domingo, 27 de maio de 2012

OPINIÃO DO DIA: Marco Aurélio Nogueira: conectados, fragmentados.

Quanto mais se observa o mundo, a América Latina e o Brasil, mais se percebe que a nossa é uma época com pouca "cabeça" política, pouca direção. As mudanças em curso abalam a vida cotidiana, as relações sociais e o Estado, mas não têm um autor que se possa reconhecer. Apesar de haver uma revolução em marcha, nenhuma revolução propriamente política ocorre. A revolução é passiva.

Impulsionadas por essa dinâmica, as sociedades fragmentam-se, individualizam-se e perdem instituições. Tornam-se cada vez mais parecidas entre si, mas dentro delas a diferença se reproduz incessantemente. Sem centros claros de coordenação, as partes (grupos, indivíduos, regiões) afastam-se umas das outras e seguem lógicas próprias - ainda que, paradoxalmente, tudo fique mais conectado.

Uma multidão de novos sujeitos gera novos conflitos e contradições, embora não consiga interferir de fato no jogo político e redirecioná-lo em termos emancipadores. A hiperatividade da sociedade civil ocorre mais em função da necessidade de autoexpressão que da disposição para organizar consensos.

O risco de fragmentação corporativista da representação política aumenta, com efeitos deletérios sobre o processo político: partidos e governos se tornam mais "dependentes" dos interesses que vicejam em seu interior, perdem potência como representantes e ficam menos ágeis para tomar decisões."

NOGUEIRA, Marco Aurélio,professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp. Novos e velhos ativistas. O Estado de S. Paulo, 26/5/2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Previdência privada
Lei de Acesso mira políticas públicas
O Brasil que não viaja de avião

FOLHA DE S. PAULO
Mantega dá um mês para banco privado cortar juros
Mortos na Ditadura pela esquerda são estimados em 120
Rosane Collor vai lançar biografia com a sua versão da história

O ESTADO DE S. PAULO
Mais de 14 milhões de famílias no País estão superendividadas
Apesar da lei, órgão público resiste a dar informações

CORREIO BRAZILIENSE
As regalias de Brunelli para se entregar
R$ 8 bilhões: O preço do medo

ESTADO DE MINAS
Minas encolhida
Mudanças no TSE põem em risco veto a contas-sujas

ZERO HORA (RS)
Como recuperar a crença nos partidos

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Melhora da renda esvazia escola pública
Brasileiro conhece mais a Rio+20

Os espectros do desenvolvimentismo :: Luiz Werneck Vianna

Ainda não é oficial, mas o processo em curso que nos embala, nessa marcha batida rumo aos grandes do mundo, animada pelas fanfarras dos nossos êxitos econômicos e sociais, já conta com um nome à espera de consagração na pia batismal: desenvolvimentismo. Desenvolvimentismo assim sem mais, sem a pesada qualificação de tempos de antanho, que o associou à fórmula, hoje cediça, do nacional-popular, criada, por volta das décadas de 1950-60, a partir de uma de suas costelas, vindo a povoar a imaginação da esquerda brasileira da época.

Sob esse nome, com raízes na tradição republicana brasileira, especialmente de suas florações autoritárias - cite-se, para encurtar razões, apenas o regime militar -, talvez se pretenda deixar para trás o tempo dominado pela contingência, como foi aquele em que o PT iniciou o seu ciclo governamental, confrontado com uma realidade que não suportava o seu programa e as ideias-força que o tinham trazido ao primeiro plano da cena política brasileira. Diante da pressão coercível dos fatos, como é sabido, o PT adaptou-se às circunstâncias, dando continuidade ao cerne da política do seu antecessor a ponto de serem pouco distinguíveis as diferenças entre eles em matéria de política econômica.

A crise política e institucional de 2005, deflagrada pelos episódios nada republicanos vindos à tona na CPI dita do mensalão, se não importou mudanças nessa dimensão, em termos de orientação política levou a um movimento defensivo por parte do governo do PT, reagindo a uma contingência ameaçadora à sua reprodução, já às portas do processo sucessório de 2006, que trouxe consigo uma verdadeira mutação na forma de esse partido se pôr no mundo. A partir daí, declina da interpretação que lhe serviu de viga mestra para a fixação do discurso com que iniciou a sua escalada vitoriosa nas eleições e na conquista da direção de importantes movimentos sociais, que identificou na ideologia do nacional-desenvolvimentismo os suportes para uma política populista que teria atrelado o sindicalismo ao Estado e à coalizão pluriclassista que o dirigia. Produzida essa metamorfose - categoria plenamente admitida no léxico partidário, enunciada várias vezes por sua principal liderança -, deu início a uma deriva rumo ao encontro com a tradição republicana brasileira, incluídas todas as suas dicções, a de Getúlio Vargas, a de Juscelino Kubitschek e, inclusive, a do regime militar, nesse caso, sobretudo a do governo Geisel.

Exemplar desse movimento a mudança de política quanto ao sindicalismo - ponto de referência estratégico quanto à sua formação -, quando, nesse mesmo ano aziago de 2005, o PT abriu mão do seu programa de reforma sindical, confirmado num fórum nacional realizado no ano anterior, abdicando dos seus princípios em favor da pluralidade sindical e contrários à contribuição sindical. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) cede lugar à Força Sindical, cuja proximidade quanto à tradição republicana se fazia garantir com a entrega do Ministério do Trabalho ao presidente do PDT, partido fundado por Leonel Brizola, um cultor da herança de Vargas. Um dos resultados dessa recomposição foi a admissão das centrais sindicais como figuras institucionalizadas do sindicalismo, passando a ser contempladas com recursos da contribuição sindical, fortalecendo-se os vértices em detrimento das bases da vida associativa dos trabalhadores.

Tal guinada em termos de orientação não foi acompanhada de razões que a justificassem, mas o fato é que, pragmaticamente, tangido pelas circunstâncias, o PT se vai descobrir instalado num território ideal antípoda ao de sua formação. O processo de modernização, bête noire de ícones intelectuais de suas primeiras horas, como Raimundo Faoro, é incorporado à sua política econômica, emprestando-se ao tema do desenvolvimento das forças produtivas materiais uma centralidade imprevista, até mesmo pela razão de esse partido ter vindo à luz com a incorporação de setores influentes da catolicidade de esquerda, refratárias doutrinariamente a construções desse tipo. Seu panteão se renova com a inclusão em lugar de honra de Celso Furtado, e sua própria interpretação da História republicana é revista, instituindo-se pontes de comunicação entre Vargas e Lula, vistos como lideranças maiores na adoção de políticas sociais inclusivas. Insinua-se, então, se bem que veladamente, o diagnóstico de que na origem dos nossos males estaria mais a falta de capitalismo do que os efeitos da sua presença.

Expandir o capitalismo brasileiro, projetá-lo além-fronteiras, torna-se o projeto in pectore do segundo mandato de Lula, consagrando-se sans phrase no governo de Dilma Rousseff. Ressurgências do passado costumam assombrar os vivos, trazendo de volta tempos mal vividos, enredos que não se completaram, espectros que saem das sombras a fim de nos cobrar ações para que, afinal, possam repousar em paz, como na tragédia clássica de Hamlet, na bela leitura de Derrida (Espectros de Marx, Relume Dumará, 1994). Espectros que nos rondam, quando os vivos não enterram bem seus mortos, e se investem desajeitados dos papéis que tão bem couberam neles em farsas que são pantomimas do que eles viveram, nas poderosas imagens de Marx de O Dezoito Brumário.

O desenvolvimentismo que ameaça retornar com galas oficiais que venha, então, com suas roupas próprias, no estilo prosaico do agronegócio, do empreendedorismo e da associação crescente com as empresas multinacionais. Ele não conhece a face amedrontadora de um inimigo fatal nem a necessidade heroica de mobilizar a Nação para combatê-lo. Seu mundo não é o da encarniçada luta política sem quartel, mas o do cálculo da racionalização de mandarins, que, como na China, tentam tecer por cima o rumo dos nossos destinos. Quanto aos espectros, basta abrir uma janela que eles se dissipam no ar.

Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Lula propôs troca de favor, diz ministro do STF

Gilmar Mendes afirmou que ex-presidente ofereceu blindagem em CPI em troca do adiamento do julgamento do mensalão

Encontro aconteceu em abril, conforme revelou ontem a revista "Veja"; ministro diz ter ficado "perplexo" com atitude

BRASÍLIA - O ex-presidente Lula procurou o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes para tentar adiar o julgamento do mensalão. Em troca da ajuda, Lula ofereceu, segundo reportagem da revista "Veja", blindagem na CPI que investiga as relações de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com políticos e empresários.
Mendes confirmou à Folha o encontro e o teor da conversa, revelada ontem, mas não quis dar detalhes. "Fiquei perplexo com o comportamento e as insinuações despropositadas do presidente."

O encontro aconteceu em 26 de abril no escritório de Nelson Jobim, ex-ministro de Lula e ex-integrante do STF.

O petista disse ao ministro, segundo a revista, que é "inconveniente" julgar o processo agora e chegou a fazer referências a uma viagem a Berlim em que Mendes se encontrou com o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), hoje investigado por suas ligações com Cachoeira.

Membro do Ministério Público, Demóstenes era na época um dos interlocutores do Judiciário e de seus integrantes no Congresso.

Procurada pela Folha, a assessoria de Lula disse que não iria comentar o caso. À "Veja", Jobim disse não ter escutado a conversa.

