terça-feira, 23 de agosto de 2011

Opinião do dia – Rubem Barboza Filho: “Era Lula”

 "O dinamismo econômico poderia, na dimensão da política, sustentar materialmente a existência de uma sociedade plural e ativa, capaz de enriquecer o horizonte de nossas possibilidades e escolhas. Não foi o que aconteceu, nos alerta Werneck Viana.  Na defensiva ao final do primeiro mandato, e por ensaio e erro, Lula reativou a velha tradição da estadofilia brasileira, jogando às traças a tradição antitradicionalista que fez nascer o PT.

Dispensando qualquer justificativa pública para esta "viagem redonda",  Lula e o PT levaram para dentro do Estado tudo o que estava vivo e se movia na sociedade, estatalizando todos os interesses e submetendo-os à administração carismática do presidente. Só há vida e só pode haver vida e significado dentro do Estado, proclama este enredo que esvazia a sociedade,  destrói sua autonomia e condena o parlamento a um apêndice irrelevante da política.  E que cria "uma verdade"  por ser a única a ter o privilégio da existência,  arranjo oposto à aspiração de uma nova hegemonia - para usar o conceito de um pensador caro ao nosso autor - pretendido pelo PT. Razão pela qual, salienta Werneck Viana, o Judiciário e o Ministério Público se vêem obrigados a um protagonismo contraditório, protegendo a sociedade deste arranjo estatalizante e sancionando a expulsão da política de nossa vida democrática".

Rubem Barboza Filho, professor titular de Ciências Sociais. Orelha do livro A modernização sem o moderno - análise de conjuntura na era Lula, autor: Luiz Werneck Vianna. Fundação Astrojildo Pereira /Contraponto, Brasília, 2011.

Três ministros de Dilma vão se explicar


Depois de perder três ministros por suspeita de envolvimento em irregularidades, a presidente Dilma Rousseff verá hoje mais três auxiliares darem explicações no Congresso. Todos por supostos desvios de conduta. São eles: Pedro Novais (Turismo), Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário) e Paulo Bernardo (Comunicações). A oposição promete ser dura com os ministros. Além disso, parte da base aliada começa a cobrar que a "faxina" de Dilma na administração seja igual para todos os partidos.

Setores do PMDB já rifam Novais e cresce pressão sobre Paulo Bernardo

João Domingos e Eduardo Bresciani

BRASÍLIA -  Mesmo após perder quatro ministros num prazo de dois meses e doze dias - três deles por suspeita de envolvimento em irregularidades e outro por falar mal dos colegas - e desencadear uma ofensiva de sedução dos partidos da base aliada, a presidente Dilma Rousseff não conteve a crise política da Esplanada. Setores do PMDB já falam abertamente na demissão de Pedro Novais do Turismo. Afora isso, o ministro Paulo Bernardo (Comunicações) entrou na mira da oposição por suposta carona em jato particular e deve seguir hoje o script do desgaste: convidado a falar na Câmara sobre radiodifusão digital, será questionado sobre o fato. O PSDB disse que tentará convocá-lo a depor futuramente.

Ontem, Bernardo e a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, foram obrigados a divulgar nota sobre o uso de jatinhos privados na campanha eleitoral, em mais um dia de tensão na Esplanada. O ministro admitiu que, nos fins de semana, durante a campanha eleitoral de 2010, utilizou aeronaves de várias companhias - embora não tenha condições de citar quais. Paulo Bernardo disse que todas as viagens foram pagas pela coligação dos partidos em campanha no Paraná. "São de grande irresponsabilidade as ilações que tentam fazer sobre meu comportamento como ministro de Estado e o uso de aeronaves particulares. Jamais solicitei ou me foi oferecido qualquer meio de transporte privado em troca de vantagem na administração pública federal", disse.

A oposição quer sitiá-lo hoje com perguntas sobre viagens em aviões da Construtora Sanches Tripoloni, que presta serviços ao governo, principalmente na área de infraestrutura, conforme revelou reportagem da revista Época do fim de semana.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou ontem que, "tal como postas na imprensa", as denúncias contra Paulo Bernardo "são graves". Mas afirmou que é preciso ver "caso a caso" se existe "promiscuidade" nos episódios de autoridades públicas viajando em jatos particulares de empresários.

"Temos de ver caso a caso se efetivamente essa promiscuidade existe. Se existir, efetivamente é indesejável", afirmou Gurgel. "O Ministério Público não pode se precipitar e formar o seu juízo a partir de notícias divulgadas pela imprensa. Ele precisa, a partir dessas notícias, reunir elementos que permitam formar um juízo seguro a respeito."

Afastamento. Para aumentar a crise, desentendimentos na bancada do PMDB podem contribuir para a queda de Novais. A vice-presidente da Câmara, Rose de Freitas (PMDB-ES), exigiu ontem o afastamento do ministro do Turismo, cuja indicação foi bancada pelo líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN) e pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). "O Pedro Novais precisa sair. Ele tem uma história política e de vida e para reafirmá-la não pode ficar nessa de "não sabia". Para mim, ele participa, ele tem responsabilidade no que aconteceu no Turismo. Se eu vou montar uma equipe e tem pessoas assim, eu não aceito", disse Rose .

Dilma participa hoje de jantar com o PMDB para evitar o racha no partido. Parte significativa da bancada contesta a condução de Henrique Alves. Há deputados que reclamam dos critérios para a distribuição de relatorias. Afirmam que só parlamentares próximos a ele conseguem ficar à frente de projetos importantes.

Contra Alves pesa também o apoio a Novais. Parte do PMDB considera o ministro "omisso" por permitir que o então secretário executivo, Frederico Costa, comandasse a pasta. Costa foi um dos presos na Operação Voucher da Polícia Federal.

"Fachada". O líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP), cobrou uma faxina séria por parte da presidente. Para ele, ante as notícias divulgadas no fim de semana, Dilma está fazendo uma "limpeza de fachada", porque dá tratamento diferente aos ministros que cometeram deslizes. Nogueira verbaliza as queixas do PR, cuja cúpula dos Transportes foi degolada com a publicação de suspeitas de irregularidades cometidas por dirigentes do setor, quase todos vinculados ao partido.

Ao contrário do que ocorreu com o PR, quando as denúncias atingiram o ministro da Agricultura, Wagner Rossi (PMDB), Dilma lhe deu todo apoio. Rossi saiu só quando não havia mais como sustentá-lo. "A crise parece não ter fim. Surgem novas denúncias semanalmente e pouco ou quase nada tem sido feito de prático", disse o líder do PSDB.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Lula despacha com ministros sobre o governo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva despachou ontem com dois ministros de Dilma Rousseff em sua ONG, o Instituto Cidadania. Ele pediu informações sobre a demora na adoção do piso nacional do magistério, projeto de sua gestão.

Lula despacha com ministros de Dilma e cobra informações

Ex-presidente discute demora na adoção de piso salarial de professores com Fernando Haddad e advogado da União

Visita a escritório de Lula em São Paulo não estava prevista na agenda, e Adams diz que contato é rotineiro

Vera Magalhães

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva despachou ontem em São Paulo com dois ministros de Dilma Rousseff no Instituto Cidadania, ONG que retomou após deixar a Presidência.

Lula pediu informações sobre a demora na implementação do piso nacional do magistério, projeto que patrocinou em sua gestão.

O ex-presidente recebeu, separadamente e em audiência conjunta, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e o ministro da Educação, Fernando Haddad.

A visita se estendeu a um almoço depois, no qual Haddad e Lula trataram da pré-candidatura do ministro à Prefeitura de São Paulo.

