sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Opinião do dia - Marcus Pestana


Vamos entrar no Cade. Estamos sofrendo concorrência desleal"

Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG), sobre a obstrução dos governistas. O Globo, 12/8/2011.

Depoimentos ligam deputada a propina


Detidos pela Polícia Federal acusam Fátima Pelaes; Temer fala em "exagero" na operação

Três detidos na Operação Voucher afirmaram à Polícia Federal que a deputada Fátima Pelaes (PMDB-AP) se beneficiava das fraudes no Ministério do Turismo. Fátima é autora das emendas cujos recursos teriam sido desviados. Segundo três pessoas ligadas à Conectur, ela recebia propina depois que as emendas eram liberadas. O vice-presidente Michel Temer disse que a PF exagerou e o uso de algemas "pegou muito mal".

Deputada na lista da propina

Depoimentos acusam Fátima Pelaes de embolsar parte das emendas do Turismo

BRASÍLIA - Depoimentos de três detidos na Operação Voucher, da Polícia Federal, acusam a deputada Fátima Pelaes (PMDB-AP) de ser beneficiária do esquema de desvio de dinheiro do Ministério do Turismo. A parlamentar é autora das emendas que deram origem aos recursos desviados. As revelações foram feitas na edição de ontem do "Jornal Nacional". Na operação, 36 pessoas envolvidas no esquema foram presas e 18 delas continuam detidas.

O nome da deputada foi citado por três pessoas ligadas à Cooperativa de Negócios e Consultoria Turística (Conectur), de Macapá (AP), subcontratada pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura (Ibrasi). A Conectur, assim como o Ibrasi, celebrou convênio com o Ministério do Turismo, tendo recebido o valor de R$2,5 milhões. Fátima Pelaes destinou R$9 milhões de suas emendas ao Ibrasi.

Em depoimento à PF, em Macapá, Hellen Luana Barbosa da Silva, sócia da Conectur, afirmou ter ouvido de Wladimir Furtado, outro dono da suposta empresa, que ele (Furtado) ficaria com 10% dos R$2,5 milhões. Fátima Pelaes receberia a maior parte desse dinheiro.

Outro depoente a acusar Fátima Pelaes como principal beneficiária do esquema foi David Lorrann Silva Teixeira. Ele é sobrinho de Wladimir e afirmou ter ouvido do tio que ele (Wladimir) ficaria com 10% e que a deputada receberia R$500 mil. Errolflynn de Souza Paixão, vice-presidente da Conectur, também afirmou que ouviu de Wladimir o relato de que o dinheiro apenas entraria na Conectur e seria destinado à parlamentar.

Pelaes nega todas as acusações

Em nota, Pelaes negou todas as acusações e afirmou repudiar o envolvimento de seu nome no esquema de recebimento de recursos ilegais de empresas ou instituições. A deputada colocou seus sigilos bancário, fiscal e telefônico à disposição da PF, disse que as acusações são caluniosas e que irá tomar medidas cabíveis.

Fátima Pelaes havia informado ao GLOBO, anteontem, que escolheu o Ibrasi para destinar emendas após conhecer a entidade por panfletos distribuídos em eventos do Ministério do Turismo. Pelaes teria optado pelo instituto pelo fato de a ONG já ter convênios com a pasta. De acordo com o Portal da Transparência do governo federal, a informação prestada pela assessoria da deputada é falsa. Segundo o Portal, o convênio de R$4 milhões bancado por emenda de Fátima foi assinado em dezembro de 2009, no mesmo dia de outro convênio financiado por emendas de comissões do Congresso. O terceiro convênio é de 2010.

Em 13 meses, o Ministério do Turismo liberou R$7 milhões dos R$9 milhões das emendas da deputada para o Ibrasi. Até a parceria com Fátima Pelaes, o Ibrasi nunca havia realizado trabalho no Amapá. O dinheiro destinado ao instituto foi supostamente desviado do esquema que atuava no ministério e deveria ser utilizado para capacitar pessoas em turismo.

O Ministério Público Federal já pediu a quebra do sigilo bancário dos suspeitos e, ainda ontem, pediria o bloqueio de bens desses envolvidos. O Ibrasi tem, ao todo, três convênios com o ministério, no valor de R$17,7 milhões e recebeu, até agora, R$13,9 milhões. Fátima Pelaes destinou duas emendas, no total de R$9 milhões.

Segundo o Ministério Público, ocorreram contratações de cinco empresas pelo Ibrasi antes mesmo do fim do processo de licitação do ministério. Segundo o "JN", o relatório do MPF aponta como provas da ilegalidade a substituição de documentos sobre a tomada de preços e a coincidência entre o valor liberado pelo governo e o total pago às empresas.

Fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que as empresas contratadas pelo Ibrasi enviaram seus orçamentos antes de o instituto encaminhar a elas o pedido de cotação de preços. O relatório também aponta como evidência da fraude a utilização de empresas de fachada e a coincidência entre os sócios dessas empresas que receberam antecipadamente por serviços não executados.

O trecho da gravação de um diálogo apresentado ontem no "Jornal Nacional", segundo o MP, demonstra como empresários combinavam as propostas de preço para participar dos convênios. Em 21 de julho deste ano, o empresário Hugo Leonardo Gomes é abordado por um amigo, identificado como Ricardo, que se diz preocupado com uma visita da PF.

- Como é o nome do instituto que você trabalhava lá no Amapá? - questionou Ricardo.

- É Ibrasi - respondeu Hugo.

- Você usou a minha empresa para fazer o quê, bicho?

- Não usei a sua empresa, não. Usei uma carta de proposta, só isso, por quê?

-- Quem te autorizou a fazer isso?

- Ué, você que passou para mim, animal. Não lembra, não?

- A Polícia Federal está aqui na minha empresa, aqui, que a minha empresa está sendo investigada.

FONTE: O GLOBO

Temer ataca a PF: 'Cadê as provas robustas?'


Vice-presidente condena atuação da polícia e diz que "força desnecessária" foi usada contra Colbert Martins

Silvia Amorim

SÃO PAULO. O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), criticou ontem a ação da Polícia Federal na Operação Voucher, que teve como alvo o Ministério do Turismo. Temer considerou um "exagero" a forma como se deu a prisão do ex-deputado peemedebista Colbert Martins Silva Filho, um dos 36 presos na operação, e disse que o uso de algemas em suspeitos de irregularidades "pegou muito mal". Ele não foi o único peemedebista a se queixar.

- Evidentemente que os exageros dos últimos acontecimentos, que são notórios, não surgiram de uma coisa gravíssima. De vez em quando, eu ouço que há provas robustas. Mas cadê as provas robustas? - questionou Temer, após cerimônia de filiação ao PMDB do ex-deputado Luiz Antonio Fleury Filho, ex-PTB.

O vice-presidente expôs publicamente insatisfação com a operação. Desde anteontem, há informações de que a presidente Dilma Rousseff ficou irritada, entendendo ter havido excessos por parte da PF no cumprimento dos mandados de prisão. Mas ela não fez, até agora, qualquer declaração sobre o assunto.

Temer também disse que o uso de algemas causou mal-estar na cúpula do governo.

- A história de usar algemas pegou muito mal. Não só eu, mas muita gente ficou muito chocada com aquilo.

Ele citou especificamente o caso da prisão do ex-deputado Colbert Martins como exemplo do "exagero". O episódio voltou a estremecer a relação entre o PMDB e o PT, embora o vice-presidente negue.

- Convenhamos, fazer o que se fez com o ex-deputado Martins foi de uma força absolutamente desnecessária. Esse cuidado é preciso tomar.

O presidente nacional do PMDB em exercício, senador Valdir Raupp (RO), foi menos diplomático nas críticas.