No encontro com Lula, Gilmar teria se irritado e dito que o ex-presidente poderia "ir fundo na CPI". Em abril, a Folha revelou que Lula havia organizado uma ofensiva, com a participação de integrantes do PT que possuem interlocução no Judiciário, para aumentar a pressão sobre o STF.

O petista disse a aliados temer que a análise do mensalão se transforme num julgamento de seu governo.

Segundo a "Veja", o próximo passo de Lula seria procurar o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, também para adiar o julgamento. Em recente almoço no Alvorada, Lula convidou Britto para tomar um vinho com ele e Celso Bandeira de Mello, um dos responsáveis pela indicação do atual presidente do STF.

À Folha Britto também confirmou o convite, mas disse que não percebeu malícia e que não houve encontro.

"Tive com Lula umas quatro vezes nos últimos nove anos e ele sempre fala de Bandeirinha [Celso Bandeira]. Nunca me pediu nada." Britto diz que a "luz amarela" acendeu quando ouviu o relato de Mendes. "Mas de imediato apaguei. Lula sabe que eu não faria algo do tipo."

A revista também diz que Lula contou a Mendes que delegaria ao ex-ministro do STF e presidente da Comissão de Ética da Presidência Sepúlveda Pertence a tarefa de falar sobre o julgamento com a ministra Cármen Lúcia.


Sepúlveda negou ontem que Lula tenha feito o pedido e disse lamentar que Mendes tenha dado "declaração sobre conversas, reais ou não, que tenha tido com um ex-presidente da República".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Mensalão deve ser julgado pelo STF em agosto

BRASÍLIA - A ação penal do mensalão deve ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal a partir de agosto deste ano, mas o início depende do ministro Ricardo Lewandowski, responsável pela revisão do processo.

A expectativa é que ele libere o voto em junho. Na melhor das hipóteses, o julgamento poderia começar no final do próximo mês, com as defesas orais dos advogados, e ser retomado em agosto.

O inquérito sobre o caso foi aberto no STF em julho de 2005, desde então sob a relatoria do ministro Joaquim Barbosa. Em 2006, a Procuradoria-Geral da República encaminhou denúncia contra 40 pessoas, incluindo toda a ex-cúpula do PT.

Delas, 38 ainda são réus. O ex-deputado José Janene morreu e o ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira fez acordo judicial.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lula pediu para adiar mensalão, diz ministro

Gilmar Mendes, do Supremo, acusa o ex-presidente de pressioná-lo para atrasar o julgamento do escândalo, marcado para este ano; petista nega

Mariângela Gallucci, Fábio Fabrini, Vera Rosa e Júlio Cesar Lima

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pressionou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, para adiar o julgamento do mensalão. Segundo reportagem da revista Veja, a conversa teria ocorrido no escritório de advocacia do ex-ministro da Defesa Nelson Jobim.

Questionado pelo Estado, durante evento ontem em Curitiba (PR), Mendes não quis dar declarações, mas confirmou o conteúdo da reportagem e salientou que nem ele nem os outros ministros do Supremo se sentem intimidados pelo ex-presidente. A expectativa é de que o STF julgue a ação no segundo semestre.

De acordo com a revista, Lula teria comentado que o julgamento agora seria "inconveniente" e feito uma oferta velada. Em troca do apoio ao adiamento, Mendes poderia ter proteção na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI) do Cachoeira.

O ministro do STF é próximo do senador Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido-GO) e há rumores sobre um encontro dos dois em Berlim, supostamente pago por Carlinhos Cachoeira. Lula teria perguntado sobre a viagem e comentado que tem controle sobre a CPI.

Lula teria dito que uma decisão este ano seria muito influenciada pelo processo eleitoral. Porém, haveria uma vantagem extra no adiamento: em 2013, os ministros Carlos Ayres Britto (atual presidente do STF) e Cezar Peluso, considerados propensos à condenação, estarão aposentados.

Procurada, a assessoria de Lula negou a conversa e afirmou que ele nunca interferiu no processo, muito menos pressionou ministros do STF a adiar o julgamento, embora considere o mensalão "uma farsa". Jobim foi na mesma linha. "O quê? De forma nenhuma, não se falou nada disso", reagiu. "O Lula fez uma visita para mim, o Gilmar estava lá. Não houve conversa sobre o mensalão." Jobim disse, sem entrar em detalhes, que na conversa foram tratadas apenas questões "genéricas", "institucionais".
Alvo. Ayres Britto, porém, disse ao Estado que Gilmar Mendes lhe relatou a conversa que teve com Lula, informando sobre "essa história que está na Veja" e que ele "conversou com Lula sobre o mensalão". Ele mesmo correu o risco de ser alvo de investida semelhante. A revista relata que num almoço no Palácio da Alvorada, o ex-presidente teria perguntado sobre um amigo comum, o jurista Celso Antonio Bandeira de Mello, e dito que precisavam tomar um vinho juntos.

Ayres Britto confessou ao Estado que, ao ouvir o relato de Mendes, "acendeu a luz amarela". Mas, depois, concluiu que não havia motivo para preocupação. "A não ser que interpretasse que Lula pretenderia me cooptar por intermédio de Celso Antonio. Mas eu não interpretei assim. Acho que Lula não faria isso porque em nove anos nunca fez. E eu não me prestaria a isso."

Na avaliação de Ayres Britto, não há possibilidade de os ministros do Supremo serem pressionados por causa do julgamento do mensalão. Veja informa ainda que Lula teria dito a Mendes que procuraria o ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence para que ele ajudasse a convencer a ministra Cármen Lúcia a adiar o julgamento para 2013. Pertence negou. "Não fui procurado e não creio que o ex-presidente Lula pretendesse falar alguma coisa comigo a esse respeito."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Lula e o STF. Um ex defende o seu legado

É quase patético o esforço de Lula para reescrever o capítulo mais sombrio de seu governo, o mensalão. Seu foco agora é o Supremo Tribunal, onde os 36 réus do escândalo serão julgados. As abordagens impróprias e os comentários de Lula sobre os juizes da corte têm causado constrangimentos

Desde que deixou o governo, o ex-presidente Lula se empenha em apagar da história o capítulo do mensalão, o esquema de compra de apoio parlamentar criado pelos petistas para ganhar a simpatia de parlamentares e abastecer as campanhas políticas do PT e de aliados com dinheiro sujo. Durante algum tempo, Lula repetiu a tese de que o mensalão não passou de caixa dois, que, na visão dele, seria um crime menor e corriqueiro na política brasileira. Mais recentemente, porém, Lula abandonou a tese do caixa dois e se entregou à pregação messiânica de que o mensalão foi uma grande farsa tramada contra ele por setores da oposição e da imprensa. O esforço para reescrever a história é tão grande que o ex-presidente patrocinou a criação da CPI do Cachoeira, estabelecendo como objetivo explícito criar um fato novo capaz de enfumaçar o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Essas estratégias são conhecidas. A novidade é que, como elas não surtiram o efeito desejado, entrou em pauta um plano B, um conjunto de ações temerárias que consistem na abordagem direta ou indireta dos ministros do STF. Lula tomou para si essa missão.

Enquanto foi presidente da República, Lula indicou seis dos atuais onze ministros do STF que julgarão os 36 réus do mensalão — entre eles o deputado cassado José Dirceu, grão-petista apontado como "chefe da organização criminosa" pela Procuradoria-Geral da República. Em conversas diretas ou por intermédio de interlocutores, Lula cobra dos ministros o adiamento do início do julgamento, o que significaria a prescrição de muitos dos crimes. Nessa sua cruzada, o ex-presidente da República põe todo o peso de sua influência, mas arrisca-se a perder parte de seu prestígio.

Há um mês, o ministro Gilmar Mendes, do STF, foi convidado para uma conversa com Lula cm Brasília. O encontro foi realizado no escritório de advocacia do ex-presidente do STF e ex-ministro da Justiça Nelson Jobim, amigo comum dos dois. Depois de algumas amenidades, Lula foi ao ponto que lhe interessava e disse a Gilmar: "É inconveniente julgar esse processo agora". O argumento do ex-presidente foi que seria mais correto esperar passar as eleições municipais de outubro deste ano só depois julgar a ação que tanto preocupa o PT, partido que tem o objetivo declarado de conquistar 1 000 prefeituras nas urnas.

Para espíritos mais sensíveis, Lula já teria sido indecoroso simplesmente por sugerir a um ministro do STF o adiamento de julgamento do interesse de seu partido. Mas vá lá Até aí estaria tudo dentro do entendimento mais amplo do que seja uma ação republicana. Mas o ex-presidente cruzaria a fina linha que divide um encontro desse tipo entre uma conversa aceitável e um evidente constrangimento. Depois de afirmar que detém o controle político da CPI do Cachoeira, Lula, magnanimamente, ofereceu proteção ao ministro Gilmar Mendes, dizendo que ele não teria motivo para preocupação com as investigações. O recado foi decodificado. Se Gilmar aceitasse ajudar os mensaleiros, seria blindado na CPI. Decupando acena, o que se tem é um ex-presidente oferecendo salvo-conduto a um ministro da mais alta corte do país, como se o Brasil fosse uma nação de beduínos do século XIX com sua sorte entregue aos humores de um califa. "Fiquei perplexo com o comportamento e as insinuações despropositadas do presidente Lula", disse Gilmar Mendes a VEJA. O ministro defende a realização do julgamento neste semestre para evitar a prescrição dos crimes.

