quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Opinião do dia – Karl Max: Abraham Lincoln

Senhor,
Felicitamos o povo Americano pela sua reeleição por uma larga maioria. Se a palavra de ordem reservada da sua primeira eleição foi resistência ao Poder dos Escravistas [Slave Power], o grito de guerra triunfante da sua reeleição é Morte à Escravatura.

Desde o começo da titânica contenda americana, os operários da Europa sentiram instintivamente que a bandeira das estrelas carregava o destino da sua classe. A luta por territórios que desencadeou a dura epopeia não foi para decidir se o solo virgem de regiões imensas seria desposado pelo trabalho do emigrante ou prostituído pelo passo do capataz de escravos?

Quando uma oligarquia de 300 000 proprietários de escravos ousou inscrever, pela primeira vez nos anais do mundo, «escravatura» na bandeira da Revolta Armada, quando nos precisos lugares onde há quase um século pela primeira vez tinha brotado a ideia de uma grande República Democrática, de onde saiu a primeira Declaração dos Direitos do Homem e de onde foi dado o primeiro impulso para a revolução Europeia do século XVIII; quando, nesses precisos lugares, a contra-revolução, com sistemática pertinácia, se gloriou de prescindir das «ideias vigentes ao tempo da formação da velha constituição» e sustentou que «a escravatura é uma instituição beneficente», [que], na verdade, [é] a única solução para o grande problema da «relação do capital com o trabalho» e cinicamente proclamou a propriedade sobre o homem como «a pedra angular do novo edifício» — então, as classes operárias da Europa compreenderam imediatamente, mesmo antes da fanática tomada de partido das classes superiores pela fidalguia [gentry] Confederada ter dado o seu funesto aviso, que a rebelião dos proprietários de escravos havia de tocar a rebate para uma santa cruzada geral da propriedade contra o trabalho e que, para os homens de trabalho, [juntamente] com as suas esperanças para o futuro, mesmo as suas conquistas passadas estavam em causa nesse tremendo conflito do outro lado do Atlântico. Por conseguinte, suportaram pacientemente, por toda a parte, as privações que lhes eram impostas pela crise do algodão , opuseram-se entusiasticamente à intervenção pró-escravatura — importuna exigência dos seus superiores — e, na maior parte das regiões da Europa, contribuíram com a sua quota de sangue para a boa causa.

Enquanto os operários, as verdadeiras forças [powers] políticas do Norte, permitiram que a escravatura corrompesse a sua própria república, enquanto perante o Negro — dominado e vendido sem o seu consentimento — se gabaram da elevada prerrogativa do trabalhador de pele branca de se vender a si próprio e de escolher o seu próprio amo, foram incapazes de atingir a verdadeira liberdade do trabalho ou de apoiar os seus irmãos Europeus na sua luta pela emancipação; mas esta barreira ao progresso foi varrida pelo mar vermelho da guerra civil.

Os operários da Europa sentem-se seguros de que, assim como a Guerra da Independência Americana iniciou uma nova era de ascendência para a classe média, também a Guerra Americana Contra a Escravatura o fará para as classes operárias. Consideram uma garantia da época que está para vir que tenha caído em sorte a Abraham Lincoln, filho honesto da classe operária, guiar o seu país na luta incomparável pela salvação de uma raça agrilhoada e pela reconstrução de um mundo social.

Karl Marx, carta à Abraham Lincoln, Presidente dos Estados Unidos da América, 22 - 29 de Novembro de 1864

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Ficha limpa já é exigida em quatro estados e dez cidades
Não à corrupção de novo nas ruas
Bolsas sobem com medidas para bancos
CNJ quer fim do Instituto Padre Severino

FOLHA DE S. PAULO
Rota Anchieta-Imigrantes tem escalada de vítimas
Correios reabrem, mas só em 10 dias voltam ao normal
Arcebispo de São Paulo critica corrupção 'por toda parte'

O ESTADO DE S. PAULO
Plano resgata governos e blinda bancos na Europa
Protestos contra a corrupção em 18 cidades

VALOR ECONÔMICO
Marfrig faz reestruturação e corta custos
Armadilhas para o Brasil no G-20
Crise faz Evo ceder e buscar novo traçado para estrada

CORREIO BRAZILIENSE
A arma da discórdia
Foto Legenda
Servidores: PF sem gente para a Copa

ESTADO DE MINAS
Mais chuva = Mais transtorno. Prepare-se
Foto Legenda: Basta de roubalheira

ZERO HORA (RS)
Previsão de queda da soja nos EUA anima produtor brasileiro
Internet arrasta às ruas do país um basta contra a corrupção

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Funcionários dos Correios voltam à ativa

Ficha limpa já é exigida em quatro estados e dez cidades

Inspirados pela Lei da Ficha Limpa, vereadores e deputados de dez cidades, incluindo Belo Horizonte e Manaus, e quatro estados (Minas, Santa Catarina, Paraíba e Pernambuco) já aprovaram legislação proibindo que cargos de confiança sejam ocupados por pessoas condenadas na Justiça. Em outras 12 cidades, entre elas o Rio, projetos semelhantes estão sendo analisados

Leis pelo país vedam servidores com ficha suja

Assembleias e câmaras criam legislação que impede a contratação de condenados na Justiça para cargos de confiança

Marcelle Ribeiro

SÃO PAULO. Câmaras de vereadores e assembleias de quase todo o país se mobilizam para aprovar leis que proíbam prefeituras, governos estaduais e casas legislativas de contratar para cargos de confiança funcionários que tenham problemas com a Justiça. No âmbito municipal, projetos desse tipo já estão em vigor ou em processo de votação em 22 cidades; seis estados e o Distrito Federal também estão agindo para evitar a contratação de quem não tiver a ficha limpa.

Sancionada há mais de um ano, a Lei da Ficha Limpa federal proíbe a candidatura de quem já foi condenado em segunda instância por crimes diversos - que vão de delitos contra a economia popular à formação de quadrilha - e de políticos que renunciaram ao mandato para escapar de processo de cassação. A expectativa é que o Supremo Tribunal Federal (STF) decida em breve se a norma vai valer integralmente para as eleições de 2012.

Inspirados na norma federal, prefeituras e estados querem impor mais restrições a pessoas que vão assumir cargos importantes, como secretários e presidentes de empresas públicas.

Segundo a organização não governamental Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), em dez cidades a "ficha limpa municipal" já está em vigor. Entre elas, duas capitais: Belo Horizonte e Manaus. Em pelo menos 12 municípios, propostas de ficha limpa estão em discussão no Legislativo, como Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Teresina e Salvador.

Minas Gerais, Santa Catarina, Paraíba e Pernambuco já têm legislação estadual em vigor sobre o assunto. No Rio, em São Paulo e no Distrito Federal projetos que preveem a exigência de ficha limpa para os funcionários estão tramitando no Legislativo.

As regras estabelecidas variam. Na Paraíba, a vedação vale apenas para o secretários, diretores de empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações e autarquias, além de pessoas com poder de ordenar despesas públicas.

Em Belo Horizonte, a proibição vale também para qualquer ocupante de cargo de direção, chefia e assessoramento da administração direta e indireta. Abrange ainda funcionários de empresas terceirizadas que prestem serviços ao município e que tenham sido declarados inelegíveis por decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado.

- A nossa lei é a mais rigorosa do país, porque abrange também os terceirizados. Não é compatível que servidores não adequados participem da administração pública - diz o presidente da Câmara de Vereadores de Belo Horizonte, Léo Burguês (PSDB).

Em Minas Gerais, o governo estadual admite que houve casos de funcionários que se demitiram e que foram exonerados porque, durante a checagem feita para avaliar quem tinha a ficha limpa, foram detectados "fichas-sujas" em cargos públicos importantes. Mas o governo mineiro disse que não poderia divulgar quantas pessoas deixaram as suas funções. Em algumas cidades, como Belo Horizonte, a checagem dos funcionários ainda está sendo feita.

Em Santa Catarina, devido a legislação estadual, sancionada no final de 2010, o presidente da empresa pública de Gás (SC Gás), Altamir José Paes, foi afastado do cargo depois de recomendação do Ministério Público. O MP entendeu que ele não deveria ficar na função, porque já havia sido condenado por ato de improbidade administrativa, em primeiro e segundo grau, quando era prefeito da cidade de Otacílio Costa.

- Há locais com casos de pessoas que foram declaradas inelegíveis que acabavam se tornando secretários, assumiam cargos importantes. Se não forem aprovadas leis da ficha limpa estaduais e municipais, essas pessoas podem encontrar abrigo assim - disse o diretor do MCCE, Marlon Reis.

Na opinião de Marlon, as restrições devem valer apenas para cargos de liderança, pois pessoas que já cumpriram as suas penas também têm direito a emprego.