Durante a audiência, Lula pediu a Adams e Haddad que explicassem por que o piso nacional de R$ 1.187,97 dos professores ainda não entrou em vigor, embora a lei que o fixou tenha sido promulgada por ele em 2008.

"O presidente disse que recebe muita cobrança de sindicalistas nas viagens que faz pelo país e queria uma explicação de como está a situação", disse Haddad à Folha depois do encontro.

Lula deixou o Palácio do Planalto há oito meses prometendo que iria "desencarnar", mas a reunião que teve com seus ex-ministros mostra que ele continua à vontade para tratar de assuntos administrativos do governo.

A visita ao Instituto Cidadania não estava na agenda de nenhum dos dois ministros. Haddad passou o fim de semana em São Paulo para cumprir compromissos do PT e permaneceu na cidade na manhã de ontem para gravar entrevista a uma rádio.

Adams disse que aproveitou uma ida a São Paulo para "fazer uma visita" ao ex-presidente, que o nomeou para o cargo que continuou ocupando no governo Dilma. Ele disse que costuma falar periodicamente com Lula por conta de processos nos quais a AGU ainda o defende.

Questionado sobre a conversa a respeito do piso nacional dos professores, confirmou a indagação de Lula e disse que tratou de atualizar o presidente sobre o assunto.

O piso ainda não está em vigor porque cinco Estados foram ao Supremo Tribunal Federal contra a medida, que consideram inconstitucional. O STF rejeitou a ação no dia 6 de abril, mas a decisão ainda não foi publicada.

"Eu disse ao presidente que o STF havia dado uma liminar acatando em parte a ação, mas no julgamento do mérito confirmou o piso nacional", afirmou Adams.

Questionado sobre a realização do encontro no instituto de Lula, Adams disse que sempre que precisa falar com ele vai até lá.

"Eu procuro mantê-lo informado dos processos que correm e nos quais ele é parte", afirmou.

O advogado-geral da União disse que não há nenhum andamento urgente de processo que justificasse a visita ontem. "Era só para atualizá-lo do quadro geral."

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Transnordestina: Passos visitou obra com avião de empresa

O atual ministro dos Transportes, Paulo Passos, inspecionou a Transnordestina com um avião da empresa que constrói a ferrovia. A viagem ocorreu em 2010, quando ele era secretário-executivo da pasta.

A pasta diz que a viagem, citada pela revista "Época", ocorreu porque aviões da FAB não operam em Salgueiro (PE).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Briga no PP vai acabar em sangue, afirma ministro

Jean-Philip Struck

SÃO PAULO - O ministro das Cidades, Mário Negromonte, disse que "vai terminar em sangue" a briga interna no PP pelo controle da pasta.

Em entrevista a uma rádio de Salvador, ele culpou o grupo que apoiava a manutenção do seu antecessor no cargo -Márcio Fortes, também do PP- pelas informações publicadas na revista "Veja" desta semana.

Segundo a revista, o atual ministro ofereceu um "mensalinho" de R$ 30 mil para políticos do grupo rival no PP. O valor seria pago em troca de apoio à permanência de Negromonte no cargo.

A assessoria do ministério disse que, ao falar em "terminar em sangue", Negromonte quis dizer que a disputa no PP pode ser prejudicial para o partido e acabar "respingando" nos congressistas.

O PP está rachado na Câmara há duas semanas, desde que o grupo ligado a Fortes assumiu a liderança da bancada.

O grupo destituiu da liderança o deputado paranaense Nelson Meurer e emplacou o nome do paraibano Aguinaldo Ribeiro, aliado do ex-ministro Márcio Fortes.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dois ministros perdem apoio nos partidos


Os ministros Mário Negromonte e Pedro Novais perderam apoio em seus partidos (PP e PMDB) e balançam nos cargos. A frente contra a corrupção reúne-se hoje com entidades da sociedade civil.

Frente anticorrupção dá primeiro passo

Reunião entre senadores e sociedade traça estratégia para atrair população

A audiência pública na Comissão de Direitos Humanos do Senado, marcada para a manhã de hoje, pretende traçar os primeiros passos para o envolvimento da população na luta contra a corrupção, fornecendo o apoio necessário para que a presidente Dilma Rousseff continue a fazer uma faxina ética no governo.

O primeiro encontro entre os senadores que lançaram a Frente Suprapartidária de Combate à Corrupção e à Impunidade e segmentos da sociedade civil deve contar com representantes da OAB, da Controladoria Geral da União (CGU), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), responsável por recolher as assinaturas para a Lei da Ficha Limpa.

- A pressão de fora para dentro do Congresso é o que faz ele se mexer. O melhor exemplo é o da Ficha Limpa, porque foi uma ação popular, e o Congresso não teve outra alternativa: teve de se curvar ao poder maior, que é o da sociedade - disse a senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS).

O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) destaca a importância de ser um contraponto a parlamentares que não desejam medidas moralizadoras:

- Percebemos que a presidente Dilma estava adotando iniciativas muito importantes para sanear a República brasileira e que começou um contramovimento no Congresso para chantageá-la. Então, lançamos esse movimento para estimular a presidente a ampliar a faxina - diz Ferraço.

FONTE: O GLOBO

OAB vai entrar no STF contra doações a campanhas


Objetivo é tentar vetar financiamento privado

BRASÍLIA. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu ontem entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra dispositivos da lei eleitoral que permitem doações de empresas a campanhas eleitorais. Segundo a OAB, o financiamento privado incentiva a corrupção, o tráfico de influência e a supremacia do poder econômico sobre o político, violando os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.

A decisão foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Federal da OAB, mas o texto da ação ainda não foi redigido - o que deverá ocorrer ainda esta semana.

O presidente da OAB, Ophir Cavalcante, classificou a decisão como um passo fundamental no combate à corrupção:

- Procuramos com este ato dar uma pancada forte na corrupção, atacando esse comprometimento, essa promiscuidade entre empresas e candidatos já a partir das campanhas eleitorais - afirmou Ophir.

A conselheira federal da OAB Daniela Teixeira, relatora da proposta de ajuizar uma Adin no Supremo, defendeu em seu voto um raciocínio semelhante. De acordo com Daniela, com a subordinação do poder político ao poder econômico, a consequência "é o agravamento da corrupção dos governantes e parlamentares que foram patrocinados por agentes econômicos poderosos". Daniela Teixeira pediu ainda a impugnação de outros dois dispositivos da lei eleitoral: o que limita as doações de uma pessoa física a no máximo 10% dos seus rendimentos aferidos no ano anterior; e outro que permite ao candidato empregar seus próprios recursos sem a fixação de um limite.

FONTE: O GLOBO

Deputados do PMDB pedem a saída de Novais

CRISE NA BASE

Com a bancada rachada, Dilma delega ao vice Michel Temer a decisão sobre o destino do ministro do Turismo

Gerson Camarotti, Isabel Braga e Luiza Damé
BRASÍLIA. Diante do racha na bancada do PMDB da Câmara, a presidente Dilma Rousseff decidiu delegar ao vice-presidente Michel Temer a condução do destino do ministro do Turismo, Pedro Novais. A decisão foi tomada após o Palácio do Planalto receber um pleito de 35 deputados peemedebistas - incluindo a vice-presidente da Câmara, Rose de Freitas (PMDB-ES) - que pedem a mudança no comando do Turismo. Assim, Dilma poderá garantir a substituição do ministro, sem se desgastar com a cúpula do partido.

Para tentar obter uma solução, Temer recebeu ontem à noite 11 deputados rebelados do PMDB. Hoje, oferecerá um jantar para Dilma no Palácio do Jaburu, com representantes das facções peemedebistas.