A certa altura da conversa com Mendes, Lula perguntou: "E a viagem a Berlim?". Ele se referia a boatos de que o ministro e o senador Demóstenes Torres teriam viajado para a Alemanha à custa de Carlos Cachoeira e usado um avião cedido pelo contraventor. Em resposta, o ministro confirmou o encontro com o senador em Berlim, mas disse que pagou de seu bolso todas as suas despesas, tendo como comprovar a origem dos recursos. "Vou a Berlim como você vai a São Bernardo. Minha filha mora lá", disse Gilmar, que, sentindo-se constrangido, desabafou com ex-presidente: "Vá fundo na CPI". O ministro Gilmar relatou o encontro a dois senadores, ao procurador-geral da República e no advogado-geral da União.

Na copa do escritório de Jobim. enquanto Lula comia frutas (recomendação médica), Mendes ainda ouviu relatos nada enobrecedores sobre seu plano B. Lula revelou que encarregaria o amigo Sepúlveda Pertence de conversar sobre o processo com a ministra Cármen Lúcia, do STF. Pertence, que chefia a Comissão de Ética Pública da Presidência, presidiu o STF e é padrinho da indicação de Cármen Lúcia. ""Vou falar com o Pertence para cuidar dela", disse Lula.

Nomeada pelo ex-presidente, Cármen Lúcia — que costuma se referir a Pertence como seu "guru" — contou a VEJA que visitou Lula no hospital, no dia 5 de abril, mas que não falaram sobre o mensalão. Ela negou ter sido procurada por Pertence para conversar sobre o processo. Lula disse que já havia feito aquelas mesmas ponderações ao ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão no STF. Entremeou o relato com uma manifestação de contrariedade. O presidente contou ter percebido que, nos últimos meses, Lewandowski estaria propenso a ceder à pressão da opinião pública em favor de uma pronta decisão do Supremo. Como revisor, a Lewandowski cabe averiguar se as etapas do processo foram cumpridas como manda a lei e, em seguida, liberar os autos para julgamento. Como não há prazo para concluir o trabalho, o ministro revisor pode, se precisar ou desejar, adiar pelo tempo que quiser o começo do julgamento. Lewandowski, porém, parece disposto a liberar os autos até junho, o que permitirá o início do julgamento no mais tardar em agosto, logo depois do recesso do Judiciário. Lula não fez questão de esconder seu desapontamento na conversa com Gilmar. "Ele só iria apresentar o relatório no semestre que vem, mas está sofrendo muita pressão".

A respeito de José Dias Toffoli, ex-advogado-geral da Unia em seu governo e outra indicação sua para o STF, Lula foi senhorial na conversa com Gilmar no escritório de Jobim: "Eu disse ao Toffoli que ele tem de participar do julgamento". A participação do ministro Toffoli é uma incógnita, pois, tendo sido assessor de José Dirceu e advogado do PT em duas campanhas presidenciais, o mais adequado seria se declarar impedido de julgar o mensalão. Adicionalmente existe o fato de a atual companheira de Toffoli, a advogada Roberta Rangel, ter atuado na defesa de três mensaleiros, entre os quais o próprio Dirceu.

No encontro entre Gilmar Mendes e Jobim, ao advogar o adiamento do julgamento, Lula argumentou que, se tomada no ano que vem, a decisão seria menos contaminada pelas disputas políticas. Não é só isso que move a estratégia. Em 2013, os ministros Ayres Britto e Cezar Peluso, considerados propensos à condenação, já estarão fora do tribunal. Seria o melhor dos mundos para os integrantes da organização criminosa, que, nos últimos tempos, têm demonstrado sinais de pessimismo. Disse Lula na conversa com Gilmar Mendes: "Zé Dirceu está desesperado". Um dos primeiros nomes escolhidos pelo ex-presidente para o STF, Joaquim Barbosa, relator do processo, é visto agora como um traidor. Barbosa teria dado evidentes sinais de ser refratário às teses dos réus do mensalão. Na conversa com Gilmar, Lula rotulou o ministro Barbosa de "complexado". Sobre o episódio, disse a VEJA um dos mais experientes ministros do STF: "É absolutamente grave e reprovável, além de inaceitável, esse tipo de pressão". "É um fato gravíssimo", acrescentou outro integrante do tribunal.

Na última quarta-feira, Gilmar Mendes relatou a conversa que tivera com Lula a Ayres Britto, presidente do STF, que disse: "Eu recebi o relato com surpresa". Ayres ainda não sabia, mas também está na agenda de Lula. 0 ex-presidente disse a interlocutores que pedirá ao jurista Celso Antonio Bandeira de Mello, amigo de ambos e um dos patronos da indicação de Ayres Britto para o STF, para marcar a conversa. Ayres Britto contou que o relato de Gilmar ajudou-o a entender uma abordagem que Lula lhe fizera uma semana antes, durante um almoço no Palácio da Alvorada, onde estiveram a convite da presidente Dilma Rousseff. Diz o ministro Ayres Britto: "0 ex-presidente Lula me perguntou se eu tinha notícias do Bandeirinha (Bandeira de Mello) e completou dizendo que "qualquer dia desses a gente toma um vinho". Confesso que, depois que conversei com o Gilmar, acendeu a luz amarela, mas eu mesmo tratei de apagá-la". Ouvido por VEJA, Jobim confirmou o encontro de Lula e Gilmar em seu escritório em Brasília, mas, como bom político, disse que as partes da conversa que presenciou "foram em tom amigável". VEJA entou entrevistar Lula a respeito do episódio. Sem sucesso, enviou a seguinte mensagem aos assessores: "Estamos fechando uma matéria sobre o julgamento do mensalão para a edição desta semana. Gostaríamos de saber a versão do ex-presidente Lula sobre o encontro ocorrido em 26 de abril, no escritório do ex-ministro Nelson Jobim, com a presença do anfitrião e do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, no qual Lula fez gestões com Mendes sobre o julgamento do mensalão". Obteve a seguinte frase como resposta: "Quem fala sobre mensalão agora são apenas os ministros do Supremo Tribunal Federal". Certo. Mas eles tem ouvido muito também sobre o mensalão.

FONTE: REVISTA VEJA

PPS condena postura mafiosa de Lula para barrar julgamento do mensalão

Foto: Tuca Pinheiro

Para os dirigentes da legenda,"chantagem" envergonha a República

Por: Nadja Rocha

O líder do PPS na Câmara, deputado Rubens Bueno (PR), disse que a sociedade brasileira deve estar “estarrecida”, ao saber que o ex-presidente Lula usa de práticas mafiosas para tentar adiar julgamento do mensalão no STF (Supremo Tribunal Federal). De acordo com a reportagem de Veja, publicada neste sábado (26), em encontro com Gilmar Mendes, em abril passado, Lula teria tentado convencer o ministro da “inconveniência” de o Supremo julgar os mensaleiros este ano.

Segundo a revista, o ex-presidente da República teria feito referência a um suposto encontro de Gilmar Mendes, durante viagem à Alemanha, com o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-Goiás), que está sendo investigado pelo Conselho de Ética por suas ligações com Cachoeira.

“É estarrecedor ver Lula posando de chefão de quadrilha (do mensalão) para chantagear um ministro da mais alta corte do país”, criticou Bueno.

Em troca do apoio, Mendes contaria com blindagem dos governistas na CPMI que investiga as relações do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com políticos e empresários.O encontro aconteceu em 26 de abril no escritório de Nelson Jobim, ex-ministro do governo Lula e ex-integrante do Supremo. Na conversa, o ex-presidente teria deixado transparecer que exerce o controle sobre outros ministros, inclusive Carlos Toffoli, que foi advogado do PT e chefiou a Advocacia da União na sua gestão.

Governo corrupto

Rubens Bueno disse que a reportagem mostra que o ex-presidente da República é o mentor de todas as articulações para que o crime do escândalo dos mensaleiros não seja julgado pelo STF. “Ele teme passar para história como um governo corrupto, que pagava sua base aliada para ter apoio no Congresso Nacional”, criticou.

Chantagem

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP),a denúncia de intimidação ao ministro Gilmar Mendes é uma das páginas “mais tristes” da história da República protagonizada pelo PT. “Primeiro foi o mensalão, que eles tentam dizer que não existiu. Agora, aparece o Lula chantageando o Supremo”, afirmou.

Freire classificou de “bazófia” a afirmação de Lula de que teria controle da CPMI do Cachoeira. “Isso é típico da postura pouco recomendável do ex-presidente. É difícil imaginar que a comissão admita ser marionete de quem quer que seja. Isso é bazófia”, condenou.

FONTE: PORTAL DO PPS

Mais de 14 milhões de famílias no País estão superendividadas

A maior parte dos que comprometem mais de 30% da renda com dívidas está nas classes baixas, diz estudo

Quase um quarto das famílias se endividou mais do que deveria e foi obrigado a reduzir o padrão de vida ou a ficar inadimplente. Um estudo com base em dados do IBGE mostra que 14,1 milhões de famílias comprometeram mais de 30% da renda mensal com dívidas. Essa marca ultrapassa o limite saudável para o endividamento, pois 70% do orçamento vai para despesas básicas, como comida, habitação ou saúde. A maior parte dessas famílias superendividadas está na fatia menos favorecidas da população: 5,8 milhões na classe C e 6,6 milhões nas classes D e E. Na média, no entanto, o brasileiro comprometeu 26,2% da renda mensal com dívidas, mostra o estudo.

