domingo, 29 de julho de 2012

OPINIÃO DO DIA – Marco Aurélio Nogueira: corrupção

A corrupção é uma falha ética. Anda junto com o poder (político, econômico ou ideológico), como se fosse uma espécie de efeito colateral: onde há poder e poderosos há sempre a probabilidade de abuso, e no abuso está a raiz da corrupção.

Nos tempos hipermodernos em que nos encontramos, a corrupção tornou-se um problema que desafia e surpreende. Redes, tecnologias de informação e comunicação, uso intensivo do espaço virtual, uma mentalidade que transforma tudo em mercadoria, oportunidade e negócio, um desejo socialmente incontido de consumir e ostentar, tudo isso atiça a corrupção. Faz com que ela tenda a ficar fora de controle, a ultrapassar fronteiras, a se sofisticar. O crime organizado, o narcotráfico, os atentados ambientais, a luta sôfrega por mercados, a facilidade com que se obtêm informações, são muitos os combustíveis.”

Marco Aurélio Nogueira, professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp. A corrupção ainda no primeiro plano. O Estado de S. Paulo, 28/7/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Mensalão desviou R$ 101 milhões

FOLHA DE S. PAULO
Síria lança ofensiva para retomar a maior cidade
Indústria de armas no Brasil exporta pouco
Especial - Mensalão: Como será o maior julgamento já feito pelo STF
Caso de Collor inspira defesa de réus do mensalão
Teles dobram total de clientes para cada antena

O ESTADO DE S. PAULO
Dilma adota agenda positiva para se afastar do mensalão
Governo critica participação de Marina Silva
Interior lidera consumo no País

CORREIO BRAZILIENSE
Advogados tentam adiar julgamento

ESTADO DE MINAS
Minas dá a receita do crescimento
Mensalão: Ação articulada tenta atrasar o julgamento

ZERO HORA (RS)
A palavra final sobre o mensalão
Turbulência sacode passageiros
Vagas no polo naval

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Segurança é assunto de prefeito, sim senhor...
Planos de saúde conseguem driblar punição

Geografia, política e destino - Luiz Sérgio Henriques

Há muitas décadas corria, na América do Norte, uma expressão que passava por espirituosa e pretendia sintetizar o contraste entre o protagonismo dos Estados Unidos e o caráter muito menor da presença canadense no mundo. O Canadá, segundo tal expressão, sofreria de um mal irreparável: sua geografia era tudo, a história, quase nada. Duplo preconceito, é evidente, contra a geografia e contra um país tão plural, diversificado e original quanto o poderoso vizinho mais ao sul.

De uma certa forma, padecemos de síndrome semelhante, que deu origem a inúmeras expressões de autoironia: o "transoceanismo" das nossas elites, inclusive culturais, deixava-nos de costas para a realidade americana, as ideias e as crenças nos vinham com o último paquete da França e nos custou muito adquirir paulatinamente, a partir da intensa modernização do País no século 20, a noção do nosso enraizamento numa realidade nova e desafiadora, bem distante, muitas vezes, do padrão metropolitano. Custou-nos descobrir, afinal, que geografia é destino - logo, é algo saturado de história, com seus dramas, encruzilhadas e até imprevistas acelerações.

É por isso que já agora nos atingem tão diretamente as peripécias individuais dos nossos vizinhos, as marchas e contramarchas do processo de unificação sul-americana: a necessária integração física do subcontinente, o aumento dos seus fluxos de comércio, a elaboração possível de um ponto de vista original sobre o mundo nesses países, em si tão variados e até estruturalmente desiguais, da América ibérica.

O fato é que por aqui convivem, numa assimetria evidente de tempos históricos, países que, como o Brasil, a Argentina ou o Chile, seria melhor considerar como membros plenos de um "extremo Ocidente", com sociedades e economias que se abriram, de um modo ou de outro, à participação dos setores subalternos; e países que, por sua vez, ainda vivem o acidentado processo de expansão das suas Repúblicas para além do restrito âmbito oligárquico. Um processo que, não raro, ocorre de modo autoritário e conduzido "pelo alto", como, aliás, se deu entre nós, nos anos 30 do século passado, e que agora parece reproduzir-se nos países da "revolução bolivariana", especialmente naquele que se singulariza por altíssimas reservas de petróleo e por uma agressiva liderança carismática, capaz de se arvorar, com alta dose de voluntarismo, em porta-bandeira de resistência ao neoliberalismo e de construção do socialismo no novo século.

Geografia e história se misturam, e não se trata de experimentos conduzidos in vitro ou, para citar expressão sugestiva, não são acontecimentos que possam transcorrer "num ringue convencionalmente regulado". Pode acontecer, por exemplo, que ações positivas de democratização social - ou que apontem nesse sentido - se entrelacem com visões esquemáticas da política e da sociedade. Nem tudo, em nuestra América, é Ocidente, ainda que extremo e periférico, razão pela qual, mesmo em ambientes de esquerda, pode predominar uma sociologia política rudimentar, que vê, de um lado, o presidente e o povo, em ligação imediata e sem restos, e, de outro, o conjunto das mediações sociais e instâncias organizativas, vistas como algo irreparavelmente oligárquico e elitista.

Nascem assim projetos autoritários de mudança social, que mais adiante vão cobrar seu preço - tal como aquele cobrado, no final do século 20, pelo esgotamento e pelo colapso das experiências igualmente autoritárias do antigo "socialismo real". As instituições clássicas da democracia política - o Parlamento, o Judiciário independente - são vistas como um obstáculo à mudança, e daí para sua descaracterização e manipulação, em contextos de autoritarismo eleitoralmente competitivo, vai um passo curto, que costuma atrofiar por décadas o florescimento de uma convivência civil livre e autônoma. A própria ideia de uma sociedade civil plural e articulada, como um valor em si mesmo, como espaço de luta muitas vezes áspera, mas também de permanente recriação de consenso e acordo, se perde em favor da arregimentação militarizada da vida social a partir de cima: do Estado e do seu homem providencial.

Os antigos Estados do Leste Europeu fossilizaram-se num sistema de privilégios, que se tornava visível assim que o olhar crítico ia além da superfície de um certo nível de direitos sociais supostamente universalizados, em troca da passividade política ou de um consenso artificialmente obtido. Faltavam-lhes animação cívica, choque de ideias, possibilidade real de alternância entre grupos dirigentes cada vez mais expostos ao controle dos governados, tanto nos critérios da sua formação quanto no exercício das diferentes instâncias de direção. Naqueles países, o contendor político era, invariavelmente, confundido com o agente externo, com o inimigo de classe, que cabia denunciar e esmagar. Em resumo, faltava-lhes o viço que só pode nascer de uma autêntica dialética democrática.

Muito poucos intelectuais de esquerda - poucos, relativamente -, contemporâneos do erguimento daquele tipo de Estado, souberam ou quiseram apontar os limites "corporativos" da experiência, sua incapacidade de marcar época e se oferecer como alternativa de civilização. Não raro, entregaram-se a exercícios "justificacionistas", como se o atraso relativo de uma sociedade implicasse necessariamente uma política baseada em demiurgos, partido único ou avassaladoramente dominante, bem como em estruturas estatais aquém dos requisitos modernos de liberdade individual e coletiva.
O custo histórico desse erro foi, e ainda é, imenso. E na América Latina, se é que entramos no século 21, a geografia também isolará novos surtos desse tipo, cuja expansividade enganosa só incendeia a imaginação dos sectários.

Tradutor, ensaísta, um dos organizadores das obras de Gramsci no Brasil

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mensalão desviou R$ 101 milhões

Após sete anos de investigação, ao fim de um processo de 50 mil páginas e 600 testemunhas, peritos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União mapearam o tamanho real do mensalão, esquema de pagamento de propina a parlamentares da base do governo Lula. Pelo menos R$ 101,6 milhões foram desviados pelo valerioduto, mostram Carolina Brígido e Francisco Leali. Laudo da PF confirma que o esquema usou verbas públicas: pelo menos R$ 4,6 milhões foram repassados pelo Banco do Brasil, por intermédio do Visanet, para a empresa DNA, do lobista Marcos Valério. O Supremo Tribunal Federal começa a julgar quinta-feira os 38 réus – entre eles, o ex-ministro José Dirceu, apontado como operador político do mensalão, Valério, que pôs bens em nome da filha para fugir do bloqueio judicial, e o ex-deputado Roberto Jefferson, que delatou o esquema e foi cassado por crime eleitoral

O tamanho real do mensalão

Para peritos, R$ 101 milhões abasteceram esquema; laudo confirma uso de verba pública
Carolina Brígido, Francisco Leali

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA . Após sete anos de investigação e mais de 50 mil páginas de processo com inquirição de cerca de 600 testemunhas, peritos oficiais conseguiram mapear o tamanho do mensalão, esquema político de pagamento de propina a parlamentares da base do governo Lula. O chamado valerioduto, que o Ministério Público diz ter sido comandado pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, desviou pelo menos R$ 101,6 milhões. O número foi apurado por investigadores da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Laudo da Polícia Federal confirma também que o esquema usou dinheiro público, originário do Banco do Brasil. Os saques de R$ 4,652 milhões realizados em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro têm como fonte recursos que a empresa DNA, de Marcos Valério, recebeu do fundo Visanet para prestar serviços de publicidade ao BB.

