terça-feira, 16 de outubro de 2012

Duda Mendonça é absolvido e relator sofre maior derrota

Na maior derrota do relator Joaquim Barbosa no julgamento do mensalão, o publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, foram absolvidos dos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Barbosa votou pela condenação de Duda — que recebeu R$ 10,4 milhões do PT numa offshore nas Bahamas — por lavagem, mas só dois ministros o acompanharam. Ele só tinha sido vencido em casos de réus menos importantes no esquema. Marcos Valério e Kátia Rabello foram condenados
 
STF absolve Duda Mendonça

Publicitário e sócia respondiam por evasão de divisas e lavagem de dinheiro; Barbosa critica MP

André de Souza, Carolina Brígido

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) absolveu ontem o publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, dos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O Ministério Público acusava Duda e Zilmar de ocultar a origem de dinheiro pago pelo PT - via Marcos Valério e Banco Rural - para saldar dívidas da campanha do ex-presidente Lula, em 2002. Parte desse dinheiro -R$ 1,4 milhão - foi sacada por Zilmar em uma agência do Banco Rural, em São Paulo. O restante - R$ 10,4 milhões - foi recebido em uma offshore chamada Dusseldorf nas Bahamas, um paraíso financeiro.

A maioria dos ministros os absolveu de lavagem por entender que não havia provas de que eles sabiam da origem ilícita dos recursos. Quanto à acusação de evasão de divisas, eles escaparam graças a uma brecha legal.

Também foram absolvidos do crime de evasão Vinícius Samarane, vice-presidente do Banco Rural; Cristiano Paz, ex-sócio de Marcos Valério; e Geiza Dias, ex-funcionária de uma das empresas de Valério. Por outro lado, foram condenados cinco réus por evasão de divisas: o próprio Marcos Valério; seu ex-sócio Ramon Hollerbach; a ex-diretora de sua agência Simone Vasconcelos; e os ex-dirigentes do Rural Kátia Rabello e José Roberto Salgado.

Frustrado com as absolvições, o ministro relator do mensalão, Joaquim Barbosa, desabafou e criticou o Ministério Público. O próprio relator já havia absolvido Duda e Zilmar do crime de evasão de divisas e de lavagem no caso dos saques no Banco Rural, mas condenado os dois por 53 práticas desse crime de lavagem no caso das remessas ao exterior.

- Poderia revisar meu voto para que o Ministério Público aprenda a fazer denúncia de forma mais explícita. Houve ações muito claras de Duda Mendonça no sentido do cometimento deste crime - disse Joaquim Babosa.

Quando tratou da acusação de evasão contra Duda e Zilmar, Barbosa disse estar convicto de que mantiveram uma conta não declarada em Miami. Mas ponderou que manter dinheiro no exterior não é crime. Ele ressaltou que uma circular do Banco Central isenta brasileiros de declarar conta no exterior se, no último dia do ano, o saldo for inferior a US$ 100 mil. O saldo da conta dos publicitários era de apenas US$ 573 em 31 de dezembro de 2003.

Banco Central tem brecha para não punição

Em depoimento, os réus afirmaram que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares ofereceu esse mecanismo de recebimento do dinheiro. Os dois não poderiam negar a oferta, pois o serviço já estava executado. Barbosa ressaltou que, no caso dos saques no Rural, os publicitários receberam o dinheiro diretamente, sem o auxílio de outra pessoa para ocultar a origem ou a propriedade dos recursos.

- Os valores recebidos por eles constituíram contraprestação financeira por serviços prestados. Assim, não há como afirmar que ambos integraram a quadrilha ou a organização criminosa a que se referem os autos, ou mesmo que tinham conhecimento dos crimes. É até possível dizer que Duda e Zilmar, com esse procedimento, tinham o objetivo de sonegar tributos. Porém, eles foram denunciados nesse ponto tão somente por lavagem de dinheiro, e não por sonegação fiscal. Daí porque, no meu entender, impõe-se a absolvição de Duda Mendonça e Zilmar Fernandes - explicou o relator.

Para receber os R$ 10,4 milhões, Duda abriu uma offshore Dusseldorf nas Bahamas, com a ajuda do BankBoston. O número da conta da empresa, em Miami, foi repassado a Marcos Valério. Cabia a Simone Vasconcelos informar aos credores as datas de pagamentos. Para Barbosa, está clara a manutenção do dinheiro no exterior sem o conhecimento das autoridades brasileiras, configurando o crime de lavagem. Ele concluiu que a norma do Banco Central "deixa uma brecha" para que esse tipo de atividade não seja punida como evasão de divisas.

O revisor, Ricardo Lewandowski, foi além e absolveu Zilmar e Duda de todas as acusações. Segundo ele, os dois não tiveram escolha para receber o que o PT lhes devia a não ser abrindo uma conta no exterior. Para o revisor, eles não tinham conhecimento da origem ilícita dos recursos:

- Inexistem elementos nos autos que indiquem que os réus Duda Mendonça e Zilmar Fernandes tinham conhecimento de que os créditos tinham origem ilícita.

Acompanharam Lewandowski os ministros Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Celso de Mello e Ayres Britto. Já Luiz Fux e Gilmar Mendes votaram com Barbosa. O único ministro a votar diferente de relator e revisor foi Marco Aurélio: ele absolveu Duda e Zilmar de lavagem, mas foi voto isolado ao condená-los por evasão.

Celso de Mello, e o presidente, Ayres Britto, absolveram Duda e Zilmar das acusações de lavagem de dinheiro e de evasão de divisas. Eles ressaltaram que, para ocorrer a lavagem, é preciso detectar um crime antecedente para "sujar" o dinheiro.

O relator chegou a argumentar que o crime antecedente da lavagem atribuída aos publicitários era a evasão de divisas para o exterior. No entanto, a maioria dos ministros do STF discordou da tese. Os dois advogados dos réus chegaram a pedir a palavra no plenário para explicar que o crime antecedente apontado na denúncia era peculato e gestão fraudulenta.

- O esquema de pagamento foi o mesmo engendrado por Marcos Valério e pelo núcleo financeiro. Mas o único recebedor de dinheiro deste esquema que era realmente credor do PT era Duda Mendonça. Havia um contrato de prestação de serviços e os serviços foram prestados - disse Ayres Britto.

Fonte: O Globo

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