14 milhões de famílias já comprometem um terço da renda mensal só com dívidas

Raquel Landim, Márcia de Chiara

Quase um quarto das famílias se endividou mais do que deveria e foi obrigado a reduzir o padrão de vida ou a dar calote. Um estudo da consultoria MB Associados, com base na Pesquisa de Orçamento das Famílias (POF), do IBGE, mostra que 14,1 milhões de famílias comprometeram mais de 30% da renda mensal com dívidas.

Essa marca ultrapassa o limite saudável para o endividamento, pois 70% do orçamento vai para despesas básicas, como comida, habitação ou saúde, conforme mostra a POF. A maior parte dessas famílias superendividadas está na fatia menos favorecida da população: 5,8 milhões na classe C e 6,6 milhões nas classes D e E.

Na média, no entanto, o brasileiro comprometeu 26,2% da renda mensal com dívidas, diz o estudo da MB. Esse resultado é superior à média de 22% estimada pelo Banco Central, porque inclui gastos como crediário de loja sem parceria com banco e despesa à vista no cartão de crédito.

Na semana passada, o governo anunciou um pacote para estimular o consumo por meio do crédito, principalmente na compra de carros. Para José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB, o efeito do pacote será limitado pelo endividamento. "É um número grande de famílias que ultrapassaram o limite, por isso o nó no mercado de crédito."

Nos últimos cinco anos, a expansão do crédito, com a entrada de novos consumidores, garantiu um crescimento robusto da economia. Mas, desde meados de 2011, o ritmo de concessão esfriou, à medida que a inadimplência crescia. Em abril, o calote atingiu o recorde de 7,6%.

Descontrole. Os consumidores deixaram de pagar as contas, apesar da menor taxa de desemprego da história. O economista da LCA, Wemerson França, diz que isso ocorreu porque eles comprometeram uma fatia maior da renda com dívidas. Com o corte de impostos na crise de 2008, os brasileiros compraram carro, casa, móveis e eletrônicos a prazo.

A importância do descontrole de gastos como fator de calote aparece numa pesquisa da Boa Vista Serviços, que administra o serviço de proteção ao crédito da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), feita com 1.100 inadimplentes em março. O desemprego é a principal causa do calote (38,3%), mas a fatia do descontrole de gastos subiu de 15% para 24,6%. Marcel Solimeo, economista-chefe da ACSP, destaca que, para as famílias com renda acima de 10 salários mínimos, o descontrole de gastos aparece como o principal motivo para a inadimplência (37,3%).

Com a facilidade de crédito, ingressou no mercado de consumo quem nunca tinha comprado a prazo. Além de não estar acostumado com o crédito, esse consumidor tem uma demanda reprimida por bens duráveis. "O resultado desses dois fatores explica por que a taxa de inadimplência dos estreantes no crédito é, na média, 20% superior ao índice geral", diz Solimeo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A cobiça de Cachoeira pelas obras do Entorno

Gravações da Polícia Federal revelam a articulação do bicheiro para assumir o PAC nas cidades ao redor do Distrito Federal, um pacote de investimentos estimado em R$ 7 bilhões

Josie Jeronimo, Denise Rothenburg

Em uma das conversas com Cachoeira, Abreu (D) diz que não pode romper com Perillo

Antes mesmo de ser oficialmente lançado, o chamado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Entorno já havia sido dividido em um consórcio de empresas em que a Delta Construções teria o comando do grupo. Dados das investigações da Polícia Federal cruzados com apurações da CPI criada para apurar a rede de influência de Carlinhos Cachoeira revelam que, além de o bicheiro pressionar políticos aliados para emplacar a Delta como líder do consórcio, o contraventor queria indicar obras para o projeto executivo do pacote de investimentos federais estimado em R$ 7 bilhões.

O ex-diretor da Delta Cláudio Abreu, em uma das escutas, explica a Cachoeira que o projeto para analisar a viabilidade de uma das obras custa aproximadamente R$ 4 milhões e pergunta ao bicheiro se ele fará parte do grupo. "Eu falei com o chefe (Fernando Cavendish) e ele falou assim, que era para você guardar esse dinheiro, era pra você aplicar lá no Entorno. Que o projeto lá vai exigir uns quatro milhões e meio. Ah, eu vou te adiantar, é porque está nós, você, a Galvão e a Odebrecht, né? Os cara tava querendo dividir os 25% seu em participação e nos íamos consultar você pra saber, você quer ficar é com a gente, né? (sic)", questiona Cláudio Abreu.

Gravações realizadas com autorização judicial em análise na CPI mostram que as mudanças ocorridas no âmbito do Ministério dos Transportes, com a queda de Alfredo Nascimento, puseram freio nas pretensões da quadrilha. O Planalto mandou parar a análise de projetos de viabilidade na construção de trechos rodoviários e de linha férrea que interessavam ao grupo de Cachoeira. Com a perda de influência da quadrilha, as outras empreiteiras que brigavam pela dianteira nos projetos do PAC do Entorno tomaram a frente nos projetos. A mudança de planos fez com que a relação entre o grupo do contraventor e o governador de Goiás, Marconi Perillo, estremecesse, pois o comando das obras supostamente foi uma promessa do tucano à época da eleição, quando encontrou dificuldades financeiras para reagir ao concorrente Iris Rezende (PMDB-GO) e pediu apoio da empreiteira.

Em uma das conversas com o bicheiro, Cláudio Abreu reclama de Perillo com Cachoeira, mas afirma que Cavendish o orientou a não romper relações com o governador. Em outra gravação, o ex-diretor da Delta afirma que chegaram até a dizer que o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) era sócio oculto da empresa para melhorar a correlação de forças com as outras empreiteiras. As reclamações de Cachoeira chegaram ao ouvido de Demóstenes. "Doutor, tô recebendo uma notícia aqui, daquele negócio do Entorno lá, vou largar mão daquilo, viu? A Odebrecht falou lá que tem acordo com todo mundo, viu? Eles que mandam, eles querem ser o líder, aí eu falei pro cara aqui, agora eu vou abrir mão".

O lobby da empreiteira pelos bilhões do governo no projeto do Entorno interferiu, até mesmo, nas prioridades definidas nos projetos executivos elaborados pelos governos do Distrito Federal e Goiás. Enquanto o executivo goiano aposta em grande obras viárias e ferroviárias, com a construção e duplicação de rodovias, nova roupagem para a criação do chamado "Expresso Pequi", linha férrea ligando Brasília e Goiânia, o Distrito Federal optou por defender a construção de um anel viário que ligasse grande parte das cidades e a melhoria de estruturas prediais da área de saúde e programas habitacionais. A remodelagem do "Expresso Pequi" era considerado o carro-chefe do governo goiano no projeto executivo do PAC do Entorno. No âmbito do Ministério dos Transportes, a Valec já havia se movimentado para iniciar pesquisas de viabilidade da proposta.

Depoimento

O ex-diretor da Delta Centro Oeste Cláudio Abreu também comparecerá a CPI nesta semana. Ele é esperado na quarta-feira, às 10h. Ele não deve responder às perguntas dos parlamentares, como fez Cachoeira na última terça-feira. A ministra do STF Carmen Lúcia concedeu liminar reconhecendo seu direito de ficar calado. Cláudio Abreu está preso e é investigado por usar a empresa para favorecer aliados do bicheiro.

"Eu falei com o chefe (Fernando Cavendish) e ele falou assim, que era para você guardar esse dinheiro, era pra você aplicar lá no Entorno. Que o projeto lá vai exigir uns quatro milhões e meio"
Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta no Centro-Oeste, em conversa com Carlinhos Cachoeira interceptada pela Polícia Federal

Contrato de gaveta

A CPI instalada no Congresso cruza informações dos contratos da Delta com a quebra de sigilo de outras empresas de construção civil envolvidas no esquema. Os parlamentares foram alertados de que a empreiteira costumava utilizar o CNPJ de outras empresas para concorrer em licitações e depois assinava contratos de gaveta para transferir serviço para a Delta. Em uma das gravações da Polícia Federal, Carlinhos Cachoeira e Cláudio Abreu falam sobre a utilização do CNPJ da empreiteira Construtora Rio Tocantins (CRT), do empresário Rossine Guimarães, que também é sócio do contraventor. "Podemos usar a CRT na conversa aí, entendeu, depois vamos fazer o contrato, com outra empresa, com a Delta, entendeu, põe a Delta na frente de tudo e a gente tem um contrato de gaveta, entendeu?", revela Cachoeira em um dos grampos.

FONTE CORREIO BRAZILIENSE

Lei de Acesso mira políticas públicas

A Lei de Acesso à Informação pode ajudar a pôr fim a uma prática pouco transparente de governos: esconder resultados de avaliações de políticas públicas.

Política pública, avaliação secreta

Para especialistas, Lei de Acesso acaba com prática de governos de esconder resultados de estudos

Antonio Gois, Alessandra Duarte

Em vigor desde o dia 16 deste mês, a Lei de Acesso à Informação pode ajudar a pôr fim a uma prática pouco transparente de governos e organismos internacionais: esconder, retardar ou divulgar só parcialmente estudos encomendados para avaliar políticas públicas. Pesquisadores consultados pelo GLOBO contam que é comum contratos com órgãos públicos serem assinados com cláusulas de sigilo. Para estudiosos da nova lei, a prática terá de ser revista, e eventuais termos de sigilo firmados antes da nova lei não valem mais.