As informações constam da Ação Penal 470, que tem 38 réus e será julgada a partir desta quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Reforçam as chances de condenação de acusados no processo - especialmente daqueles que participaram diretamente das operações financeiras.

Levantamento inédito feito pelo GLOBO nos laudos periciais anexados ao processo detalha como o esquema foi abastecido. Os números incluem dados compilados pelos peritos da Polícia Federal e os produzidos pela defesa. A maior parte dos recursos (R$ 88,695 milhões) passou pelas contas bancárias das empresas de Marcos Valério, acusado de ser o principal operador do mensalão. Em 2003, foram R$ 32,754 milhões. Em 2004, mais R$ 55,941 milhões. Esses valores estão registrados na contabilidade das empresas de Marcos Valério, segundo dados compilados pelos seus contadores.

A maior fatia viria de empréstimos concedidos pelos bancos Rural e BMG às empresas de Valério, que foram inscritos na versão corrigida dos livros contábeis depois que o escândalo veio a público em 2005. Essa cifra chegou a ser questionada pelos peritos da Polícia Federal. Laudo da perícia oficial, que Valério tentou anular, sustenta, após analisar a contabilidade da empresa SMP&B, que os "empréstimos não foram registrados na contabilidade original da empresa, sendo lançados posteriormente, após a divulgação dos fatos na imprensa". Os peritos atestaram, porém, que os empréstimos existiram, apesar de ressaltar que os integrantes da quadrilha montaram um emaranhado de operações financeiras para esconder as transações dos órgãos oficiais e impossibilitar a identificação dos destinatários finais dos recursos.

Cálculo inclui o que duda recebeu no exterior

Somam-se aos empréstimos os R$ 10,8 milhões remetidos por doleiros ao publicitário Duda Mendonça. Contas operadas, segundo a Polícia Federal, pelo Banco Rural e por empresas com sede em paraísos fiscais foram usadas para saldar no exterior as dívidas do PT com o marqueteiro que trabalhou para a campanha do ex-presidente Lula em 2002.

Os peritos da PF e auditores do TCU encontraram ainda recursos que deixaram de ser repassados ao Banco do Brasil e foram embolsados pela DNA, uma das empresas de Valério. Auditores do TCU analisaram notas fiscais que a DNA apresentou para justificar serviços de publicidade prestados ao BB.

Para os auditores, só no universo analisado, a DNA deixou de repassar ao banco R$ 2,923 milhões. Esse dinheiro seria referente ao "bônus de volume" (BV), uma bonificação concedida no meio publicitário que, segundo o contrato entre a DNA e o Banco do Brasil, deveria ter sido devolvida à instituição financeira. Os auditores do TCU estimam que, se considerado todo o volume de recursos repassados à DNA pelo banco, a cifra desviada de BV poderia chegar a R$ 37,663 milhões. Em julho deste ano, ao julgar um processo sobre o assunto, os ministros do TCU consideraram que as bonificações não precisavam ser devolvidas ao BB por conta de lei aprovada em 2010. Mas a decisão não trata de eventuais desvios de recursos para fins políticos. Ou seja, o tribunal arquivou o processo administrativo de cobrança dos recursos, mas não se pronunciou sobre aspectos penais.

A movimentação financeira para rastrear o dinheiro do mensalão foi objeto de disputa jurídica no processo. A defesa de Valério tentou anular o material produzido pelo Instituto Nacional de Criminalística da PF. No julgamento, deve voltar a questionar a validade dos laudos oficiais. "Manipularam, falsificaram e alteraram registros e documentos, de modo a modificar os registros de ativos, de passivos e de resultados; omitiram milhares de transações nos registros contábeis; realizaram registros de transações sem comprovação ou as simularam; e aplicaram práticas contábeis indevidas", diz um dos laudos da Polícia Federal que a defesa de Valério contesta. O mesmo documento atesta que foram impressas 80.000 notas fiscais falsas.

Em 2010, os advogados de Marcos Valério conseguiram autorização do relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, para que peritos privados analisassem contas e laudos da PF. Dois peritos de Minas produziram laudo em que tentam provar que o mensalão não se valeu de verbas públicas e que tudo foi registrado na contabilidade das empresas.

Segundo documento da Controladoria Geral da União anexado à ação penal do mensalão, a DNA foi favorecida no período de 2003 e 2004 pela diretoria de Marketing do BB. A CGU constatou que a empresa levou a maior fatia da verba publicitária, ultrapassando o estabelecido no contrato. Laudo de 2009 da PF mostra que a DNA recebeu R$ 73,851 milhões entre maio de 2003 e junho de 2004.

Empréstimos são verdadeiros, diz Valério

O advogado Marcelo Leonardo, que representa Valério, sustenta que os recursos distribuídos por seu cliente, atendendo à orientação do PT, foram adquiridos por meio de empréstimos junto aos bancos Rural e BMG:

- Na fase de perícia, ficou provado que os empréstimos são verdadeiros. Os recursos efetivamente saíram de contas bancárias de titularidade dos bancos para a conta de titularidade das empresas SMP&B e DNA, tendo sido os mesmos regularmente registrados no Sisbacen (sistema de informações do Banco Central).

Ele não comentou o julgamento.

- Não falo nada a respeito disso. Não é tarefa do advogado fazer prognóstico.

FONTE: O GLOBO

Vida dupla de consultor e político

Protagonistas do escândalo: José Dirceu

Thiago Herdy, Sérgio Roxo

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

SÃO PAULO . Quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes trocaram acusações há dois meses, José Dirceu entrou em campo para reclamar da briga e pôr panos quentes. Para Dirceu, Gilmar era um voto praticamente certo pela sua absolvição no julgamento do mensalão, e o atrito, a última coisa de que precisava.

O comportamento do ex-chefe da Casa Civil parece contraditório a interlocutores. Ele alterna momentos de confiança plena em sua absolvição com o temor de ser condenado pela participação no financiamento de petistas e aliados.

A assessores mais próximos, disse não saber o que será de sua vida daqui a dois meses. Também não faz planos e adia discussões em torno de uma eventual candidatura em 2014.

Desde a saída do ministério de Lula e da cassação de seu mandato como deputado federal, em 2005, Dirceu se divide entre o papel de líder político e consultor de empresas que muitas vezes dependem de decisões do governo que ele ajudou o PT a conquistar em 2002.

Não se incomoda com a vida dupla, pelo contrário: dela parece tirar proveito. Recebeu o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e o então presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, em quarto de hotel de Brasília para tratar de política, às vésperas da queda de Antonio Palocci, então ministro da Fazenda. É também quem representa no Brasil os interesses do homem mais rico do mundo, o mexicano Carlos Slim, dono da Embratel, embora negue.

O ex-ministro não revela a sua lista de clientes. Fala que ajuda empresas estrangeiras interessadas em negócios no Brasil e companhias brasileiras com interesses no mercado externo. A colegas de partido, Dirceu justifica suas atividades de consultor como necessárias para financiar sua defesa, na guerra que vive desde a sua cassação.

Desde 2010, integra o diretório nacional do PT, mas nunca deixou de cuidar da articulação com outros partidos. É amigo do presidente petista, Rui Falcão. Os dois têm casa no mesmo condomínio de luxo, em Vinhedo, no interior de São Paulo.

Com Lula, tem relação de respeito e desconfiança. Em conversa com seus interlocutores, antes da crise do mensalão, Lula se referia a Dirceu como a maior cabeça política do partido, mas também como alguém com particular capacidade de mentir.

Para evitar a execração pública, Dirceu só viaja em jatos executivos e não vai a restaurantes em São Paulo.

No auge da crise do mensalão, em 2005, dizia:

- Se eu sair, o governo cai.

Errou. Lula foi reeleito e escolheu a sua sucessora.

FONTE: O GLOBO

Caso de Collor inspira defesa de réus do mensalão

A defesa de Collor para absolvê-lo no STF em 1994 é modelo para o mensalão. Pelos argumentos, não havia relação entre pagamentos ao réu e atos na Presidência. Para réus do mensalão, só haveria corrupção se comprovado vínculo entre pagamentos de Marcos Valério e a atividade parlamentar de beneficiados.

Absolvição de Collor inspira defesa de réus do mensalão

Argumentos usados em 94 serão replicados no julgamento que começa na 5ª

Naquele ano o STF não viu relação entre dinheiro recebido pelo ex-presidente e atos praticados no governo

Breno Costa, Felipe Seligman

BRASÍLIA - Quase 20 anos depois do impeachment do ex-presidente Fernando Collor no Congresso, os argumentos jurídicos que garantiram sua absolvição pela Justiça viraram um paradigma para os réus do mensalão.