No Rio, projetos tramitam na Alerj e na Câmara

Em Manaus, onde o projeto de emenda à Lei Orgânica estabelecendo a exigência da ficha limpa foi aprovado por unanimidade, o autor da proposta, Mário Frota (PSDB), disse que a norma é importante porque impõe moralidade. Ele critica o Congresso Nacional:

- O Congresso, inspirado numa proposta popular, legislou para os candidatos, mas cochilou, não legislou para a administração. Um ministro e um secretário podem mexer com milhões de reais. A lei deve ser ampliada.

No Rio, um projeto de emenda à Lei Orgânica, do vereador Carlo Caiado (DEM), que exige a ficha limpa para secretários, subsecretários, subprefeitos, administradores regionais e pessoas em cargos de confiança, está pronto para ser votado no plenário da Câmara de Vereadores.

Na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), as comissões de Constituição e Justiça e de Servidores Públicos ainda precisam analisar um projeto de lei do deputado Nilton Salomão (PT), que cria impedimentos para o exercício de cargos comissionados no alto escalão da administração pública direta e indireta no estado.

FONTE:: O GLOBO

Não à corrupção de novo nas ruas

Em pelo menos 12 capitais, novas marchas contra a corrupção reuniram ontem cerca de 28 mil pessoas. Presidente da CNBB, dom Raymundo Damasceno pediu que o povo fiscalize os governos

Marchas anticorrupção reúnem 28 mil pelo país

Brasília concentrou o maior número de manifestantes; além de críticas a políticos, eles pediam fim do voto secreto e manutenção do poder do CNJ

BRASÍLIA, SÃO PAULO, RECIFE, CURITIBA, MACEIÓ, SALVADOR, PORTO ALEGRE, GOIÂNIA. Um mês após a primeira marcha contra a corrupção e a impunidade, pelo menos 28 mil brasileiros espalhados por várias cidades do país, e mobilizados nas redes sociais, voltaram às ruas para cobrar ética na administração pública. Desta vez, predominaram apelos contra o voto secreto no Congresso, a favor da manutenção da Lei da Ficha Limpa e do poder do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de investigar e punir juízes corruptos. A adesão foi um pouco menor do que a registrada nos protestos de Sete de Setembro, quando 30 mil pessoas foram às ruas. Quatro capitais já articulam novas manifestações.

Brasília, mais uma vez, reuniu o maior número de pessoas. Segundo a Polícia Militar, 20 mil manifestantes participaram do ato na Esplanada dos Ministérios, organizado pelo movimento Brasil contra a Corrupção. Vestindo camisetas pretas com os dizeres "CNJ forte, Justiça transparente", associados a várias seções da Ordem do Advogado do Brasil (OAB), que apoia o movimento, participaram do protesto.

Os manifestantes criticavam o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, que se envolveu numa polêmica com a corregedora do CNJ, Eliana Calmon. O presidente da OAB nacional, Ophir Cavalcante, discursou:

- Nas ruas, vamos continuar a transformar a sociedade. Os advogados estão aqui porque não têm rabo preso a político.

A marcha foi do Museu da República até a Praça dos Três Poderes. Foram duas horas de caminhada, com alvos preferenciais, como o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF), flagrada, em vídeo, recebendo dinheiro de suposta propina.

A postura apartidária do movimento veio à tona quando um militante do PSOL, portando uma bandeira, foi expulso, sob vaias puxadas pelo orador.

- Qual o problema? Estou aqui com um senador do meu partido - reagiu ele, afirmando estar acompanhando Randolfe Rodrigues (PSOL-AP).

Situação semelhante ocorreu em Recife, onde, segundo a PM, cerca de 800 pessoas ocuparam a principal avenida da Praia de Boa Viagem. A presença do deputado federal Paulo Rubem (PDT-PE) foi repudiada por parte dos manifestantes. Pelo microfone, um alerta:

- Esse movimento é apartidário. Político que faz parte da marcha só quer se promover - dizia o contador Karlos Bungenstab.

Cercado de amigos, o pedetista desabafava, em voz baixa:

- Não vão me tirar daqui. A marcha é de toda a sociedade.

Coordenadora da ONG Gestos, Alessandra Nilo, sem ter ligação com o deputado, reclamou.

- Não se pode confundir alhos com bugalhos. Ele integra a Frente contra a Corrupção na Câmara.

Em São Paulo, a marcha levou para a Avenida Paulista ideologias diferentes: maçons de ternos pretos, senhoras de caras pintadas, jovens com a máscara do personagem "V". Segundo a PM, havia 2,5 mil pessoas. Punks se infiltraram na passeata e começaram a jogar garrafas contra o vidro dos prédios. Um deles foi detido. No protesto, o senador José Sarney foi o político mais criticado, gerando bordões de baixo calão.

Em Curitiba, cerca de 500 pessoas participaram dos protestos. Já em Porto Alegre, as rajadas de vento contribuíram para a baixa adesão: apenas 50 saíram às ruas. Em Maceió, a marcha, realizada na praia de Pajuçara, reuniu 120 pessoas, e em Goiânia, 1.200, a maioria, vestida de preto.

O ato anticorrupção realizado em Salvador, na orla da cidade, mobilizou cerca de 600 pessoas.

- Nosso maior desafio é trazer para as ruas toda a multidão que aderiu ao movimento nas redes sociais - disse a universitária Paola Rodrigues.

(Fábio Fabrini, Evandro Éboli, Tatiana Farah, Marcus Vinicius Gomes, Letícia Lins, Naira Hofmeister, Odilon Rios, Agência A Tarde, G1)

FONTE: O GLOBO

CNBB pede rigor contra corrupção

Em Aparecida, cardeal defende fiscalização dos governantes

Sérgio Roxo

APARECIDA (SP). O presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Raymundo Damasceno, declarou ontem, após a missa em homenagem à padroeira do Brasil, em Aparecida (SP), que a população deve fiscalizar o trabalho dos governantes para ajudar a combater a corrupção. Dom Raymundo também é cardeal-arcebispo de Aparecida

- Defendemos que a população deve acompanhar os nossos homens públicos, sejam do Executivo, sejam do Legislativo, para que exerçam um governo a serviço do bem comum, e não de interesses pessoais ou de grupos. Sempre que há uma participação da população nesse sentido é muito bem-vinda - afirmou, ao ser perguntado sobre os atos contra a corrupção.

Ele também cobrou rigor nas investigações de escândalos e acrescentou que os ocupantes de cargos públicos têm "responsabilidade de usar os recursos (do governo), que não são seus, mas do povo, em benefício da população".

Cerca de 130 mil pessoas passaram ontem pelo santuário de Aparecida. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o ex-governador José Serra, do PSDB, estavam entre as 30 mil pessoas que assistiram à missa.

FONTE: O GLOBO

Correios reabrem, mas só em 10 dias voltam ao normal

As agências dos Correios reabrem hoje, após decisão judicial que determinou o retorno ao trabalho dos funcionários em greve. A empresa estima que levará de uma semana a dez dias para normalizar os serviços de entrega de cartas e de encomendas.

Volta ao normal leva 10 dias nos Correios

Assembleias de funcionários em São Paulo, no Distrito Federal e em outros Estados decidem pelo fim da greve

Desfecho com a intervenção da Justiça repercute na negociação entre bancários e bancos

Filipe Coutinho, Toni Sciarretta


BRASÍLIA e SÃO PAULO - Os funcionários dos Correios vão cumprir a ordem do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e voltam a trabalhar hoje. A empresa estima que vai levar de uma semana a dez dias para normalizar os serviços. Houve atraso na entrega de 184 milhões de cartas e encomendas. Segundo o secretário-geral da Fentect (Federação dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos e Similares), José Rivaldo da Silva, a maioria dos Estados suspendeu a greve iniciada em 14 de setembro.

"A orientação da federação é para cumprir a decisão, mas a palavra final é sempre das assembleias. Mesmo que um ou dois sindicatos decidam manter a greve, a maioria vai trabalhar", disse.

A federação afirma ainda que, mesmo nos Estados em que as assembleias sejam realizadas hoje, o retorno ao trabalho poderá começar logo em seguida. São Paulo, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Maranhão e Ceará decidiram retomar as atividades.

BANCÁRIOS

A decisão do TST prevê reposição na inflação de 6,87%, reajuste linear de R$ 80 a partir de outubro e um vale extra (alimentação) único de R$ 575. O resultado é inferior à reivindicação inicial dos trabalhadores dos Correios, que pediram reajuste de 7,16%, reposição das perdas dos últimos 16 anos de 24% e reajuste linear de R$ 400.

A volta ao trabalho nos Correios interfere em outra greve. Bancários e banqueiros aguardavam o desfecho da paralisação na empresa postal para reavaliar o rumo das negociações.