Exemplo da falta de independência de pesquisadores contratados para avaliar políticas vem do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), que até hoje não divulgou na íntegra a segunda rodada de avaliação de seu mais importante programa, o Bolsa Família. Os pesquisadores foram a campo em 2009 e acompanharam 11 mil famílias em 269 cidades, ao custo de US$ 2 milhões. Em agosto de 2010, dois meses antes das eleições, o ministério convocou a imprensa para apresentar resultados parciais, divulgando nota de quatro páginas e um comunicado que dizia que o programa "fazia a criança progredir na escola e ter vida mais saudável". Desde então, nada mais foi publicado.

O GLOBO solicitou a íntegra do estudo ao MDS e a um dos autores da avaliação, John Hoddinott, do IFPRI (sigla em inglês para Instituto Internacional de Pesquisa em Políticas Alimentares). Do ministério, ouviu que o processo de validação dos últimos produtos da pesquisa estava sendo finalizado e que seus resultados seriam postos à disposição do público "como é praxe nas pesquisas de avaliação conduzidas pelo MDS". De Hoddinott, ouviu que ele já estava pronto, mas que não havia autorização do governo brasileiro para sua divulgação. Pesquisadores reclamam que a primeira rodada de avaliação do programa, realizada em 2005, até hoje tem trechos não divulgados.

O exemplo do Bolsa Família não é exceção. Mês passado, o colunista Elio Gaspari revelou que a pesquisadora Ligia Bahia, da UFRJ, fez sob encomenda do CNPq estudo sobre o mercado de saúde privada com críticas à atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regula planos de saúde. O CNPq, no entanto, rejeitou o trabalho dizendo que "os resultados estavam desconectados dos objetivos propostos". O estudo acabou sendo divulgado no site da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, e a polêmica motivou um abaixo-assinado, em apoio a Ligia, de quase 300 acadêmicos, como Aloisio Teixeira, ex-reitor da UFRJ.

Outro exemplo de avaliação de política pública divulgada pela imprensa antes de o governo tornar público seus resultados foi um estudo da professora Lena Lavinas, da UFRJ, sobre o programa Um Computador por Aluno. O relatório final, entregue em novembro do ano passado à Secretaria de Assuntos Estratégicos, fazia críticas à forma como o programa piloto foi implementado. Resultados e recomendações foram ignorados até o momento em que o estudo foi divulgado.

Professora da Ebape-FGV, Sônia Fleury lembra que contratos com organismos internacionais, em geral, também tornam esses órgãos "proprietários da produção" dos estudos.

- Podem ou não divulgar os dados, enquanto os autores ficam impedidos de divulgar seu trabalho - diz Sônia, dando outro exemplo de sigilo: - Há um conjunto de avaliações feitas sobre as favelas pacificadas no Rio, contratadas por organismos internacionais, e que até o momento não foram tornadas acessíveis a pesquisadores e à sociedade.

Presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), Marcos Costa Lima, professor da Universidade Federal de Pernambuco, confirma a prática de termos de sigilo, que chama de "corriqueira" e diz que já foi impedido de divulgar resultados.

- Já participei de uma pesquisa sobre urbanização de favelas, do governo estadual de Pernambuco com o Banco Mundial, em que não podíamos divulgar os resultados, nem usá-los em outros estudos - afirma Costa Lima, para quem o sigilo também não se justifica na contratação de pesquisas.

O presidente da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, José Marcos da Cunha, concorda com os colegas, com exceção dos casos de projetos pilotos.

- Não vejo motivos para que estas pesquisas não sejam divulgadas, a não ser talvez em casos de projetos pilotos que se prestam para avaliações de políticas a serem implantadas.

FONTE: O GLOBO

PSB prefere PT em Minas e abala relação de Aécio com Campos

Lula agiu para afastar o PSB mineiro do PSDB e aproximá-lo dos petistas; relação de senador com prefeito também azedou

Christiane Samarco

BRASÍLIA - O PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que sempre operou em Minas Gerais como linha auxiliar do PSDB do senador Aécio Neves, mudou de direção política e caminha rumo ao PT. Isto, graças à influência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que plantou seu ex-ministro Walfrido Mares Guia no comando do PSB mineiro, com a missão de afastar os socialistas dos tucanos e aproximá-los dos petistas.

A operação ainda está em curso, mas já abalou as relações política e pessoal de Aécio com o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), e segundo cálculos de dirigentes do PSB estadual ameaça destruir metade das parcerias seladas na disputa municipal de 2008. Isto sem falar no distanciamento entre Aécio e Eduardo Campos, hoje vistos como dois líderes políticos popstars e presidenciáveis de campos opostos - governo e oposição -, que podem se confrontar em 2014 ou 2018.

O clima é tenso entre as duas legendas e nem mesmo uma conversa reservada e a sós entre Aécio e Campos, uma semana atrás, em Recife, foi suficiente para reverter o distanciamento que vai além das montanhas de Minas. Que o diga o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que mantém socialistas no secretariado, mas já dá por perdida a aliança eleitoral para eleger o tucano José Serra prefeito da capital paulista.

Decepção. Aécio mostrou-se desanimado especialmente em razão do comportamento de Lacerda. Tucanos e socialistas lembram que o prefeito chegou a dar declarações simpáticas à reeleição da presidente Dilma Rousseff, embora Aécio, um de seus padrinhos na política, tenha anunciado que pretende disputar a Presidência.

Na quinta-feira passada, foi a vez de um expoente da ala aecista do PSB mineiro alertar o governador pernambucano e presidente nacional do partido. O interlocutor de Campos falou claramente que Mares Guia está "atropelando" acordos fechados com os tucanos para compor com o PT.

Campos foi advertido de que está havendo um "alinhamento automático" do PSB com o PT em Minas. E não apenas em pequenos municípios do interior, mas também em cidades-pólo, como Uberlândia, onde o PSB municipal já compôs com o PT, e em Governador Valadares, um dos locais em que o acerto com os petistas é iminente.

Os socialistas também tendem a fechar com o PT em Poços de Caldas, Teófilo Otoni, Ipatinga, Divinópolis e Betim.

"O Aécio acreditou na aliança e no Marcio, mas o prefeito está seguindo o Walfrido", conclui um dirigente do PSB mineiro, para quem o erro do tucanato foi não ter preparado uma alternativa eleitoral da própria legenda. Este dirigente está convencido de que, se o PSDB tivesse um nome "minimamente viável" para enfrentar Lacerda em Belo Horizonte, o jogo de forças estaria mais equilibrado.

Apesar das dificuldades, este socialista afirma que ainda aposta na relação com Aécio e trabalha pela reaproximação. Mas em um cenário em que o prefeito passa a ser contabilizado como expoente da ala do PSB petista de Mares Guia, fica difícil imaginar que o PSDB repita o erro de não ter opção própria para disputar o Palácio Tiradentes, sede do governo de Minas, em 2014.

Pimentel. Em recente reunião em São Paulo, o ex-prefeito de Belo Horizonte e ministro da Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel (PT), comunicou aos socialistas que não deseja mais ser candidato a governador de Minas daqui a dois anos.

Pimentel teria dito que o candidato será Marcio Lacerda e a direção nacional do PSB avalia que o prefeito é mesmo o nome natural do partido ao governo. Lacerda só não é mais o "trunfo" que Aécio um dia imaginou negociar com o PSB de Campos - na época o ex-governador tucano tinha como principal ponte na legenda socialista o ex-ministro Ciro Gomes, atualmente sem a mesma força na sigla -, ofertando-lhe o governo de Minas em troca do apoio à sua candidatura ao Palácio do Planalto.

Ninguém tem dúvidas de que, depois da vitória da reeleição com mais de 80% dos votos válidos e do sucesso administrativo do governo pernambucano, Campos tem cacife para se lançar na disputa presidencial.

Ele e Aécio só não devem se confrontar diretamente na próxima corrida pela Presidência porque Lula já interveio, oferecendo ao socialista a vice de Dilma em 2014.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Estudo vê reeleição como desvantagem

Dados indicam que candidatos a prefeito têm desempenho mais fraco quando concorrem no exercício do cargo

Daniel Bramatti

Os cientistas políticos Ricardo Ceneviva e Thomas Brambor analisaram dados das eleições municipais de 1996, 2000, 2004 e 2008 e fizeram uma descoberta que contraria praticamente tudo o que já se escreveu sobre o instituto da reeleição: no caso dos prefeitos, o fato de estar no cargo durante a campanha mais atrapalha do que ajuda na busca pelos votos.

A conclusão é surpreendente porque a taxa de reeleição nas prefeituras é alta - chega a 62%, nas médias das três últimas disputas municipais. Mas não é correto relacionar diretamente esse índice a supostas vantagens inerentes ao exercício do cargo - maior visibilidade e "uso da máquina", por exemplo. Obviamente, há outros fatores que influenciam o eleitorado.

Um prefeito que se reelege, é bom lembrar, já venceu uma eleição antes, e, portanto, já demonstrou ter vantagens em relação aos demais candidatos. Essas vantagens podem ser carisma, mais dinheiro na campanha, força do partido, entre outras.

Para evitar que essas variáveis contaminassem sua pesquisa, o brasileiro Ceneviva (pesquisador do Centro de Estudos da Metrópole/Cebrap) e o alemão Brambor (da universidade Stanford) limitaram o número de candidatos a serem avaliados, com base em sua performance nas urnas.