A partir de quinta-feira, quando começa o julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal), os mesmos argumentos de Collor serão usados pelos advogados dos réus em suas sustentações orais.

Collor foi acusado de corrupção passiva e absolvido pelo STF em 1994. Dos 38 réus do mensalão, 10 são acusados de corrupção ativa, 12 de corrupção passiva. Para caracterizar esses crimes, é preciso demonstrar que uma vantagem indevida foi oferecida, recebida ou solicitada por um agente público para que ele fizesse algo no cargo.

O caso Collor é citado pela defesa de figuras centrais do mensalão, como o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o empresário Marcos Valério.

Precursor

A absolvição de Collor por falta de provas é um precedente importante porque é o único caso relevante de corrupção julgado pelo STF. Desde 1970, só cinco réus foram julgados sob a acusação de corrupção passiva ou ativa. Desses, só um foi condenado, um ex-deputado do Rio Grande do Norte, em 1978.

Em 1994, Collor foi acusado de receber dinheiro do ex-tesoureiro de sua campanha para favorecer empresas, orientando a Petrobras a fazer um empréstimo e nomeando um executivo de empreiteira para cargo público.

A defesa de Collor argumentou que não havia relação entre os pagamentos que recebera e seus atos no exercício da Presidência.

A maioria dos ministros do STF concordou, e por isso ele foi absolvido.

Interpretações

No processo do mensalão, a Procuradoria-Geral da República acusa o PT de organizar um esquema clandestino de financiamento político para comprar apoio parlamentar no Congresso nos anos de 2003 e 2004.

Os deputados beneficiados dizem que o dinheiro era para pagar dívidas de campanhas eleitorais, e não um suborno para que votassem a favor do governo.

O argumento dos réus é que só haveria corrupção se fosse comprovado o vínculo entre os pagamentos feitos por Marcos Valério e a atividade parlamentar dos políticos beneficiados.

Apontado pela acusação como chefe da quadrilha do mensalão e acusado de corrupção ativa, Dirceu era deputado federal em 1992 e foi um dos autores do pedido de instalação da CPI que levou ao impeachment de Collor.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também citou Collor em suas alegações finais.

Segundo ele, ficou estabelecido que, para configurar crime de corrupção, basta demonstrar a intenção de agir, ou a expectativa de que o agente público corrupto faça algo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Advogados tentam adiar julgamento

As defesas dos réus buscam falhas nas acusações formu¬ladas pela Procuradoria-Geral da República para conse¬guir adiar a decisão do STF. A estratégia é fazer de tudo pa¬ra que a análise e o veredito dos ministros sejam anun¬ciados só depois das eleições municipais em outubro.

Advogados orquestram atraso no julgamento

Defesas articulam questões de ordem contestando brechas na acusação dos réus formulada pela Procuradoria-Geral da República. A intenção é empurrar a análise do caso para depois das eleições municipais de outubro

Josie Jeronimo

Advogados de defesa dos réus do mensalão elaboram uma estratégia orquestrada para atrasar a fase inicial do julgamento. Além do risco de anunciar a troca de defensores em cima da hora, como mostrou ontem o Correio, os representantes dos acusados vão levantar questões processuais logo após a leitura do relatório do ministro Joaquim Barbosa, etapa que antecede a sustentação oral dos advogados, para tumultuar o cronograma dos trabalhos. A defesa do empresário Marcos Valério já tem pronta sua estratégia: o advogado Marcelo Leonardo informou que apresentará questão de ordem contestando a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar Valério, pois ele não tem foro privilegiado e a análise da ação penal pela corte cercearia seu direito constitucional ao duplo grau de jurisdição, caso seja condenado. "Três réus alegaram a incompetência do Supremo Tribunal Federal. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado. Se não for examinada após a leitura do relatório, será apresentada na forma de questão de ordem", afirma Marcelo Leonardo, advogado de Valério.

Representantes dos réus e ministros da corte ouvidos pelo Correio afirmam que a estratégia de orquestração entre os advogados de defesa dos réus sem foro privilegiado é dada como certa no julgamento do mensalão. Levantando questões de ordem e elementos processuais, os defensores esperam forçar manifestações individuais dos ministros, debate que pode se estender por todo o primeiro dia de julgamento, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Com o artifício, os advogados de defesa apostam que uma discordância irreconciliável entre os ministros sobre a questão de ordem apresentada force o pedido de vista de algum dos 11 magistrados, adiando o julgamento por tempo indeterminado.

Na prática, a questão de ordem questionando a competência do Supremo em julgar réus sem foro privilegiado tem o mesmo efeito da petição apresentada pelo advogado Márcio Thomaz Bastos solicitando o desmembramento do processo. O advogado de Marcos Valério afirma, no entanto, que quando a corte rejeitou a petição analisou o pedido somente do ponto de vista processual. "Não foi avaliado na Constituição. Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição."

Caixa dois

Supostas falhas na denúncia do Ministério Público serão usadas pela defesa de Marcos Valério para "derrubar" elementos da acusação. Limitações no texto que aborda o crime de lavagem de dinheiro na peça do Ministério Público se tornaram trunfos nas mãos dos advogados do empresário para aliviar a pena de Valério em caso de condenação. De acordo com Marcelo Leonardo, a tese de lavagem de dinheiro não se sustentará no decorrer do julgamento por erro da denúncia do MP. Segundo o advogado do empresário, a peça não estabelece qual é o "crime antecedente".

Até maio deste ano, as leis estabeleciam que a caracterização do crime de lavagem de dinheiro ocorreria após um primeiro julgamento apontando o dinheiro em questão como oriundo de fontes ilegais. "A lei estabelece quais são os crimes antecedentes, de onde viria o dinheiro. A lavagem teria que ter a operação de ocultação do dinheiro e indicar os recursos voltando depois à economia formal", alega o advogado.

Um magistrado ouvido pelo Correio corroborou a argumentação do advogado de Valério. "É muito difícil você ter uma lavagem se o Ministério Público não indicar o crime antecedente. No caso da Ação Penal nº 470, o crime antecedente está sendo julgado com o crime de lavagem." Assim, o advogado avalia que o empresário poderia receber condenação apenas por crime eleitoral. "O que nós entendemos que aconteceu foi o caixa dois de campanha."

Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição"

Três réus alegaram a incompetência do STF. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado" Marcelo Leonardo, advogado de Marcos Valério

Toffoli mantém suspense

A cinco dias do começo do julgamento, o ministro Dias Toffoli ainda não anunciou se participará da análise do caso. Ele tem manifestado a pessoas próximas que pretende julgar o mensalão, mas sofre pressões para se declarar suspeito ou impedido, por ter sido advogado do PT, assessor da Casa Civil durante a gestão de José Dirceu — um dos réus do processo — e, ainda, por ser companheiro da advogada Roberta Rangel, que atuou na defesa de um dos réus do mensalão.

A estratégia é protelar

Táticas de protelação miram brechas na denúncia da Procuradoria-Geral da República

Questões de ordem

Logo após o ministro Joaquim Barbosa fazer a leitura do relatório, advogados de defesa podem apresentar questões de ordem levando o presidente da sessão, ministro Ayres Britto, a decidir sobre a colocação dos representantes dos réus. A questão de ordem pode ser discutida por todos os ministros, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Falhas processuais

No momento da sustentação oral, os advogados de defesa poderão apontar "falhas" na tramitação do processo, alegando que o direito de defesa foi cerceado por falta de inclusão de informações que consideram relevantes, como relatórios financeiros e relato de testemunhas.

Lavagem de dinheiro

A defesa enxerga falhas na denúncia em relação à tipificação do crime de lavagem de dinheiro. Segundo os defensores, a acusação não aponta o "crime antecedente", elemento jurídico indispensável ao conceito de crime de lavagem de dinheiro até maio deste ano, quando a legislação foi alterada.

Corrupção passiva

Réu do mensalão que não tinha cargo público foi denunciado por corrupção passiva, o que constituiria uma falha, de acordo com a defesa.

Origem do dinheiro

Defensores dos réus apontam brechas em relação à definição da origem dos recursos que abasteciam o suposto esquema do mensalão. Os advogados reforçarão que a maioria do dinheiro apontado na denúncia é de empresas privadas.

Origem dos recursos

Fragilidade das investigações sobre o esquema do mensalão, a blindagem política da CPI criada para apurar as denúncias de cooptação de parlamentares, e a centralização do processo no Supremo Tribunal Federal (STF) podem favorecer a defesa dos 38 réus que serão julgados a partir de quinta-feira. Brechas na acusação, que não conseguiu comprovar todos os pontos da origem do dinheiro, acendem entre os defensores a esperança de derrubar a tese de que o esquema foi abastecido por recursos públicos.