- Pedro Novais precisa sair. Ele tem história nessa Casa, não quero desmerecer. Mas, se eu vou trabalhar e sei que a pessoa tem problema, não aceito. Era para ele (Novais) ter feito a limpa de entrada. Eu fui uma das que falaram que era um absurdo a permanência do Fred - disse Rose, referindo-se ao ex-secretário-executivo do ministério Frederico Costa, preso na Operação Voucher e que se demitiu.

Os rebelados dizem que Novais tem servido só aos interesses do líder da bancada, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e a um pequeno grupo do partido. Ainda exigem a retirada da indicação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a relatoria da comissão sobre mudanças do Código de Processo Civil.

O líder do governo, senador Romero Jucá (RR), defendeu Novais, que hoje falará no Senado sobre as denúncias na pasta:

- O ministro tem o apoio do partido e do governo. Não podemos falar em rebelião. Há, sim, reclamações na Câmara, e o líder Henrique Eduardo Alves tem procurado conversar com todos - disse Jucá.

Colaborou: Cristiane Jungblut

FONTE: O GLOBO

Crise pode afetar negociação salarial


Dissídio dos bancários deve ser o principal impactado pela turbulência internacional; industriais podem sentir efeito mais adiante

Roberta Scrivano e Luiz Guilherme Gerbelli

SÃO PAULO - As negociações do dissídio salarial neste ano devem ser mais longas e complexas do que a do ano passado. O porcentual de categorias que terá aumento acima da inflação também pode recuar. Para os bancários, a grande questão em pauta será a crise financeira mundial. Aos industriais pesará sobretudo a conjuntura econômica nacional dos últimos doze meses.

O segundo semestre é marcado pelas principais negociações sindicais. Metalúrgicos, bancários, petroleiros e químicos são algumas das maiores categorias que sentarão à mesa para debater o dissídio salarial.

Até então, a maré estava boa para os trabalhadores. Para se ter uma ideia, nos últimos reajustes negociados, a grande maioria das categorias teve aumento salarial acima da inflação, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). No primeiro semestre de 2011, por exemplo, 84% das negociações terminaram em aumento real de salário (ou seja, inflação mais um porcentual). De janeiro a junho de 2010 esse montante foi ainda mais alto: 87% das categorias conseguiram alta dos ganhos acima da inflação.

Os bancários, por exemplo, têm acumulado sete dissídios salariais acima da inflação consecutivos, segundo o diretor de relações do trabalho da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Magnus Apostólico. Neste ano, porém, o aumento poderá ser igual à inflação, comentou. "É importante dizer que toda vez que temos um ambiente econômico turbulento, a turbulência vai para a mesa de negociação", explicou Magnus Apostólico. "Creio que teremos discussões mais longas neste ano até chegarmos a um acordo", emendou.

O setor industrial também crê que só será possível reajustar o salário dos trabalhadores ao mesmo nível da inflação. Para André Rebelo, gerente do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), no entanto, a atual crise, por enquanto, não vai reverberar na negociação do dissídio com os trabalhadores. "Essa é uma crise diferente da de 2008, quando as exportações caíram 30% e, portanto, a produção industrial foi afetada. Até agora, a atual turbulência só afetou a Bolsa de Valores no Brasil", disse.

Rebelo pondera, no entanto, que a inflação dos últimos doze meses, o aumento dos custos de produção e a valorização cambial são fatores que podem puxar para baixo o porcentual do aumento do salário dos trabalhadores. "Na verdade, a indústria tem pouca margem para subir os salários acima da inflação por causa do cenário interno", admitiu.

A reportagem do Estado também procurou a Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) para falar sobre o assunto. Os porta-vozes, no entanto, não tinham agenda para atender às solicitações. A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) também foi procurada e, por meio da assessoria de imprensa, informou que "ainda está aguardando o desenrolar da crise para saber se haverá ou não impacto na negociação com os trabalhadores".

Acadêmicos e especialistas em relações de trabalho também consideram que este será um semestre mais delicado na negociação entre empresas e empregados. "É difícil prever o que pode acontecer. Se a crise se aprofundar, ela terá reflexos e algum contágio na economia brasileira, mas não nas mesmas dimensões da última", avaliou José Silvestre Prado de Oliveira, coordenador de relações sindicais do Dieese.

Apesar disso, Oliveira acredita que os reajustes reais serão mantidos, principalmente porque as grandes categorias negociam o aumento nos próximos meses e, se conseguirem o reajuste real, servirão de parâmetro para as outras classes.

Disputa. Para aquecer as discussões da negociação, os bancários fizeram uma manifestação na Avenida Paulista na sexta-feira com o slogan "Bancário não é máquina". A presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Juvandia Moreira Leite, afirmou que a categoria quer reajuste de 12,8%. "Estamos negociando com o setor que mais ganha dinheiro no País e com a maior taxa de juros do mundo." Ela disse ainda que a economia nacional deve continuar aquecida por conta do mercado interno grande e do fortalecimento da classe média. "O governo está atento à crise e tem tomado as medidas necessárias", insistiu.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, que representa 40 mil trabalhadores e 926 empresas, querem aumento total de 17,45%. A negociação da classe começou na quinta-feira passada.

"Numa primeira explanação dos patronais, já percebemos que eles vão usar a crise como mote para reduzir o porcentual de aumento", comentou Vivaldo Moreira, presidente do sindicato dos Metalúrgicos. E é justamente para não correlacionarem o cenário externo com o dissídio salarial que os metalúrgicos estão debatendo sob slogan "O Brasil cresceu, quero o que é meu".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mais do mesmo:: Merval Pereira


O Brasil tende a aderir aos principais países ocidentais e reconhecer o Conselho Nacional de Transição da Líbia como o verdadeiro governante do país, mas só depois que a Liga Árabe e outros países da região como o Egito, a Tunísia e a Autoridade Palestina deram seu "apoio pleno" aos rebeldes líbios.

Mas o porta-voz do Itamaraty ressalvou que o Brasil ainda pretende conversar com seus parceiros do Brics (além do Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul) para tornar a decisão oficial.

Não foi por acaso, portanto, que um membro do Conselho Nacional de Transição disse que os rebeldes líbios não têm problemas com países ocidentais como Itália, França ou Reino Unido, mas preveem "problemas políticos" com Rússia, China ou Brasil.

Já quando o Conselho de Segurança da ONU aprovou ações contra a Líbia "para defender os civis", o Brasil se absteve, juntamente com a Rússia e a China.

E, mais adiante, quando da proposta de advertência ao governo da Síria de Bashar Al Assad pela violência com que tentava controlar as manifestações contra sua ditadura, o próprio ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, anunciou a oposição brasileira.

Mais que isso, representantes dos governos do Brasil, da África do Sul e da Índia estiveram com Al Assad, e um comunicado conjunto defendeu a soberania da Síria, apoiando as reformas prometidas pelo governo sírio e condenando a violência "dos dois lados", argumentação que a diplomacia brasileira costuma utilizar quando não quer condenar apenas as ditaduras que apoia.

Assim como acontecera ainda na gestão de Celso Amorim, quando o Brasil deu para o regime do Irã condições políticas de não ficar isolado quando assumiu uma negociação sobre o programa nuclear ao lado da Turquia, também dessa vez o comunicado conjunto do Brasil, da África do Sul e da Índia serviu para que o ditador sírio mostrasse ao mundo que não estava isolado pelas críticas da ONU e dos principais países ocidentais.

O chanceler Antonio Patriota colocou ainda em questão a ação das Nações Unidas na Líbia, usando os ataques aéreos da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) na Líbia para justificar a "hesitação" que, segundo ele, os membros do Conselho de Segurança estavam experimentando em relação às ações contra a Síria.