- A prisão do Colbert Martins, sem uma única prova, foi uma grande injustiça que fizeram com o PMDB. Se isso é tratamento privilegiado, eu não sei o que seria se não fosse - reagiu, ao ser perguntado se o PMDB estaria tendo tratamento diferenciado do governo sobre as investigações no Ministério da Agricultura em relação à faxina feita por Dilma nos Transportes, comandado pelo PR.

No caso das investigações na pasta do Turismo, Raupp ironizou a justificativa dada ao partido pelo governo de que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT), não teve informações antecipadas da PF:

- A informação que chegou é que o ministro só ficou sabendo na última hora. É uma coisa muito difícil de acreditar, mas nós vamos acreditar na palavra do ministro.

FONTE: O GLOBO

O governo puxadinho :: Roberto Freire

Envolvido por um tsunami de denúncias de corrupção que já destituiu dois ministros e em que, a cada semana, novos escândalos se sucedem em uma espiral sem fim, o governo da presidente Dilma Rousseff é o retrato da fragilidade. Na verdade, na maior parte dos casos, trata-se do esfacelamento do sistema de apoio político montado pelo ex-presidente Lula, junto aos partidos que formavam sua base parlamentar. Lula deixou para essas legendas a responsabilidade de administrar os ministérios em tenebrosas transações. É o resultado dessa irresponsabilidade que estamos assistindo todos os dias.

Mas não é disso que trataremos aqui. Vamos deixar que Ministério Público, Polícia Federal e o Congresso, por meio da instituição de CPIs, trabalhem, visando resgatar os princípios republicanos da administração e a preservação da res publica.

Falaremos, mais uma vez, da precária situação de nossa indústria frente aos desafios da globalização e de sua sobrevivência em um ambiente de acirrada competição. Depois de vivermos um ciclo de efervescência econômica planetária, na maior parte do governo Lula, a partir de outubro de 2008, a economia mundial viu-se em meio a uma de suas maiores crises.

Lépido e fagueiro, o então presidente, do alto de sua sapiência, desdenhou sua gravidade dizendo tratar-se de uma marolinha.

Garantiu que o país estaria a salvo de suas repercussões.

Vemos hoje, com mais clareza, o resultado da incúria e da irresponsabilidade de não se fazer as necessárias reformas do Estado, vitais para nosso desenvolvimento sustentado, dentre elas a política, a financeira, a tributária, a previdenciária e a trabalhista. Se elas tivessem sido implantadas, agora, que a crise se agudiza com ameaça de uma recessão profunda, envolvendo os países mais desenvolvidos, responsáveis pelo giro da economia mundial, estaríamos em melhores condições de enfrentá-la e aproveitaríamos as oportunidades que crises, independentemente de seu porte, sempre abrem, para os que se preparam para aproveita-as. O que, infelizmente, não é o nosso caso.

Acossado pelo recrudescimento e pela gravidade da crise, o governo Dilma resolveu fazer algo positivo, buscando ocupar espaço na mídia com alguma coisa positiva, que aponte para além do noticiário policial.

Assim apresentou com pompa e circunstância o Programa Brasil Maior, basicamente um programa de desoneração para alguns ramos da indústria, notadamente a automobilística e para alguns setores, principalmente o têxtil e o de confecções, além de calçados e artefatos, móveis e aqueles ligados à tecnologia da informação.

Fosse um programa relacionado com um projeto de desenvolvimento de longo prazo, tendo como um de seus eixos centrais o fortalecimento da indústria nacional, estabeleceria como meta a superação dos gargalos de nossa precária infraestrutura física e humana. Não deixaria de contemplar a constituição de instrumentos capazes de promover a inovação tecnológica, aumentar a produtividade, garantir linhas sustentáveis de financiamento de longo prazo, uma política nacional de formação de mão de obra, envolvendo escolas técnicas e universidades.

Apresentado como foi, resta a questão: quem pagará o custo da desoneração trabalhista? Será o contribuinte. Mais uma vez.

Em vez de um projeto consistente, o que temos é mais um puxadinho, como tantos que só têm efeito midiático. Nada mais.

Roberto Freire é deputado federal e presidente nacional do PPS

FONTE: BRASIL ECONÔMICO

Fim da euforia:: Arthur Virgílio

Os EUA encontram-se manietados e sem maiores margens para aumentar seu endividamento. A Europa lida com déficits fiscais insustentáveis. A China, com inflação já à altura de 6.6% ao ano, terminará por desacelerar o crescimento.

Óbvio que o Brasil não deixará de padecer as consequências desse quadro turbulento. Os sinais já estão dados: o desempenho da Bovespa é o pior dentre as economias emergentes e o segundo pior, se levarmos em conta a situação dramática vivida pela Grécia; é explosiva a combinação de inflação (6.81% em números anualizados) com juros estratosféricos e real sobrevalorizado; possíveis bolhas nos mercados de imóveis e de crédito e, finalmente, produtividade industrial em queda livre.

As medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco Central e pela Fazenda revelam-se insuficientes. A situação fiscal que Dilma herdou do governo do qual ela própria era figura chave, não é vista com realismo por uma equipe econômica tatibitati.

A mágica da artificialização do crédito chega ao fim. Passamos a depender exclusivamente da fome chinesa por commodities. Esta, infelizmente, poderá mostrar-se menos pantagruélica a partir do instante em que políticas de contenção da inflação naquele país sejam efetivamente adotadas. Menor crescimento chinês = sérios problemas para a economia brasileira.

O governo-cigarra de Lula começa a ser revisto e desmascarado. Interrompeu o ciclo de reformas estruturais. Criou as bases da crise fiscal que, agora, se soma, enquanto problema doméstico, aos reflexos das dificuldades do mundo.

Chegou o inverno e a cigarra não preparou agasalho para os brasileiros. A conta começa a chegar, nem bem nos livramos do “sapientíssimo” presidente que tudo sabia e tudo resolvia.

A crise mundial é semelhante àquela, bem recente, de 2008. Menos intensa ainda, porém grave a mais não poder. Os bancos, outra vez, serão testados, e os governos estarão descapitalizados para proteger os acionistas e o sistema.

Enquanto isso, o Brasil revive o delírio de Alice. Todos os dias um escândalo novo (o ultimo é o do Ministério do Turismo, que resultou, até o momento, na prisão de 40 pessoas; o ministro, certamente, é da política do “eu não sabia”) e Dilma Rousseff apenas administra a esquizofrênica relação de seu governo com as maltas que o povoam.

O mundo inteiro discute a crise econômica com prioridade. Somente o Brasil se dá ao luxo de olvidá-la porque seu tempo é gasto com as estripulias do ministério mais desqualificado de nossa História republicana.

Tempos duros virão!

Arthur Virgílio é diplomata, foi líder do PSDB no Senado

FONTE: Blog do Noblat

Oposição quer atrair sociedade para abrir CPI


Ideia é investigar todas as denúncias de corrupção juntas

BRASÍLIA. A oposição decidiu ontem aproveitar o clima de insatisfação crescente na base governista para começar a coletar assinaturas para a criação de uma CPI Mista para apurar todas as denúncias de corrupção que surgiram nestes primeiros oito meses do governo Dilma Rousseff. Desta vez, a estratégia de PSDB, DEM e PPS não deverá ficar restrita ao Congresso. Para tentar furar o bloqueio dos aliados do governo, o líder do DEM na Câmara, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), propõe que seja feita uma mobilização também junto à opinião pública.

A ideia é usar redes sociais para iniciar essa mobilização popular em favor da CPI e buscar depois o apoio de entidades civis já organizadas de combate à corrupção, como o Movimento do Ficha Limpa. Será criado ainda um site na internet, o que poderá ajudar a pressionar deputados e senadores.

- Nossa ideia é expor o nome dos parlamentares que querem contribuir para o combate à corrupção - disse ACM Neto.