Entre os pontos cegos que os advogados dos réus comemoram está a ausência de provas envolvendo transações diretas entre o Banco do Brasil e empresas comandadas por réus da ação penal e a predominância de bancos privados no cerne do suposto esquema. A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que considerou regular um contrato entre a agência DNA Propaganda e o Banco do Brasil, que teria rendido R$ 4,4 milhões a Marcos Valério em descontos obtidos com fornecedores, também pesa na sustentação de ausência de dinheiro público no esquema. O Ministério Público apresentou recurso da decisão do TCU.

Outra fragilidade a ser explorada pelos advogados é a caracterização de crime de formação de quadrilha em relação ao chamado "núcleo político" do mensalão. O conceito de formação de quadrilha é alcançado quando pelo menos quatro acusados admitem ter agido em conjunto buscando uma mesma finalidade ou a denúncia apresenta provas dessa atuação. No caso do núcleo financeiro, informações de movimentação de recursos podem atestar que alguns dos réus agiram em grupo, mas, em relação ao núcleo político, a confirmação carece de elementos mais sólidos, alegam advogados de defesa.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Dilma adota agenda positiva para se afastar do mensalão

Preocupada com o potencial de desgaste que o julgamento do mensalão pode trazer ao governo, a presidente Dilma Rousseff tentará manter o Planalto longe dos holofotes do STF. Apesar de torcer para que os réus do PT sejam absolvidos, Dilma baixou uma espécie de lei do silêncio. A ordem é blindar o governo do impacto do julgamento, que vai pôr o PT no banco dos réus, e preparar um pacote de estímulo aos investimentos, a "agenda do desenvolvimento"

Dilma se blinda para evitar que julgamento espirre em seu governo

Presidente quer "agenda de desenvolvimento" durante julgamento de seus colegas petistas

Vera Rosa

Preocupada com o potencial de desgaste que o julgamento do mensalão pode causar a seu governo, a presidente Dilma Rousseff deverá fazer de tudo para manter o Palácio do Planalto longe dos holofotes do Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar de torcer para que os réus do PT sejam absolvidos, sob o argumento de que uma punição representaria a condenação moral da Era Lula e acabaria se voltando contra ela e o seu partido nas eleições municipais, Dilma baixou a lei do silêncio.

A ordem é blindar o Planalto do impacto do julgamento, que vai pôr o PT e o governo Lula no banco dos réus. Na tentativa de mostrar que sua gestão não será contaminada pelas ruidosas sessões do Supremo, Dilma preparou um pacote de estímulo aos investimentos, a ser lançado em várias etapas, entre agosto e setembro. A "agenda do desenvolvimento" terá medidas populares, como a desoneração de impostos para a redução do custo da tarifa de energia elétrica.

Na semana passada, a presidente quis saber de auxiliares se a repercussão do julgamento do mensalão ocuparia o espaço nobre da imprensa nos próximos meses. Diante da resposta positiva, não escondeu a contrariedade.

Em conversas privadas, Dilma avalia que a denúncia da Procuradoria-Geral da República não fica de pé porque não há provas da compra de votos em troca do apoio parlamentar no Congresso na administração de seu padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva.

O caso que mais a sensibiliza na Ação Penal 470 – um calhamaço com 50 mil páginas, 38 réus e 600 testemunhas – é o do ex-deputado José Genoino. Presidente do PT à época do escândalo de corrupção, Genoino é atualmente assessor do Ministério da Defesa e Dilma já o chamou várias vezes ao Palácio da Alvorada para trocar impressões sobre os rumos do governo.

Alívio. A presidente gostaria de reabilitar Genoino na bancada do PT na Câmara, da qual ele é suplente. Não quer, no entanto, que José Dirceu, seu antecessor na Casa Civil, retorne ao comando do PT, embora deseje que ele seja inocentado. O ex-ministro é descrito na denúncia do Ministério Público como "chefe da quadrilha".

Dilma disse ter ficado aliviada ao saber que só terá de indicar o substituto de Cezar Peluso, ministro do STF que se aposenta em setembro, após o veredicto sobre o mensalão. Tem pavor de que suas ações sejam interpretadas como ajuda a réus do PT.

Amigos da presidente garantem que, embora esteja próxima de forças opostas a Dirceu no mosaico ideológico do petismo, ela jamais entrará em confronto com Lula nem trabalhará pela "faxina" no PT, mesmo de olho no projeto da reeleição, em 2014. Além disso, Lula só concordará em disputar novamente o Planalto contra o PSDB se ela não quiser concorrer a um segundo mandato, hipótese hoje improvável.

Cara nova. Herdeira do pós-mensalão, cristã nova no partido e caloura em eleições, Dilma só chegou à ribalta após a sucessão de crises que dizimou a cúpula petista e abateu candidatos "naturais" à cadeira de Lula, como Dirceu, o todo-poderoso chefe da Casa Civil entre 2003 e 2005, e Antônio Palocci, à época titular da Fazenda.

Então ministra das Minas e Energia, a ex-guerrilheira furou a fila no PT e foi chamada por Lula para substituir Dirceu no período de ruína. Em reuniões que vararam a madrugada no Planalto, Dilma foi uma das integrantes do "núcleo duro" que mais o ajudaram na estratégia de proteção do governo.

Desde que foi eleita presidente, no entanto, ela se distanciou de Dirceu e desenhou uma nova geografia de poder. Sem trânsito no PT, Dilma constituiu um grupo formado por ministros do partido que, em sua maioria, não são ligados a Dirceu, como José Eduardo Cardozo (Justiça), Aloizio Mercadante (Educação), Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Paulo Bernardo (Comunicações), além de Fernando Pimentel (Desenvolvimento), seu amigo de adolescência.

Escudeiros. Foi o próprio Lula quem a orientou a escalar um time de conselheiros políticos. "Monte sua equipe de confiança. Você vai precisar", disse o presidente à afilhada, em mais de uma ocasião. Apesar da fria relação com Dirceu – que a chamou de "companheira de armas e de lutas" ao passar o bastão para ela, em 2005 –, a presidente convidou o ex-ministro, em maio, para a cerimônia de instalação da Comissão da Verdade, que vai investigar violações de direitos humanos cometidos durante a ditadura militar (1964-1985). Ele ficou radiante.

"Acho Dirceu uma pessoa injustiçada", afirmou Dilma, quando ainda comandava a Casa Civil. "Não tenho conhecimento de que ele tenha beneficiado instituição financeira no tocante a crédito consignado." As declarações estão no processo do mensalão.

A principal interlocutora de Dirceu no Planalto, hoje, é a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti. É ela quem o informa sobre o andamento da CPI do Cachoeira, as pressões de aliados por cargos e as preocupações palacianas. O governo e a cúpula do PT temem que o julgamento do mensalão, agora, prejudique campanhas prioritárias, como a de Fernando Haddad, em São Paulo, e a de Patrus Ananias, em Belo Horizonte.

"Haverá interferência na eleição, qualquer que seja o resultado, e a decisão tanto pode atingir o PT como a oposição", comentou o advogado Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT. "Alguém pode conceber um julgamento durante o dia e o programa eleitoral à noite? Isso é um absurdo", criticou ele. Dilma, porém, não vai mexer nesse vespeiro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Técnica, mas política - Merval Pereira

A discussão sobre se a base do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal será técnica ou política é inócua, pois, como lembra o jurista Joaquim Falcão, diretor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio, qualquer decisão, por mais técnica que seja, é de fundo político ou tem consequências políticas.

O maior exemplo disso foi a decisão do plenário do Supremo de não desmembrar o processo do mensalão, tese que o advogado Márcio Thomaz Bastos, que defende o ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado, apresentará mais uma vez na abertura do julgamento, a fim de atrasar seu desenrolar.

Segundo alega Bastos, seu cliente tem o direito de ser processado inicialmente pela Justiça comum porque não tem foro privilegiado, que apenas três dos 38 atuais réus do mensalão têm: os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry Neto (PP-MT).

Quando, porém, decidiu considerar que o processo do mensalão é um só, e todos os réus seriam julgados pela última instância da Justiça, a maioria dos ministros do Supremo escolheu não permitir que os crimes fossem dissociados entre si, mantendo a tese da Procuradoria Geral da República de dar um sentido sistêmico ao crime de que são acusados.

Com isso, evitaram que a defesa dos réus protelasse mais ainda o processo com os recursos às várias instâncias do Judiciário.

O tempo do processo, de cinco anos, é considerado recorde, devido aos inúmeros relatórios, perícias, e os "acidentes de percurso", com os diversos recursos por parte da defesa. Sempre que havia um problema, o ministro Joaquim Barbosa encaminhava o assunto ao plenário.

Foi assim com a decisão sobre o desmembramento ou não do processo, que provoca críticas até hoje do ministro Marco Aurélio Mello, voto vencido.

Outro exemplo claro de que decisões técnicas têm base política é a do então procurador-geral Antonio Fernando de Souza de não incluir o presidente Lula na denúncia do mensalão, enquanto ele mesmo, anos depois, denunciou o senador Eduardo Azeredo, do PSDB, como um dos principais envolvidos no esquema de corrupção montado com o auxílio do mesmo empresário mineiro Marcos Valério na campanha para a eleição de governador em 1998.