Os bancários terão hoje a primeira reunião com a Fenaban (Federação Nacional dos Bancos) desde o início da greve, que entra no 17º dia, e também podem encerrar a paralisação.

Com o mercado de trabalho aquecido, as duas categorias viram a oportunidade de obter reajuste acima da inflação com o argumento de recuperar perdas e de participar do recente aumento nos lucros de seus empregadores.

Segundo os bancários, as sete maiores instituições financeiras ampliaram em 20% o lucro no primeiro semestre de 2011 em relação ao mesmo período de 2010.

A categoria pede um aumento real de 5% nos salários, enquanto os bancos oferecem somente 0,56% acima da inflação. Juvandia Moreira, presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo (ligado à CUT), disse lamentar que a negociação dos Correios tenha chegado à Justiça.

Ela afirma que a proximidade dos bancários (e dos trabalhadores dos Correios) do governo petista não facilita nem prejudica as negociações sindicais. "Não importa em qual partido você milita; importa onde você está. Nosso papel é lutar pelos trabalhadores."

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Bancos decidem retomar negociação com bancários

Greve, que entra hoje no 17º dia, foi deflagrada pois trabalhador pede aumento real de 5% e os patrões oferecem 0,56%

Marcelo Rehder

Depois de 16 dias de greve, a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) decidiu ontem retomar as negociações salariais com o Comando Nacional dos Bancários. Uma nova rodada de conversas entre as partes foi marcada para as 16 horas de hoje em São Paulo.

A expectativa dos sindicalistas é positiva. "A gente espera que eles (os representantes dos bancos) apresentem uma proposta capaz de acabar com a greve, uma proposta que possa ser levada para as assembleias", disse Carlos Cordeiro, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT)e coordenador do Comando Nacional dos Bancários.

A greve, que já é a maior da categoria nos últimos 20 anos, foi deflagrada no dia 27 do mês passado. Os bancários decidiram cruzar os braços em assembleias da categoria que rejeitaram a proposta de reajuste de 8% feita pela Fenaban.

A oferta dos b ancos foi recusada porque representa um aumento real de apenas 0,56% nos salários, muito abaixo do reivindicado pelos trabalhadores. Eles querem reajuste de 12,8% (aumento real de 5% mais a inflação acumulada em 12 meses até agosto).

Os bancários pedem ainda valorização do piso salarial da categoria, maior Participação nos Lucros e Resultados (PLR) dos bancos, mais contratações e o fim das metas abusivas, entre outras reivindicações.

Desde o início da greve, tanto a Contraf quanto a Fenaban diziam que estavam abertas ao diálogo, mas nenhuma das partes tomava a iniciativa de chamar para a mesa de negociação. O silêncio foi quebrado ontem.

Para os sindicalistas foi a força da greve, que paralisa mais de 9 mil agências de bancos privados e públicos em todos os 26 Estados e no Distrito Federal, que levou os bancos a reabrir as negociações. "Vamos manter a greve forte para que os banqueiros apresentem uma proposta decente à categoria", afirmou Juvandia Moreira, presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.

Os bancários são uma da poucas categorias no Brasil que têm contrato coletivo de trabalho com validade nacional. Ou seja, os direitos conquistados nas negociações valem para todo o País. Com data base para renovação da convenção coletiva de trabalho em primeiro de setembro, a categoria soma 484 mil bancários.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Luta social vai se ampliar, diz professor

Indústria se sustenta na precarização do trabalho, diz Ricardo Antunes, que escreveu "O Continente do Labor"

Bancários mostraram que, mesmo em mundo de máquinas, é possível parar um banco para negociar, afirma autor

Eleonora de Lucena

SÃO PAULO - A terceirização reduz salários, aumenta a intensidade do trabalho e desorganiza os sindicatos. É nela que a indústria se sustenta. A visão é do sociólogo Ricardo Antunes, 58, que prevê aumento nas lutas sociais no mundo. Professor de sociologia do trabalho na Unicamp, ele está lançando o livro "O Continente do Labor". Nesta entrevista, ele fala das greves dos bancários e dos Correios.

Folha - Como analisar greves como a dos bancários e dos Correios?

Ricardo Antunes - Diziam que não iria haver mais greve bancária. Chegamos a ter 1 milhão de bancários. Hoje são 490 mil, mas há milhares nos call centers que realizam trabalho de bancários. Até a compensação é terceirizada. A terceirização é a porta da precarização e da informalidade. Os bancários mostram que é possível fazer greve.

Qual é a novidade nesse movimento?

Para extrair um aumento um pouco maior do que a inflação do setor mais rentável da economia é preciso fazer greve. Mesmo nesse mundo cheio de máquinas, com pelo menos um terço do trabalho bancário sendo realizado por terceirizados, é possível parar um banco e exigir negociações. Já os Correios querem se tornar uma transnacional da correspondência, mas tratam os seus trabalhadores como um nível de intensificação da força de trabalho.

Como é essa nova morfologia produtiva e como ela afeta o sindicalismo?

Reestruturação produtiva, desregulamentação do trabalho, informalização. Chegamos a ter quase 60% na informalidade. Os sindicatos não sabem representar a classe trabalhadora informalizada.

O sindicalismo hoje não é muito atrelado ao Estado e ficou anestesiado?

Sim. O sindicalismo autônomo dos anos 70 desapareceu. Na CUT houve processo gradativo estatização das cúpulas. A briga é para ver quem fica com o ministério, a previdência, a secretaria.

Historicamente como isso se situa?

O sindicalismo está vivendo um processo semelhante ao que houve na virada do século 19 para o 20, quando o sindicalismo de ofício foi alterado porque nasceu a indústria fordista e foi criado o sindicalismo de massa. Agora, a tendência da indústria é ser liofilizada, enxuta. Assim, as empresas esparramam a produção e nasceram pequenas fábricas chamadas de "outsourcing". 

Qual é o sindicato hoje capaz de enfrentar isso? 

Os sindicatos, como no século 19 para o 20, estão passando por um tsunami e desse tsunami vão nascer formas novas.

A Zara se enquadra nisso?

Terceirização é isso. A indústria de ponta hoje se sustenta no trabalho precário. A terceirização reduz salários e aumenta a intensidade do trabalho, o adoecimento, as horas de trabalho, a desorganização sindical, a rotatividade. A Zara utilizou de trabalho de bolivianos e peruanos, que trabalham 16 horas por dia na indústria de confecção. Isso tem que ser coibido.

O sr. diz que Lula foi o paladino do capital. O que acha de Dilma?

É uma incógnita. Num período de crescimento de 4%, a incógnita não aflora. Quando a coisa esquentar e as lutas sociais se ampliarem...

O sr. acha que isso vai acontecer?

Não tenho dúvida. Tem havido em todo o cenário global uma amplificação das lutas sociais.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O sofá e a sala :: José Serra

Hoje em dia, quase ninguém contesta a importância da concessão de serviços públicos em áreas de infraestrutura e energia, como forma de aumentar os investimentos e melhorar a eficiência do setor. Nas campanhas eleitorais, as "privatizações" costumam ser demonizadas, especialmente contra os tucanos, mas, em seguida, os próprios autores e seus partidos, como o PT, passam a defendê-las e a procurar implantá-las onde vencem as eleições.

Isso aconteceu depois da campanha de 2002, quando o governo Lula impulsionou a lei que modelou as Parcerias Público-Privadas (PPPs) e prestigiou o modelo de concessões na exploração de petróleo, implantado no governo FHC, que foi o responsável direto pelas descobertas do pré-sal. Ocorreu também depois da eleição de 2006, com as concessões nas estradas federais e na exploração da energia hidrelétrica. Agora, em 2011, o fenômeno se repete, com o anúncio das concessões em aeroportos, um dos belzebus da campanha do ano passado.

No que diz respeito aos interesses do País, o problema principal é a incapacidade do governo federal de fazer as coisas direito e com rapidez em qualquer modelo. Por exemplo, até agora não conseguiram implantar nenhuma PPP, sete anos depois de aprovada a lei, diferentemente de Estados como São Paulo ou Minas Gerais.

No seu quinto ano de existência, em 2007, o governo do PT revelou ao País ter colocado em pé o ovo de Colombo na concessão de estradas: conseguiria ótimas rodovias com pedágios baratíssimos e investidores estimulados a promover com rapidez avanços decisivos na infraestrutura. Tudo ao mesmo tempo!

Antes de algo acontecer na vida real, começou a operar uma impressionante louvação ao ineditismo. Diferentemente dos carros e caminhões, a mistificação não precisa de estradas para trafegar. Na época, o entusiasmo foi tamanho que certo detalhe paradoxal acabou minimizado: o petismo sempre criticou as privatizações alheias por supostamente venderem patrimônio público subavaliado. Celebrizou a expressão "preço de banana". Pois bem, as concessões rodoviárias do governo do PT não foram "a preço de banana"; foram de graça mesmo.