Ficou acertado ainda que os três partidos de oposição vão agendar uma reunião com o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para cobrar o andamento das dezenas de representações apresentadas nas últimas semanas. O ministro-chefe da Controladoria Geral da União, Jorge Hage, também está na mira da oposição.

- Vamos centrar fogo em cima da CGU. De duas uma: ou o órgão é completamente incompetente para identificar a corrupção no governo ou está limitado por ordens políticas - afirmou o líder do DEM.

Depois de ver pelo menos três requerimentos seus rejeitados ontem pela Comissão de Agricultura do Senado, o líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), admitiu que a oposição terá dificuldades para conseguir as assinaturas necessárias para a CPI:

- Não temos ingenuidade de achar que será fácil, mas desta vez pretendemos expor a fotografia do Congresso para a sociedade, mostrando os parlamentares empenhados no combate à corrupção e os que são contrários.

FONTE: O GLOBO

Irritada, base derrota governo na Câmara


Ação orquestrada por PR, PMDB, PTB, PP e PSC impediu a votação de projeto rotineiro. Os deputados estão irritados com a demora na liberação de emendas e com o tratamento dispensado pela presidente Dilma Rousseff. Já o vice-presidente Michel Temer pediu mais diálogo do governo com o PMDB e disse "estar "chocado" com a ação da Polícia Federal.

Em "recado", base aliada derrota Dilma

Bloco informal impede votação de projeto rotineiro do governo e ameaça não prorrogar DRU, medida essencial para receitas do Planalto

Eugênia Lopes

 BRASÍLIA - Irritados com a demora na liberação das emendas de parlamentares e com o tratamento dispensado pela presidente Dilma Rousseff ao Legislativo, os aliados do governo mantiveram ontem a paralisação dos trabalhos da Câmara.

Uma ação orquestrada por PR, PMDB, PTB, PP e PSC, que criaram um bloco informal com mais de 200 deputados, pôs lenha na fogueira da crise que tomou conta da base e impediu a votação de projeto rotineiro e sem polêmica. Foi mais um recado para o Palácio do Planalto, materializado ontem em manobra regimental que impediu a votação de um decreto que autorizaria a celebração de um tratado do governo brasileiro com a China na área criminal.

Além de não deixarem votar nada, os aliados voltaram a ameaçar o governo com a aprovação da PEC 300, que cria um piso salarial para os policiais militares, civis e Corpo de Bombeiros, e a chamada Emenda 29, que fixa porcentuais mínimos de gastos pela União, pelos Estados e pelos municípios para a saúde. Todos esses projetos não são de interesse do Palácio do Planalto, pois aumentariam os gastos públicos.

Vingança. Mas como a votação desses projetos depende de o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), colocá-los na pauta, os aliados preparam sua "vingança" contra o governo em duas frentes. A primeira é a derrubada da prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), proposta considerada essencial pelo Palácio do Planalto. "Rebelião vai ter mesmo é com a morte da DRU", afirmou um peemedebista. "Por enquanto, estamos apenas mandando um recado." Em outra frente, os aliados estão dispostos a dar um susto no governo Dilma Rousseff com o apoio à criação de uma comissão parlamentar de inquérito específica - que trata de investigação exclusiva, como, por exemplo, de um banco.

"O clima na base está como no Rio Grande do Sul de manhã cedo, gelado e com cerração", afirmou Maia. "Vai necessitar de ajuste político, de uma sintonia fina para votações como esta (da DRU)." Um deputado aliado, diante da paralisação da Câmara, ironizou: "O pessoal está com preguiça".

À exceção do PSOL, todos os partidos aliados e oposição entraram ontem pela manhã em obstrução, ou seja, não deram quórum no plenário da Câmara.

Com essa estratégia, os parlamentares impediram a votação do projeto de decreto legislativo simples, que previa a aprovação do tratado de extradição entre Brasil e China, firmado em 2004. A obstrução foi iniciada pelo PR, que, desde a saída do senador Alfredo Nascimento (AM) da pasta dos Transportes, há cerca de um mês, deixou clara sua insatisfação com o Planalto. Rapidamente todos os aliados aderiram à obstrução, o que impediu votações.

Marta. Além de paralisar o plenário da Câmara e ameaçar apoiar a criação de CPI, a base avisou ao Planalto e ao PT que está pronta para aprovar requerimento apresentado pelo DEM na Comissão de Fiscalização da Câmara para ouvir a senadora Marta Suplicy (PT-SP).

O ex-assessor dela Mário Moysés foi preso na Operação Voucher, da Polícia Federal, que detectou um esquema de desvio de recursos do Ministério do Turismo para uma organização não governamental (ONG) e um grupo de empresas privadas.

Diante da rebelião da base governista, os partidos de oposição correm a fim de tentar obter as assinaturas para a criação da CPI da Corrupção. A ideia é fazer uma CPI mista da Câmara e do Senado. "Quem não assinar a CPI é porque não quer investigar. Quem não assinar a CPI é porque concorda com todos esses absurdos que estão acontecendo no Brasil, de um processo endêmico de corrupção", disse o líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA). Conforme o regimento, para a abertura de CPI são necessárias as assinaturas de, no mínimo, 171 deputados (no total, são 513) e de 27 dos 81 senadores.

O clima revoltoso entre os aliados da presidente Dilma Roussef também se estende para governadores. No Ceará, por exemplo, Cid Gomes (PSB) tem criticado o governo e cobrado investimentos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mistura perigosa :: Merval Pereira


Necessidade de conter gastos públicos, por um lado, e a reivindicação generalizada por liberação de verbas e aumentos salariais no serviço público, um paradoxo que desafia o governo e o coloca à mercê de seus próprios aliados. Diante do quadro preocupante da crise econômica internacional, o governo trabalha para não aprovar medidas como a PEC 300, que estabelece um piso salarial nacional para policiais militares e bombeiros, mas políticos da base aliada apoiam a reivindicação.

Da mesma forma, uma aliança informal entre vários partidos da base aliada decidiu boicotar as votações de interesse do governo até que sejam liberadas verbas já aprovadas.

E, culminando esse clima de insubordinação reinante em Brasília, a Polícia Federal, irritada com as restrições que a própria presidente fez à sua atuação na operação que prendeu 36 pessoas no Ministério do Turismo, um feudo que era do PT e foi transferido para o PMDB, ameaça entrar em greve contra o contingenciamento das verbas que, segundo uma nota divulgada por sua associação nacional de delegados, está impedindo a eficácia de suas ações.

"A Polícia Federal já está sofrendo com a agenda econômica do governo, não pode ser pautada também pela sua agenda política", disse o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Bolivar Steinmetz.

Esse ambiente já classificado de "clima de boicote", está propiciando à oposição uma situação favorável ao recolhimento de assinaturas para uma CPI da Corrupção, que analisaria todos os escândalos acontecidos nesse começo de governo.

Houve um momento do governo Lula em que parecia que o governo havia perdido o controle sobre a Polícia Federal, que estaria agindo autonomamente e a serviço de interesses de grupos políticos variados.

Custou muito ao então Ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos controlar a Polícia Federal, e especificamente quanto ao uso das algemas, que hoje está sendo novamente criticado por setores do governo, a muito custo Thomaz Bastos soltou uma norma para evitar esse tipo de exposição de pessoas presas que não ofereçam resistência ou perigo de fuga.

O uso de algemas, avaliado como exorbitante por alguns, é uma característica da polícia dos Estados Unidos, e temos por aqui setores da Polícia Federal que consideram pedagógico o seu uso em crimes do colarinho branco.

Mas o problema do governo Dilma é que não existe ninguém com a experiência, o conhecimento e a capacidade de influência de Marcio Thomaz Bastos para controlar a Polícia Federal, se ela eventualmente voltar a ficar dividia em grupos e a atuar de acordo com interesses políticos.

O atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não tem essa experiência toda, e não foi por acaso que ele, depois de receber críticas pela atuação da Polícia Federal por parte da própria presidente Dilma, do vice-presidente Michel Temer e de políticos importantes do PT e do PMDB, saiu em defesa dos métodos adotados, para acalmar o quadro de crise na Polícia Federal.

Se o governo perder o controle da Polícia Federal, pode voltar aquela época em que todo mundo grampeava todo mundo, em que todo político ou empresário utilizava a Polícia Federal para seus próprios interesses.

A presidente Dilma não tem razão para se preocupar com os índices de popularidade registrados na mais recente pesquisa do Ibope, pois aparentemente não houve uma queda, mas uma volta a níveis médios que vêm sendo registrados desde que tomou posse.

A comparação com março, quando ela atingiu um índice maior de apoio, não é válida tecnicamente, aquele parece que foi um ponto fora da curva.

Sua situação, portanto, está estável, não é preocupante desse ponto de vista. É claro que se ela atingiu um ponto mais alto em março, e agora voltou para média, é sinal de que não conseguiu sustentar uma avaliação positiva mais alta, mas nada grave em termos de aceitação popular.

Ela tem que ficar preocupada é com o governo, que está muito desestruturado. Principalmente, tem que se preocupar com os aliados no Congresso, que estão muito inquietos diante dos últimos acontecimentos, inconformados com a ação saneadora do governo e, sobretudo, com as últimas ações da Polícia Federal num ministério controlado pelo PMDB que anteriormente era do PT.

O noticiário sobre corrupção no governo, especialmente se é sustentado por fatos concretos, é claro que influencia a percepção da opinião pública sobre o governo, assim como essa percepção negativa pode ser contrabalançada com as medidas que o governo venha a tomar.

No caso atual, até o momento o saldo tem sido positivo para a presidente Dilma, embora as coisas estejam ficando meio nubladas por atitudes ambíguas quando as denúncias atingiram ao mesmo tempo o PMDB e o PT.

A sensação de que a situação está descontrolada pode afetar o governo. Se todo o dia aparecem acusações novas, denúncias em vários ministérios, o que passa para a opinião pública é que o governo é uma bagunça, está dominado por ladrões. Que não sabe escolher as pessoas que trabalham nele.

Mesmo a ação direta contra a corrupção pode ficar neutralizada pela percepção de que o governo perdeu o controle da situação. E o "fogo amigo" atinge vários partidos da base aliada, revelando a verdadeira natureza do que aparenta ser uma coalizão governamental ampla: um saco de gatos onde ninguém se entende.

FONTE: O GLOBO

Rebelião :: Eliane Cantanhêde

A presidente Dilma Rousseff está sob fogo cruzado. O tiroteio vem de fora, com a crise econômica que agora ameaça o "triplo A" da França, e de dentro, com a insubordinação e as ameaças da base aliada no Congresso.

Ela tenta manter o foco na questão econômica, que não permite otimismo, apesar do refresco de ontem: reequilíbrio das Bolsas e anúncio de reservas internacionais de US$ 351 bilhões, mais de 60% acima das da crise passada.

Mas Dilma não pode se descuidar do flanco interno. A CPI, que seria só no Senado e só sobre a roubalheira no Ministério dos Transportes, ganha duplo upgrade: a nova coleta de assinaturas é para uma CPI mista (Câmara e Senado) e sobre a corrupção nos ministérios em geral. Ou seja: sobre o governo.

A ameaça, explícita na oposição (PSDB, PSOL, DEM e PPS), é dissimulada nos partidos aliados (PMDB, PR, PTB, PP e PSC), que fazem "operação padrão" no Congresso Nacional, contra o PT e o governo. Reclamam um pouco da não liberação de emendas e muito da "faxina ética" em ministérios. Sentem-se "vítimas".

Não bastasse, começa uma nova frente de batalha: Dilma mandou, e o Ministério da Justiça resolveu bater de frente com a Polícia Federal, questionando as dezenas de prisões no Turismo e a volta ostensiva de algemas, com altos funcionários sendo fotografados algemados, apesar de serem ainda suspeitos.

O argumento do Planalto e da Justiça é que a prática contraria os limites estabelecidos pelo Supremo em 2008 (algemas, só com risco de fuga ou resistência à prisão).

Dilma disse que está "tranquila" com a queda de seis pontos de popularidade na pesquisa CNI/Ibope divulgada anteontem, mas não deveria estar tanto. Até porque a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, parece sozinha ao dar ordem unida às tropas aliadas. E ela é aquela, sim, que o ex-ministro Jobim chamou de "fraquinha".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Eike Batista para líder do governo:: Maria Cristina Fernandes

"Quis sinalizar para o mercado que o mundo real está pegando fogo". O empresário Eike Batista explicava à repórter Marina Falcão, do Valor, as razões por que, face a perdas bilionárias dos papéis de suas empresas na bolsa, resolvera dar um aumento salarial de 8,5% a seus funcionários.

O empresário enxerga uma janela de oportunidades para o Brasil em mais essa leva de inquietações nas finanças mundiais. Acha ridículo o risco da dívida de um país que imprime a moeda mundial - "Não vai faltar tinta nem papel" - e diz que vai sobrar no mundo a mão-de-obra qualificada de que falta ao Brasil.

Eventuais percalços parecem embutidos no preço. O empresário já foi vítima da mesma Polícia Federal que agora acossa pemedebistas e petistas.

As empresas de Eike, cujos papeis caíram na bolsa, ainda são o que o mercado chama de pré-operacionais - ativos que, por estarem em fase de maturação, não geram os dividendos que se buscam em momentos de crise.

O mundo real está pegando fogo e ninguém viu

Aos sete meses de vida, o governo Dilma Rousseff também está em maturação. A turbulência envolvendo o quarto ministério do governo só deixa entrever a gritaria de quem quer realizar de imediato. E esconde a janela de oportunidades aberta a quem estiver aliado ao seu projeto de poder.

O apelo oficial não poderia ser outro senão o de cautela para que o Congresso barre projetos de impacto fiscal como a PEC 300, que aumenta salários de policiais. Dilma não pode descumprir a lei que manda aumentar o salário mínimo em mais de 13% em 2012 sob o risco de ver as centrais sindicais, já em litígio com o governo, declararem guerra de uma vez por todas. Daí a sua determinação em segurar um funcionalismo que teve ganhos expressivos no governo anterior.

O outro lado do discurso oficial, encoberto pelo medo das algemas, é que as autoridades econômicas se declaram convencidas da possibilidade aberta ao Brasil pela crise para a inversão na curva dos juros, em elevação desde a posse de Dilma.

Some-se a isso a determinação de maior controle sobre o mercado, traduzido pela medida provisória que lança mão do IOF contra o capital especulativo e amplia a regulação dos derivativos, a política industrial e o incentivo fiscal para micro e pequenas empresas de onde se avalia que venha parte expressiva dos emergentes da classe média.

Este governo, que tem ainda um Orçamento bilionário para obras da Copa do Mundo e da Olimpíada - com centenas de milhares de fornecedores para todos os tipos, gostos e candidatos - será posto em xeque por um punhado de apaniguados? A ameaça de CPI só prospera se os aliados se convencerem da improvável possibilidade de um governo nas cordas lhe oferecer vantagens comparativas maiores.

Os brasileiros da nova classe média, nomeclatura oficial que ignora as favelas de esgoto a céu aberto cheias de famílias com renda mensal de mais de R$ 1 mil, diriam que o momento está a tirar dos aliados políticos deste governo aneis - de bijuteria - e a deixar os dedos, além de intactos, capazes de agarrar as muitas oportunidades à sua frente.

Está claro que se a investida contra a corrupção seguir desembestada justiçando a ferro e fogo a imoralidade pública, mandato eletivo algum - a começar da Presidência da República - estará a salvo.