O então procurador-geral classificou o esquema mineiro de precursor do mensalão do PT e identificou Azeredo como seu principal beneficiário.

No caso de Lula, o grande beneficiário do mensalão, o Supremo rejeitou diversas tentativas de incluí-lo no processo, a maioria feita pelos advogados do ex-deputado Roberto Jefferson, o grande delator do esquema, que acabou cassado no processo, juntamente com o ex-ministro José Dirceu.

Trata-se, no entanto, de uma tática diversionista apenas, pois não há possibilidade de o ex-presidente ser incluído no julgamento no meio do processo.

Outra decisão de cunho exclusivamente político é a do ministro Dias Toffoli de participar ou não do julgamento.

Tendo sido advogado do PT, trabalhado sob as ordens do então ministro José Dirceu na Casa Civil da Presidência e com a mulher com que vive tendo sido advogada de diversos acusados no processo do mensalão, Toffoli deveria se colocar como impedido de atuar nesse julgamento de acordo com a maioria de seus colegas de Supremo, que de uma maneira ou de outra fizeram chegar a ele essa opinião.

No entanto, tudo indica que não agirá assim, declarando-se impedido no máximo de julgar o caso do Professor Luizinho.

Uma decisão política no mais amplo sentido da palavra, que colocará sua carreira de juiz do Supremo em análise apurada não apenas da opinião pública, mas também de seus pares.

Em resumo, estarão em jogo valores como a ética na política, uma demanda mundial na ordem do dia. A defesa tentará fragmentar a atuação de cada réu, explorando a linha dos direitos individuais contra a ação opressora do Estado.

Já a Procuradoria Geral da República coloca em julgamento a necessidade de moralidade na administração pública.

O pensamento dos ministros que dirigem dois dos tribunais superiores paira sobre o julgamento: a ministra Cármen Lúcia, do Tribunal Superior Eleitoral, outro dia desabafou dizendo que ninguém aguenta mais tanta corrupção.

E o presidente do próprio Supremo Tribunal Federal, ministro Ayres Britto, já declarou que três leis no país podem acabar com a cultura da impunidade existente: a Lei da Ficha Limpa, a de Acesso à Informação e a da Improbidade Administrativa, de 1992, que considera "revolucionária" no conteúdo, mas precisa ser praticada.

FONTE: O GLOBO

"Atrevido e escandaloso" - Eliane Cantanhêde

O ministro Celso Amorim gosta de recorrer a uma máxima quando se trata de garantir recursos para a sua pasta: "Mulher, mala e verba pública, cada um cuida da sua". A máxima cabe perfeitamente no caso do mensalão.

Às vésperas do julgamento pelo STF, a imprensa se prepara como se fosse uma Olimpíada, e os nervos dos juízes, partidos e advogados estão à flor da pele. Imagine os dos réus...

O ex-presidente do PT José Genoino diz que não tinha nada a ver com aquilo tudo, pois só assinava o que os, digamos, escalões inferiores lhe enviavam. Já o ex-tesoureiro Delúbio Soares (alvo dos maiores atos petistas de solidariedade) diz o oposto: que era quase um bagrinho e só executava o que os, digamos, escalões superiores lhe determinavam. Alguém está se subestimando aí.

José Dirceu, o "chefe da quadrilha", segundo a peça da Procuradoria-Geral da República, encampada pelo relator Joaquim Barbosa, preferiu se preservar do empurra-empurra e correu para o colo da mamãe no interior de Minas, certamente esperando pelo pior.

E Roberto Jefferson, que detonou o esquema em entrevista a Renata Lo Prete, na Folha, atribui o câncer no pâncreas a "pressão, tensão, sofrimento". Acha que é mera somatização, apesar de sua mãe ter tido o mesmo tumor há 11 anos -e estar bem, como se deseja ao ex-deputado.

Falta defesa e sobram táticas, enquanto os 11 ministros do Supremo estão espremidos entre o PT, para "evitar o linchamento moral", e os adversários petistas, para botar todo mundo na cadeia.

Quanto ao efeito nas eleições municipais, o PT teme, os adversários torcem e o professor da USP Lincoln Secco descarta: 75% dos militantes se filiaram nos dois mandatos de Lula. Podem cair canivetes e provas, e eles votarão com o partido.

A questão, portanto, não é como o julgamento afeta o PT. É como -e se- atinge o seu grande eleitor: Lula.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O dinheiro do mensalão - Janio de Freitas

Como Kátia Rabello, do Banco Rural, sabe que o dinheiro veio do governo e estatais não está indicado

Uma das questões centrais no julgamento do mensalão, a despontar desde as defesas iniciais na quinta-feira, já se mostra nas entrevistas de advogados e de réus como um choque de versões cuja solução, segundo o entendimento de cada ministro, será um fator determinante de condenações ou absolvições.

O Banco Rural encabeça a versão de que o dinheiro usado no mensalão procedia do governo e de estatais. Dirigente do Rural com relevância em várias partes do caso, Kátia Rabello inclui em sua defesa a afirmação de que o dinheiro "passava pelas contas de Marcos Valério" no banco. "Passava" porque "vinha de outros bancos". Como sabe que o dinheiro foi posto, antes, em outros bancos pelo governo e por estatais, não está indicado.

Por sua vez, e desde as primeiras indagações sobre o dinheiro do mensalão, Marcos Valério e Delúbio Soares o atribuíram a empréstimos bancários. Logo, dinheiro de procedência privada, sobretudo do Banco Rural, com participação também do Banco de Minas Gerais, o BMG.

Se admitida a utilização de dinheiro público, de algum modo desviado de verbas publicitárias do governo ou de estatais, muitos fatos se desdobrariam em agravantes e muitos réus teriam sua posição piorada no processo.

Se admitido o levantamento de empréstimos como fonte do mensalão, desvinculam-se, no todo ou em maior parte, o mensalão e os negócios do governo. Por exemplo, os de publicidade, que chegaram a exigir sucessivas explicações do então ministro Luiz Gushiken contra cargas da imprensa e da oposição.

A CPI dos Correios, arena do escândalo, não deixou dúvida sobre a existência dos empréstimos bancários. O Rural não pôde negá-los. Mais tarde, em segundo reconhecimento deles, adotou providências para cobrá-los de Marcos Valério, com uma fortuna em acréscimos.

Tudo noticiado com fartura, como pretendida prova de que nada fora mais do que operações bancárias comuns. Comuns, mas de dezenas de milhões, em empréstimo sobre empréstimo, sem que a CPI tenha constatado mais garantias do que avais insuficientes, apenas de formalidade.

Não ficou claro, ainda, o que seria feito das dezenas de milhões tomados em empréstimos, se o dinheiro do mensalão, como diz a banqueira Kátia Rabello, era proveniente do governo e de estatais, e não dos empréstimos.

Do mesmo modo, embora o Tribunal de Contas da União venha de aprová-lo, não está claro o que se passou com o contrato de publicidade dos cartões de crédito do Banco do Brasil. E, menos ainda, com o caminho tomado por parte da respectiva verba.

Não se negue ao Banco Rural, porém, tratar-se de um grupo empresarial com história.

Foi o banco das "operações especiais" cuja descoberta fundamentou, para a CPI do Congresso, as conclusões sobre a associação PC Farias/Collor. Antes, o grupo Rural, por intermédio de sua empreiteira Tratex, foi parte de escândalos de fraude em licitações para grandes obras públicas.

No escândalo da ferrovia Norte-Sul, cuja fraude de US$ 2,4 bi foi aqui comprovada, o então presidente do Rural/Tratex disse à CPI do caso, no Senado, que eu deveria ser mandado para a Sibéria. Inquirido a respeito pela CPI, informei preferir o Taiti ou o Havaí.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Alcance restrito - Dora Kramer

Ressalvada alguma ação do inesperado, a CPI do momento retoma seus trabalhos nesta semana direcionada a restringir mesmo a exposição das ilegalidades cometidas pela organização chefiada pelo silente prisioneiro Carlos Cachoeira, aos estados de Tocantins, Goiás e Distrito Federal.

Ao menos é essa a avaliação do relator Odair Cunha (PT-MG). Ele não viu nas gravações e documentos examinados até agora nada que sustente a ampliação das investigações ao restante do país, não obstante a construtora Delta – parceira de Cachoeira – tenha contratos em mais de 20 estados e, até ser declarada inidônea, era a maior prestadora de serviços do PAC.

"Mas, relações mesmo de negócios com Cachoeira, a Delta só tinha na região Centro-Oeste", diz Cunha com base nas escutas feitas pela Polícia Federal durante dois anos e que a CPI vem ouvindo em sua versão bruta, não depurada.

Petista, ele não teme ser acusado de parcialidade por sua posição coincidente com o roteiro original que já previa a limitação das investigações a uma região de pouco peso político e reduzido potencial de prejuízo a figuras mais proeminentes da República.

