Na maior derrota do
relator Joaquim Barbosa no julgamento do mensalão, o publicitário Duda Mendonça
e sua sócia, Zilmar Fernandes, foram absolvidos dos crimes de evasão de divisas
e lavagem de dinheiro. Barbosa votou pela condenação de Duda — que recebeu R$
10,4 milhões do PT numa offshore nas Bahamas — por lavagem, mas só dois ministros o acompanharam.
Ele só tinha sido vencido em casos de réus menos importantes no esquema. Marcos
Valério e Kátia Rabello foram condenados
STF absolve Duda
Mendonça
Publicitário e sócia respondiam por evasão de divisas e lavagem de dinheiro;
Barbosa critica MP
André de Souza, Carolina Brígido
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) absolveu ontem o publicitário
Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, dos crimes de evasão de divisas e
lavagem de dinheiro. O Ministério Público acusava Duda e Zilmar de ocultar a
origem de dinheiro pago pelo PT - via Marcos Valério e Banco Rural - para
saldar dívidas da campanha do ex-presidente Lula, em 2002. Parte desse dinheiro
-R$ 1,4 milhão - foi sacada por Zilmar em uma agência do Banco Rural, em São
Paulo. O restante - R$ 10,4 milhões - foi recebido em uma offshore chamada
Dusseldorf nas Bahamas, um paraíso financeiro.
A maioria dos ministros os absolveu de lavagem por entender que não havia
provas de que eles sabiam da origem ilícita dos recursos. Quanto à acusação de
evasão de divisas, eles escaparam graças a uma brecha legal.
Também foram absolvidos do crime de evasão Vinícius Samarane,
vice-presidente do Banco Rural; Cristiano Paz, ex-sócio de Marcos Valério; e
Geiza Dias, ex-funcionária de uma das empresas de Valério. Por outro lado,
foram condenados cinco réus por evasão de divisas: o próprio Marcos Valério;
seu ex-sócio Ramon Hollerbach; a ex-diretora de sua agência Simone Vasconcelos;
e os ex-dirigentes do Rural Kátia Rabello e José Roberto Salgado.
Frustrado com as absolvições, o ministro relator do mensalão, Joaquim
Barbosa, desabafou e criticou o Ministério Público. O próprio relator já havia
absolvido Duda e Zilmar do crime de evasão de divisas e de lavagem no caso dos
saques no Banco Rural, mas condenado os dois por 53 práticas desse crime de
lavagem no caso das remessas ao exterior.
- Poderia revisar meu voto para que o Ministério Público aprenda a fazer
denúncia de forma mais explícita. Houve ações muito claras de Duda Mendonça no
sentido do cometimento deste crime - disse Joaquim Babosa.
Quando tratou da acusação de evasão contra Duda e Zilmar, Barbosa disse
estar convicto de que mantiveram uma conta não declarada em Miami. Mas ponderou
que manter dinheiro no exterior não é crime. Ele ressaltou que uma circular do
Banco Central isenta brasileiros de declarar conta no exterior se, no último
dia do ano, o saldo for inferior a US$ 100 mil. O saldo da conta dos
publicitários era de apenas US$ 573 em 31 de dezembro de 2003.
Banco Central tem brecha para não punição
Em depoimento, os réus afirmaram que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares
ofereceu esse mecanismo de recebimento do dinheiro. Os dois não poderiam negar
a oferta, pois o serviço já estava executado. Barbosa ressaltou que, no caso
dos saques no Rural, os publicitários receberam o dinheiro diretamente, sem o
auxílio de outra pessoa para ocultar a origem ou a propriedade dos recursos.
- Os valores recebidos por eles constituíram contraprestação financeira por
serviços prestados. Assim, não há como afirmar que ambos integraram a quadrilha
ou a organização criminosa a que se referem os autos, ou mesmo que tinham
conhecimento dos crimes. É até possível dizer que Duda e Zilmar, com esse
procedimento, tinham o objetivo de sonegar tributos. Porém, eles foram
denunciados nesse ponto tão somente por lavagem de dinheiro, e não por
sonegação fiscal. Daí porque, no meu entender, impõe-se a absolvição de Duda
Mendonça e Zilmar Fernandes - explicou o relator.
Para receber os R$ 10,4 milhões, Duda abriu uma offshore Dusseldorf nas
Bahamas, com a ajuda do BankBoston. O número da conta da empresa, em Miami, foi
repassado a Marcos Valério. Cabia a Simone Vasconcelos informar aos credores as
datas de pagamentos. Para Barbosa, está clara a manutenção do dinheiro no
exterior sem o conhecimento das autoridades brasileiras, configurando o crime
de lavagem. Ele concluiu que a norma do Banco Central "deixa uma
brecha" para que esse tipo de atividade não seja punida como evasão de
divisas.
O revisor, Ricardo Lewandowski, foi além e absolveu Zilmar e Duda de todas
as acusações. Segundo ele, os dois não tiveram escolha para receber o que o PT
lhes devia a não ser abrindo uma conta no exterior. Para o revisor, eles não
tinham conhecimento da origem ilícita dos recursos:
- Inexistem elementos nos autos que indiquem que os réus Duda Mendonça e
Zilmar Fernandes tinham conhecimento de que os créditos tinham origem ilícita.
Acompanharam Lewandowski os ministros Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen
Lúcia, Celso de Mello e Ayres Britto. Já Luiz Fux e Gilmar Mendes votaram com
Barbosa. O único ministro a votar diferente de relator e revisor foi Marco
Aurélio: ele absolveu Duda e Zilmar de lavagem, mas foi voto isolado ao
condená-los por evasão.
Celso de Mello, e o presidente, Ayres Britto, absolveram Duda e Zilmar das
acusações de lavagem de dinheiro e de evasão de divisas. Eles ressaltaram que,
para ocorrer a lavagem, é preciso detectar um crime antecedente para
"sujar" o dinheiro.
O relator chegou a argumentar que o crime antecedente da lavagem atribuída
aos publicitários era a evasão de divisas para o exterior. No entanto, a
maioria dos ministros do STF discordou da tese. Os dois advogados dos réus
chegaram a pedir a palavra no plenário para explicar que o crime antecedente
apontado na denúncia era peculato e gestão fraudulenta.
- O esquema de pagamento foi o mesmo engendrado por Marcos Valério e pelo
núcleo financeiro. Mas o único recebedor de dinheiro deste esquema que era
realmente credor do PT era Duda Mendonça. Havia um contrato de prestação de
serviços e os serviços foram prestados - disse Ayres Britto.
Fonte: O Globo
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