Na semana passada, a Controladoria Geral da União divulgou um recorde à la Caged. De janeiro a julho foram expulsos 328 servidores públicos federais por envolvimento em irregularidades. É um número recorde se comparado com o mesmo período de qualquer outro ano a partir de 2003.

Os motivos das expulsões, pela ordem de ocorrência, foram valimento do cargo para obtenção de vantagens, improbidade administrativa e recebimento de propina. No mesmo período, a Polícia Federal prendeu 392 corruptores, entre empresários, intermediários e laranjas, por desvio de verba pública, aliciamento de servidores e favorecimento em licitação.

A menor leniência de Dilma com a corrupção é uma estratégia medida e pesada. Tanto serve à depuração de uma aliança política que chega a extraordinários 400 deputados quanto à formatação de uma base de apoio numa sociedade em que, ao contrário dos Estados Unidos em crise, as novas gerações têm mais anos de escolaridade que seus pais e avós.

É fato que, se até o encantador de multidões Luiz Inácio Lula da Silva chegou a temer pelo seu mandato no auge do mensalão, Dilma não há de desprezar o risco de atear fogo às próprias vestes se a estratégia de afirmação da identidade de seu governo não for bem conduzida.

Os juros podem baixar e o país virar um canteiro de obras, mas o que sua base aliada tem de mais imediato pela frente são as eleições municipais. A disputa é o mundo real da política de meio de mandato. É por meio dela que deputados e senadores renovam as perspectivas de sua carreira. A votação de projetos de interesse do governo não deveria ser excludente em relação à missão de acompanhar a movimentação partidária de alianças e acordos com vistas à disputa de 2012. Não será a liberação das emendas parlamentares, essenciais aos projetos políticos em disputa no próximo ano, que vai comprometer o esforço fiscal do governo.

PMDB e PT estão metidos numa disputa encarniçada pela montagem desses palanques municipais. Lula mandou recentemente o recado de que os aliados terão que se entender se quiserem tê-lo no palanque. Mas é a nova ocupante do Planalto a quem, além de tomar gosto pela coisa, cabe incumbir suas lideranças de desmontar os conflitos mais potencialmente destrutivos desta disputa.

O mensalão nasceu na montagem da primeira campanha municipal da era Lula. Dilma tem todas as condições para evitar que crises semelhantes se avolumem. Mas tanto as lideranças da base de governo, que desprezam as oportunidades abertas pela conjuntura do Brasil na crise, quanto os gabinetes do Palácio do Planalto, que ignora as vicissitudes do calendário eleitoral, precisam dar ouvidos a Eike Batista quando ele diz que o mundo real está pegando fogo.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Para além do vaivém das Bolsas:: Luiz Carlos Mendonça de Barros

A causa mais importante de toda essas oscilações é, sem dúvida, a volta do risco de uma nova recessão nos EUA

Incríveis as oscilações de preços nos mercados financeiros nas últimas duas semanas. Depois de um longo movimento de quedas diárias, e que destruiu trilhões de dólares de valor nos três cantos do mundo, estamos agora vivendo um vaivém insensato. Em um dia os preços das ações -no Brasil e no mundo- caem mais de 4%; no dia seguinte, sobem com a mesma intensidade, para em seguida voltar a cair forte.

Essa mesma gangorra acontece com a cotação do franco suíço, do iene japonês e do ouro, ativos vistos pelo mercado como mais seguros do que o dólar americano.

A moeda suíça -uma das mais estáveis do mundo- chegou a se valorizar em mais de 5% em relação ao dólar em um só dia. Mesmo os títulos emitidos pelo Tesouro americano tiveram seus preços flutuando diariamente em níveis também muito acima do padrão histórico.

Isso apesar de serem eles os títulos financeiros de maior liquidez em circulação no mundo e, portanto, difíceis de serem manipulados pelos especuladores.

Vou usar um derivativo que mede a variação dos preços das ações na Bolsa de Nova York -o chamado índice VIX- para dar ao leitor da Folha uma ordem de grandeza da loucura deste período. O VIX, que em tempos normais vale 15 pontos, chegou a mais de 40 nesta semana.

As perguntas que chegam hoje a todos os que ocupam um espaço de reflexão sobre economia e finanças são quase sempre as mesmas: como explicar esse estado de irracionalidade coletiva, e do que depende a volta de um comportamento mais previsível aos mercados?

A causa mais importante de toda essa volatilidade é, sem dúvida nenhuma, a volta do risco de uma nova recessão nos Estados Unidos.

Essa ameaça -que, por vários meses, parecia afastada- voltou com força a partir da divulgação do crescimento do PIB americano no segundo trimestre deste ano e, principalmente, das revisões dos números relativos aos trimestres anteriores.

As estatísticas mostraram a todos duas verdades explosivas: a recessão em 2009 foi mais profunda do que medida anteriormente e o crescimento no início deste ano foi muitíssimo mais fraco do que o que havia sido medido pelo governo americano e por instituições privadas há alguns meses.

O quase pânico que se instalou nos mercados após a divulgação desses dados deveu-se ao reconhecimento de que as medidas que vinham sendo tomadas pelo governo e pelo Fed não estavam sendo suficientes para colocar a maior economia do mundo de volta à rota do crescimento sustentado. Tinha havido uma recuperação ao longo de 2010, mas os números agora revelavam que isso tinha sido apenas um espasmo de crescimento.

Além disso, mesmo os mais fervorosos economistas keynesianos, como eu, sabiam que não existem novos medicamentos a serem ministrados ao paciente. E todos sentiam a frustração de reconhecer que os ensinamentos e os conselhos do velho mestre não estavam funcionando desta vez.

No meio dessa decepção, a crise criada pelo impasse na renegociação do teto da dívida pública americana funcionou como elemento adicional no imaginário já pessimista dos mercados. A recuperação da economia dos Estados Unidos, todos sabem, é um elemento fundamental para que a Europa possa administrar sua própria crise fiscal.

Na medida em que a confiança nesse cenário desaparecia e se transformava em um fantasma recessivo das piores proporções, a crise europeia mudava de dimensão.

Com esse futuro negro à frente, o mercado passou a criar seus próprios monstros. O maior deles foi o mito da fuga dos investidores tanto dos títulos emitidos pelo governo americano como do dólar.

Felizmente, essa ameaça durou apenas um fim de semana, pois na segunda feira seguinte à decisão da agência Standard & Poor"s os investidores corriam para comprar esses papéis e a moeda americana.

Com os mercados mais calmos, e bem mais baratos, creio que teremos um período de maior racionalidade à espera de novos dados econômicos que mostrem a economia ainda crescendo e do início de um entendimento no Congresso americano sobre a questão fiscal nos EUA.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, 68, engenheiro e economista. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Como blindar a economia brasileira :: Paulo R. Haddad


Há uma taxa mínima de crescimento da economia brasileira que é indispensável para que sejam atingidos três objetivos simultânea e complementarmente. O primeiro é manter um ritmo adequado do nível de emprego capaz de absorver quase 2 milhões de brasileiros que entram anualmente nos diferentes mercados de trabalho. O segundo objetivo é gerar um excedente econômico que permita financiar as necessidades crescentes das políticas sociais compensatórias, visando a atenuar os índices de pobreza e de miséria, assim como atenuar eventuais tensões sociais e políticas em nosso país. Finalmente, essa taxa tem a função de manter acesa a chama do "espírito animal" dos nossos empreendedores efetivos ou potenciais, além de uma expectativa recorrente de confiança no nosso progresso econômico e social.

Não é tão difícil obter consenso entre lideranças políticas e comunitárias sobre uma agenda de reformas estruturais e institucionais que poderiam dar sustentabilidade a essa taxa mínima de crescimento, mantidas as condições de relativa estabilidade monetária e de consistência macroeconômica de nossa economia. Mas, entre o processo de negociação político-institucional dessa agenda e a sua implementação, prevê-se um longo período de maturação. Como já dizia Keynes em 1923, em momentos de turbulências financeiras pouco adianta sugerir soluções que somente são eficazes no longo prazo.