O fato de, durante os vários dias que duraram as manifestações no Egito e na Tunísia, até o desfecho com a renúncia dos ditadores, não ter havido nem bandeiras de outros países queimadas nem slogans que não fossem relacionados com as reivindicações nacionais foi considerado como sintomático de que as revoluções populares daqueles países, e agora também na Líbia, expressam os anseios da chamada "rua árabe" de liberdade, de democracia, de melhores condições de vida, de mais justiça social e igualdade de oportunidades.

Na Líbia, as forças de apoio à ditadura de Kadafi demonstraram que, sem o apoio dos Estados Unidos e de outras nações ocidentais, provavelmente ele não correria o risco de ser derrubado, como parece iminente.

É claro que não há garantias de que extremistas não se apossem das "revoluções populares" mais adiante, e sobretudo na Líbia, quando chegar o momento. O Ocidente terá que agir para garantir que a democracia saia vitoriosa.

Mas a excessiva cautela do governo brasileiro parece ainda indicar que o centro de nossa política externa não teve alterações, e não é por receio de que extremistas assumam o poder nesses países que o Brasil teve posições ambíguas, frequentemente favoráveis aos ditadores já instalados.

A nomeação do ex-chanceler Celso Amorim para o Ministério da Defesa esclareceu o que realmente a presidente Dilma achava da política externa brasileira nos oito anos de governo Lula.

A não permanência de Amorim à frente da pasta, apesar dos apelos do presidente Lula e do desejo expresso de Amorim na ocasião, juntamente com declarações da presidente logo depois de eleita, a respeito da defesa dos direitos humanos, deu a impressão de que havia uma percepção diferente por parte dela, mesmo tendo escolhido o segundo de Amorim, o embaixador Antonio Patriota, para o cargo.

A declaração da presidente contra o apedrejamento de mulheres no Irã e a favor dos direitos humanos foi compreendida como mais um passo no rumo contrário ao que se defendia na gestão anterior.

Pois hoje se sabe exatamente o que Dilma pensa de Amorim, que assumiu o Ministério da Defesa "porque já deu mostras de ser um brasileiro muito dedicado ao Brasil".

Os fatos posteriores mostraram que não havia divergências de fundo sobre a condução da política externa, mas apenas uma diferença de estilo. Talvez a mesma coisa que acontece agora dela em relação ao ex-presidente Lula.

FONTE: O GLOBO

Fruta de entressafra :: Dora Kramer


Toda vez que Dilma Rousseff e Fernando Henrique Cardoso por alguma razão são vistos juntos, surgem especulações sobre aproximações de natureza política.

É fato que ambos, cada um a seu modo, tratam de alimentá-las. Mais recentemente, o ex-presidente manifestou apoio à dita faxina ética da presidente e ainda aconselhou a oposição a deixar para lá a ideia de criar uma CPI para investigar a corrupção no governo.

Dilma, por seu lado, aproveitou a solenidade de lançamento do programa Brasil sem Miséria para o Sudeste para falar em "pacto republicano e pluripartidário" em plena cidadela tucana, o Palácio dos Bandeirantes, ao agradecer a presença de FH na solenidade.

Junte-se a isso o tratamento especial que FH recebeu de Dilma durante o almoço para Barack Obama e a carta elogiosa que lhe enviou por ocasião do aniversário de 80 anos e podemos tirar quais conclusões?

A rigor, nenhuma que guarde relação com projetos políticos em comum. A começar pelo referido "pacto" que só tem o nome: faltam-lhe os termos.

Entre o ex e a atual nada há além de boa educação e cálculo político. Para Dilma interessa incorporar ao projeto do PT a parcela do eleitorado que não se reconhece nas grosserias de Lula. Para Fernando Henrique interessa incensar Dilma, a fim de acentuar a desaprovação a aspectos negativos do modo de agir de Lula.

Pessoalmente FH não tem planos eleitorais e Dilma seguirá o plano que Lula traçar. Por isso foi ela a escolhida por ele e não um político "de raiz" que pudesse dar-se a independências.

Dilma e Lula não têm projetos políticos distintos: o que Lula quiser fazer será feito. Ele tem o partido e mais todo o entorno de expectativas de outras legendas nas mãos e ela não dispõe de autonomia para alterar os planos de longo prazo de poder, o que, obviamente, exclui qualquer tipo de aproximação com o PSDB.

José Serra e Aécio Neves, que estão na batalha, diferentemente de FH, entendem isso bem e por isso não atuam no mesmo diapasão do ex-presidente.

Dilma e Fernando Henrique fazem como que as honras da casa na sala de visitas, enquanto os personagens da luta que voltará a ser travada em termos de preliminar em 2012 e ao molde de finalíssima em 2014, estão onde sempre estiveram: em campos estritamente opostos.

O resto é conversa de tempos de estio. Pura fruta de entressafra e nada mais.

Gente diferente. O ex-presidente Lula tinha toda razão. O presidente do Senado, José Sarney, realmente não é uma pessoa como as outras.

Não tem percepção do mundo em volta, não tem noção de limite, não tem amor próprio em grau suficiente para se preservar de certos vexames e não tem freio na expressão do cinismo.

Usa um helicóptero da Polícia Militar do Maranhão em translado de lazer à ilha de Curupu, leva junto um empresário amigo com interesses comerciais no Estado, atrasa com isso o atendimento a um homem com traumatismo craniano e alega que tem "todo o direito" ao transporte porque viajava a convite da governadora Roseana Sarney.

Sua filha que o convidou para ir à própria casa de veraneio para passar fins de semana.

Sarney faz questão da liturgia, é exigente quanto a formalidades, mas é absolutamente descontraído quando se trata do uso e abuso da coisa pública.

Por essas e muitas outras não pôde, ao completar 80 anos no ano passado, contar com as homenagens que recebeu este ano o também ex-presidente Fernando Henrique.

Enquanto um é celebrado pela biografia o outro se vê enredado numa folha corrida.

Cobrança. O senador petista Walter Pinheiro não acha que o PT tenha razões para temer a "faxina" da presidente Dilma, concorda com medidas saneadoras, mas acha que o governo está devendo aquela que na opinião dele é a mais eficaz.

"Falta tirar da gaveta do Collor o projeto da Lei de Acesso à Informação. É o melhor instrumento de transparência que existe e cria o ambiente para todo mundo trabalhar limpo."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Um choque de gestão para a candidatura Aécio:: Raymundo Costa


O presidenciável tucano Aécio Neves tem um Plano B, para o caso de não concorrer à Presidência: disputar o governo de Minas Gerais, pois Antonio Anastasia não tem mais direito à reeleição e o grupo hoje no poder não vê outra opção para vencer em 2014. O Plano B de Aécio é a cada dia um Plano B+, que pode se transformar em Plano A, sobretudo se Luiz Inácio Lula da Silva for o candidato do PT à sucessão de Dilma Rousseff. De certa forma, Aécio tem frustrado as expectativas que os tucanos depositavam na sua liderança para voltar ao poder daqui a quatro anos.

A perspectiva de poder, às vezes, é mais forte que o poder em si. Se não esperava tanto de Aécio, o PSDB, após as eleições de 2010, contava ao menos que o ex-governador de Minas, a esta altura, já tivesse se firmado como alternativa incontestável a Dilma, Lula e ao PT. Mas paira no ninho uma reversão de expectativas - real e que ainda pode ser contida, mas que deixa perplexo o partido.