"Eu me baseio nas informações, quem quiser tirar ilações que tire, mas tenho convicção de que a melhor maneira de deixar a turma do Cachoeira impune é tentar ampliar as investigações sem a existência de indícios consistentes de irregularidades ou envolvimento de agentes públicos. Não temos tempo nem informações concretas para analisar tudo."

Por "turma do Cachoeira" entenda-se um grupo de pessoas que, na visão de Odair Cunha, já tem lugar quase assegurado no relatório final da CPI.

Da lista fazem parte hoje o governador de Goiás, Marconi Perillo, o ex-senador Demóstenes Torres, os deputados federais Sandes Júnior e Carlos Alberto Leréia, o prefeito de Palmas (TO), Raul Filho, dois integrantes da cúpula do Judiciário em Goiás e Edvaldo Cardoso, ex-presidente do Detran goiano.

Sobre esses o relator já firmou convicção de envolvimento, faltando, no entanto, levantar mais dados, confrontar as gravações com contratos da Delta em Goiás, Tocantins e Distrito Federal, conferir pagamentos repassados pela empreiteira a empresas fantasmas do esquema e os saques feitos pelo "financeiro de Cachoeira", para tipificar os crimes em que estariam enquadrados.

Fernando Cavendish poderá entrar no rol, a depender de seu comportamento quando for à CPI. "Se calar vou entender como confissão de que mantinha relações com Cachoeira."

Odair Cunha decidiu que não divulgará conclusões parciais, mas apenas um relatório no prazo estipulado para o fim dos trabalhos da CPI. Depois das eleições.

Intenção e gesto. Atento e sensível a atitude da presidente Dilma Rousseff de se manifestar em nota oficial sobre a morte da policial militar Fabiana de Souza, assassinada por bandidos no Complexo do Alemão, no Rio.

Atenção e sensibilidade, contudo, a que não tiveram direito as famílias dos oito PMs mortos em São Paulo em ataques patrocinados pelo crime organizado.

A ação num caso e a omissão no outro provavelmente justifica-se. Queira o bom senso que por razões alheias às relações político-partidárias amistosas com o governador Sérgio Cabral Filho e inamistosas com o tucano Geraldo Alckmin.

Alternativa. No oficial, o PT já realizou o prejuízo: admite ver o PMDB no comando da Câmara e do Senado a partir de ano que vem. Não tem condições políticas para interferir sem criar embaraços para o governo.

No paralelo, entretanto, os petistas consideram a hipótese de PSD e PSB (são quase 100 deputados) se juntarem para correr por fora e disputar com os pemedebistas a presidência da Câmara, a fim de reforçar o cacife dos caciques de ambos os partidos para a vaga de vice-presidente na eleição de 2014.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Rio de Janeiro - nos bastidores da campanha, a batalha dos comitês

Paes e Rodrigo Maia têm maior estrutura financeira e já alugaram áreas na cidade; adversários reclamam de falta de recursos e apostam nas redes sociais

Cássio Bruno, Renato Onofre

Um espaço com 45.515 metros quadrados, 61 lojas disponíveis em um único prédio de dois pavimentos, amplo estacionamento, em Jacarepaguá. Assim é o comitê de campanha do prefeito Eduardo Paes (PMDB), candidato à reeleição. A megaestrutura inclui desde a linha de montagem de placas de propaganda do peemedebista nos fundos do terreno até salas reservadas para a cúpula nomeada para a coordenação. O aluguel do imóvel pode chegar a R$ 800 mil por mês, segundo a imobiliária Renascença, responsável pela locação.

O comitê funciona no antigo Barra Car Auto Shopping, de venda de automóveis, na Avenida Ayrton Senna 6.000, no acesso da Linha Amarela. Paes registrou no Tribunal Regional Eleitoral despesas que podem chegar a R$ 25 milhões - R$ 2 milhões a mais do que a soma dos quatro adversários das principais coligações. Os 20 partidos da base aliada de Paes têm direito a uma sala no comitê. Cada sigla disponibiliza pelo menos dois representantes para se instalarem nos espaços.

Paes monta até gabinete de crise

De acordo com integrantes do PMDB, vão trabalhar no comitê cerca de 200 funcionários, divididos entre administração e infraestrutura. Nas ruas, durante os compromissos, Paes é acompanhado por uma tropa de choque de pelos 150 pessoas, que dão apoio e distribuem material de campanha, como O GLOBO constatou durante uma carreata na Zona Oeste.

A campanha de Paes também contratou uma empresa de comunicação digital para uma espécie de gabinete de crise. Do Rio e de Brasília, jornalistas e técnicos em informática acompanham o que é publicado sobre o prefeito na internet, principalmente nas redes sociais. Todos os adversários também são monitorados.

Ex-presidente da Assembleia Legislativa e presidente regional do PMDB, Jorge Picciani tem local especial no comitê. O coordenador do núcleo central da campanha de Paes é o vice-prefeito, Carlos Alberto Muniz, presidente do diretório municipal do PMDB. Mas quem manda na campanha é o ex-chefe da Casa Civil do prefeito, Pedro Paulo, que, pela hierarquia, só está abaixo de Paes.

Questionado sobre o valor do aluguel do imóvel e o número de funcionários e cabos eleitorais, Pedro Paulo disse que tudo dependerá das doações que serão feitas. Sobre o valor do aluguel do imóvel, o ex-chefe da Casa Civil disse que está negociando com o proprietário:

- Queremos pagar entre R$ 50 mil e R$ 60 mil ao mês. Estamos pechinchando.

A imobiliária Renascença informou que a negociação da locação está sendo feita diretamente pelo dono do terreno com Paes. Em nota, o prefeito afirmou que o espaço não é de uso exclusivo de sua campanha e, sim, de todos os partidos da coligação. Além disso, diz, apenas parte do imóvel foi alugada como comitê.

Entre os adversários de Paes na corrida eleitoral, só mesmo quem conseguiu apresentar até agora uma estrutura de campanha foi o candidato do DEM, Rodrigo Maia, filho do ex-prefeito do Rio Cesar Maia, que tem como vice Clarissa Garotinho (PR), filha dos ex-governadores Anthony Garotinho e Rosinha Matheus. Rodrigo é o segundo candidato que mais planeja ter gastos, R$ 9 milhões.

Quem comanda a campanha é o vereador Alexandre Cerruti (DEM). Até o momento, foi montado um comitê logístico em Benfica para recebimento e distribuição de materiais dos candidatos do DEM e do PR. Mesmo com um pouco mais de organização, até o início desta semana, o local, que custará R$ 18 mil por mês, ainda não tinha telefones e computadores.

- Temos a estrutura que é necessária para o momento. Seguimos a cartilha do Cesar de minimizar este tipo de gasto - explica Cerruti.

Três outros candidatos derrapam na falta de recursos. Marcelo Freixo (PSOL) se apega à militância e concentra esforços nas mídias sociais. Otavio Leite (PSDB) e Aspásia Camargo (PV) prometem usar recursos próprios.

Freixo tem 70 comitês comunitários

Marcelo Freixo, que projetou gastos de R$ 2,5 milhões, está usando a estrutura partidária do PSOL, na Lapa. O candidato conta ainda com os chamados comitês voluntários de militantes. Já são pelo menos 70.

- Nossa força está na militância. Esperam que as doações também venham - explica Freixo.

Quem está mais longe do seu objetivo é a verde Aspásia Camargo, que está usando a sede do PV como comitê. Ao TRE, a candidata informou que pretende gastar até R$ 7 milhões. Só que, até o momento, a folha 01 do registro de doação ainda não foi preenchida. Para a coordenação da campanha, a meta não será alcançada e já ameaça a produção de materiais.

- Estamos conversando com algumas empresas que se identificam com nossas ideias, mas não está fácil -explica o verde Paulo Senra, coordenador de eleições do PV.

No fim do túnel dos recursos está o deputado federal Otavio Leite (PSDB). Ele tirou do próprio bolso R$ 40 mil para começar a movimentar a campanha. Os recursos vão para a produção de televisão.

FONTE: O GLOBO

Rejeição a Kassab faz Serra abandonar discurso da ‘continuidade’ na campanha

Acertando o prumo. Para não ir na contramão do eleitorado, que desaprova a atual gestão, candidato tucano à Prefeitura passa a reconhecer falhas que precisam ser corrigidas na cidade e vai usar TV para mostrar projetos tocados quando era prefeito e governador

Bruno Boghossian

A equipe de José Serra (PSDB) na disputa pela Prefeitura de São Paulo decidiu evitar uma campanha de “continuidade” em relação ao prefeito Gilberto Kassab (PSD), seu aliado. Diante da avaliação negativa da atual gestão pelos paulistanos, a propaganda eleitoral do tucano na TV deve apresentar sua própria experiência administrativa como solução para os problemas do município. O tucano admite publicamente a existência desses problemas e pretende apresentar um rol de realizações passadas para convencer os eleitores de que ele “é o melhor nome” para resolvê-los.

Na prática,Serra não vai se descolar do prefeito–que assumiu o cargo em 2006,quando o tucano renunciou para disputar o governo do Estado – e vai manter a defesa da atual administração.