Com o pretexto de reduzir pedágios e estimular o concessionário a fazer rapidamente as obras, o governo entregou as rodovias à iniciativa privada sem ônus. Quem arrematou os lotes não precisou pagar nada, diferentemente de São Paulo, onde a concessão implica uma contrapartida inicial para que o Estado garanta algum retorno do capital que investiu e mantenha sua capacidade de intervenção econômica - no setor e fora dele.

Se o PT estivesse na oposição e o governo oferecesse de graça patrimônio público a agentes privados, denunciar-se-ia o "neoliberalismo selvagem". Como estava no governo, praticou-o. Se o modelo estivesse funcionando, isso poderia ficar na rubrica dos debates e disputas políticas. Mas não funciona.

Há três meses, reportagem do Estadão mostrou que as coisas não iam bem nas estradas federais privatizadas: falta de obras, acidentes batendo recordes e mau estado de conservação, o que turbina o custo do transporte. Pesquisa recente da Confederação Nacional dos Transportes mostrou que só um terço da malha federal pode ser considerado ótimo ou bom. Em São Paulo, 75% das estradas estão nessa categoria.

Mas o governo decidiu agir: tirou o sofá da sala e estendeu para a posteridade os deveres das concessionárias. Como os investimentos não acontecem, deixou de exigi-los. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, a obrigação de a concessionária investir foi remetida às calendas. E as empresas que levaram os trechos de graça, mas não cumpriram os contratos? O governo faz questão de mostrar sua indignação: afrouxou os contratos!

No edital do trecho da BR-101 que corta o Espírito Santo, cuja concessão será licitada, a duplicação poderá ser concluída em 2035. Você não leu errado: 23 anos para o felizardo entregar a duplicação de 418 quilômetros de estrada! Um quilômetro e meio por mês. Não chega a ser estafante. Mesmo assim, a concessão apenas chega no sul da Bahia (20 km), Estado onde a BR-101 se estende por quase mil quilômetros, e é conhecida em vários lugares como a rodovia da morte. Enfim, estradas ruins e o governo fazendo o jogo de esconde-esconde com as concessionárias. É a típica situação em que o barato sai caro: em São Paulo, na Régis Bittencourt e na Fernão Dias, as obras não chegaram, mas os pedágios subiram bem acima da inflação.

O método de tirar o sofá da sala se repete em outras áreas. O que se passa com a apoteótica promessa do governo Lula-Dilma de aproveitar a Copa do Mundo para dar um salto de qualidade no transporte urbano nas metrópoles? Hoje se tornou mais modesta: decretar feriado em dia de jogo para diminuir o trânsito.

Os aeroportos? Aqui e ali, veem-se um ou outro puxadinho para desafogar a demanda. Planejamento? Mudança estrutural? Benefícios duradouros para as cidades e comunidades? Quase nada. Quanto tempo o governo brasileiro teve para se preparar decentemente para a Copa do Mundo e como o aproveitou?

É o caso de perguntar também: o que ele vai fazer de prático para que as estradas federais atinjam, em prazo razoável, uma condição mais próxima do desejável? Quando os brasileiros terão à disposição rodovias seguras, prontas a receber os motoristas e suas respectivas famílias e suas cargas? É algo que não se avista no horizonte.

Nisso tudo, a fraqueza de gestão, não tanto a ideologia, conta muito. O governo acaba funcionando como escola de administração, aonde as pessoas vão mais aprender do que fazer. E há, sobretudo, o estilo patrimonialista de governar, que compreende o uso do setor público como se fosse propriedade do partido, de seus aliados e de algumas corporações. É a privatização viciosa que atrapalha a virtuosa. Por último, a publicidade massiva e a espetacularização permanente - esta, sim, competente - das realizações não cumpridas fecham o círculo: ilude o próprio governo, amolece o trabalho e dificulta as soluções.

Ex-prefeito e ex-governador de São Paulo

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Três ou quatro coisas que eu sei sobre ela: reflexões sobre a democracia representativa :: Bolívar Lamounier

Atualmente, quase toda discussão sobre a democracia emperra já no ponto de partida: na imensa teia de equívocos que cerca o conceito. Percebendo estar a um passo de um labirinto escolástico, o leitor em geral tira o time de campo. Há solução para isso?

Transportemo-nos para um enredo de ficção. Por toda parte, milhares ou milhões de cidadãos mostram-se inconformados com o funcionamento do sistema político de seu país. “Chutam o balde” em toda oportunidade que se lhes apresenta; berram sua indignação a plenos pulmões, e talvez fizessem mais que isso, se soubessem o quê e como. Sua raiva tem muitas causas, mas uma lhes parece especialmente chocante.

É democrático – eles perguntam a todo momento – um país em que um senador ignorante, corrupto e prepotente, eleito por um pequeno estado, exerce uma influência avassaladora sobre seus colegas? Merece respeito uma democracia em que um tipo desses, não contente com desmoralizar o Legislativo, chantageia o presidente da República em todas as votações importantes? E tudo isso à luz do dia, acintosamente, seguro de que os cidadãos continuarão apalermados e impotentes?

Como assinalei, a situação acima evocada é pura ficção. O senador em questão seria no máximo o Seeb Cooley, personagem interpretado por Charles Laughton em Advise and Consent, um filme de 1962, produzido e dirigido por Otto Preminger. Para mim é um dos melhores no gênero político. No Brasil, se bem me lembro, ele foi exibido com o título “Tempestade sobre Washington”.

Em dois pontos, porém, os parágrafos acima mantêm contato com a realidade que pretendo explorar nesta série de artigos. Primeiro, trata-se da democracia representativa – a única, aliás, de que temos conhecimento na realidade histórica. Segundo, por maiores que sejam os seus méritos, a democracia é rejeitada, senão in totum, pelo menos em alguns de seus aspectos; disto até os avestruzes têm consciência.

A democracia representativa funciona graças a uma engrenagem institucional bastante sofisticada; um encadeamento que começa no momento em que o cidadão comparece ao cartório eleitoral para tirar seu título, prossegue com a eleição, passa pela diplomação dos candidatos eleitos e culmina no exercício por esses dos mandatos populares que lhes foram conferidos.

Podemos também pensar a democracia como um jogo. Como todo jogo que se preza, o jogo democrático tem regras. O legislador eleito para um mandato de “x” anos cumpre aqueles “x” anos, ponto final. Aqui nós já resvalamos no célebre senador por North Carolina, aquele que detestamos, mas não temos como tirar. Se ele obteve votos bastantes para se eleger, aos que não o têm em alta conta só resta resmungar. A menos que alguém dê um golpe e derrube o regime inteiro, o mandato dele está garantido.

O “x” do problema é portanto se o jogo institucional está ou não está sendo jogado. No Brasil, como todos se lembram, esta questão foi posta à prova numa eleição histórica: a de 1974. Estávamos em pleno regime militar, o general Ernesto Geisel havia assumido a presidência um ano antes. O Senado compunha-se à época de 66 senadores, um terço (22) dos quais teriam de enfrentar de novo as urnas a fim de renovar seus mandatos. Para surpresa geral, a oposição, então reunida no MDB (Movimento Democrático Brasileiro), abocanhou 16 das 22 cadeiras.

As especulações pareciam não ter fim: os 16 vão tomar posse? Seus mandatos serão garantidos? O general obviamente não gostou, mas não interveio. Mandou o jogo seguir, favorecendo dessa forma a interpretação de que as instituições não eram totalmente ocas, malgrado o caráter em última instância arbitrário do regime.

Voltando ao nosso hipotético senador – a qualquer um que detestemos -, de fato, ao garantir o mandato o que se valida não é uma prerrogativa pessoal, mas a incolumidade da instituição frente aos outros dois Poderes e a eventuais agressões externas. A incolumidade da Casa está corporificada em cada mandato, vale dizer, na pessoa de cada um que o haja conquistado nas urnas.

Mas é igualmente óbvio que as regras do jogo nem sempre produzem os efeitos que desejaríamos (e aqui eu passo batido sobre esse “nós” implícito, que também é ficção); ao contrário, elas dão margem a muitos efeitos indesejáveis ou perversos. Estes por sua vez dão ensejo a questionamentos que muitas vezes transcendem o motivo específico do descontentamento e atingem o próprio regime democrático.

Nas sociedades ‘primitivas’, os contendores partiam para o enfrentamento físico; um subjugava ou matava o outro. Na democracia, um arranjo moderno, os enfrentamentos são mediatizados pelo referido jogo institucional; vencem os que têm mais votos, mais força no partido, mais presença no plenário etc. Os perdedores não são liquidados, pelo menos não fisicamente.