Tome-se como exemplo alguém que tenha, em sua primeira campanha, o dobro dos votos do segundo colocado. Pode-se concluir, com alto grau de certeza, que se trata de uma pessoa popular, cuja campanha foi bem conduzida e contou com respaldo dos grupos políticos majoritários no município. Se essa mesma pessoa vence quatro anos depois, pode-se dizer que o resultado se deve a uma vantagem inerente ao instituto da reeleição? A resposta é não - provavelmente, o candidato venceu graças aos mesmos fatores que o levaram à vitória na primeira disputa.

Políticos "especiais" como esses não foram levados em conta no estudo. Foram considerados apenas aqueles que, ao serem eleitos pela primeira vez, tiveram vitória apertada, por margem pequena em relação ao segundo colocado. Isso significa que fatores como carisma, dinheiro e estrutura de campanha não representaram vantagem significativa.

O passo seguinte foi analisar o desempenho eleitoral desses "vencedores por pouco" quatro anos depois, quando estar no cargo de prefeito era o fator que marcava a diferença fundamental em relação a suas campanhas anteriores. A lógica indica que, se a reeleição fosse uma vantagem, esses candidatos teriam uma margem de vitória maior que na campanha anterior.

Mas não foi isso que os números mostraram. Na maior parte dos casos, os prefeitos que buscaram se reeleger tiveram margem menor em relação ao segundo colocado - ou mesmo perderam para os desafiantes. Na média de 4 mil candidatos, a margem caiu 4 pontos porcentuais.

O estudo não avaliou as causas do fenômeno. Mas detectou que a desvantagem dos prefeitos é maior nas cidades pequenas e mais pobres. Prefeitos do PT, diferentemente dos demais, têm pequena vantagem eleitoral ao buscar a reeleição.

Pesquisa considera resultados de mais de 4 mil candidatos

O estudo de Ricardo Ceneviva e Thomas Brambor analisou dados de 22 mil disputas municipais, entre 1996 e 2008, e de mais de 40 mil candidatos.

Levando-se em conta apenas os candidatos que, ao serem eleitos pela primeira vez, tiveram vitórias apertadas (margem de até 5 pontos porcentuais), esse universo cai para cerca de 4 mil candidatos.

A pesquisa observou que a desvantagem eleitoral dos detentores de cargos de prefeito tem diminuído ao longo do tempo. Na disputa de 2008, na média, houve até vantagem para os que buscaram a reeleição. Mas ela é pequena e "estatisticamente insignificante", de acordo com os pesquisadores.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Como recuperar a crença nos partidos

Juliana Bublitz

Prestes a escolher seus candidatos às eleições municipais, as legendas vivem crise crônica de credibilidade provocada por fatores como falta de identidade e excesso de siglas.

O Brasil tem 29 partidos. Sem pesquisar no Google, você é capaz de citar pelo menos metade deles de cabeça?

A dificuldade para responder é mais comum do que parece e, segundo especialistas, pode estar por trás de um fenômeno indicado por diferentes institutos de pesquisa: a maioria dos brasileiros não confia nas siglas partidárias. E não é de hoje.

O último levantamento sobre o tema, divulgado no dia 15 pela Fundação Getulio Vargas (FGV), revela que 94% dos entrevistados veem os partidos com suspeição. Em outra enquete, publicada pelo Vox Populi no dia 4 deste mês, 60% admitem não simpatizar com nenhuma legenda.

– As pessoas têm razão ao criticar. A situação chegou a um patamar em que ninguém mais sabe quem é oposição e quem é situação – resume o cientista político Valeriano Costa, da Unicamp.

Mas não é só isso. A descrença, na opinião do cientista político André Marenco, da UFRGS, é resultado de uma história marcada por rupturas. As constantes mudanças de regime, intercaladas por períodos de exceção, como o Estado Novo e a ditadura militar, retardaram a consolidação dos partidos. Com duas décadas de democracia, não é exagero afirmar que a maioria dos brasileiros sequer sabe para o que eles servem.

– As principais siglas, como o PMDB e o PT, têm apenas 30 anos. Na Europa, elas têm mais de cem, e isso faz diferença – destaca Marenco.

O problema é que a desconfiança crônica vem sendo turbinada desde a década de 1980. Nas Diretas Já, setores da sociedade chegaram a depositar esperanças nas novas legendas, mas a euforia durou pouco. A partir da redemocratização, as agremiações se multiplicaram em velocidade acelerada. Muitas mudaram de nome. A infidelidade partidária e as alianças de ocasião, unindo adversários em troca de cargos públicos, contribuíram para confundir o eleitorado.

– A verdade é que os partidos foram se esvaziando de ideias, de princípios e de ideologias. Em nome da governabilidade, alguns fazem coisas que até o diabo duvida. Aos olhos da população, ficaram todos iguais – lamenta o ex-governador Alceu Collares, um dos ícones do PDT no Estado.

Reforma política pode indicar saídas

Para completar o cenário, a corrupção ganhou as manchetes dos jornais e entrou em evidência como nunca. Casos como o do mensalão, que atingiu em cheio o petismo, abalaram de vez a fé dos eleitores, até os mais convictos.

– Se os partidos já eram frágeis antes, com todos esses escândalos a fragilidade só se acentuou – diz o cientista político Paulo Moura, da Ulbra.

Apesar de tudo, os especialistas acreditam que a crise de credibilidade tem saída. Inclusive porque, curiosamente, o voto nulo ou branco nunca teve grande expressão no país e, mesmo com o pé atrás, 40% dos brasileiros disseram ao Vox Populi se identificar com algum partido – o que não é pouco.

A reversão dos baixos níveis de confiança depende das próprias agremiações e de seus líderes, de uma reforma política eficaz e, principalmente, da capacidade do eleitorado de punir as siglas descomprometidas. Previstas para junho, as convenções definirão candidatos e coligações para as próximas eleições. A palavra final, no entanto, não é deles: é de quem vota.

O que dizem as pesquisas

FGV
Este ano, a FGV mapeou o grau de confiança dos brasileiros nas instituições. As siglas apareceram em último lugar.

Partidos
Avaliação                       RS         Brasil
Pouco ou nada confiável 94,2%    94,0%
Confiável ou muito confiável 5,1%   5,4%
Não sabe                          0,6%       0,6%

IBOPE

Desde 2009, o Ibope mede o Índice de Confiança Social em países como Brasil e Argentina. Até 2011, os partidos estavam na lanterna entre os brasileiros e na penúltima posição entre os argentinos. A nota vai de zero a cem. Nos dois países, o Corpo de Bombeiros é a instituição campeã na pontuação.

Nota dos partidos

           Brasil     Argentina

2011  28           41

2010 33           32

2009 31            25

IPESPE

- Em 2008, o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas criou o barômetro de confiança nas instituições: 72% disseram não confiar nos partidos.

USP
- Em 2002, a USP ouviu 17 mil pessoas para medir o índice de confiança nas instituições. Os partidos ficaram em último lugar: 7% dos entrevistados disseram confiar nos partidos.

FONTE: ZERO HORA (RS)

José Álvaro Moisés, cientista político da USP: As legendas deixaram de ser uma referência

Diretor do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), José Álvaro Moisés estuda a percepção dos brasileiros em relação às instituições desde os anos 80. Autor e organizador de mais de uma dezena de livros sobre o tema, o professor de Ciência Política da USP conta que a descrença nas agremiações nem sempre prevaleceu.

Zero Hora – Por que o nível de confiança nos partidos é tão baixo?

José Álvaro Moisés – As pessoas têm uma percepção muito forte de que os partidos e os políticos, em geral, não cumprem bem suas funções. Não representam a população e, muitas vezes, só querem atender os próprios interesses.

ZH – Sempre foi assim no Brasil?

Moisés – Os partidos tiveram uma imagem mais positiva sempre que se iniciavam novos regimes, principalmente em 1945 e em meados dos anos 1980. Nessa última fase, havia uma expectativa de que eles completariam a passagem para o regime democrático e atenderiam às reivindicações da população. Isso foi maior em relação ao PT, que, com o mensalão, sofreu uma queda. Mesmo assim, os petistas ainda têm a maior preferência, mas nunca ultrapassam os 12%. São índices relativamente baixos. Os outros partidos, como o PMDB e o PSDB, têm 2, 3, 4%.

ZH – Por que a pessoas perderam a confiança nas legendas?

Moisés – À medida que os partidos chegaram ao poder, ficaram mais pragmáticos, perderam de vista seus programas e conteúdos ideológicos. Além disso, tanto os de esquerda quanto de direita migraram para o centro. Qual é, hoje, a grande diferença entre PT e DEM ou entre PMDB e PSDB? Da parte do eleitor, eles deixaram de ser vistos como uma referência.

ZH – O excesso de partidos no país contribuiu para isso?

Moisés – Quando você tem um número muito grande, em que muitos deles se assemelham, tende a confundir os eleitores. As pessoas passam a ver o político A e B e não mais o partido.

ZH – Qual é a solução?