Partindo, pois, dos pressupostos de que essa taxa mínima de garantia se situa entre 4% e 5% e que a crise econômico-financeira mundial deverá persistir sem solução por um longo período plurianual, como será possível evitar que uma eventual desaceleração da economia brasileira comprometa a realização dos três objetivos mencionados?

Por um lado, a política monetária deverá continuar restritiva para trazer a taxa de inflação para o centro da meta pelo menos em 2012. Por outro lado, há poucas saídas que venham da política fiscal anticíclica, num contexto em que a carga tributária se encontra no seu limite do possível econômico e político; a despesa pública, enrijecida por razões constitucionais e comprometimentos com políticas sociais compensatórias; e a gestão da dívida pública, com restrições à redução do superávit primário, sob pena de perda de credibilidade diante dos credores internos e externos. O que fazer, então?

Uma estratégia factível no curto prazo se refere à aceleração da execução de um conjunto único e magnificente de grandes projetos de investimentos em implantação ou em fase final de decisão para serem operacionalizados em diferentes setores e regiões do País. Somente no segmento de minérios e seus concentrados, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) destaca investimentos no valor total de US$ 64 bilhões, sem contar os projetos da cadeia produtiva do setor petrolífero, em que os investimentos do pré-sal atingem os três dígitos de bilhões de dólares. A esse conjunto se somam os grandes investimentos dos setores do agronegócio e da bioenergia com projetos em andamento.

São grandes projetos de investimento que se orientam pelo comportamento dos mercados no médio e no longo prazos, em que novos patamares de demanda foram alavancados de forma sustentada pela China e por outros países emergentes, como megaconsumidores de produtos intensivos direta e indiretamente de recursos naturais, onde esses investimentos se posicionam competitivamente em nível global, independentemente das turbulências financeiras de curto prazo. A sua implementação tem como fator limitante os riscos jurisdicionais e a lentidão das burocracias governamentais que prevalecem atualmente no País. Cabe, pois, ao governo, coordenar-se internamente e negociar com as organizações que controlam esses projetos os mecanismos e instrumentos que possam acelerar e tornar irreversíveis o seu processo de implantação. A não ser que o governo continue acreditando que a atual crise econômica mundial não será longa, profunda e portadora de incertezas.

Professor do IBMEC/MG. Foi ministro do Planejamento e da Fazenda do governo Itamar Franco

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Bloqueio de mídias sociais proposto por Cameron após distúrbios é criticado por especialistas

LONDRES - Apagões na internet e na telefonia celular já foram usados como forma de tentar desarticular protestos no Egito e na Tunísia, durante manifestações por mudanças. A medida, tachada na ocasião pelo Ocidente como censura, voltou a ser cogitada na quinta-feira. Desta vez, não num país onde sua população é impedida de escolher seus governantes, mas no Reino Unido. A declaração do premier David Cameron de que poderá bloquear temporariamente as mídias sociais e torpedos durante distúrbios como os vistos nos últimos dias dividiu opiniões no país onde foi escrita a primeira Magna Carta garantindo liberdades individuais - acendendo, agora, o debate sobre os limites entre o que é a necessidade de manter a ordem pública e o que é censura.

A eficácia da medida foi logo posta em dúvida, com especialistas lembrando que ações para bloquear a internet em Egito e Tunísia não detiveram as manifestações que acabaram por derrubar ditadores. Na China, internautas tentam driblar o controle do Estado hospedando seus sites em servidores no exterior.

- Sem dúvida que seria um contrassenso com a tradição histórica britânica - diz o professor Williams Gonçalves, do curso de Relações Internacionais da Uerj. - Uma coisa é pôr ordem nas ruas, outra é coibir os meios de comunicação.

Para o acadêmico, a cogitada censura seria uma "violentação do direito das pessoas de se comunicarem livremente".

- Isso só ressalta a dificuldade que os governos estão tendo de lidar com esses instrumentos eletrônicos de comunicação. É uma situação nova.

John Bassett, um ex-funcionário da inteligência e atual membro do Royal United Services Institute, acha que o governo britânico deve evitar agir com mão de ferro:

- Aqueles governos que tentam usar antigos modelos de controle tendem a fracassar, perdendo legitimidade e o respeito - disse.

Conservador vê erro 'político colossal'

Um colega de Cameron no Partido Conservador, e que pediu anonimato, vê a medida como um "colossal erro político".

- Esse pode ser seu (furacão) Katrina ou suas Falklands - disse ele referindo-se à Guerra das Malvinas.

O discurso do premier despertou ainda uma série de criticas no Twitter. O blogueiro egípcio Mahmoud Salem, conhecido como Sandmonkey, escreveu: "Se o Reino Unido limitar as mídias sociais para conter os distúrbios, então estaremos testemunhando um momento revelador para os regimes do Primeiro Mundo."

Salem se referia a uma mudança de postura de Cameron. Em fevereiro, o premier elogiou o papel das mídias sociais na queda de regimes autocráticos, descrevendo-as como "uma poderosa ferramenta nas mãos de gente cansada de corrupção". Cameron ressaltara ainda que a liberdade de expressão e a internet deveriam ser respeitadas "tanto na Praça Tahrir quanto em Trafalgar Square."

"Oh, Cameron, você sabe que bloquear as mídias sociais não deterá os distúrbios. Mas pode temporariamente interromper as críticas ao seu governo", tuitou Kate Crawford, pesquisadora da Universidade de New South Wales em Sydney, Austrália.


FONTE: O GLOBO

Congresso chileno propõe acordo com estudantes


SANTIAGO - Dois dias depois de mais uma mobilização estudantil em Santigo, os presidentes do Senado e da Câmara de Deputados chilenos propuseram um acordo político e uma mesa de negociação com todos os setores envolvidos nos protestos por reformas educadionais, que sacodem o país há mais de dois meses.

O presidente chileno Sebastian Piñera acudiu o apelo do Legislativo e ressaltou que é preciso "buscar de uma vez por todas o diálogo fértil, que é o único que vai permitir que o Chile melhore a qualidade, a igualdade e o financiamento da Educação, que são as prioridades dos estudantes".

O presidente do Senado, o esquerdista Guido Girardi, disse que os estudantes conseguiram mudar o Chile com os protestos, mas que agora é o momento de sentar à mesa de negociações para transformar as conquintas do grupo em mudanças duradouras. O direitista Patricio Melero, líder da Câmara, também reforçou a necessidade de diálogo. Nas últimas duas semanas, as manifestações paralisaram várias universidades 7,7% de colégios de Ensino Médio, informou o governo.

Na semana passada, o ministro da Educação, Felipe Bulnes, entregou uma proposta com 21 pontos a serem melhorados a líderes estudantis e professores, mas o projeto foi rejeitado por tratar de mudanças insuficientes, explicou o grupo. Os manifestantes tinham dado um prazo de até quarta-feira passada para o governo fazer novas propostas, mas Piñera resolveu manter o plano inicial.

O conflito estudantil conseguiu o apoio da grande maioria da população, o que refletiu na imagem do presidente chileno que, segundo as últimas pesquisas, sofre um nível de desaprovação maior que 53%.

FONTE: O GLOBO

A crise econômica e os limites da inovação política no PPS:: Vagner Gomes de Souza

Não há dúvidas sobre a emergência de uma crise mundial do capitalismo financeiro. A liberdade de circulação monetária no mundo sem lastro na produção econômica gerou uma “bolha artificial” que agora está explodindo em diversos países. Seus primeiros momentos foram vividos no ano de 2008 no núcleo central do capitalismo: os EUA. A vitória do Partido Democrata foi uma esperança de novos rumos no cenário internacional. Entretanto, seus desdobramentos políticos foram “congelados” na gestão de Obama diante do fortalecimento do extremismo conservador do “Tea Party”.