A democracia moderna existe para equacionar pacificamente os conflitos, mas aos olhos do cidadão ela é geralmente portadora da mensagem oposta. É um sistema arestoso, conflituoso e desagregador, com o agravante de ser quase sempre incompreensível. Confortavelmente instalado à frente da TV, ele não se pergunta se a solução ‘primitiva’ era boa, justa ou natural; ele apenas constata que a ‘moderna’ não é de seu agrado.

Subjacente a essa avaliação parece haver uma necessidade de acreditar que vivemos em um mundo definitivamente pacificado. O cidadão quer reconfirmar essa impressão a todo momento, e por isso rejeita, screens out, toda indicação que traz desarmonia a suas certezas.

Mas isso não é tudo. Como em qualquer sistema político, também na democracia a participação no processo decisório tem como condição a posse de uma fração qualquer de poder. Poder é capital, e capital precisa ser acumulado, conservado e reinvestido. Se quer sobreviver na política eletiva, o deputado ou senador precisa estar preparado para um combate diário, e em diversas frentes. É a luta por espaços na mídia, por um cargo na hierarquia do partido, por um lugar na comissão tal ou qual do Congresso etc etc. A eleição tem um significado decisivo, isto é óbvio, mas do ponto de vista que ora nos interessa ela é um marco temporal entre outros.

Observe-se que os exemplos acima têm a ver com as atividades-meio da vida política. São, digamos assim, formas exteriores e seccionadas de um processo muito maior – a aquisição ou acumulação de poder -, sem o qual elas carecem de sentido. Não surpreende que uma grande parte dos eleitores, mesmo nos países desenvolvidos, tenha dificuldade em compreendê-las e tenda a rejeitá-las emocionalmente. Eu me aventuraria a especular que o cidadão comum as abomina tanto quanto ao hipotético senador a que nos referimos momentos atrás, e provavelmente mais que a logorréia inflamada dos parlamentares quando da votação de projetos importantes.

A esta altura, e muito compreensivelmente, a paciência dos meus leitores deve estar por fio. O objetivo deste post não era iniciar uma série de reflexões sobre a democracia? Que proveito tiramos do que foi dito até aqui?

O saldo talvez seja magro, mas vou destacar dois pontos. Primeiro, eu preferi frisar que a democracia é um regime de instituições, em vez de começar já tentando explicar o conjunto do desenho institucional.

Segundo, eu quis evidenciar como a hostilidade atualmente muito difundida contra a política e os políticos mais dificulta que facilita o esclarecimento conceitual que estamos procurando. Inegavelmente, os antagonismos políticos, ou algumas de suas exterioridades, causam muito desconforto aos cidadãos; para muitos destes, o ideal seria uma democracia tipo buffet, na qual eles se servissem tão-somente do que fosse de seu agrado.

O mais proveitoso do percurso seguido até aqui talvez seja o balizamento metodológico a que bem ou mal chegamos, cuja utilidade será evidenciada, espero, nos próximos textos.

Em 1613, Francis Bacon ensinou que o primeiro passo na busca do conhecimento é repelir certos fantasmas (‘ídolos’) que se alojam em nossa alma com o intuito de impedir o nosso acesso à verdade. A historieta do senador e os desdobramentos que elaborei a respeito da aversão do cidadão comum a certos aspectos da política correspondem bastante bem ao primeiro dos quatro tipos de fantasmas da advertência baconiana – os ídolos da tribo, quer dizer, os sentimentos, paixões e preconceitos de que somos portadores pelo simples fato de pertencermos à ‘tribo’ (ou à ‘raça’) humana.

Na seqüência, precisaremos nos guardar contra os ídolos da caverna: o senso comum, o saber por ouvir dizer, o juízo formado apenas a partir de aparências cotidianas ou meras convenções familiares e sociais.

Em terceiro lugar, os ídolos do mercado: fetiches que se nutrem do emprego incorreto das palavras ou de idéias imprecisas de que ligeiramente nos valemos em situações de intercurso público.

E, finalmente, os ídolos do teatro: a pretensa autoridade de determinados pensadores ou correntes de pensamento que tendemos a aceitar sem maior exame ou em razão de seu prestígio.

FONTE: BLOG DE BOLÍVAR LAMOUNIER

Primeira página :: Merval Pereira

O debate sobre o documentário do diretor Andrew Rossi "Primeira Página, por dentro do New York Times", cuja pré-estreia aconteceu terça à noite no auditório do GLOBO dentro do Festival do Rio, foi uma boa oportunidade para discutir com o público para onde vai o jornalismo depois que os novos meios tecnológicos de transmitir informações passaram a ter um papel preponderante na relação com os leitores.

O documentário focaliza anos difíceis do jornal que ainda é o parâmetro internacional do bom jornalismo, apesar de todas as crises que teve de enfrentar, desde questões meramente financeiras até - o mais importante - crises de credibilidade trazidas por diversas formas de fraudes jornalísticas.

De Jayson Blair, o jornalista que inventava suas reportagens, até Judith Miller, que assumiu como verdadeiras informações da Casa Branca sobre a existência de armas de destruição em massa, fazendo com que o "New York Times" avalizasse a invasão do Iraque no governo Bush.

A capacidade de apuração proporcionada pelas novas mídias, colocando o relato de novas fontes à disposição do público, é uma diferença crucial, que dificulta que os jornais se portem como na guerra do Iraque, quando assumiram como verdadeiras as versões oficiais, e só anos depois refizeram seus relatos revelando que não havia armas de destruição em massa em poder do ditador Saddam Hussein e as manipulações que o governo Bush usou para justificar a invasão do país.

O documentário mostra como a divulgação de um filme pelo WikiLeaks no You Tube, de massacre promovido por soldados americanos no Iraque, fez com que o "New York Times" publicasse reportagem crítica. Ao mesmo tempo, ao constatar que o WikiLeaks montara o filme para realçar a selvageria dos soldados americanos, o jornal frisou esse papel de ativista político do grupo de Assange.

A diferença entre ativismo político e jornalismo, que foi debatida no encontro do Globo, também foi objeto de um painel desse mesmo seminário de que participei em maio deste ano em Washington.

Um jornalista africano chamou atenção para o fato de que, por melhores que fossem suas motivações, ativistas que usavam o You Tube e a internet para divulgar informações contra governos ditatoriais não estavam fazendo jornalismo.

Com relação ao WikiLeaks, também defini o papel deles como de "ativistas políticos" e não de jornalistas, o que, aliás, Assange admite em uma entrevista do documentário.

Após mostrar uma quebradeira em sequência de vários jornais nos EUA entre 2009 e 2010, resultado da mistura explosiva da crise econômica que ainda hoje abate o mundo e o surgimento dos novos meios de comunicação que roubaram anunciantes e leitores dos jornais impressos, o documentário termina com uma mensagem de otimismo sobre o futuro do jornalismo impresso, com o "New York Times" reafirmando sua excelência ganhando o Prêmio Pulitzer no ano passado.

Mas o que se destaca no filme é a presença, não por acaso, de um grande repórter de carne e osso, David Carr que defende a qualidade do jornalismo dos chamados meios tradicionais com palavras e reportagens. Outro grande jornalista, Bob Woodward, famoso pela reportagem no "Washington Post", com Carl Bernstein, que derrubou o presidente Nixon no que ficou conhecido como Watergate, dá seu depoimento defendendo a reportagem, seja em que plataforma for.

No debate, lembrei que no início do ano estive em um seminário em Washington sobre novas mídias em que Woodward era o convidado de honra para falar sobre o que mudou com a chegada dos novos instrumentos da mídia digital que, segundo a definição do seminário, "mudaram fundamentalmente a natureza da reportagem e o sentido da transparência".

Já relatei aqui, mas vale a pena repetir. Woodward declarou-se em discordância "firme" com essa afirmação logo na abertura de sua fala, deixando inquietos os organizadores do encontro.

Para Woodward, o jornalismo ainda depende das revelações de fontes humanas, que viveram os acontecimentos e relatam suas histórias aos bons jornalistas.

Do filme e do debate tira-se uma conclusão: é impossível abrir mão da mídia tradicional como fonte fundamental para a divulgação de informações, assim como da capacidade de seus profissionais para apurar e checar notícias, dentro de padrões técnicos e éticos largamente testados pelos anos, o que dá credibilidade às notícias divulgadas.

Tenho repetido sempre que falo sobre o tema uma informação do jornalista Tom Rosestiel, um dos teóricos mais importantes do jornalismo, segundo a qual, entre os 20 blogs mais acessados dos EUA - o mesmo acontece na maioria dos países, inclusive no Brasil -, nada menos que 18 fazem parte da mídia tradicional ou estão ligados a ela de alguma maneira.

A partir de 1997, um grupo de jornalistas, liderado por Bill Kovach e Tom Rosenstiel, organizou seminários, entrevistas e pesquisas pelo país para fazer uma análise da imprensa americana. O trabalho resultou no livro "Os elementos do jornalismo - O que os jornalistas devem saber e o público exigir".