Moisés – Sou favorável que se estabeleça no Brasil a cláusula de barreira. A cláusula determina que o partido deve ter um percentual mínimo de votos em um número significativo de Estados para estar representado no Congresso e ter direito ao fundo partidário e tempo de TV. Acredito que, no Brasil, o partido deveria ter 5% dos votos em pelo menos nove Estados. Com isso, diminuiria drasticamente o número de partidos. Provavelmente, teríamos apenas seis ou sete e, ao mesmo tempo, haveria uma busca por diferenciação. Fora isso, os líderes partidários precisam dar o exemplo. Têm de mostrar a capacidade que seu partido tem de atender os interesses públicos, e não particulares.

FONTE: ZERO HORA (RS)

O "B" e o "C":: Merval Pereira

Como não podia deixar de ser, o papel dos Brics no cenário mundial foi tema recorrente em várias palestras no encontro da Academia da Latinidade que terminou na sexta-feira aqui em Pequim. Entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, na visão do secretário-geral da academia, o cientista político Candido Mendes, os poderes emergentes se diferenciam, a começar pelo fato de que existem quatro nações em desenvolvimento e a Rússia "em franca regressão".

Dentre eles, há o protagonismo de Brasil e China, a situação brasileira reforçada pela política externa "de afirmação de independência" no Oriente Médio, de avanço nas ações africanas, mas, sobretudo, segundo ele, de "descontextualização da antiga moldura latino-americana".

Para Candido Mendes, o Brasil entra nessa globalização não hegemônica que se desenha com parceiros que seriam impensáveis há 20 anos e, nesse quadro, o protagonismo de Brasil e China pode ser constatado na expansão das atividades dos dois e na consequente competição, na África.

A China está em vários países africanos - Angola, Moçambique, Cabo Verde - e, na visão de Candido Mendes, não na velha posição demagógica de Fidel Castro, mas na perspectiva de criar uma política de desenvolvimento social e de mobilização. "Até diria que a China está avançando sobre o Brasil, mesmo na antiga África portuguesa."

Ele vê "uma parentela natural" entre as duas imensas nações voltadas para seus mercados internos. O lado discordante dessas políticas faz parte do jogo democrático, com cada país defendendo seu interesse imediato, mas há um enorme espaço, segundo Mendes, para uma parceria.

Dentre essas nações, na sua opinião, o Brasil é aquela que tem o melhor regime democrático, pois a Rússia está deixando de ser uma democracia, a Índia tem o regime dos párias, e a África do Sul tem problemas regionais dos mais graves.

Mas tem que ser levado em conta, ressalta Candido Mendes, que a China não é um país inerte do ponto de vista político e social. "Basta ver a presença universitária chinesa, a mobilização interna da China do ponto de vista cultural, 250 milhões de pessoas visitando os museus todos os anos."

Esses dois países tem posições de liderança, mas são distantes entre si, e as condições objetivas para uma provável convergência histórica ainda precisam ser montadas através do conhecimento recíproco.

Candido Mendes fala de intercâmbios universitários e culturais, a começar por um festival de cinema nos dois países. Ele acha que o aprofundamento do conhecimento das realidades será viabilizado pela nova postura da China, que sempre foi um país voltado para seu interior e agora está num processo de globalização acentuado.

O professor Enrique Larreta, diretor de Pluralismo Cultural do Instituto Candido Mendes e que tem se dedicado a estudar a China, onde passa temporadas pesquisando na Academia de Ciências Sociais de Xangai, ressalta que esse processo de globalização tem sido bem recebido pela população chinesa e começou nos anos 40 do século passado, depois da Guerra do Ópio, quando ocorreu um grande debate no país sobre como entrar na modernidade.

Um forte movimento pedia "a senhora ciência" e "a senhora democracia", estudantes queriam acabar com toda a tradição, inclusive os ideogramas.

Mao era um modernista, e desse processo nasceu a revolução marxista de 1949, que teve sua base na questão agrária, num país com quase 70% de camponeses.

O processo de modernização começou com Deng Xiaoping e prossegue nos últimos 30 anos. Um marco foi a entrada na Organização Mundial do Comércio, que foi considerada aqui uma grande vitória.

Hoje, segundo Larreta, há processos de regularização jurídica, tratados de direitos humanos assinados, com monitoramento de resultados. Há um processo de liberalização em curso, com retrocessos, muitas dimensões, mas inegável, ressalta Larreta.

A população está de acordo. E, como não é democrático, o regime chinês precisa se legitimar de alguma maneira sem ser pela força. "Aí entra a questão do bem-estar, o regime tem que ser eficaz, tem que manter o sucesso econômico e fazer o país se desenvolver", adverte, lembrando que há problemas sérios de etnias, como o Tibete, e a liberalização afeta bastante os conflitos étnicos, que são uma expressão da democracia, com espaços, mesmo que limitados, para a reivindicação de direitos.

Um bom exemplo de espaços de reivindicação numa ditadura é a reação da opinião pública, liderada pelas denúncias de jornais - todos estatais -, de crítica aos responsáveis pelo desastre do trem-bala há cerca de um ano, quando toda a burocracia responsável foi demitida e culpada pelas mortes.

O aspecto político da união dos Brics, ressaltado por Candido Mendes, foi dissecado pelo professor Walter Mignolo, da Duke University, que atribuiu o sucesso econômico do grupo à desobediência aos organismos internacionais como FMI ou Banco Mundial, assumindo uma tarefa de descentralizar a governança econômica mundial.

Ele chama a atenção para a necessidade de o grupo encontrar uma coerência política interna, o que, aliás, é um objetivo explicitado na última reunião em Délhi, na Índia.

Além disso, Mignolo vê nos Brics uma questão ética subjacente, a de ser um grupo formado por lideranças "não ocidentais", no sentido de serem países que de uma maneira ou de outra foram colonizados pelas potências ocidentais - Mignolo acha que a China com a globalização sofre com a lógica da colonização, embora nunca tenha sido colonizada diretamente - e hoje se mantêm independentes, ganhando força nos organismos internacionais anteriormente dominados por europeus e americanos.

Essa tese do professor de Duke foi rebatida tanto por scholars chineses durante os debates, pois não houve nenhum que se mostrasse insatisfeito com os progressos alcançados nos últimos 30 anos, e também por Enrique Larreta, que ressaltou que os laços culturais da China são tão fortes que o nome em chinês dos Estados Unidos (Meiguo) quer dizer "país bonito".

FONTE: O GLOBO

Espalha brasa:: Dora Kramer

Convocado ou não, o governador Marconi Perillo está pronto para ir à CPMI que investiga as conexões público-privadas da organização Cachoeira e nesta terça-feira decide, além da quebra de sigilos da matriz da construtora Delta, se chama ou não para depor os governadores de Goiás, Brasília e Rio de Janeiro.

Caso a comissão resolva não convocar os governadores, Perillo (GO) examina fortemente a hipótese de ainda assim se oferecer para depor. Contraria, nessa posição, a opinião de seu partido (PSDB) que considera sua ida arriscada por expor o governador a um massacre político patrocinado pelo PT.

Marconi Perillo concorda em parte. Acha que é mesmo alvo de "uma CPMI que nasceu direcionada para atingir a imprensa, desmoralizar o procurador da República, enfraquecer a oposição e desviar o foco do julgamento do mensalão".

Por isso, em princípio não veria "razão objetiva" para ser convocado. Mas, segundo ele, as "razões subjetivas" existem e não podem ser ignoradas.

Dos três governadores, reconhece, é o mais atingido. Portanto, melhor ir "e esclarecer tudo de uma vez" do que não ir e sangrar na opinião pública como suspeito.

Uma espécie de contra-ataque no qual incluirá a apresentação de uma proposta para que se faça a CPI das Empreiteiras. "Aí se poderia obter um quadro bastante realista sobre financiamentos de campanhas eleitorais no Brasil."

O roteiro de Perillo na CPMI já está praticamente concluído: da exposição inicial - em que ressaltará a importância de instrumentos de fiscalização como comissões de inquérito - aos documentos que levará mostrando que os negócios da Delta em Goiás começaram no governo do PMDB e prosperaram também em administrações do PT.

Sobre a venda da casa onde foi preso Carlos Augusto de Almeida Ramos no fim de fevereiro, exibirá uma entrevista que deu na ocasião dizendo exatamente o que Wladimir Garcez Henrique - lobista da Delta e braço direito de Cachoeira - disse à CPMI na última quinta-feira.

"Não há choque de versões", atesta. Na edição de 3 de março, o jornal O Popular, de Goiás, registra que o governador contou ter sido procurado por Wladimir, interessado em comprar a casa. "Quando fui passar a escritura, ele me informou que o (empresário) Walter Paulo seria o comprador. Recebi três cheques e fui fazendo os depósitos como combinado."

Sim, mas como o governador explica ter recebido os três cheques assinados por Leonardo de Almeida Ramos, sobrinho de alguém que já havia sido protagonista do escândalo Waldomiro Diniz?

Pois é, não explica. Atribui a "erro imperdoável" o fato de não ter verificado a identidade de quem assinada os cheques. "Daí o desgaste extremo que venho sofrendo."

Segundo ele, injusto, pois "quem primeiro levou Cachoeira a fazer negócios com o governo foi o Maguito (Vilela, do PMDB), em 1995, para exploração da loteria estadual por meio da empresa Gerplan".

A Delta, de acordo com o governador, entrou em Goiás pelas mãos do mesmo partido quando Íris Rezende era prefeito de Goiânia, em 2005.

Perillo apresentará à comissão certidões do tribunal de contas mostrando que entre 2005 e 2011 a empreiteira recebeu cerca de R$ 300 milhões de contratos firmados em Goiânia, Aparecida de Goiás, Anápolis e Catalão, em gestões do PT e do PMDB.