Para enfrentar a dimensão da crise econômica é necessária uma inovação política permanente. Caso contrário, testemunharemos o aumento do descrédito da democracia uma vez que a política eleitoral estaria aprisionada a formação de máquinas de conquista do voto sem posições políticas claras (vejam o exemplo do “novo” PSD no Brasil) e suas possíveis vinculações a uma rede de corrupção sistêmica.

Na onda de uma crise econômica, muitos boatos podem estimular o enriquecimento especulativo de pequenos grupos econômicos. A indignação da juventude pelo mundo seria um indício de resistência que as forças democráticas da esquerda devem estar abertas para fazer política com e para elas. Formular uma política positiva que enfrente a crise com o aprofundamento da democracia. Redistribuir os canais da participação democrática para que os efeitos da crise econômica não penalizem os mais pobres e a classe média.

No Brasil, o “lulismo” desqualificou a crise econômica de 2008 como se fosse uma “marolinha” em benefício do fortalecimento de uma gestão da “grão-burguesia”. Foi uma reação que formou uma “cortina de fumaça” num momento de ampla transferência de recursos públicos para a elite econômica, sempre “demonizada” na ideologia do petismo mas sempre bem tratada na política econômica. Nós tivemos a emergência de novos sujeitos nas camadas médias diante de um forte crescimento econômico que hoje não se produz mais. Não há sustentabilidade no crescimento da economia pelo arcaísmo de nossa infraestrutura. Logo, a chamada nova classe média atual poderá ser a nova camada de endividados na crise que se avizinha em Planos de Saúde, em cartões de crédito, nas faculdades particulares, nos financiamentos de automóveis e casas.

Contudo, a gerência estatal da crise econômica de 2008 com recursos financeiros do BNDES foi acompanhada pela polarização com uma oposição com déficit na formulação política diante da amplitude de seu leque de aliança que agrupava desde uma social-democracia liberal passando por forças liberais e socioliberais até correntes da esquerda democrática. Desacreditar essa oposição, que estava vazia na formulação de uma política comum, foi uma tarefa fácil. O Bloco Democrático e Reformista (PSDB/DEM/PPS) foi um slogan sem conseqüências na política para a sociedade. Viveu suas contradições e manteve um velho estilo da política brasileira ao perdurar o “caciquismo político” na escolha das candidaturas majoritárias em várias esferas. A política cedeu espaço ao marqueteiro da política.

Diante de um cenário político e econômico que exigia democracia no cotidiano partidário, os partidos do Bloco não ampliaram a democracia e muito menos se demonstraram reformistas. Os partidos do Bloco ficaram aprisionados ao modelo das convenções de confirmação de nomes sem debate da política. Esses partidos ficaram tímidos em realizar “prévias partidárias” com filiados e não filiados para a escolha das candidaturas de oposição. O partido político que deveria ser modelo na formulação da política, o Partido Popular Socialista (PPS), realizou o XVI Congresso em 2009 em clima de “pré-convenção” eleitoral como muitos militantes e alguns dirigentes apontam sem que nascer uma postura política para dirigir o enfrentamento do “lulismo”. Nasce nesse momento os desdobramentos da atual crise política de todos partidos da oposição e do sentimento de desorientação da esquerda democrática.

A construção de um novo caminho para a oposição não se resume em reconhecer a existência de um possível peso político da classe média. Esse é um ponto de partida sociológico que pode estar se esquecendo do que foi a Semana de Arte Moderna e o Tenentismo já em 1922 quando fundaram o Partido Comunista Brasileiro antes da grande crise de 1929. Devemos ter outras atitudes no campo democrático da esquerda em nosso país. Para enfrentar a crise econômica que se avizinha, devemos expor os perigos dos encaminhamentos nem sempre democráticos e transparentes das propostas do Governo. Fazer isso é uma tarefa que exige formar um ator político (mesmo que alguns declarem horror a essa expressão) democrático e reformista da esquerda na nossa vida partidária (mesmo que outros tenham pânico para essa interpretação).

O XVII Congresso do Partido Popular Socialista deve enfrentar os vícios da política brasileira. Portanto, não pode compactuar com o caciquismo eleitoral de lideranças estaduais aliados ao centralismo e a tendência ao esvaziamento da formulação política no partido que, entre tantos exemplos, se acentua no desmonte da identidade partidária. Esses são problemas comuns aos partidos políticos que podem contagiar nosso debate congressual num momento que devemos estar politicamente preparados para formular uma política de valorização da democracia para enfrentar a crise econômica mundial.

Se os dirigentes reconhecem a gravidade da Cris econômica, saudaremos que nesse momento façam uma proposta de inovação da política do PPS enquanto ainda há tempo para mobilizar a sociedade. Devemos reconhecer que não somos mais o “Partidão”, o que não significa questionar o trabalho regional de nenhum companheiro militante, para que o reformismo seja uma proposta para a sociedade. O sentimento de “mumificação” do debate interno só daria sobrevida ao partido como uma legenda eleitoral para servir aos interesses individuais diante do “furacão da crise econômica”. Entendemos que o reformismo democrático da esquerda não se fará com rupturas, mas com a formulação de um programa de outra oposição para nosso pais que passa pela ampliação da democracia. Trata-se de uma condição que esse debate seja feito no processo congressual. Portanto, o PPS não pode fazer “mais do mesmo” no cenário político partidário.

Vagner Gomes de Souza (Dirigente Municipal do PPS-Rio de Janeiro

Para Marina, Dilma ''não pode usar duas medidas''


Roldão Arruda e Pablo Pereira

A ex-senadora Marina Silva (sem partido) disse ontem em São Paulo que a presidente Dilma Rousseff não pode trabalhar com dois pesos e duas medidas no tratamento a escândalos de corrupção em seu governo. Mariana se referia à "faxina" promovida nos últimos dias no Ministério do Turismo, quando a Polícia Federal prendeu 35 pessoas acusadas de fraudes na pasta.

"Corrupção é corrupção. Deve ser combatida com rigor. Não importa se o partido é da base aliada ou não. Se é de partido pequeno, ou se é de um partido grande. A sociedade não vai aceitar dois pesos e duas medidas", afirmou Marina, após participar do evento Encontros Estadão&Cultura, no Teatro Eva Herz, na Livraria Cultura, em São Paulo.

Para Marina, o governo Dilma vive um momento grave com a troca de três ministros em sete meses de mandado. Ela acredita que o Planalto deve ignorar as pressões e manter mão forte na responsabilização dos culpados.

"Neste momento, a aliança que precisa ser feita é com a sociedade", resumiu. Ela defende, no entanto, que partidos políticos e setores da sociedade devem se manifestar publicamente apoiando a "faxina".

A ex-senadora disse ainda que a corrupção não é um problema só de Dilma: "Vem de décadas. É um problema da sociedade." E recordou sua campanha presidencial: "Na campanha eu já dizia que iam para o dreno da corrupção 5% dos recursos, o equivalente ao valor que vai para a educação. Os indícios que temos é de que é muito mais". "Temos de ter ação como sociedade. O que eu chamo de "novo acúmulo" e Fernando Henrique Cardoso chamou de "novo consenso"".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Não há razão para drama, nem para pensar grande demais:: Bernardo Guimarães


Crises lá fora costumavam ter impactos muito fortes aqui no Brasil, e não faz muito tempo. A crise do México, em 1994/95, abalou a confiança no real, então uma jovem moeda com menos de um ano de idade.

