de agir livremente, de outro, precisam edificar novas instituições estáveis e duradouras que possam abrigar a liberdade. O peso diferente de cada uma destas forças bem como a relação entre elas condicionaram o destino contrastante das duas revoluções.

A revolução francesa eclodiu em um ambiente de opressão de uma massa da população extremamente pobre. Além disso, não havia na história pré-revolucionária da França nenhuma experiência no trato das questões políticas fora dos círculos oficiais. A revolução foi aclamada em seu apelo libertário. No entanto, logo em seguida, a força da questão social impôs-se e reduziu o significado da liberdade ao da libertação da necessidade e da pobreza. Também a pluralidade — condição essencial para o exercício da política — foi sacrificada em nome da igualdade dos que foram chamados pelos revolucionários de “le peuple”. Rousseau, com seu conceito de vontade geral, foi o teórico da revolução francesa. Na avaliação de Hannah Arendt, a revolução morreu em seu berço. No entanto, ela serviu de inspiração para todas as revoluções que seguiram, as quais reconheceram no sofrimento não um estado a ser superado, mas o motor da História.

A visão de Hannah Arendt da revolução americana é muito mais favorável. O entusiasmo com a figura de Thomas Jefferson contrasta com a avaliação muito crítica de Rousseau. Dois fatos pesaram positivamente para o sucesso da experiência americana. A revolução foi precedida pela libertação da pobreza. Assim, a dimensão propriamente política da iniciativa revolucionária pôde ser destacada. Por outro lado, mesmo antes da independência, em cada pequena comunidade por todo o país, tinham sido formadas assembléias com a participação dos cidadãos.

O desafio enfrentado pela revolução americana foi o da criação de instituições políticas que garantissem o espaço onde a liberdade podia aparecer. Neste ponto, os Estados Unidos fracassaram. A revolução tinha dado liberdade ao povo, mas falhou em fornecer um espaço para o seu exercício. Isto explica porque, nos Estados Unidos e nas democracias modernas em geral, o exercício da cidadania fique confinado no dia das eleições e que a atividade política seja a ocupação de políticos profissionais. A representação tomou o lugar da ação.

O último capítulo do livro corrige parcialmente esta asserção. Duas formas políticas novas surgiram nas revoluções modernas — o partido e o conselho popular, o sistema partidário e o de autogestão, a democracia representativa e a direta. A experiência dos clubes revolucionários na França, das comunas de 1870, dos sovietes nas duas revoluções russas, do levante húngaro de 1956, mostra que pode haver uma forma de organização que revigora o exercício da política. Porém, esta é uma “triste e estranha história que precisa ser contada”, pois, em cada um destes episódios, os conselhos foram esmagados e prevaleceu o sistema centralizador dos partidos.

Trata-se de um livro desiludido? Sim e não. Ao considerar o cenário contemporâneo, a autora só pode lamentar o esvaziamento da política nas democracias de massas. O tesouro das revoluções está perdido. Por outro lado, o livro é um exame da história das revoluções e, como todo esforço compreensivo, deve “examinar e suportar conscientemente o fardo que os acontecimentos colocaram sobre nós — sem negar sua existência nem vergar humildemente a seu peso, como se tudo o que de fato aconteceu não pudesse ter acontecido de outra forma.”

A recepção do livro foi muito reticente. Ele apareceu em uma época em que nem mesmo os americanos reconheciam a importância da sua revolução e a noção da revolução francesa vitoriosa ainda não tinha sido abalada. Também o ambiente da guerra fria, polarizado por esquerda e direita, não favorecia a visão de uma ideia libertária da política que desafiava todos os padrões. Hoje, o livro, com sua interpretação lúcida dos acontecimentos históricos e seu estilo potente e cativante, lança luz sobre os impasses da nossa época de uma maneira raramente vista.

Eduardo Jardim é professor de Filosofia da PUC-Rio e autor de “A duas vozes — Hannah Arendt e Octavio Paz” (Civilização Brasileira)

FONTE: PROSA & VERSO/ O GLOBO

O sertanejo falando::João Cabral de Melo Neto

A fala a nível do sertanejo engana:

as palavras dele vêm, como rebuçadas
(palavras confeito, pílula), na glace
de uma entonação lisa, de adocicada.
Enquanto que sob ela, dura e endurece
o caroço de pedra, a amêndoa pétrea,
dessa árvore pedrenta (o sertanejo)
incapaz de não se expressar em pedra.


Daí porque o sertanejo fala pouco:
as palavras de pedra ulceram a boca
e no idioma pedra se fala doloroso;
o natural desse idioma fala à força.
Daí também porque ele fala devagar:
tem de pegar as palavras com cuidado,
confeitá-la na língua, rebuçá-las;
pois toma tempo todo esse trabalho.