No livro, há a definição dos princípios do bom jornalismo, onde se destaca lealdade com os cidadãos e necessidade de ser "monitor independente do poder".

São esses compromissos que ficam registrados no documentário sobre o "New York Times", com o diretor de redação Bill Keller utilizando-se do sarcasmo de Mark Twain para comentar notícias sobre sua morte: "As notícias sobre a morte do jornalismo são um pouco exageradas".

FONTE: O GLOBO

Massa mansa:: Dora Kramer

Desmotivadas, as pessoas reclamam da desmotivação geral por intermédio de meia dúzia de motivados que se perguntam qual a razão de tanta apatia.

Têm sido comuns as comparações ora com mobilizações de outrora - aí sempre lembrados os movimentos de rua em favor das Diretas Já e do impeachment de Fernando Collor - ora com marchas menos ortodoxas que as organizadas (se é que se aplica o termo) pela internet para protestar contra a corrupção.

Naquelas as presenças eram contadas na casa dos milhões, quantidades que hoje levam às ruas gente motivada pela religião ou pelo simples prazer de farrear sob a bandeira do combate à discriminação.

Quando o assunto é corrupção os números são infinitamente mais modestos: falou-se em 20 mil nos protestos de setembro, calculou-se em 2 mil (SP), no máximo 11 mil (DF), o público presente aos atos marcados para ontem.

Fez sucesso um recente artigo do correspondente do espanhol El País, Juan Arias, questionando a capacidade do brasileiro de reagir "à falta de ética de muitos que os governam". O jornalista resumiu no texto a perplexidade que há algum tempo permeia o ambiente.

A questão lançada por Arias tem sido respondida de diversas formas, sendo a mais comum delas a que atribui a indiferença da maioria ao fato de o governo do PT ter cooptado os movimentos sociais, as entidades estudantis e sindicais e conseguido estabelecer a (falsa) premissa de que protesto contra a corrupção é coisa "da direita", "golpismo" e "farisaísmo".

Há verdade nisso. Basta ver na internet as várias manifestações de desqualificação da iniciativa. É um fator inibidor realmente. Mas não é o único.

O que parece faltar mesmo é apelo, condução e organização. As marchas bem sucedidas e que são usadas como comparativos reúnem esse fatores, mas têm, sobretudo, gente por trás comandando a massa.

Nenhum movimento surge do nada, por geração totalmente espontânea. Nas Diretas Já havia o apelo da aprovação da emenda Dante de Oliveira e o comando da oposição. Os políticos foram para as ruas, organizaram os atos e davam consequência política a cada um deles.

No impeachment de Fernando Collor havia uma CPI no Congresso, havia o ineditismo das revelações que eram feitas quase que diariamente, havia a raiva encubada pelo confisco da poupança e houve o inusitado chamamento do então presidente para que os cidadãos o defendessem nas ruas vestidos de amarelo (a cor das diretas), que resultou num espetacular tiro pela culatra.

Hoje o que há? Os políticos são o alvo e, portanto, não têm credibilidade nem motivação para organizar o que quer que seja; o cinismo engajado põe gente com capacidade de liderança contra a causa; o desengajado acha que o Brasil é mesmo assim, inclusive porque nos últimos tempos foi convencido a abraçar a tese de uma vez por todas; e, depois da adesão do PT aos velhos vícios, falta quem vocalize institucionalmente a indignação "contra tudo que está aí".

O resultado é a dispersão traduzida na indiferença que poderia nos levar a uma constrangedora interrogação: "E quem disse que o brasileiro está real e definitivamente convencido de que a corrupção é uma ameaça concreta a ser combatida?".

Talvez esteja bem menos interessado no assunto do que supõem meia dúzia de motivados preocupados com a desmotivação geral.

Omissão. Para que serve a proximidade do governo federal com os sindicatos - cujos representantes se espalham pela máquina pública e cujos cofres são mantidos cheios e longe de quaisquer fiscalizações por influência oficial - se não serve para estabelecer uma mediação eficaz a greves que prejudicam milhões de pessoas? Só há uma conclusão possível: serve para assegurar apoio político-eleitoral a um grupo político, numa união do útil (para o governo) ao desagradável (para o público).

Na hora das benesses vale a regra da tutela, mas na hora de atender ao interesse coletivo vigora o conceito da liberdade sindical de uns como licença para impor prejuízo a todos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O mar não está para peixe :: Eliane Cantanhêde

O governo baixou a expectativa de crescimento de 4,5% para, no máximo, 4% neste ano, e a Confederação Nacional da Indústria, de 3,8% para 3,4%. É um efeito direto da crise internacional e cria uma situação estranha: menor crescimento e maior inflação (?!).

Você pode perguntar: e nós com isso? Nós temos tudo a ver com isso. Se o país cresce robustos 7,5%, como no ano passado, o governo arrecada e investe mais, a indústria está aquecida, o comércio vende muito, as pessoas têm emprego e salários, com perspectiva favoráveis. Logo, compram. É um círculo virtuoso.

Com um crescimento de modestos 3,4%, como prevê a CNI, e sendo sucessivamente revisto para baixo, inverte-se o clima: o governo se acautela, a indústria recua, o comércio vende menos, as pessoas temem perder o emprego e veem o sonho de aumentos evaporar. Logo, param de comprar. Principalmente se a inflação se assanha, como agora. Começa, senão um círculo vicioso, uma situação de intranquilidade.

Para o ano que vem, a CNI mantém o otimismo e a previsão de crescimento de 5%. Se a Europa, os EUA, a China e os deuses deixarem, claro.

Como será ano de eleições municipais, há uma notícia boa e outra má para o país, particularmente para o setor industrial. A boa: os governos tendem a contratar obras de infraestrutura -e placas de inauguração. A má: os mesmos governos desandam a gastar em custeio, ameaçando o controle fiscal.

Para a presidente Dilma Rousseff, os dados do crescimento, a reversão do otimismo e o aumento de preços, em especial de alimentos, apontam também para uma ainda sutil mudança de humor da população.

Como pano de fundo, a onda de greves que se espalha pelo país.

O primeiro semestre de Dilma foi de "faxina" e de queda de ministros. O segundo é da economia, da economia e da economia.

Sem certezas, com dúvidas e cheia de temores.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Fervura no caldeirão nas semanas finais:: Raquel Ulhôa

Dilma Rousseff chega a menos de três meses do fim do primeiro ano de mandato com uma agenda legislativa sem reformas estruturais e com prioridades pendentes de votação. Até o fim do ano o calendário é apertado e há projetos de interesse do governo na pauta do Congresso. São dez semanas até o encerramento da sessão legislativa (22 de dezembro), com feriados em 2 e 15 de novembro, respectivamente quarta e terça-feira, o que deve esvaziar duas semanas.

A coordenação política do governo vai ter trabalho. O ambiente de votações está contaminado pela polêmica da repartição dos royalties do petróleo, que divide Estados produtores dos demais. A votação no Senado está prevista para 19 de outubro, porém sem acordo que afaste o risco de confronto federativo - com consequências para a União.

O debate em torno dos royalties deixou em segundo plano a reforma do Código Florestal, em análise por comissões do Senado, e a lei de acesso à informação, com regime de urgência para ser votada em plenário, após um bom tempo emperrada por ações do senador Fernando Collor.

Com a ameaça do Senado de retomar a proposta original de fixar em 10% de sua receita o mínimo que a União deve gastar em Saúde, o governo tenta evitar a votação da regulamentação da Emenda Constitucional 29 (define percentuais mínimos a serem aplicados em saúde por União, Estados e municípios). Mas há pressão de municípios e setores ligados à saúde pela aprovação.

Na reta final de 2011, Dilma faz questão mesmo é da prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que permite ao governo aplicar livremente 20% de suas receitas. A DRU expira em 31 de dezembro e tramita na Câmara uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para mantê-la até 2015. Para ser aprovada, uma PEC precisa dos votos de três quintos de deputados e senadores, em dois turnos de votação em cada Casa.

Deputados querem uma prorrogação menor. O Palácio do Planalto não vai fazer cavalo-de-batalha para garantir os quatro anos. A preocupação é com 2012. O assunto foi discutido na reunião da coordenação política de segunda-feira. Num cenário econômico internacional adverso, o governo quer mobilidade para investir nos planos que considerar prioritários. Para continuar em vigor em 2012, a PEC precisa estar promulgada até 31 de dezembro deste ano.

Correndo por fora, estão o Orçamento Geral da União para 2012 e o Plano Plurianual (PPA), que estabelece medidas, gastos e objetivos a serem seguidos pelos governos federal, estaduais e municipais durante quatro anos. Os dois projetos estão na Comissão Mista de Orçamento e têm que ser votados em sessão do Congresso Nacional (deputados e senadores reunidos). A rigor, o governo não precisa da aprovação do Orçamento, porque pode ir executando no ano seguinte um doze avos da proposta original a cada mês.