No entanto,vai se apresentar como um gestor com um estilo próprio de governar e capaz de lançar “projetos inovadores”. “O fato é o seguinte: eu estou sendo candidato para resolver problemas. Os problemas estão aí, existem”, disse o candidato em entrevista à TV Bandeirantes na última segunda-feira. Com esse discurso, Serra vai tentar evitar ficar na contramão do eleitorado paulistano, que atribuiu nota 4,4 à gestão de Kassab em pesquisa divulgada na semana passada pelo Datafolha.

Nota dez. No início do mês, o tucano se irritou quando o prefeito deu “nota dez” à própria gestão. A interlocutores Serra disse que o autoelogio era uma “estupidez”que abriu espaço para críticas de opositores. Embora desembarque do discurso da continuidade, a campanha não apontará falhas da atual administração ou problemas do município. O foco da TV estará sobre as realizações de Serra na Prefeitura (2005-2006) e no governo do Estado (2007-2010). Em vez de exibir imagens de regiões que sofrem com enchentes, por exemplo, como costumam fazer candidatos de oposição,o programa apresentará projetos de canalização de córregos lançados por Serra.

Autoria. As obras tocadas por Kassab terão espaço durante a campanha,mas o objetivo é manter a defesa da atual gestão sem personalizar seu governo. “Trata-se de uma proposta de continuidade do que o próprio Serra já fez. Não há necessidade de personalizar a gestão Kassab”, disse reservadamente um colaborador do candidato tucano. Pesquisas conduzidas pelo PSDB revelam que os eleitores rejeitam a figura de Kassab, apesar de avaliarem como positivas algumas realizações de seu governo, como a Lei Cidade Limpa e o combate ao comércio ambulante irregular. Discretamente, Serra vem assumindo um discurso de independência em relação ao prefeito.Nas últimas semanas, trocou o plural que refletia uma única gestão (“nós fizemos”) pelo singular que marca uma imagem de liderança (“eu fiz” e “eu criei”). “Eu fui eleito (em2004). O Kassab era vice e completou minha gestão. Depois, ele se reelegeu por conta própria e fez seu mandato, mas permaneceu na linha que nós tínhamos fixado”, disse Serra a candidatos a vereador na semana passada.

O discurso da continuidade foi um dilema nas duas eleições presidenciais que Serra dispu-tou.Em 2002, candidato à sucessão do governo mal avaliado de Fernando Henrique Cardoso (PSDB),escondeu o aliado e adotou como slogan a frase “continuidade sem continuísmo”. Em 2010, foi o principal candidato de oposição ao PT, mas tentou até colar sua imagemà do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Bastidores. Até agora, Kassab tem atuado principalmente nos bastidores: costurou a adesão de partidos à coligação,mobiliza cabos eleitorais e participa de eventos fechados com empresários.

Em entrevista publicada ontem pelo Estado,o prefeito admitiu que não vai aparecer na propaganda de rádio e TV.No entanto, deve participar de eventos de campanha em locais fechados. Por sua vez, o governador do Estado, Geraldo Alckmin (PSDB), já foi visto ao lado de Serra emdois eventos desde o início do mês.Embora enfrente críticas na área de segurança, Alckmin tem boa avaliação nas pesquisas e sua imagem é usada para destacar uma eventual parceria entre os dois caso Serra seja eleito.

Prefeito espera que aprovação melhore durante campanha

Apesar de admitir que sua imagem deve ter um papel secundário na campanha de José Serra (PSDB), o prefeito Gilberto Kassab (PSD) espera que a avaliação de seu governo pelos paulistanos melhore com a exposição, na propaganda eleitoral, de obras lançadas nos últimos oito anos. “O papel da campanha é dar oportunidade para o candidato do governo apontar o que fez”, afirmou, em entrevista publicada ontem pelo Estado. “As pessoas não vão votar no Kassab. Vão votar no Serra”, acrescentou. Para aliados do prefeito, o foco dessa estratégia são os paulistanos que hoje consideram seu governo “regular”. O objetivo é fazer com que sua avaliação positiva passe de 20% para 40%.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Em São Paulo, candidatos investem em sites ineficazes

Especialistas consultados analisam a campanha virtual das principais chapas que disputam a Prefeitura de SP

Página de Haddad é a mais interativa; a de Serra, mais atualizada; as de Russomanno e Chalita, as mais claras

Nancy Dutra

SÃO PAULO - Os candidatos que terão mais tempo de TV na corrida pela Prefeitura de São Paulo consideram a internet uma ferramenta fundamental na busca por votos. Mas nenhum deles demonstra saber como usá-la de forma eficiente.

Textos extensos demais, navegação difícil, falta de clareza e de ferramentas de busca estão entre os problemas apontados por um grupo de cinco especialistas em internet convidados pela Folha a dar notas (de 0 a 5) para os sites dos candidatos.

O site mais bem avaliado foi de Fernando Haddad (PT). Com 7% nas pesquisas de intenção de voto, sua página teve nota média de 3,2.

Tecnicamente empatados na liderança da disputa, segundo o Datafolha, José Serra (PSDB), com 30% das intenções de voto, e Celso Russomanno, com 26%, também estão embolados na avaliação de seus sites. Serra obteve nota média de 2,5. O candidato do PRB ficou com 2,6.

Por uma pequena margem, o site do peemedebista Gabriel Chalita foi considerado melhor que os de Serra e Russomanno. Levou nota 2,7.

Para o pesquisador de internet Juliano Spyer, o maior trunfo de Haddad é explorar o uso de vídeos "curtos, quentes e bem editados".

"Haddad pede pouca atenção. É pra passear pelo conteúdo", diz Spyer, que trabalhou nas campanhas de Marina Silva e Gilberto Kassab (PSD).

Mas são poucos os textos. E as abas não cumprem a função de orientar o leitor. A seção de notícias, por exemplo, se chama "tv H".

Na opinião do consultor Gabriel Rossi, isso torna a navegação difícil e deixa o site "parecido com o de uma banda de rock". Seria uma forma de reforçar a ideia de jovem e novo. O petista tem como slogan a sentença "o homem novo para um tempo novo".

O domínio escolhido complementa essa estratégia: pensenovotv.com.br. A dificuldade em relacionar a página ao candidato fez a equipe de sua campanha adquirir novos domínios -haddad13.com.br, por exemplo-, que redirecionam o usuário ao endereço.

Assim como o site de Haddad, o de Serra usa muitas imagens, mas os especialistas apontaram dois problemas básicos: a necessidade de um navegador atualizado para entrar na página e a falta de uma ferramenta de busca.

"Os textos são muito grandes, o internauta precisa usar muito o mouse para chegar até o final", comenta a consultora Mercedes Sanchez.

Serra é o candidato mais ativo no Twitter, com mais de 1 milhão de seguidores.

O especialista em transparência Fabiano Angélico critica a falta de acesso fácil às propostas nos sites: "É lamentável que não haja destaque para as ideias para a cidade. Tem muito conteúdo inútil."

Entre os quatro, Russomanno é o único que expõe uma lista extensa de propostas.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

"Postes" tiram o sono de padrinhos políticos

Mentores de candidatos desconhecidos usam telemarketing e telão para apresentar os pupilos

João Valadares

Missão quase inglória: transformar um "poste" em prefeito. Em pelo menos três capitais brasileiras, Recife, Fortaleza e São Paulo, onde estão os casos mais emblemáticos, a tarefa não tem sido nada fácil. Estreantes em disputas políticas e completamente desconhecidos pelo eleitorado, os candidatos fabricados nesses municípios amargam péssimos índices nas pesquisas de intenção de voto, mas apostam que serão carregados no colo por seus padrinhos políticos. É certo que a corrida eleitoral está apenas no começo. Com previsões de gastos milionários, os "criadores" não perdem tempo e demonstram que estão dispostos a tudo para eleger as "criaturas". É a política do andor, porque os santos são de barro.

No Recife, 225 mil moradores têm sido "importunados" diariamente por um telefonema do governador Eduardo Campos (PSB). O Disque-Dudu custou R$ 120 mil. Pouco para os R$ 8 milhões que o candidato Geraldo Julio pretende gastar na campanha. Algumas pessoas se queixam dos horários das ligações, durante a noite ou logo de manhã cedo. Alguns são "premiados" com mais de um telefonema por dia. "O governador já ligou duas vezes para mim. Uma vez no meu telefone convencional e outra para o meu celular. Eu vou gostar mesmo quando receber uma ligação dele avisando que arrumou um emprego para o meu filho", diz a comerciante recifense Angélica Alcoforado Pereira. No visor do celular, aparece um número de São Paulo. Mas, ao atender, o eleitor escuta uma gravação de 30 segundos com a voz do governador.

"Alô! Aqui quem fala é Eduardo Campos. Meu telefonema é pra (sic) conversar com você sobre o futuro do Recife. Sei que você é testemunha do crescimento de Pernambuco." Esta é a primeira frase. Muitos, sem paciência, desligam logo. "Tenho moral e bati o telefone na cara do governador", brinca o funcionário público federal Geraldo Lima. Quem não desiste, escuta um Eduardo falar de maneira pausada sobre o seu pupilo. "O Recife também pode avançar neste mesmo ritmo. Por isso, estou apoiando Geraldo Julio para prefeito. Obrigado pela atenção e um forte abraço!".

As ações vão além. No atos de campanha em que o governador não pode participar, um telão é montado rapidamente no teto de um veículo. Eduardo Campos aparece no vídeo para mostrar a população quem é esse tal de Geraldo Julio, ex-secretário de desenvolvimento econômico. Antes das caminhadas, um carro de som é enviado ao bairro com mais uma mensagem do governador.

Lula-Móvel

Em São Paulo, o andor de Fernando Haddad, ex-ministro da Educação e candidato petista, é levado com muito esforço pelo ex-presidente Lula. Ele já declarou que, por Haddad, pretende "morder as canelas dos adversários." Até o momento, as mordidas não surtiram o efeito esperado. Haddad aparece em terceiro nas pesquisas, com apenas 7% das intenções de voto, atrás de José Serra (PSDB) e de Celso Russomanno (PRB).

Recuperando-se de um câncer na laringe, Lula pretende participar o mais ativamente possível da campanha. Para driblar os problemas de saúde, os marqueteiros tiveram a ideia do Lula-Móvel. O objetivo é percorrer o maior número de bairros possíveis durante a campanha. O pacote inclui ainda a construção de um estúdio no Instituto Lula para que o ex-ministro da educação grave de maneira rápida vídeos para o guia eleitoral sem precisar se deslocar até uma produtora. Todos os depoimentos serão enviados automaticamente para o Lula.TV, uma sessão específica no site de Haddad.

Em Fortaleza, capital do Ceará, a prefeita Luizianne Lins (PT), contra tudo e contra todos, resolveu bancar a candidatura do desconhecido Elmano de Freitas (PT), seu ex-secretário de Educação, provocando um racha com o PSB, que resolver lançar candidatura própria. O candidato escolhido por ela está emperrado nos 3% nas pesquisas eleitorais. Luizianne aposta todas as fichas no horário eleitoral.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Segurança é assunto de prefeito, sim senhor...

Segurança é missão de prefeito

AGENDA RECIFE - COMBATE AO CRIME

O que o morador do Recife espera do futuro prefeito? Qual o principal problema do bairro onde vive? O Instituto Maurício de Nassau foi às ruas da capital ouvir quais são as prioridades do recifense. A voz do cidadão coloca o dedo na ferida. Traz para o centro do debate um tema que costuma ficar, estrategicamente, esquecido nas campanhas municipais. Para 35% das 2.879 pessoas ouvidas na pesquisa, realizada em maio deste ano, é a segurança pública o maior problema do município. A preocupação com o combate à violência fica muito à frente do segundo ponto apontado pelos eleitores: saneamento, citado por 13% dos entrevistados. O JC inicia hoje uma série de reportagens que vai debater a cidade a partir da ótica de quem mais interessa: o recifense. Até o próximo domingo, é a opinião do eleitor que pautará a discussão. Na agenda, o futuro de uma das principais capitais do País.

Ciara Carvalho

Maria Helena da Cruz é dona de casa. Tem 43 anos, nasceu e se criou na Várzea, na Zona Oeste do Recife. Adora o bairro, mas a rua onde ela mora é um breu. No escuro, a via costuma ser palco de assaltos. Maria Helena reclama: “O prefeito tinha que cuidar da segurança. Botar luz é proteger o cidadão dos bandidos”. A dona de casa tem razão. Não está escrito em lugar algum que cuidar da segurança é uma responsabilidade exclusiva do governador ou do presidente da República. O que o artigo 144 da Constituição diz, com todas as letras, é que a “segurança pública é dever do Estado”. O Estado, leia-se aqui a autoridade governamental, o gestor público. Uma interpretação que a maioria dos prefeitos insiste em ignorar. Mas o recifense não quer saber de desculpa. Ele quer segurança. E, ao eleger o combate à violência o principal problema da cidade, joga o tema direto no colo do futuro prefeito da capital.

A cobrança é ainda mais forte, dependendo do local onde o entrevistado mora. Seguindo a mesma divisão da cidade adotada pela Prefeitura do Recife, a pesquisa consultou os eleitores de acordo com as regiões político-administrativas onde vivem, as chamadas RPAs. Ao todo, são seis no Recife. A grita maior veio dos bairros da RPA 2, que inclui locais como Encruzilhada, Rosarinho, Campo Grande, Água Fria e Bomba do Hemetério. Para 41% dos moradores dessa área, a segurança é o principal calo do recifense. “À noite, essa região fica abandonada. Por causa da prostituição e do ponto de venda de drogas que existem em torno do Mercado da Encruzilhada, evito sair de casa quando escurece. Minha filha já foi assaltada e temo a ação dos marginais”, diz o militar aposentado Erandir Pereira de Freitas, 70 anos.

O que o morador da Encruzilhada reclama não se resolve apenas com policiamento, mas com ordenamento urbano e acompanhamento social. É nesse viés que o gestor municipal se insere no debate da segurança. Defensor da ideia de que criminalidade também é assunto para as prefeituras, o coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e consultor na área de segurança pública José Vicente da Silva Filho aponta uma omissão dos gestores municipais nessa área. “Muitos prefeitos preferem lavar as mãos até por não saber o que fazer. Mas a experiência tem mostrado que quando há a participação das prefeituras os resultados são muito mais eficientes”, avalia. Para o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Adriano Oliveira, um dos coordenadores da pesquisa realizada pelo Instituto Maurício de Nassau, o resultado da consulta coloca, de forma definitiva, o tema da segurança na agenda dos prefeitos. “Não há mais como transferir essa responsabilidade apenas para o governador e o presidente.”

Os exemplos, ainda que raros no Brasil, ratificam esse entendimento. Cidades como Diadema, em São Paulo, e Canoas, no Rio Grande do Sul, viraram referência no enfrentamento à violência justamente por terem tomado para si a responsabilidade na promoção da segurança pública. Não só com políticas de prevenção, mas sobretudo com uma atuação integrada junto aos órgãos de segurança e uma intervenção territorial focada nas áreas mais degradadas. Uma parceria ainda bem distante da realidade do Recife.

Silêncio emblemático

Em fevereiro deste ano, a Secretaria de Defesa Social promoveu uma reunião do Gabinete de Gestão Integrada com representantes das prefeituras da Região Metropolitana, propondo uma minuta de convênio para que os municípios entrassem de forma mais incisiva no combate à violência. Foi entregue a cada uma das cidades um CD mostrando áreas que favorecem a criminalidade e que poderiam ser tratadas de forma prioritária pelas prefeituras. A ideia era que os municípios apresentassem propostas que poderiam ser implantadas em conjunto com as Polícias Civil e Militar. Cinco meses depois, nenhuma resposta da Prefeitura do Recife foi dada à SDS. Uma omissão que fica ainda mais grave por se tratar da capital, pela relevância e liderança natural que a cidade ocupa na RMR.

Os números da criminalidade do Recife exigem pressa nas ações integradas. Detentora em 2000 do incômodo posto de capital mais violenta do País, hoje a cidade ocupa o 5ª lugar no ranking nacional. Apesar da redução, a quantidade de homicídios ainda é alarmante. No ano passado, 692 pessoas foram assassinadas no Recife. Em números absolutos, a região recordista em mortes, em 2011, foi a RPA 6, que inclui bairros como Boa Viagem, Ibura e Jordão. Foram 148 assassinatos nessa região. Quando o critério é a taxa de mortalidade, quem dispara no mapa da violência da capital é a RPA 1, que engloba bairros como Santo Amaro, Coelhos e Boa Vista. É, de longe, a taxa mais alta, com 85,93 mortes por 100 mil habitantes. Praticamente o dobro do percentual do Recife, cujo índice é de 43,87 mortes por 100 mil habitantes.

Responsável pela execução do Pacto pela Vida, programa do governo do Estado criado para reduzir a criminalidade em Pernambuco, o secretário de Defesa Social, Wilson Damásio, diz que as prefeituras são o ente governamental que está faltando nas ações integradas de segurança. “No Recife a gente ainda precisa avançar muito. Por enquanto, há propostas, mas nada de concreto. Nós temos feito um bom trabalho com a Secretaria de Segurança Cidadã e com a Dircon, mas ainda é uma ação muito restrita”, analisa. O secretário diz que essa parceria é essencial para atingir índices maiores de redução da violência. “De forma alguma a gente vai conseguir uma segurança de 1º mundo sem a participação das prefeituras”, defende. “Qualquer gestão municipal moderna não pode mais excluir a questão da segurança no debate da cidade. O prefeito precisa reconhecer que esse também é um problema dele.”, reforça o coronel José Vicente. A população, pelo que indica a pesquisa, vai cobrar esse compromisso.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)