A atuação de Aécio, em cinco meses de Senado, é talvez o melhor exemplo do anticlímax. Demorou a falar. Quando subiu à tribuna, pronunciou um discurso vazio. Evidentemente, com a fama que o precedia, foi prestigiado com um plenário cheio e muitos apartes. Mas de concreto sobraram apenas os elogios dos governistas - que o proclamaram líder da oposição e o candidato presidencial do PSDB em 2014 -, e a sensação dos oposicionistas de que Aécio não se preparou para se apresentar como uma opção aos 12 anos de governo que o PT estará por completar nas próximas eleições presidenciais.

Tucanos começam a ter dúvidas sobre candidato em 2014

Faltaram, ao discurso, brilho intelectual e uma visão de Brasil como tinha, por exemplo, o avô do senador, o presidente Tancredo Neves, morto antes de tomar posse no cargo, em 1985. Mesmo alguns improvisos de Tancredo tinham estilo e conteúdo. Se falta um projeto e uma ação legislativa mais firme, qual será a arma de Aécio em 2014? A simpatia, a média com os companheiros, o chamado estilo mineiro de fazer política?

No Senado, Aécio se destacou por duas proposições: a emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias para o governo incluir no Orçamento Geral da União as emissões do Tesouro para o BNDES, algo hoje em torno dos R$ 240 bilhões, e um projeto de mudanças radicais no processo de edição de medidas provisórias.

A emenda para tornar mais transparentes as emissões do Tesouro passou no Congresso, teve sucesso de parte da crítica especializada, mas foi impiedosamente vetada pela presidente Dilma Rousseff nos seguintes termos: "A inclusão de todas as emissões na peça orçamentária representaria uma sinalização prévia de emissões estratégicas a serem feitas pelo Tesouro Nacional ao longo de cada exercício, possibilitando aos agentes econômicos anteciparem seus movimentos no mercado de títulos públicos, com impactos e riscos à gestão da dívida pública federal". Só faltou chamar Aécio de ingênuo.

No caso das medidas provisórias Aécio tomou carona na onda de protestos dos senadores pelo pouco tempo de que dispõem para analisar as MPs, depois que elas são aprovadas na Câmara - houve casos já de a Câmara aprovar um texto pela manhã e o Senado ser obrigado a referendá-lo à tarde, para não perder prazos regimentais. O ambiente era tão ruim que o próprio presidente do Senado, José Sarney, tomou a iniciativa de apresentar um projeto regulamentando a tramitação e a emissão de MPs.

Aécio percebeu na situação uma oportunidade e apresentou um projeto bem mais ousado que, entre outras coisas, previa a criação da uma supercomissão para analisar a admissibilidade das MPs enviadas pelo Executivo ao Congresso. Prevaleceu o projeto de Sarney, que atendia o principal: a garantia de que os senadores terão mais tempo para estudar as medidas (80 dias, a Câmara, 30, o Senado e mais dez a Câmara, se os senadores fizerem mudanças no texto dos deputados). Relator do acordo que permitiu a aprovação do projeto, Aécio pode posar de pai da mudança do processo atual, resultado de uma mudança feita quando o senador, então deputado, presidia a Câmara.

Politicamente, Aécio mantém uma relação amena com o governo. Para os governadores do PSDB, "função de governador não é fazer oposição", como fizeram questão de deixar bem claro já em duas reuniões. Mas também ficou claro que essa seria a tarefa das bancadas. A elas caberia realçar as diferenças entre os projetos do PSDB e do PT. Em sua maioria, senadores e deputados gostariam de ver seu eventual candidato em 2014 com uma postura mais crítica em relação ao governo, principalmente agora com a aproximação das eleições municipais.

Na prática, a aproximação de Aécio do governo Dilma parece a muitos tucanos mais um capítulo da guerra com José Serra. Uma estratégia destinada a identificar Serra como oposição radical, enquanto mantém abertos os canais administrativos com o governo federal. O discurso replicado em Minas é de que "todos os problemas do Estado são de responsabilidade do governo federal". Belo Horizonte, diga-se, é a única grande capital brasileira que não tem um metro de linha de metrô (tem um trem de subúrbio que é chamado de metrô).

Apesar das dificuldades políticas do semestre de Dilma, o PSDB é o mesmo partido dividido que perdeu as três últimas eleições para o PT. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi o único até agora a apresentar um comando conceitual para a sigla, mas não foi ouvido e até mesmo criticado. A cúpula tucana ridicularizou um documento em que Serra tentou alinhavar algumas ideias para a discussão. FHC aceita feliz o reconhecimento de Dilma pois acha que passou a ser detestado pela maioria da população por causa de Lula e do PT. A campanha deixou sequela na relação de Serra com Dilma, que já foi melhor.

Agora, há quem lembre que em 2002 Aécio hesitou em sair candidato ao governo de Minas. É menor a figura do messias tucano. O pior é que começa a crescer no PSDB a sensação de que Aécio teme o enfrentamento com Lula, mesmo que seja para acumular capital para 2018. Na cúpula tucana já se avalia que candidatura presidencial de Aécio precisa de um bom "choque de gestão". Ou Serra pode outra vez "fazer acontecer".

FONTE: VALOR ECONÔMICO

De gestora a faxineira :: Marco Antonio Villa


O governo é pródigo na construção de versões. Nos primeiros meses do ano, a presidente Dilma Rousseff foi transformada, da noite para o dia, em uma genial gestora pública. Falava-se que ela não aparecia em público porque priorizava o trabalho administrativo. Era uma devoradora de relatórios. Exigia o máximo dos seus ministros. Conhecia detalhadamente os principais projetos do país. Era tão diferente de Lula...

O impressionismo político, típico do Brasil, vigorou por três meses. Foi o prazo de validade dado pela realidade. Viu-se que administrativamente o governo ia mal. Nenhum programa do PAC estava com o cronograma em dia. As obras em andamento não tinham o acompanhamento devido. Faltava coordenação entre os ministérios. Em suma, o governo estava sem rumo. Ou melhor, estava em um movimento inercial, dentro daquela lógica nacional de que é melhor deixar como está, para ver como é que fica.

Vieram as crises políticas. Uma atrás da outra. Atingiram o coração do governo. E foram caindo os ministros, sempre devido às denúncias da imprensa ou por alguma operação da Polícia Federal. Nunca por iniciativa da presidente. Foram defenestrados ministros considerados fortes, como Antonio Palocci, e outros pouco conhecidos, como Alfredo Nascimento. As retiradas sempre foram penosas e só ocorreram depois de muita pressão da imprensa. Seguindo um velho roteiro, até o último momento o governo tentou abafar as denúncias, desqualificando as acusações e acusadores. Quando não encontrou mais saída, restou a demissão.

A repetição dos fatos, em tão curto espaço de tempo, demonstrou que o governo estava apresado pela corrupção. O loteamento dos ministérios e a inépcia dos órgãos de vigilância permitiram que milhões de reais fossem desviados. As denúncias foram pipocando e as acusações eram de que tudo não passava de "fogo amigo". Ou seja, era uma guerra entre os partidos da base governamental, uma luta interna pelo poder (e pelo dinheiro). Como se fosse absolutamente natural saquear o Erário.

Em meio à crise, os partidos continuaram exigindo cargos e favores. Sabiam que a apuração era para inglês ver. Trocavam-se os nomes mas não as práticas; como no Ministério da Agricultura, onde saiu um ministro do PMDB e entrou outro do... PMDB. As denúncias de desvio de milhões de reais não foram apuradas, sequer internamente, em um processo administrativo. Muito menos na esfera judicial.