No segundo semestre de 1997, foi a vez de a crise no Sudeste Asiático forçar uma tremenda alta nos juros e reduzir ainda mais o ritmo da economia brasileira, que já crescia pouco. Um ano depois, era a Rússia em crise que instaurava o tremor de uma crise cambial e de um calote na dívida.Em vários sentidos, a crise de 2008 e 2009 foi muito pior que essas todas. Uma recessão nos Estados Unidos e na Europa tem muito mais impacto na economia mundial do que uma crise na Tailândia e na Coreia. De fato, essa crise levou a uma drástica redução no crescimento da economia global. As crises dos anos 1990 no México, na Coreia ou na Rússia tiveram muito menor impacto.

Contudo, a sensação que se tem é que as crises estão tendo um impacto menor por aqui. Sim, a crise financeira que se abateu sobre os países mais ricos influenciou nossa economia: o crescimento do PIB brasileiro foi de cerca de 4% ao ano em 2008 para 0% em 2009. Mas o ano de 2010 praticamente recuperou o tempo perdido e em 2011 estamos de volta ao nível esperado de crescimento de 4% ao ano. Drásticas quedas nas bolsas de valores europeias e americanas continuam tendo um forte impacto no Brasil e uma recessão grande por lá vai certamente afetar a atividade econômica aqui, mas o efeito parece ser bem menos dramático do que no passado.

A dívida líquida externa do setor publico é negativa e o estoque da dívida corresponde a menos de um ano de exportações

Isso tudo é verdade? Se for, temos motivos para ficar confiantes em que a economia brasileira não vai sofrer tanto se houver uma nova recessão global. Mas o que explicaria o menor impacto das crises de hoje sobre a economia brasileira?

Há várias explicações possíveis. Uma é baseada nas informações geradas pelas crises. A ideia é a seguinte: uma crise em um país revela informações para os agentes econômicos e passa a informação de que a economia do país em crise não está funcionando tão bem quanto pensávamos. Por exemplo, uma crise no México pode realçar a instabilidade política daquele país ou a dificuldade de se resolver os problemas de fundo que causam inflação. A crise no Sudeste Asiático pode mostrar ao mundo que segurar um câmbio fixo é difícil e que o ajuste à mudança é mais custoso do que achávamos.

Consequentemente, a crise no México pode ter levado investidores e analistas a revisar suas impressões sobre o Brasil, assim como a crise no Sudeste Asiático pode ter realçado os problemas do regime de câmbio brasileiro da época. No caso da Rússia, dizia-se que a crise havia ensinado aos investidores um pouco sobre o FMI, e esse aprendizado indicaria que as chances de o FMI interferir para evitar um possível calote na dívida brasileira era menor do que se pensava. Histórias como essas podem ter levado investidores a mudar suas posições com relação às chances e às consequências de uma crise no Brasil.

Por outro lado, a crise financeira de 2008 e 2009 trouxe menos informações relevantes sobre a economia brasileira. Enquanto nos Estados Unidos o problema era que o sistema financeiro estava muito alavancado, aqui o sistema financeiro ainda era pouco desenvolvido, o volume de crédito era muito baixo. Aliás, o volume de crédito tem crescido muito no Brasil, e o Banco Central tem tentado evitar um crescimento muito rápido por conta do aprendizado que a crise proporcionou.

Muitos analistas acreditam que a crise de 2008 acabou mostrando aos investidores que o Brasil era mais resiliente do que pensávamos. O Brasil foi um dos primeiros países a se recuperar da crise, o que fez o mercado de ações disparar: o aprendizado se reflete nos preços dos papéis. Parte do otimismo com a economia mundial agora parece ter sido prematuro, e por isso os mercados do mundo inteiro estão despencando.

A crise do momento também não ensina muito sobre o Brasil. A instabilidade política nos Estados Unidos não nos faz reavaliar a nossa situação política. Os percalços dos europeus com a moeda única e a impossibilidade de desvalorizar o câmbio revelam os problemas daquele arranjo, mas não dizem nada relevante sobre o cenário macroeconômico brasileiro.

Aliás, outras explicações para o menor efeito das crises aqui estão ligadas ao cenário macroeconômico brasileiro. Com o euro, a moeda dos gregos e dos portugueses não pode se desvalorizar. Uma desvalorização cambial reduz os salários e preços no país. Isso reduz o poder de compra dos habitantes do país no mercado internacional, mas os ajuda a exportar e receber recursos do exterior. Com a moeda única, essa "desvalorização" só pode ser obtida com uma queda nominal na renda de todos, e é muito difícil coordenar essa mudança. Assim como o horário de verão faz todo mundo acordar uma hora mais cedo sem que tenhamos que mudar nossos horários, a desvalorização cambial reduz a renda de todos sem que tenhamos que mudar os salários.

No Brasil, o câmbio flutua. As oscilações do câmbio atrapalham nossa vida: às vezes o real está caro demais, em outros momentos está muito desvalorizado. Essa é a desvantagem do câmbio flutuante. A grande vantagem é que essas oscilações nos ajudam a reagir aos choques internacionais, e nos momentos de crise essa vantagem é importantíssima. Ao meu ver, a Comunidade Europeia é uma excelente ideia, mas o euro não é - ou, pelo menos, veio cedo demais.

Além disso, nos anos 1990, o Brasil tinha muita dívida, e em dólar. Isso mudou muito. A dívida líquida externa do setor publico é negativa, o estoque da dívida equivale a menos de um ano de exportações (era cerca de 5 no final dos anos 1990; as exportações aumentaram muito). E a dívida pública, na maior parte, não está indexada ao dólar. Antes, se o real se desvalorizasse, o valor em reais da dívida do governo indexada ao dólar aumentaria, sem efeitos correspondentes nos impostos que o governo arrecada. Assim, uma grande desvalorização do real teria efeitos fiscais sérios. Não há mais esse círculo vicioso.

A economia brasileira hoje é mais aberta. Assim, está mais sujeita a choques provenientes de vários países, pois transacionamos mais. Certo? Sim, mas cada choque tem muito menos impacto nos preços relevantes para nossa economia. Suponha que o país importe e exporte apenas um bem. Se o preço do bem importado dobra, ou se passa a importar metade do que se importava ou será necessário dobrar as exportações. 

Quando se importam e exportam muitos bens, o fato de um dos bens dobrar de preço requer um aumento modesto nas exportações e, por conseguinte, um ajuste muito menor no câmbio. Em linhas gerais, em uma economia mais diversificada, choques são mais frequentes, mas é mais fácil reagir a eles.

Por fim, se a crise acabar afetando a atividade econômica no Brasil, há muito espaço para reagirmos. Os juros estão muito longe do ponto em que não se pode mais baixá-los (zero), os compulsórios são enormes e as reservas astronômicas. Claro, uma grave recessão nos Estados Unidos e na Europa teria impactos aqui, mas há motivos para acreditar que esses impactos serão como foram nos últimos três anos: significativos sim, mas não tão dramáticos.

Escuto às vezes que, agora, os países emergentes estão liderando a economia mundial e os países ditos desenvolvidos estão ficando para trás. Não é bem assim. A economia dos países emergentes tem crescido muito mais que a dos países ricos, mas os emergentes ainda são bem mais pobres - assim como um bebê cresce muito mais que um adulto, mas é muito menor. Estima-se que o produto per capita dos Estados Unidos seja ainda mais de 4 vezes o produto per capita brasileiro e mais de 6 vezes o produto per capita chinês. Crescer 5% a mais ou a menos em um determinado ano não vai mudar essa realidade do dia para a noite. Habitantes dos Estados Unidos e da Europa, em média, continuarão desfrutando de um nível de vida bastante superior ao dos chineses e dos brasileiros por bom tempo.

Ainda temos muito que crescer. Há muito que fazer para tornar nossa economia mais dinâmica e eficiente. Mas isso é assunto para outro dia.

Bernardo Guimarães é professor da Escola de Economia de São Paulo - Fundação Getúlio Vargas (EESP-FGV)

FONTE: VALOR ECONÔMICO