Com isso, pretende demonstrar a "diversificação" geográfica e partidária da atuação da Delta em Goiás.

Voltemos a Carlos Cachoeira, já que Perillo é citado nos grampos da Operação Monte Carlo que registra um telefonema dele para o hoje presidiário e na época prestigiado empresário no Estado - "morava no edifício onde moram os mais ricos de Goiânia".

O governador qualifica suas relações com ele como "absolutamente esporádicas". E o que significa isso?

"Que o recebi uma vez a pedido do senador Demóstenes, que o encontrei em dois ou três jantares e que telefonei para ele uma vez para cumprimentar pelo aniversário."

A propósito de quê, se não eram próximos? "Estava numa festa, bebendo vinho numa roda de amigos que sugeriram e eu telefonei."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Dentro da Casa Branca:: Eliane Cantanhêde

O anúncio de que o diplomata de carreira Ricardo Zúñiga será o principal assessor da Casa Branca para as Américas foi muito bem recebido pelo Itamaraty e, em geral, pelo governo brasileiro.

A avaliação é de que a decisão de Obama é uma vitória do embaixador dos EUA em Brasília, Thomas Shannon, e consolida a orientação formalizada pelo Council on Foreign Relations em meados do ano passado: o Brasil não pode ser visto apenas no contexto sul-americano ou latino-americano, mas com um foco específico, individualizado. Como, aliás, já ocorre com outros parceiros dos Brics: a Índia e, obviamente, a China.

Zúñiga é, atualmente, assessor político da embaixada e não é coincidência que saia deste cargo direto para a Casa Branca. O Itamaraty tem certeza de que a nomeação "teve o dedo" de Shannon, respeitado na cúpula do governo e badalado nos corredores do Departamento de Estado como "the brain" (o cérebro).

Ele era o homem da diplomacia dos EUA para as Américas antes de vir para Brasília e sua chegada já foi saudada como um degrau a mais do novo patamar do Brasil na percepção de Washington. A ida de Zúñiga é um novo degrau.

De família hondurenha, ele fala português fluentemente (com sotaque de Portugal) e está há cerca de dois anos no Brasil, tempo suficiente para compreender o país, costurar bons contatos diplomáticos e políticos e ilustrar a Casa Branca sobre a ascensão econômica e diplomática brasileira. E, claro, sobre o que se passa por aqui, internamente.

De quebra, o novo assessor da Casa Branca -uma espécie de Marco Aurélio Garcia de Obama- é considerado culto, bem-humorado e... especialista em Cuba. Este dado é sempre importante e se torna crucial na mesma proporção em que a idade e a doença de Fidel Castro avançam. O futuro de Cuba, aliás, é um dos itens do cardápio que atrai norte-americanos e brasileiros para a mesma mesa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

De Alpoim@edu para Graça.Foster@gov:: Elio Gaspari

Dona Maria das Graças,

Eu e a Lota de Macedo Soares ficamos na maior felicidade quando soubemos que a senhora comprará para a Petrobras o terreno onde está o quartel-general da Polícia Militar do Rio de Janeiro, na Rua dos Barbonos, que hoje chamam de Evaristo da Veiga. Há mais de 250 anos eu desenhei a estrutura do aqueduto que abasteceu o Centro do Rio, os Arcos da Lapa. Ele ia do Morro da Santa Teresa ao de Santo Antônio. Foi uma obra sem maiores pretensões que hoje é uma das belezas da cidade. No governo do senhor Kubitschek, desmontaram parte de um dos morros, atirando a terra na orla que ia da ponta do Calabouço a Botafogo. Eu vi como Dona Lota transformou esse aterro na joia que é. Não fosse ela, aquilo viraria um carrascal cortado por pistas de carros.

Pois, enquanto os burocratas foram dobrados por Lota em relação ao despejo da terra, prevaleceram na urbanização da área onde estivera o morro. Fizeram uma avenida chamada Chile, ligando o Largo da Carioca à rua que tem o nome do Senhor Marquês do Lavradio. Um quilômetro de desastre e desconforto, frio na aparência, infernal na temperatura, sem árvores que nos deem sombra. Agravou-se a ofensa com a construção de edifícios recuados, hostis ao pedestre. Isso para não falar do prédio da Petrobras, muito feinho, que passa por moderno porque fica ao lado da catedral mais horrível destas terras de Nosso Senhor. Não há no Rio outra avenida desse tamanho onde não se possa parar para um café ou, no caso dessa trilha de camelos, beber um copo d"água.

O terreno de 13.500 metros quadrados do quartel que a senhora quer comprar por R$ 336 milhões vai dos fundos da Petrobras à Rua Evaristo da Veiga. Faça um concurso internacional de arquitetura, não dê o projeto a amigos da casa. Mais que isso, provoque o remanejamento do tráfego dos pedestres. Se a Petrobras abrir um espaço na Evaristo da Veiga, criará um acesso aprazível à Avenida Chile para quem vem do muito lindo Passeio Público. Quem sabe a senhora oferece uma ajuda ao arcebispo D. Orani Tempesta para que ele cristianize a área adjacente à catedral. Juntos, vosmecês farão um jardim que ocupará quase todo o lado da avenida onde estão vossos prédios. O Burle Marx, que cuidou da paisagem do Aterro, assegura que ali se pode fazer uma das mais belas praças do velho Centro. A Petrobras tem 17 jardins suspensos. Arborize o chão dos cariocas, a senhora não perderá área útil para sua torre.

Do seu vassalo

José Fernandes Pinto Alpoim, engenheiro militar

O aborto ao alcance de todos. Um levantamento do Ministério da Saúde revelou a existência de 359 sites que vendem ilegalmente na internet a droga abortiva Cytotec. Cobram R$ 350 pelo kit de cinco comprimidos. Enquanto a questão do aborto é mantida numa moldura teológica, a vida real ensina que ele está ao alcance de todas as mulheres que aceitam colocar sua saúde em risco, tomando a droga sem assistência médica. (A história da agulha de tricô é lenda, e nela acreditou até a doutora Dilma durante a campanha eleitoral.)

Desde o final do século passado o problema dos médicos deixou de ser o atendimento a mulheres que buscam abortos clínicos. Na absoluta maioria dos casos, as pacientes chegam a eles com os efeitos adversos do Cytotec e só lhes resta dissuadir as jovens que veem na droga um anticoncepcional de última instância. Tomaram o primeiro, resolveram o problema e pretendem tomar o segundo.

Todo mundo ganharia se, em vez de se discutir se o aborto deve ou não ser permitido, o assunto fosse tratado como uma coisa que está aí, ao alcance de todos (com R$ 350 no bolso), arriscando a saúde das mulheres, muitas vezes de adolescentes.

Greve na UFF. Há na Universidade Federal Fluminense professores que defenderam a greve iniciada na terça-feira, sem dia para terminar, em busca de um novo plano de carreira e melhores salários. Hoje o piso por 20 horas de serviço vale R$ 557, e eles pedem R$ 2.239.

O que não se deve supor é que os três mil professores da instituição decidiram parar. Normalmente, as assembleias que puxavam greves tinham pelo menos 400 professores, representando institutos e departamentos. Desta vez, a assembleia teve cem mestres representando a si próprios. Para reforçar seus argumentos, além de recorrer a piquetes, uma milícia bloqueou com tapumes dois portões de acesso ao Instituto de Ciências Humanas e Filosofia. Sem tapumes nem piquetes, na sexta-feira a greve desmanchou-se no ar.

Sono do Planalto. A doutora Dilma é uma gerentona. Tudo bem. Resta saber por que há 60 listas para preenchimento de vagas no Superior Tribunal de Justiça e em tribunais federais, trabalhistas e eleitorais dormindo nas prateleiras do Planalto.

Nunca aconteceu isso.

Miau au.  A cidade de São Paulo tem quatro milhões de bípedes vivendo em áreas onde não há hospitais públicos.

O prefeito Gilberto Kassab pretende comprar equipamentos e custear a operação de um hospital público para cães e gatos. (Eles seriam três milhões na cidade.)

Quando um trabalhador de São Miguel Paulista, onde há um tomógrafo encaixotado desde o final do ano passado, entrar nesse hospital latindo, sobre quatro patas, será posto para fora?

A fera tunisiana. No dia 17 de dezembro de 2010, o vendedor de frutas tunisiano Mohamed Bouazizzi ateou fogo às vestes em frente à prefeitura da cidade de Sidi Bouzid. Semanas depois, morreu. Seu caso acendeu a fagulha que incendiou o mundo árabe, derrubando os governantes da Tunísia, do Egito e da Líbia.

À época, noticiou-se que uma policial (Faida Hamdi) achacava-o sistematicamente. O companheiro Barack Obama referiu-se a ela, dizendo que era uma policial e esbofeteara o vendedor.

O jornalista Michael Totten foi a Sidi Bouzid e conversou com Faida. Resultou no seguinte:

1) Ela não é policial, mas fiscal da prefeitura.

2) Nunca portou arma nem esbofeteou Bouazizzi. Se o tivesse feito, uma mulher batendo num homem teria sido notícia na cidade.

3) Ela nunca falara com ele.

4) "Eu não aceito propinas." (Acredita quem quiser.)

5) Foi presa e condenada a quatro anos de cadeia. Durante algum tempo, nenhum advogado aceitou defendê-la.

FONTE: O GLOBO