Herdeira e partícipe ativa do presidencialismo de transação, a presidente acabou prisioneira deste sistema. Não sabe o que fazer. Lula conseguia ocultar os escândalos graças ao seu prestígio popular. Aproveitava qualquer cerimônia para desqualificar os acusadores. E convencia, graças ao seu poder de comunicação. Com Dilma é muito diferente. Ela pouco fala. Quando quer seguir a cartilha lulista, fracassa. Se esforça, tenta retomar a iniciativa, mas, sem agenda política própria, movimenta-se como um zumbi. Transformou em rotina ter de responder, toda segunda-feira, às acusações de corrupção que cercam o governo. Passa a semana tratando do desfecho do problema. Posterga as soluções. No sábado, fica aguardando as revistas e jornais de domingo com mais denúncias. E o processo recomeça.

Em meio ao desgaste, o governo foi obrigado a substituir o figurino da presidente: trocou a fantasia, já gasta, de eficaz gestora, por outra, novinha em folha, a de moralizadora da administração pública, que vem acompanhada de uma vassoura. E, por incrível que pareça, já está colhendo os primeiros frutos. Todos estão elogiando a "faxina". Não foi visto nenhum resultado prático. Para o governo, isto é o que menos importa. Vale a aparência, não a ação, mas a palavra. E, principalmente, a repetição pela imprensa que a presidente está enfrentando a corrupção. Isto "pega bem", a população simpatiza (e como!) com a ideia. Além do que, no ano que vem, tem eleição e nada pior do que a pecha de corrupto para um partido.

A oposição - com raríssimas exceções - continua tão perdida como o governo. Não sabe como agir. Quando encontra um caminho parlamentar - uma CPI no Senado - acaba sendo bombardeada também por "fogo amigo". O argumento é que é necessário dar apoio à presidente para que faça a "faxina". Ela estaria se distanciando do seu partido e, principalmente, do seu criador, o ex-presidente Lula, identificado como o gestor deste presidencialismo de transação. É uma leitura fantasiosa, que impede o embate com o governo e desmobiliza uma oposição já numericamente no Congresso Nacional. Lembra, guardadas as devidas proporções, a estratégia estabelecida durante o mensalão. No ápice da crise, ao invés de avançar e solicitar a abertura de um processo contra o presidente, a oposição apequenou-se. Temeu a vitória. Buscou justificativa na "governabilidade". Optou por levar - expressão da época - Lula sangrando até 2006, para daí vencê-lo facilmente nas urnas. Deu no que deu.

É inegável que a situação atual é muito distinta de 2005. Hoje, vivemos um momento político pior. A oposição é mais frágil, perdeu duas eleições presidenciais, e a impunidade dos mensaleiros deu salvo conduto aos corruptos. Nesta situação adversa, imaginar um antagonismo entre Dilma e Lula não passa de um logro. Esta tática já fracassou no início do ano. E pior: confunde a sociedade. Dá asas à falácia de que a presidente quer fazer a "limpeza" mas não pode. Como se não fosse responsável pelas mazelas do seu governo. Entrega a bandeira da ética e da moralidade aos que a desprezam.

Marco Antonio Villa é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos.

FONTE: O GLOBO

Aliados e companheiros :: Eduardo Graeff

A principal função dos aliados é servir de rede de segurança e de cortina de fumaça para o aparelhamento da máquina federal promovido pelo PT

Se quisesse mudar para valer sua relação com os aliados, a presidente Dilma Rousseff teria que mudar sua relação com o PT.

É aí que mora realmente o perigo moral que ronda seu governo.

Acredite quem quiser que os ares de Brasília conspurcaram a inocência original do PT. Ele chegou lá escolado por pelo menos dez anos de prática nas instâncias de poder que lhe caíram nas mãos antes de 2003.

Em 2006, quando o escândalo do "mensalão" fervia, a promotoria da cidade de Santo André ouviu de um secretário municipal de Mauá que, em 1998, Lula e José Dirceu procuraram o prefeito de Mauá e cobraram ajuda para financiar as campanhas do PT.

Segundo o secretário, Lula teria dito: "Pô, Oswaldo Dias, tem que arrecadar como faz o Celso Daniel.

Você quer que a gente ganhe a eleição como?". O depoimento foi noticiado pela Folha ("Secretário de Mauá acusa Lula de cobrar propina de prefeitos", 25/5/2006).

Lula afinal ganhou a eleição de 2002. O prefeito Celso Daniel perdeu a vida meses antes, em crime cujo pano de fundo seria um esquema de desvio de recursos da prefeitura de Santo André para o caixa do PT.

Entre os que respondem a processo pelo esquema de corrupção está Gilberto Carvalho, atual secretário-geral da Presidência da República de Dilma, antes secretário particular de Lula, na época secretário municipal de Santo André, acusado de levar dinheiro desviado da prefeitura para Dirceu.

O que mudou com a chegada ao poder em Brasília foi a escala das operações. O modo de operar veio pronto do berço político-sindical do PT em São Paulo.

Os esquemas dos aliados de Lula e de Dilma no Congresso empalidecem perto da máquina alojada no coração do maior partido do Brasil.

Eu não engulo que só assim se ganha eleição. Mas, se fosse, qual é a desculpa agora que eles ganharam três eleições presidenciais?

Onde foram parar os fins elevados com que justificavam os meios baixos? Socialismo? Transparência?

Esqueceram. A palavra de ordem agora é governabilidade. Não dá para tirar todos os picaretas dos ministérios se a presidente precisa deles no Congresso. Desculpa esfarrapada. Com uma agenda legislativa aguada, quem precisa dessa maioria toda no Congresso?

Ah, mas se o governo não contar com essa maioria qualificada -numericamente, quero dizer- a oposição pode aprontar!

O número mágico da governabilidade não seria 3/5 de deputados e senadores, para aprovar emendas constitucionais, mas 2/3, para impedir a instalação de CPIs.

Às vezes, parece que o governo precisa da maioria inchada para impedir que a oposição exponha os métodos usados pelo governo para cooptar essa maioria.

Há outra explicação, que para mim faz mais sentido: a principal função dos aliados é servir de rede de segurança e de cortina de fumaça para o aparelhamento da máquina federal pelo PT.

Até dá para entender que os aliados, nesse papel, exijam status de "nação mais favorecida". Por que aceitariam menos do que o governo dá ao sócio maior?

Para baixar as exigências dos aliados a níveis decorosos, Dilma teria que dar o exemplo e moderar o apetite dos companheiros do PT.

Começando pelo companheiro de todos os companheiros.

Não invejo a sorte dela.

Eduardo Graeff, 61, é cientista político. Foi secretário-geral da Presidência da República (gestão Fernando Henrique Cardoso).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lula inventou a "ingovernabilidade" :: Arnaldo Jabor


A corrupção no Brasil é tratada como um desvio da norma, um pecado contra a lei de Deus. Não é. A corrupção no Brasil é hoje um importante instrumento político, quase um partido. Nos últimos anos adquiriu novas feições, virando um "quarto poder". Antigamente, a corrupção era uma exceção; hoje é uma regra. E não se trata mais de um "que horror" ou "que falta de vergonha" - ficou claro que o País está inibido para se modernizar, porque a corrupção desmedida cria "regras de gestão". O atraso no Brasil é um desejo colonial que persiste e dá lucro.

Só agora estamos vendo o tamanho dessa mutação, quando o Executivo tenta a "faxina" e depara com a resistência indignada do Congresso. Deputados resmungam pelos cantos: "Aonde tudo isso vai parar?"

Um bloco de 201 deputados comunicou que "enquanto não se resolverem os problemas de cargos e emendas, não se vota mais nada..." Tradução: "enquanto não deixarem a gente roubar em paz, como nos bons tempos do Lula, não se vota nada." Congressistas reclamam que Dilma "não respeita as regras do jogo". Ladrões de galinha reclamam contra algemas, contra as belas fotos de presos de peito nu (que adorei...), detalhes ridículos comparados aos crimes de bilhões no turismo, agricultura e transportes e outros que virão.

Dizem: "Se ela continuar assim, não chega ao fim do mandato..." O próprio Lula telefonou para a presidente: "Dilma... pega leve com o PMDB..."

Ou seja, há um país paralelo de políticos, ONGs fajutas, empresários malandros com leis próprias - o legado de Lula, que transformou uma prática criminosa dissimulada em descarada "normalidade". Essa foi a grande realização de seu governo e se divide em duas fases.

Quando Lula chegou ao poder em 2002, havia um "Comitê Central" que o orientava (ou desorientava). Esse grupo de soviéticos desempregados viu, na sua vitória, a chance de mudar o Estado, usando a democracia para torná-la "popular", uma tosca versão remendada de "socialismo". Para isso, era necessário, como eles dizem, "desapropriar" dinheiro de um sistema "burguês" para fins "bons". Essa racionalização adoçava a água na boca dos ladrões na hora do ato, pois o véu ideológico de um remoto "Bem futuro" os absolvia a priori. Nessa fase, Lula foi um coadjuvante - sabia de tudo e nada fazia, para deixar os "cumpanheiro" cumprir sua tarefa. Roberto Jefferson, com sua legítima carteirinha, destruiu a quadrilha que angariava grana para eleger o Dirceu presidente em 2010.

Com sorte, Lula livrou-se da tutela de soviéticos e pôde, no segundo mandato, realizar seus sonhos de grandeza, que acalentava desde que descobriu que ser líder carismático dos metalúrgicos era bem melhor do que trabalhar.

Aí surgiu o novo Lula: uma miniatura, um bibelô perfeito para triunfar na mídia aqui e no Exterior. Ele é portátil, com um nome tão legível e íntimo como "Pelé". Lu-la, como "Lo-li-ta", como Nabokov enrolava a língua para descrevê-la... Lula conta com a absolvição a priori por ser um operário, um "excluído que se incluiu". Lula é um mascote perfeito: baixinho, barbinha "revolucionária", covinhas lindas quando ri, voz grave para impressionar em seriedade, talento para forjar indignação como se fosse vítima de alguma injustiça ou como o próprio povo se defendendo.

Esquemático e simplista, mas legível para o povão sem cultura e para os estrangeiros desinformados, Lula resume em meia dúzia de frases a situação geral do País, que teve a sorte de ser um dos emergentes cobiçados pela especulação internacional. Com a estabilidade herdada do governo anterior e com dinheiro entrando, ele pôde surfar em seus truísmos sem profundidade, como se a verdade morasse na ignorância. Lula não governou para o PT nem para o País; governou para sua imagem narcisista, governou em "fremente lua de mel consigo mesmo", num teatro em que éramos a plateia.

Seu repertório de frases feitas é composto dos detritos de chavões dos seus ex-soviéticos sindicalistas: fome x indigestão, elite e povo, imperialismo americano e Terceiro Mundo que incluía até o Kadafi e outros assassinos.

Claro, sempre houve corrupção (com FHC, com todos), mas era uma prática lateral, ainda dissimulada. A grande "inovação" (essa palavra da moda) de Lula foi apropriar-se (com obsceno oportunismo) de 400 anos de corrupção endêmica e transformá-la em alavanca para governar, mantendo sua fama de "tolerante e democrático".

No seu ideário, feito das migalhas que caíram da mesa leninista, "corrupção" é coisa "menor", é problema de pequeno-burguês udenista. Pensou: "No Brasil, sempre foi assim; logo, o importante é me deixarem curtir o mandato, hoje que eu sento ao lado de rainhas, com o aval de uma "santidade" de esquerda que peguei dos comunas que me guiaram."

Ele se confundia com o Estado. Se ele ia bem, o Brasil também.

Essa foi a "palavra de ordem" para o ataque geral a todos os aparelhos do Estado pelos ladrões. Sua irresponsabilidade narcisista deixou Dilma nesta sinuca histórica: se não fizer nada contra as denúncias insofismáveis, perde poder e prestígio; se fizer, perde também. Quem ganha com isso? Só ele e a coligação dos escrotos interpartidários. Se nossa abobalhada oposição conseguir uma CPI contra o governo Dilma, isso só beneficia o PMDB e aliados da caverna de Ali Babá. Ainda bem que alguns senadores decentes se unem para dar apoio à faxina das donas de casa do Executivo. A opinião pública também dá sinais de reação. Vamos ver. Pelas mãos de Lula, instituíram a chantagem como método político.

Lula inventou a "ingovernabilidade" a que assistimos. Os assaltantes estão com saudade e querem que ele volte para normalizar tudo, como um "Luis Inácio Bonaparte da Silva", como um "caudilho da vaselina". Tudo o beneficia para 2014. Temíamos um "peronismo" sindicalista no País, mas isso não existe. Só existe o PMDB.

FONTE: O GLOBO

Faxina agrária :: Xico Graziano


Para combater a corrupção, nada melhor do que a sociedade transparente. Nisso ajuda a internet. Vejam o e-mail que recebi denunciando a prática da propina dentro do Incra. Guardo, obviamente, o sigilo da fonte.

"Foi enviado o Memorial Descritivo Georreferenciado solicitando o novo registro de área por intermédio de um escritório de engenharia e topografia. De cara ele nos alertou que, ao protocolar o processo no Incra, existem dois caminhos a percorrer. Primeiro, o da burocracia. Este vai levar em torno de 2 anos e meio, ou mais, para ser percorrido, às vezes eles até perdem a documentação lá dentro. Segundo, o do jeitinho. Este outro passa pelo nosso amigo lá, no máximo com uma semana ele devolve assinado, não falha, mas tem que depositar tudo certinho pra ele, e à vista, antes de receber o documento".

Continua: "Pois bem, optamos pelo o caminho rápido: depósito em dinheiro de R$ 3.000,00 (três mil reais) na conta do escritório, que em seguida faria o mesmo depósito em dinheiro para o contato dentro do Incra. Em uma semana recebemos o Sedex com o documento assinado, certificado, auditado e aprovado. Seguem os dados do carimbo do documento".

Incrédulo com a leitura da mensagem que recebera, terminei por verificar, ao final dela, a cópia da ordem de serviço, devidamente numerada, emitida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/Superintendência Regional de São Paulo/Comitê Regional de Certificação. O jeitinho, realmente, havia funcionado.

O caso, ocorrido na região de São João da Boa Vista (SP), infelizmente, parece não ser único. Por todo lugar se escuta que o Incra tem demorado exageradamente no andamento desses processos de regularização fundiária. Os agricultores confessam ter medo de perseguição se delatarem a malandragem. Preferem se calar.

Mas a faxina contra a corrupção que a presidente Dilma Rousseff está sendo obrigada a realizar no alto escalão da República abre portas para a honradez vencer o medo. Denúncias começam a pipocar, indicando uma podridão que precisa ser desmantelada.

Georreferenciamento parece palavrão. Mas se trata de um artifício técnico fundamental para aprimorar o cadastro rural do Incra, acabando com o histórico mal da grilagem de terras. Sua obrigatoriedade chegou com a Lei n.º 10.267/2001, trazendo maior transparência aos registros cartoriais. Herança bendita de Fernando Henrique Cardoso.

Em qualquer transação, os imóveis rurais, a começar das áreas maiores, foram compelidos a confirmar seu perímetro utilizando-se de métodos precisos, e uniformes, de mensuração topográfica. O memorial descritivo das propriedades rurais passou obrigatoriamente a estar conectado ao Sistema Geodésico Brasileiro. Uma pequena revolução na cartografia agrária.

Tradicionalmente, desde a época das sesmarias, os registros de terras definiam-se em função de discutíveis, e curiosos, marcos. Cordas e trenas traçavam das fazendas e dos sítios os polígonos, delimitados por um acidente geográfico, uma frondosa árvore, um mourão velho. Agrimensura rudimentar.

Sucessores do astrolábio, os teodolitos somente passaram a melhor precisar a medição geométrica a partir de 1920. Progressivamente aperfeiçoados, os modernos aparelhos ganharam leitura eletrônica há 40 anos. Novo passo da topografia mais recentemente se obteve com a utilização de satélites. Hoje os mapas descritivos das propriedades rurais em nada se parecem com os alegóricos rascunhos de antanho.

O olhômetro era uma moleza para os grileiros de terras, que se apossavam de áreas fincando limites ilusórios, escondidos nas matas. Terrível problema agrário do País, a grilagem começou efetivamente a ser combatida a partir de 1995, quando o Incra iniciou uma varredura dos imóveis rurais com área superior a 10 mil hectares.

Operação pente-fino.

Sucessivas diligências e instrumentos legais, incluindo uma CPI no Congresso Nacional, resultaram, em 2000, no cancelamento de 48 milhões de hectares e na interdição de outros 44 milhões, do cadastro de terras do Incra. Para comparação, a safra de grãos do País cultiva-se em 47 milhões de hectares.

Excluindo esses latifúndios fantasmas, o índice de Gini, um indicador utilizado para medir o grau de concentração da estrutura agrária, caiu de 0,847 para 0,802. Incrível. A simples limpeza do cadastro rural derrubou o velho chavão de que o Brasil era o campeão mundial de concentração fundiária. Liderava, isso sim, a grilagem de terras.

Agora, não apenas mais facilmente se descobrem as fraudes, como se evita o problema futuro no mercado de terras. Para a nova legislação funcionar, todavia, carece do carimbo oficial do Incra. Aí é que a coisa, segundo dizem, anda empacando.

Eu sugiro que a presidente Dilma mande realizar uma faxina agrária no Incra. E não apenas para investigar essa delonga nos processos de georreferenciamento dos imóveis rurais. Poderia aproveitar a onda moralizadora e seguir mais além, promovendo uma ação saneadora nos assentamentos rurais e acabando com a maracutaia, sabida há tempos, da venda irregular de lotes da reforma agrária.

Daria para levantar, também, os dados sobre a compra superfaturada de terras, prática adorada por conluiados fazendeiros picaretas. Fora a investigação, pra valer, dos convênios suspeitos - apontados pelo Tribunal de Conta da União e pelo Congresso Nacional -, que repassam recursos públicos às organizações de sem-terra.

O Incra ganhou respeito pela sua história, ligada à causa da democratização da terra. Não pode ser posto em suspeição, nem aparelhada pela política vil. Devolver-lhe a decência faria bem enorme ao Brasil vislumbrado neste recente namoro da moralidade com a República.

Agrônomo, foi Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A hora é essa :: Carlos Heitor Cony

Desde criança que não entendo o mundo em que vivo. E agora, muito menos. Penitenciei-me no último fim de semana lendo os programas dos candidatos presidenciais da eleição de 2010, sobretudo o de Dilma.

Ela falou de muitas coisas, prometeu outras, continuação da era de ouro petista, combate à fome e a erradicação da miséria, prioridade para programas sociais, falou até em aborto e células-tronco.

Não falou, por julgar desnecessário, em corrupção; os oito anos de Lula teriam sido impecáveis, imaculados, embora o caso da Erenice, que a substituiu na Casa Civil, tivesse provocado um terremoto que foi imediatamente blindado para salvar a sua candidatura presidencial.

Oito meses apenas de mandato e o programa elaborado por ela e sua equipe parece ter ido para o espaço.

A máquina governamental está rateando, um único assunto ocupa a mídia, as redes sociais, as conversas das ruas, velórios e retretas.

Outro dia, fui abordado por um cidadão na calçada da Academia Brasileira de Letras. Julgando-me autoridade ou coisa que o valha, e achando que a ABL, com sua nobre fachada de Petit Trianon, fosse uma repartição, cobrou-me uma atitude contra a corrupção reinante.

Ora, eu ia em busca do meu mestre Evanildo Bechara, para saber se afinal a palavra "herói" tem ou não tem acento -o corretor do meu notebook ainda não está atualizado.

O sujeito olhou-me escandalizado, deve ter pensado que o Brasil não vai para frente por causa de tipos alienados como eu.

Ainda bem que a Associação Brasileira de Imprensa, dirigida pelo Maurício Azêdo, está pensando em botar a sociedade nas ruas, tal como foi feito no passado, quando do impeachment de Fernando Collor de Mello.

Não precisarei pintar a cara como os jovens daquele tempo fizeram. E terei a vantagem de aprender se herói tem ou não tem acento.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

MST ocupa Ministério da Fazenda e pede pressa na reforma agrária


Martha Beck

BRASÍLIA - Cerca de 2,5 mil trabalhadores sem-terra ocuparam no começo da manhã desta terça-feira a portaria do Ministério da Fazenda e do prédio anexo, em Brasília. Os agricultores saíram em marcha do Estádio Nilson Nelson, no centro da cidade, em direção ao ministério. Eles exigem que o ministro Guido Mantega receba o grupo para discutir o orçamento destinado à reforma agrária no país e que o governo dê prioridade aos agricultores atingidos por barragens, enchentes e chuva.

Desde o início da manhã, os funcionários que chegam ao local e tentam entrar no prédio são barrados. Quem tentou forçar a entrada, acabou sendo removido do local à força. A orientação do gabinete do ministro é para que os servidores aguardem uma solução para o problema.

Os seguranças da Fazenda conseguiram fechar as portas giratórias que ficam logo atrás da entrada principal do prédio. Com isso, também estão impedindo que o MST entre no local. Mantega não deve ir ao ministério durante a manhã, pois vai participar de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) quer uma resposta à questão das dívidas dos pequenos agricultores, avaliadas em cerca de R$ 30 bilhões. Também cobra o fim da previsão de corte de aproximadamente R$ 65 milhões nos investimentos em reforma agrária no país este ano. Os trabalhadores estão acampados em Brasília desde segunda-feira. Eles organizam marcha em 17 estados amanhã . Na segunda-feira, Integrantes do MST invadiram a fazenda da Cutrale , uma das maiores produtoras de suco de laranja do mundo, em São Paulo.

Não há uma previsão sobre o tempo que os trabalhadores ficarão no Ministério da Fazenda, mas a expectativa, segundo a assessoria de imprensa, é que passem o dia no local.

O último levantamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que analisa os números de 2003 a 2010, mostra que a área incorporada ao programa de reforma agrária saltou de 21,1 milhões de hectares de terras, de 1995 a 2002, para 48,3 milhões, registrando aumento de 129%.

Pelo levantamento, o número de famílias beneficiadas também aumentou ao longo de oito anos, chegando às atuais 614.093. No mesmo período, foram criados 3.551 assentamentos. Atualmente, o Brasil conta com 85,8 milhões de hectares incorporados à reforma agrária, 8.763 assentamentos atendidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), onde vivem 924.263 famílias.

De acordo com o Incra, a aquisição de áreas pelo instituto ocorreu por meio de desapropriação, compra direta para implantação de assentamentos de trabalhadores rurais e por meios não onerosos, como a destinação de terras públicas e o reconhecimento de territórios.

FONTE: O GLOBO