Ameaçando as votações da DRU e do Orçamento está a insatisfação da base aliada com a lentidão no pagamento de emendas parlamentares. A falta do PPA também não causaria transtornos para o governo, segundo o próprio relator, senador Walter Pinheiro (PT-BA). O problema, diz ele, seria do Congresso, que estaria abrindo mão da prerrogativa de deliberar sobre prioridades para o país. "O governo vai dizer: vocês não aprovaram, vou tocar meu PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)."

Uma das marcas que Dilma quer deixar no primeiro ano de gestão é o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), cuja criação aguarda votação no Senado. Na Câmara, o governo considera prioritária a criação da previdência complementar do servidor público, por causa do grande déficit anual produzido pelo setor (cerca de R$ 57 bilhões).

Os dois antecessores de Dilma aproveitaram o capital político obtido nas urnas para propor reformas constitucionais no primeiro ano de governo. Na gestão de Fernando Henrique Cardoso, em 1995 o Congresso promulgou cinco emendas constitucionais da ordem econômica. E na de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, duas emendas constitucionais fizeram, ainda que parcialmente, reformas tributária e da previdência.

A única PEC enviada por Dilma ao Congresso foi a da DRU. Para a oposição, um desperdício. "A presidente não utilizou o capital político de início de governo em favor da diminuição da carga tributária e do custo Brasil e da garantia de segurança jurídica e tranquilidade previdenciária", diz o líder do DEM, senador Demóstenes Torres (GO).

Aliados da presidente têm outra opinião. "No Brasil, existe uma febre para alterar a Constituição. Neste momento, não há grande necessidade de reformas estruturais. Lula fez algumas por necessidade, era um governo diferente do anterior. O governo Dilma é de continuidade", afirma o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). Ele cita como marcas do início da gestão os projetos de valorização da pequena e média empresa e o programa de combate à miséria.

Mas ele próprio diz que o governo terá de enfrentar a discussão da reforma tributária no ano que vem, junto com outras questões federativas. "Há várias propostas discutidas, como critérios do FPE e do FPM, cobrança do ICMS na origem ou no destino, dívida dos Estados, etc. Temos que pensar tudo isso globalmente", diz. Pinheiro aponta outro problema, que também demanda mudança constitucional: o vencimento das concessões do setor elétrico em 2015.

Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), foi opção de Dilma não enviar propostas polêmicas ao Congresso, por não ter capital político próprio e dispor de base parlamentar heterogênea. Para ele, se ela não fez isso ao assumir o governo, não fará em outro momento.

Com a polêmica dos royalties e a insatisfação de aliados com a lentidão na liberação das emendas parlamentares, o caldeirão de pressões ainda deve ferver neste ano. Mas há sempre a solução do esforço concentrado, quando as propostas são aprovadas de roldão.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

É isso, Aécio? :: Ricardo Melo

Por ossos do ofício, resolvi ler a entrevista concedida pelo senador tucano Aécio Neves ao "Estado de S. Paulo", publicada no domingo passado. Esperava identificar ali alguma ideia relevante, a favor ou contra, pouco importa, mas alguma ideia capaz de estimular o debate político. A depender do vazio demonstrado pelo eventual adversário, o PT pode dormir tranquilo por vários anos no poder.

Globalizadas ou não, até novelas e pessoas de instrução modesta incorporaram ao repertório assuntos como recessão e estratégias de crescimento; soluções para evitar o desemprego; Ocupe Wall Street; União Europeia; crise financeira global; corrupção; quebradeira de bancos.

Não seria exigir demais que alguém, no enésimo lançamento de sua candidatura à Presidência, apresentasse opiniões sobre este universo tão vasto. Duas penosas páginas depois, a decepção é absoluta.

Em vez disso, nós e a repórter somos maltratados por frases como: "Decisão correta no momento errado é uma decisão errada"; "Será o futuro versus o passado"; "Ou vamos todos unidos de verdade ou não teremos êxito"; "Política é arte de administrar o tempo"; "O projeto original que trouxe o Brasil até aqui é do PSDB, mas o que está em execução agora é um software pirata".

Ao longo do palavrório, nem mesmo a lógica fica de pé. Aécio defende a ênfase no "legado do PSDB e do nosso futuro", mas diz que o principal desafio dos tucanos é "refundar o PSDB em seu discurso". Entendeu?

Bandeira mesmo, apenas uma. "Vamos lutar contra o aparelhamento da máquina pública", como se os tucanos fossem virgens à beira do altar, ou como se dirigir um país fosse tão simples quanto escapar de um bafômetro. Ainda assim, e supondo que o desejo fosse sincero, desaparelhar a máquina a favor de que plataforma, de que propostas, de que objetivos, de que projeto social?

É mais simples convocar Carlos Lacerda para ocupar a tribuna.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Serra reage a Aécio e critica antecipação da sucessão

Tucano diz a seguidores no Twitter que debate sobre 2014 desorganiza oposição

Comentário é visto como resposta a declarações de senador mineiro, que se diz pronto para concorrer

Márcio Falcão

BRASÍLIA - O ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB) afirmou ontem que a oposição deveria evitar a antecipação do debate sobre a sucessão presidencial de 2014 e se preparar para as eleições municipais do próximo ano.

Em mensagem a seus seguidores no Twitter, Serra, que perdeu a eleição do ano passado para a presidente Dilma Rousseff (PT), escreveu que "querer colocar o carro adiante dos bois só atrapalha e desorganiza a oposição".

Políticos interpretaram o comentário de Serra como uma reação aos movimentos mais recentes do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que nas últimas semanas manifestou em dois momentos sua disposição de concorrer à sucessão de Dilma em 2014.

No final de setembro, como a Folha mostrou, Aécio aproveitou uma reunião com a bancada tucana na Câmara para indicar pela primeira vez que deseja se candidatar ao Planalto em 2014.

Em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo", no último domingo, o senador reafirmou sua disposição e garantiu que, se o PSDB quiser, estará pronto para enfrentar Lula ou Dilma, "sem temer" nenhum dos dois.

Aécio tem dito a seus aliados que o PSDB deveria discutir o nome de seu candidato no início de 2013, mas começou a demarcar território e sua movimentação incomoda os aliados de Serra.

Serra e Aécio disputaram a indicação do partido na última corrida presidencial. Serra retardou o lançamento de seu nome durante meses e só o fez depois que Aécio decidiu se afastar da disputa.

Sem um mandato que lhe dê maior visibilidade, Serra tem enfrentado dificuldades para recuperar a influência no seu partido e no debate nacional desde a derrota na eleição presidencial.

Logo depois de cutucar Aécio no Twitter ontem, Serra escreveu outra mensagem para defender a estratégia adotada pelo governo Dilma na condução da economia.

"Volta a pressão para manter ou subir os juros altos. Mas o governo tem que achar um caminho para combater a inflação sem subir juros. É necessário", escreveu Serra.

Serra aparecerá hoje num programa que o PSDB veiculará na televisão, junto com Aécio e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Frase
"2014 está longe. Antes vem 2012. Querer colocar o carro adiante dos bois só atrapalha e desorganiza"
José Serra (ex-governador, em seu Twitter)

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Alívio na zona do euro

Medidas de reforço ao sistema bancário e acordo na Eslováquia animam mercados

Os mercados fecharam ontem em alta, impulsionados pelo anúncio de José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia (UE), de que vai apresentar à reunião de cúpula do bloco, no dia 23 de outubro, medidas para reforçar o sistema bancário da zona do euro. Uma das propostas inclui a obrigatoriedade de os bancos elevarem o patamar de capital básico, para reforçar as defesas contra os efeitos da crise da dívida. Segundo a Autoridade Bancária da Europa, a medida poderá ter um impacto de 100 bilhões sobre os bancos. Barroso propôs a rápida introdução do Mecanismo de Estabilidade Europeia (ESM, na sigla em inglês) e defendeu que os governos da UE, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia coordenem esforços para recapitalizar os bancos, através de injeções privadas e estatais.

Também sustentou o bom humor dos investidores o acordo alcançado ontem por líderes políticos da Eslováquia para aprovar o aumento do fundo de resgate europeu, encerrando uma crise que ameaçava desestabilizar todo o bloco.

Ao falar sobre o aumento de capital dos bancos, Durão Barroso disse que as principais instituições financeiras da UE deveriam ser proibidas de pagar dividendos aos sócios ou bônus a seus executivos até que seu capital básico alcance o novo patamar. Ele, no entanto, não detalhou as propostas.

O principal temor que vem afligindo o setor financeiro é que os bancos sofram grandes prejuízos com os títulos soberanos que possuem de nações com problemas de solvência, como a Grécia. Essa incerteza já começa a afetar o fluxo de empréstimos - quer entre bancos como também na economia em geral -, situação que pode levar a zona do euro à recessão.

Produção industrial no bloco surpreende

Segundo uma fonte próxima à situação, pela proposta de Barroso, os principais bancos europeus terão que implementar novas regras sobre capital de reserva antes de 2019, como estava previsto. Essas instituições terão que elevar seu capital de reserva para, pelo menos, 9% do valor de seus empréstimos, investimentos e outros ativos de risco e, assim, poder absorver perdas potenciais. No teste de estresse feito há alguns meses, o percentual exigido não passava de 6%.

A fonte não revelou quando os novos níveis de capital terão que ser implementados. Apenas disse que será "substancialmente mais cedo" que 2019. A fonte pediu para não ser identificada porque a autoridade europeia do setor de bancos só vai revelar os novos padrões na próxima semana.

Após o anúncio das propostas de Barroso, as ações de bancos subiram, mantendo o movimento de alta da semana, puxado pela esperança de que a zona do euro esteja, enfim, conseguindo conter a piora da crise da dívida. O sinal de acordo político na Eslováquia sobre a expansão do fundo de resgate e o inesperado aumento da produção industrial da zona do euro em agosto também alimentaram a alta das bolsas.

A agência de estatísticas Eurostat informou ontem que a produção industrial dos 17 países da zona do euro cresceu 1,2% na comparação mensal em agosto, para uma expansão anual de 5,3%. Economistas ouvidos pela Reuters previam declínio mensal de 0,7% e alta anual de apenas 2,2%. Os dados mostraram que a produção de bens de capital, usados para investimento, saltou 12,2% em termos anuais. A produção de bens de consumo duráveis, uma medida da confiança do consumidor, subiu 2,8%.

Em Londres, o índice FTSE subiu 0,85%; em Frankfurt, o DAX avançou 2,21%; e o CAC-40, de Paris, cresceu 2,42%. O bom humor contaminou os investidores em Wall Street, onde o índice Dow Jones subiu 0,9%; o Standard & Poor"s 500, 1%; e o Nasdaq, das ações tecnológicas, 0,8%.

Um dos principais pontos de tensão na zona do euro foi desarmado ontem, depois que líderes políticos da Eslováquia chegaram a um acordo para aprovar o aumento do fundo de resgate europeu (Feef). A medida é considerada essencial como parte da solução da crise da dívida no bloco. Na terça-feira, o governo eslovaco havia sofrido uma dura derrota, ao atrelar a aprovação do fundo a um voto de confiança à gestão da primeira-ministra, Iveta Radicova.

Ontem, porém, o ex-premier Robert Fico, líder do Smer, o maior partido de oposição, e partidos governistas chegaram a um acordo para aprovar o plano. O país de apenas 5,4 milhões de habitantes - menos de 2% da população do bloco do euro - era o único que não havia concordado com o aumento do fundo, que precisa da aprovação unânime de todos os 17 membros do bloco.

- O acordo torna possível que votemos amanhã (hoje) à noite ou no máximo na sexta-feira o Feef, e as leis vinculadas ao fundo serão aprovadas - disse Fico.

Mas, os sinais de turbulência na região continuam. Ontem, em um comunicado incomumente franco, o presidente da Itália, Giorgio Napolitano, expressou graves dúvidas sobre a capacidade de o governo do premiê Silvio Berlusconi cumprir as reformas econômicas prometidas. Berlusconi vem sendo pressionado a renunciar.

FONTE: O GLOBO

Ocupe Wall Street não traz "agitação revolucionária"

Historiador diz que cerne do movimento é "inquietação profunda" da classe média

Robert Darnton vê, no entanto, chance de que bandeiras dos ativistas conduzam a uma "nova onda de tipo populista"

Verena Fornetti

NOVA YORK - O movimento Ocupe Wall Street, que começou com um acampamento próximo ao centro financeiro de Nova York e se espalhou por várias cidades do país, é sinal de que a inquietação social chegou à classe média americana.

A avaliação é do historiador especializado em Revolução Francesa Robert Darnton. Americano, ele leciona na Universidade de Harvad e é autor de "O Grande Massacre dos Gatos", entre outros.

"Os protestos devem ser levados a sério. Não como uma ameaça de qualquer tipo de agitação revolucionária, mas como um sinal de inquietação profunda", disse à Folha.

Para Darnton, a crescente distância entre ricos e pobres no país a partir dos anos 1990 ainda não havia mobilizado essa fatia da população, que passou a se posicionar contra os altos salários do mercado financeiro. "Eles escolheram um bom alvo", avalia.

Mas, para o historiador, a proposta de taxar milionários, encampada pelos manifestantes, não soluciona os problemas econômicos do país. A ideia de aumentar impostos para os mais ricos acentuou a disputa entre republicanos e democratas.

Congressistas republicanos têm atacado o projeto de taxar milionários nos EUA. O tema acirrou a disputa partidária -entre republicanos e democratas- nos últimos dias. Uma das propostas em debate é lançar uma sobretaxa de mais de 5% sobre rendas anuais. A decisão recente de bancos americanos de cobrar pelo uso do cartão de débito como forma de pagamento em lojas também irritou a classe média dos EUA.

DIREÇÃO POLÍTICA

O historiador de Harvard afirma que a possibilidade de conduzir politicamente o movimento Ocupe Wall Street em direção a demandas mais claras ainda está indefinida.

"A fúria dos manifestantes, que não têm líderes nem um programa claro, ecoa pelo país e poderia ser sintomática de uma nova onda de tipo populista", afirmou.

Para ele, se "alguém será capaz de aproveitá-la e transformá-la com sentido útil, para quebrar o impasse político em Washington e conseguir algum grau de justiça social" é uma questão aberta.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Indignação vira global. E daí?:: Clóvis Rossi

Estão previstos para sábado protestos em 45 países dos cinco continentes. Mas o que virá depois disso?

Sábado será, em tese, o dia mundial da indignação. Pelo menos é o que prometem os diferentes movimentos de indignados que pipocaram neste ano um pouco por toda a parte: 350 atos de protesto em 45 países dos cinco continentes.

Pelo número de pessoas que se têm manifestado recentemente na Espanha, no Chile, nos Estados Unidos, na Grécia etc., é razoável imaginar que haverá bom público na maioria desses atos. Acho ótimo.

Um mundo que produziu, só nestes anos de crise, 30 milhões de desempregados, a se somarem aos 170 milhões pré-existentes, precisa mesmo de uma bela sacudida, mesmo sem mencionar as outras mazelas.

Que sejam os jovens os motores dos protestos se explica exatamente por aí: o desemprego entre jovens até 24 anos bate em 28%, o dobro no conjunto da população.

Mas sucesso de público nas manifestações é apenas o começo de um processo, cujo desdobramento é muito difícil de antever.

Faço minha a avaliação da revista alemã "Der Spiegel": "Nestes tempos de crise crônica, e depois das intensas experiências da Primavera Árabe, permanece incerto se cenas como estas [a dos protestos nos EUA] representam parte de uma comédia curta ou de um longo drama, um fragmento de um filme velho e familiar ou talvez o princípio de uma revolução americana".

Vale para o Ocupe Wall Street, vale para os demais movimentos de indignados.

Eu vi esse filme antes, em meia dúzia de cidades do mundo, de Praga a Washington, de Québec a Seattle. Foi nos anos 90, e assustaram tanto o establishment que o movimento foi batizado de "globalifóbico", para tentar carimbá-lo como dinossauros que reagiam ao inevitável. O ponto culminante foi durante conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (Seattle, 1999), em que a moçada conseguiu a proeza de impedir o discurso inaugural a cargo da então secretária de Estado, Madeleine Albright.

Não é nada trivial bloquear, em plena terra do "free speech", o discurso da segunda mais importante figura da administração, depois do presidente.

Mas vieram os atentados de 2001 e, com eles, a tentativa de carimbar os indignados da época como cúmplices do terrorismo. O movimento refluiu sem deixar marcas realmente relevantes.

Dez anos depois, as causas que empurravam os jovens para as ruas só se fizeram mais agudas. Não é apenas a crise ou o desemprego, mas também o arcabouço institucional, magnificamente descrito por Robert Kuttner na mais recente edição de "The American Prospect":

"Libere o capital, e você incrementa seu poder político. Enfraqueça o Estado, com privatizações e desregulação, enfraqueça os sindicatos com mercados laborais mais "flexíveis", e você colhe não apenas mais economia de livre mercado, mas acaba com menos solidariedade cívica e uma política fragmentada. Você remove os contrapesos políticos e institucionais ao poder do "business" organizado. Nos bons e maus tempos, o capital manda".

Os indignados tentam ser esse contrapeso desaparecido. Tomara que consigam, mas é um processo complexo e provavelmente lento para as urgências que a crise dita.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO