quarta-feira, 24 de outubro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Marco Aurélio Mello: ‘o mensalão maculou a República’ (LXXI)


Infelizmente, vivenciamos tempos muito estranhos, em que se tornou lugar-comum falar dos descalabros que, envolvendo a vida pública, infiltraram na população brasileira - composta, na maior parte, de gente ordeira e honesta - um misto de revolta, desprezo e até mesmo repugnância. São tantas e tão deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de escrúpulos que já não se pode cogitar somente de uma crise de valores, senão de um fosso moral e ético que parece dividir o País em dois segmentos estanques - o da corrupção, seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma ilimitada e duradoura, e o da grande massa comandada que, apesar do mau exemplo, esforça-se para sobreviver e progredir.

Não há, nessas afirmações - que lamento ter de lançar -, exagero algum de retórica. Não passa dia sem depararmos com manchete de escândalos. Tornou-se quase banal a notícia de indiciamento de autoridades dos diversos escalões não só por um crime, mas por vários, incluindo o de formação de quadrilha, como por último consignado em denúncia do Procurador-Geral da República, Doutor Antônio Fernando Barros e Silva de Souza. A rotina de desfaçatez e indignidade parece não ter limites, levando os já conformados cidadãos brasileiros a uma apatia cada vez mais surpreendente, como se tudo fosse muito natural e devesse ser assim mesmo; como se todos os homens públicos, nas mais diferentes épocas, fossem e tivessem sido igualmente desonestos, numa mistura indistinta de escárnio e afronta, e o erro passado justificasse os erros presentes.

A repulsa dos que sabem o valor do trabalho árduo se transformou em indiferença e desdém, como acontece quando, por vergonha, alguém desiste de torcer pelo time do coração e resolve ignorar essa parte do cotidiano. É a tática do avestruz: enterrar a cabeça para deixar o vendaval passar. E seguimos como se nada estivesse acontecendo. Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país do faz-de-conta. Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam - o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mal houvessem feito. Faz de conta que não foram usadas as mais descaradas falcatruas para desviar milhões de reais, num prejuízo irreversível em país de tantos miseráveis. Faz de conta que tais tipos de abusos não continuam se reproduzindo à plena luz, num desafio cínico à supremacia da lei, cuja observação é tão necessária em momentos conturbados.
  
Marco Aurélio de Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), no discurso de posse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2006.  

Manchetes dos principais jornais do Brasil

O GLOBO 
Valério já pega 12 anos de cadeia em regime fechado
Sem vetar importados: Lugar garantido ao vinho nacional
Cruzeiro do Sul teve laranjas

FOLHA DE S. PAULO 
STF define que Marcos Valério irá para a cadeia
Prefeitura de SP só divulgará notas de alunos após 2º turno
Serra e Haddad elevam ataques a 5 dias da eleição

O ESTADO DE S. PAULO 
Condenação de Valério já soma 11 anos
PT e aliados disputam cargos na Prefeitura
Rentabilidade de bancos cai a níveis da década de 90
Governo vai distribuir 1 milhão de bafômetros

VALOR ECONÔMICO 
Mantega admite 'flutuação suja'
Valério terá pena acima de 11 anos
BRF investe em fábrica na China
Cosan pode mudar oferta pela ALL
Mais lotes parados no São Francisco

BRASIL ECONÔMICO 
Rússia só comprará mais carne do Brasil se vender armamentos
“Infraero é incompetente”
AL continua fora do debate americano
Dez países europeus vão taxar bancos

CORREIO BRAZILIENSE
Farra distrital
Crime, castigo e popularidade
Gazeta retarda o fim do 14º e 15º

ESTADO DE MINAS 
Inflação de 2013 já mostra a cara
Eleições 2012: Uberaba
Pelo menos 11 anos de prisão para Valéri
Para não ficar só na memória

ZERO HORA (RS) 
Pena para Marcos Valério já soma 11 anos de prisão
Mais CCs em férias durante a campanha

JORNAL DO COMMERCIO (PE) 
Cadeia para mensaleiro
Luta contra a dengue é antecipada
Suape terá mais R$ 920 milhões para estrutura
SPC revela risco de alta do calote no Brasil
Solidariedade no combate à seca

Valério já pega 12 anos de cadeia em regime fechado


Cálculo se refere a apenas três de nove crimes já analisados

Ministros decidem ainda absolver réus nos sete casos de empate. Com isso, três deles terminam sem condenação

Na primeira sessão dedicada à estipulação das penas de 25 condenados, os ministros do STF não conseguiram terminar de calcular a punição do primeiro réu analisado: Marcos Valério. Mesmo assim, já é certo que ele pegará ao menos 11 anos e oito meses, o suficiente para colocá-lo em regime fechado de prisão. A Corte também decidiu pela absolvição nos sete casos de empate. Com isso, os ex-deputados Paulo Rocha e João Magno, além do ex-ministro Anderson Adauto, saem do julgamento sem condenações, pois não foram punidos por nenhum outro crime.

Prisão à vista para Valério

Operador do mensalão já está condenado a 11 anos e 8 meses por apenas um terço dos crimes

Carolina Brígido, André de Souza

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA - Depois de considerar culpados 25 réus do mensalão e absolver 12, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou ontem a calcular as penas dos condenados. Na primeira sessão dedicada à dosimetria, os ministros não conseguiram terminar de calcular sequer a pena do primeiro réu: o operador do esquema, Marcos Valério. Foram imputadas penas a somente três dos nove crimes pelos quais ele foi condenado. Mesmo assim, Valério já tem sobre os ombros 11 anos e oito meses de reclusão, o suficiente para colocá-lo no regime fechado de prisão. Ele também já foi condenado a pagamento de multa de R$ 978 mil. A cifra foi fixada em valores da época dos ilícitos e será corrigida na época da execução.

Em nenhum dos casos examinados Valério pegou pena mínima, mas também não recebeu a máxima. Hoje, os ministros retomarão o cálculo das penas dele. Só no fim, formalizarão a decisão sobre o regime de cumprimento. Pela lei brasileira, penas de prisão superiores a oito anos devem ser cumpridas em regime inicialmente fechado. O STF também deixou para decidir no fim se o réu restituirá aos cofres públicos o dinheiro desviado.

Antes de começar a calcular as penas, os ministros decidiram que quem absolveu um réu por determinado crime não pode participar da dosimetria. Ricardo Lewandowski, revisor do processo, autor do maior número de absolvições, concordou com a solução. Dias Toffoli discordou. Queria participar do cálculo da pena dos réus que absolveu. O presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, e Gilmar Mendes concordaram com Toffoli, mas a maioria venceu.

- Como é que o magistrado que absolveu pode, depois, se pronunciar sobre agravantes ou atenuantes (da pena)? É uma contradição lógica, além de ser um gravame para a própria consciência do magistrado - disse Lewandowski.

- Não vejo razões para quem absolveu não participar da dosimetria - afirmou Toffoli.

Foi o relator, Joaquim Barbosa, quem decidiu começar a dosimetria pelo chamado núcleo publicitário. Para Valério, líder do grupo, Barbosa sugeriu pena de dois anos e 11 meses pela condenação de quadrilha - um crime para o qual o Código Penal determina pena de um a três anos. Ele também sugeriu o pagamento de multa, mas os colegas lembraram-lhe que não há multa prevista no Código Penal para quadrilha.

Para chegar ao número, o relator levou em conta o grau de culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, bem como o comportamento da vítima. Barbosa considerou intensa a culpa do réu, mas ponderou que Valério não tem antecedentes criminais:

- Há ações judiciais em tramitação contra Marcos Valério, mas, enquanto o plenário não resolver essa pendência (sobre a influência de ações não concluídas nos antecedentes de um réu), não vejo condições de aplicar maus antecedentes.

O ministro considerou graves os motivos e as consequências do crime, a compra de apoio político no Congresso. As circunstâncias também, já que tudo foi combinado com a cúpula do PT. Sobre as consequências do crime, afirmou:

- A compra de apoio político no Congresso pôs em risco o regime democrático, a independência dos poderes e o sistema republicano, em flagrante ofensa à Constituição.

A pena foi aumentada, ainda, porque Valério tinha posição de liderança em relação aos sócios, que também integravam a quadrilha. Para o relator, não houve atenuantes. O voto de Barbosa foi acompanhado por cinco ministros. Só não participaram Lewandowski, Rosa Weber, Toffoli e Cármen Lúcia, por terem absolvido o réu.

Pelo crime de corrupção ativa no episódio de pagamento de propina ao então presidente da Câmara João Paulo Cunha, Barbosa fixou a pena em quatro anos e um mês de reclusão, mais 180 dias-multa. O total ficou em R$ 432 mil. O voto foi seguido por todos os sete ministros aptos a votar.

"Palavra emprestada da medicina"

O passo posterior foi votar as penas de Valério referentes às práticas de peculato - que pode gerar de dois a 12 anos de prisão. O primeiro peculato analisado foi o ocorrido na Câmara: a SMP&B embolsou dinheiro público em troca de serviços não prestados. Barbosa fixou pena de quatro anos e oito meses de reclusão, mais 210 dias-multa (R$ 546 mil). Para Barbosa, o motivo do crime influenciou negativamente na fixação da pena:

- Marcos Valério pretendeu não apenas enriquecer ilicitamente, mas também obter sua remuneração pela prática concomitante de outros crimes em proveito do PT.

Barbosa disse que o dinheiro desviado, quase R$ 1 milhão, também influenciou na pena.

- Considero que quanto mais alto o desvio, mais reprovável a conduta e mais grave as consequências para o bem jurídico protegido - afirmou, recebendo o apoio de sete ministros. Lewandowski e Toffoli tinham absolvido e não votaram.

Os ministros não concluíram a votação sobre corrupção ativa por Valério ter subornado o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato em troca da liberação de R$ 73,8 milhões do fundo Visanet para a SMP&B. Barbosa fixou a pena em quatro anos e oito meses, mais o pagamento de 210 dias-multa (R$ 504 mil).

Foi a primeira vez que Lewandowski divergiu do relator. Ele propôs três anos, um mês e dez dias de reclusão, mais R$ 108 mil. Houve discussão.

- A palavra dosimetria é interessante, ela é emprestada da Medicina, é como a dose de um remédio. Esse remédio não pode ser menor ou maior que o necessário, tem que ser na dose certa - argumentou Lewandowski.

- E não pode ser barateado também - respondeu Barbosa.

Fonte: O Globo

STF define que Marcos Valério irá para a cadeia


O Supremo decidiu que Marcos Valério Fernandes, operador do esquema do mensalão, irá para a cadeia. Em análise ainda parcial dos crimes, o empresário foi condenado a ao menos 11 anos e oito meses de prisão por corrupção ativa, peculato e formação de quadrilha. Ele também pagará multa de no mínimo R$ 978 mil. Ontem foi iniciado o cálculo das penas, tecnicamente chamado de dosimetria

MENSALÃO - O JULGAMENTO

Valério cumprirá pena em regime fechado, decide STF

Ministros aplicam pelo menos 11 anos e 8 meses de prisão, mais R$ 1 mi de multa

Após definir pena final que o empresário terá, tribunal irá debater o tamanho da punição aos demais condenados

Felipe Seligman, Flávio Ferreira, Márcio Falcão e Nádia Guerlenda

BRASÍLIA - O STF (Supremo Tribunal Federal) definiu que o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, operador do mensalão, terá que cumprir pelo menos 11 anos e 8 meses de prisão.

Pela lei, penas com esse tamanho têm que ser cumpridas inicialmente em regime fechado.

Na sessão de ontem, os ministros analisaram a pena para apenas três crimes pelos quais Valério foi condenado: corrupção (4 anos e 1 mês) e peculato (4 anos e 8 meses), cometidos por ele ao desviar dinheiro da Câmara, além da formação de quadrilha (2 anos e 11 meses).

A decisão parcial prevê ainda que o empresário mineiro terá de pagar multa de pelo menos R$ 978 mil.

O tribunal ainda precisa votar a punição de Valério em outros seis episódios do mensalão. Isso deve ocorrer hoje, começando pela análise dos desvios de recursos ligados ao Banco do Brasil.

Após quase três meses, o tribunal chegou à 40ª sessão do julgamento iniciando o cálculo das penas, tecnicamente chamado de dosimetria. Ao todo, o STF condenou 25 réus por sete crimes e absolveu outros 12.

O tribunal já estabeleceu que o esquema, idealizado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, foi usado para a compra de apoio político em parte do primeiro mandato do ex-presidente Lula.

Divergência

As primeiras penas de Valério foram estabelecidas pelo relator, Joaquim Barbosa, e seguidas pelos demais ministros.

Quando o tribunal começaria a analisar a penalidade a ser aplicada ao empresário no caso de corrupção ativa pelos desvios de dinheiro do Banco do Brasil. Barbosa propôs a pena de 4 anos e 8 meses de prisão.

Mas o revisor, Ricardo Lewandowski, estabeleceu-a em 3 anos e 1 mês.

O relator argumentou então que Lewandowski estaria "barateando demais a corrupção".

Em meio a discussão, o revisor defendeu seus parâmetros. "A dosimetria, tal como um remédio, uma quimioterapia, tem que ser na dose certa". Neste momento que a sessão foi interrompida.

Somente depois de resolver a situação de Valério, os ministros passarão a analisar as penas dos outros réus.

A demora praticamente inviabiliza o fim do julgamento ainda nesta semana.

Após a conclusão das penas, o STF ainda terá que decidir quando as prisões serão realizadas. O Ministério Público Federal pediu a prisão imediata, mas a Folha apurou que isso não deve acontecer. A prisão pode ocorrer com a publicação do resultado do julgamento ou após a análise dos recursos.

A defesa pode pedir esclarecimentos da sentença ou a sua reavaliação em caso de haver pelo menos 4 votos para a absolvição.

Ontem o ministro Celso de Mello afirmou que ainda poderá haver uma outra fase do julgamento em que os ministros irão analisar o total das penas, a relação entre elas, possibilitando até a diminuição da condenação final.

Mesmo com a concordância dos integrantes da corte em relação ao voto do relator, ficou definido que hoje o plenário deve tratar das penas sugeridas pelo ex-ministro Cezar Peluso, que se aposentou no meio do julgamento.

Para o ex-ministro, Valério deveria ser condenado por uma pena menor, de três anos de prisão tanto na corrupção quanto no peculato analisados ontem.

Como o julgamento ainda não terminou, nada impede que os ministros mudem o voto.

Fonte: Folha de S. Paulo

Condenação de Valério já soma 11 anos


Mensalão - Especial: Operador do mensalão, empresário é o 1º a receber penas, que ainda devem crescer • Ele terá de cumprir regime fechado • Punição inclui multa de R$ 979 mil • Fim do julgamento pode ficar para novembro.

Operador do mensalão, o empresário Marcos Valério foi condenado pelo STF a pelo menos 11 anos e 8 meses por três dos crimes pelos quais foi condenado - corrupção ativa, peculato e formação de quadrilha. Ele também terá de pagar R$ 979 mil de multa. A pena ainda será aumentada, pois vários outros crimes não entraram na pauta. Na sessão de ontem, os ministros só definiram a punição para os crimes que envolveram o contrato com a Câmara dos Deputados, na gestão do petista João Paulo Cunha. Valério terá de cumprir parte da pena na cadeia. A sistemática adotada ontem deve atrasar o fim do julgamento, previsto pelo relator, Joaquim Barbosa, para esta semana. Com isso, somente depois do segundo turno das eleições o tribunal definirá a pena imposta ao ex-ministro José Dirceu. Marcos Valério quer receber tratamento de réu primário. Sua defesa sustenta que não há fundamentos para consideração de "maus antecedentes".

Ministros do Supremo iniciam cálculo das penas e impõem regime fechado a Valério

Condenação.Sentenças iniciais superam 11 anos e se referem a apenas três dos cinco crimes pelos quais empresário foi condenado; votação sobre as punições começa em ritmo lento e conclusão da dosimetria deve ocorrer depois da realização do 2º turno das eleições

Felipe Recondo, Mariângela Gallucci, Ricardo Brito e Eduardo Bresciani

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal impôs ontem ao empresário Marcos Valério Fernandes de Souza pelo menos 11 anos e 8 meses de prisão por três dos cinco crimes dos quais foi condenado no mensalão – corrupção ativa, peculato e formação de quadrilha. O empresário também terá de pagar R$ 979 mil de multa, valor que ainda será atualizado. Marcos Valério, necessariamente, cumprirá parte da pena na cadeia – isso ocorre quando a punição supera oito anos de reclusão. A punição do chamado operador do mensalão deve ser aumentada, pois os ministros ainda estabelecerão as penas para os crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Muitos dos réus foram condenados várias vezes pelo mesmo crime – em operações diferentes dentro do esquema. É o caso de Valério. Na sessão de ontem, os ministros só definiram as penas para os crimes que envolveram o contrato firmado com a Câmara dos Deputados e executado na gestão do ex-deputado João Paulo Cunha (PT-SP). Foi o primeiro dia da chamada dosimetria –cálculo das punições dos 25 condenados no julgamento que apontou compra de apoio político no primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva num esquema chefiado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e apoiado pelo ex-presidente nacional do PT José Genoino. O relator do processo, Joaquim Barbosa, disse ter levado três pontos em consideração. Primeiro, afirmou que os crimes praticados são "altamente reprováveis" por terem levado, ao fim, à compra de votos no Congresso. "Como alcançou o objetivo de compra de deputados, colocou em risco o próprio regime democrático, a independência entre os poderes e o regime republicano." Barbosa lembrou que a propina paga neste caso foi entregue ao então presidente da Câmara, João Paulo Cunha."Entendo que corromper o presidente de um poder nas próprias instalações desse poder é algo muito grave."

Várias frentes. Valério teve participação em todos os núcleos do esquema. Por isso, ele foi condenado mais de uma vez por corrupção ativa – por ter comprado o apoio de parlamentares e por ter provocado o desvio de recursos do Banco do Brasil, por lavagem de dinheiro e por evasão de divisas. Com isso, sua pena poderá ser aumentada. A sistemática adotada ontem pelos ministros deve atrasar o fim do julgamento, antes previsto para esta semana. A definição da pena de Dirceu, por exemplo, deverá ficar para depois do 2.º turno das eleições municipais. Barbosa queria dividir a dosimetria das penas por núcleos–financeiro, publicitário e político. Dessa forma, leria a íntegra do voto em relação a todos os réus e depois seria aberta a votação.Mas os ministros defenderam que o julgamento fosse feito réu por réu e cri-me por crime.Assim,o relator calcularia a pena imposta a um dos crimes pelo qual um réu foi condenado e a votação seria aberta. Outra decisão tomada ontem é que os ministros que absolveram os réus não vão participar da dosimetria de suas penas.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Amigos de Dirceu articulam reação política


Em caso de prisão, petistas vão se declarar prisioneiros do que consideram um "julgamento de exceção"

Tatiana Farah, Sérgio Roxo, Maria Lima e Juliana dal Piva

SÃO PAULO e ÁGUAS DE LINDOIA - Amigos de militância de esquerda de José Dirceu e de José Genoino já se articulam para uma reação política à condenação dos dois petistas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O grupo "Os Amigos de 68", que reúne ex-presos políticos, realizou um almoço de solidariedade a Dirceu e Genoino no domingo, na casa de Ana Corbisier, companheira do ex-ministro no Movimento de Libertação Popular (Molipo). Os "amigos de 68" não descartam iniciar um movimento político mais amplo, que inclua o tema da reforma política e uma análise do Judiciário, ou organizar uma mobilização de apoio direto aos ex-guerrilheiros.

-Deve haver uma reação. Esse processo foi muito desigual. É complicado quando a Justiça se politiza - avaliou José Luiz Del Roio, ex-militante contra a ditadura e ex-senador na Itália.

Del Roio participou do almoço, que foi marcado por conversas sobre o passado dos dois petistas, principalmente sobre suas prisões. Genoino é o mais abalado, mas parecia tranquilo no encontro com os ex-companheiros. O ex-deputado foi quem comparou os tempos de sua prisão ao momento atual. Para os presentes, persistiu a conversa de que os petistas foram injustiçados e que todo o rigor da condenação está, de alguma forma, relacionado ao passado deles.

- Os dois se comportaram de maneira magnífica na prisão durante a ditadura. Se forem presos, irão para a cadeia com dignidade, não fugirão. Mas qualquer réu tem o direito de defender sua biografia - disse Del Roio.

Para o cineasta Cláudio Kahns, Genoino e Dirceu "estão empenhados em continuar se defendendo".

- Alguma reação deve ter. Ninguém está satisfeito - disse o cineasta, referindo-se a uma mobilização dos "Amigos de 68" em prol de Genoino e Dirceu.

O PT vai acatar a decisão do STF no julgamento do mensalão, mas, em caso de prisão, os integrantes do partido vão se declarar prisioneiros políticos de um julgamento de exceção, afirmou ontem ao GLOBO o ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência Paulo Vannuchi, que participou do encontro anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, em Águas de Lindoia, interior de São Paulo.

- O Supremo tem que ser respeitado. Se determinar prisão, as pessoas vão para a prisão. Agora, as pessoas não vão admitir que são corruptas, elas vão declarar que são prisioneiras políticas de um julgamento de exceção. Vai ser a razão de viver do Genoino e do Dirceu demonstrar que foram condenados sem provas - afirmou Vannuchi.

O petista disse ainda que, a partir de agora, o partido observará atentamente todas as decisões do STF em casos semelhantes:

- Nós vamos acompanhar com lupa cada voto de ministro, e, se daqui a um ano, eles absolverem um grande empresário acusado de corrupção por falta de provas, nós vamos lembrar, democraticamente, que, no julgamento do mensalão, quando não havia provas, os indícios foram tidos como suficientes para condenar.

Procurado ontem, Genoino disse que não falaria sobre o julgamento. Em entrevista à Rádio Estadão/ ESPN, afirmou que vai lutar para provar a sua inocência:

- Sou inocente. Nunca fiz parte de quadrilha nem o PT é partido de quadrilheiros. Não sou corrupto. Sou inocente e considero uma injustiça (a condenação pelo STF).

O ex-presidente do PT prometeu ainda "dedicar a vida a provar a sua inocência":

- Esse julgamento não apresentou provas concretas. Foi feito na base do indício, da dedução, do domínio do fato, que são teses que têm um viés autoritário.

Genoino também comparou o julgamento do mensalão com a sua condenação pela Justiça Militar na época da ditadura, quando foi preso depois de atuar na guerrilha do Araguaia:

- Minha disposição é o risco do combate. Prefiro o risco do combate do que a humilhação e do que a servidão.

Nos dois dias mais pesados do julgamento do mensalão para o núcleo político, Dirceu e o ex-tesoureiro Delúbio Soares produziram textos variados para os blogs e twitter. Para fugir do assunto, focaram em temas como a eleição municipal, futebol, o arquivamento das denúncias contra o ministro Fernando Pimentel pela Comissão de Ética da Presidência e até a visita do atleta jamaicano Usain Bolt ao Rio de Janeiro.

Fonte: O Globo

Genoino fala em 'viés autoritário' de nova condenação


Um dia depois de o STF o condenar por formação de quadrilha, ele reafirma inocência e diz que não se sente condenado

No dia seguinte à condenação pelo crime de formação de quadrilha pelo Supremo Tribunal Federal, o ex-presidente do PT José Genoino reafirmou sua inocência e classificou como injusta uma condenação, segundo ele, política.

Em entrevista à rádio Estadão ESPN ontem, o petista disse ter sido condenado sem provas. "Não me sinto condenado porque sou inocente. Essa condenação política não me atinge", defendeu-se.

Na acusação apresentada ao STF, o Ministério Público defendeu que José Genoino participou do esquema de compra de apoio político durante o primeiro mandato do governo Lula.

A acusação foi fundamentada com base nas assinaturas de Genoino em contratos de empréstimos, assumidos, para a promotoria, de forma fraudulenta e que garantiam os recursos para compra de votos. Para o relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, o petista atuava como "interlocutor político do grupo criminoso".

"Esse julgamento não apresentou provas concretas. Foi feito na base do indício, da dedução, do domínio do fato, que são teses que têm um viés autoritário", rebateu Genoino.

Legitimidade. O petista afirma que assinou os empréstimos por ter sido presidente do PT no período e que as transações financeiras, destinadas ao próprio partido, eram legítimas. "Não houve compra de votos, não houve compra de deputados. Houve debate político e franco." Ao comentar o julgamento, Genoino defende que o processo foi "politizado" e voltou a criticar o que define como criminalização da política. "Eu fiz alianças, fiz acordos, participei de debates. Isso é da natureza política. Não existe política sem negociação. O STF não pode querer ser uma espécie de poder moderador", considerou.

STF começou a definir ontem as penas dos envolvidos com o esquema do mensalão. O petista foi condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha - igual condenação do ex-ministro José Dirceu e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. A pena prevista para cada um dos crimes varia de 2 a 12 anos.

"Serei obrigado a cumprir, democraticamente, as decisões do STF. Mas vou discuti-las a cada hora, a cada dia, a cada momento", afirmou Genoino, que adiantou que vai recorrer da decisão do Supremo.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Marco histórico em defesa do estado de direito – O Globo / Editorial


A trajetória mais que centenária da República brasileira é acidentada. Para a nação conseguir completar 27 anos ininterruptos de estabilidade institucional, feito inédito na Era republicana, ela cumpriu tumultuado percurso de crises, com dois longos períodos de trevas - no Estado Novo varguista e na ditadura dos militares, da qual o país saiu unido em torno de um projeto de redemocratização, em que se lançou sem violência, inclusive com a adesão de políticos do antigo regime.

Desde 1985, quando a posse de um presidente civil (Sarney) serviu, e serve, de registro do fim do ciclo militar autoritário, as instituições da democracia representativa têm amadurecido e se consolidado, essencial para o desenvolvimento econômico - impossível num quadro de insegurança jurídica - e, por decorrência, o aprimoramento social.

O desfecho do julgamento do mensalão entra para a História como um dos pontos altos neste processo de amadurecimento do regime, e torna o Brasil um exemplo ainda mais positivo numa região intoxicada pelo antigo e pernicioso vírus do nacional-populismo latino-americano, em nome do qual fundam-se regimes autoritários pela via de mecanismos apenas na superfície democráticos. Sempre em nome da "justiça social".

Ao condenar por corrupção passiva e formação de quadrilha a cúpula do PT da época da primeira campanha vitoriosa de Lula, em 2002, e da primeira parte do seu governo até a eclosão do escândalo, em 2005, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou de forma enfática a separação entre os Poderes e a independência do Poder Judiciário, questão pétrea em qualquer democracia que mereça ser chamada pelo nome.

Quando um dos beneficiários do mensalão, o ainda deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), sentindo-se acuado em lutas internas na base do governo, resolveu denunciar o esquema, ninguém poderia antever que José Dirceu, ministro-chefe da Casa Civil, José Genoíno e Delúbio Soares, presidente e tesoureiro do PT, iriam, algum dia, ser punidos na Justiça.

A quase certeza da impunidade que costuma acompanhar os poderosos no Brasil deve ter animado a direção dos bancos Rural e BMG a participar da fraude financeira dos empréstimos forjados para lavar o dinheiro do mensalão surrupiado dos cofres públicos (BB/Visanet e Câmara dos Deputados).

A tendência do Brasil tem sido de avanços. A renovação da classe política não é a ideal, em velocidade e qualidade, mas não se deve esquecer que o país das tentativas de tomadas do poder pela força, duas delas bem-sucedidas, cassou no Congresso o mandato do primeiro presidente eleito pelo voto direto depois do apagão da ditadura militar, sem nada de anormal acontecer nas ruas - e nos quartéis.

Em certa medida, a condenação de petistas, aliados e sócios no valerioduto pelo Supremo repete o feito do Congresso em 1993. Logo nas primeiras condenações do julgamento, o "New York Times", ao divulgar a notícia, acrescentou que o fato renovava as esperanças dos brasileiros na possibilidade de poderosos serem punidos por corrupção, mercadoria rara na vida pública nacional. Aconteceu no impeachment de Collor e agora no mensalão. Desta vez, porém, o alcance político chega até a ser mais amplo, com a fixação de limites nítidos para o trânsito dos poderosos de ocasião na vida pública.

O procurador-geral da República Cláudio Fonteles construiu sólida denúncia contra os mensaleiros, tachou a cúpula do esquema de "organização criminosa" e teve êxito, em 2007, ao pedir a instauração do processo pelo STF. Cinco anos depois, já com a denúncia sendo defendida pelo sucessor de Fonteles, Roberto Gurgel, a "organização criminosa" e boa parte de seus beneficiários foram condenadas, com José Dirceu à frente, considerado por Fonteles o "chefe da organização".

Toda a tramitação do caso tem sido exemplar. O MP, com base em depoimentos perante CPIs, investigações e perícias policiais, encaminhou denúncia consistente. O relator, ministro Joaquim Barbosa, executou trabalho minucioso de tomada de depoimentos pelas justiças regionais e no encaminhamento dos seus votos ao restante do Pleno. O mesmo aconteceu com o outro polo do julgamento, Ricardo Lewandowski, revisor do processo. Só a má-fé leva alguém a enxergar algum viés político nas condenações por um Pleno composto em sua maioria por ministros indicados nos governos petistas de Lula e Dilma - mais um fator de enobrecimento da atuação da Corte.

Concluída a avaliação do mérito, na segunda-feira, na 39ª sessão do julgamento, o Supremo deixa um acervo de discussões e definições técnicas importantes sobre os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha de "colarinhos brancos", por exemplo, para balizar as instâncias inferiores da Justiça com uma jurisprudência mais adequada a um tipo de delinquência cometida em gabinetes fechados, quase sempre sem provas materiais, mas nem assim pouco ofensiva para a sociedade.

Advogados de defesa foram surpreendidos por uma interpretação de instrumentos já existentes na legislação penal que levou a maioria dos ministros a considerar como elementos fortes de convicção para condenações indícios e provas testemunhais mesmo não colhidas perante juízes. Houve, ainda, a aplicação do conceito do "domínio do fato" , pelo qual alguém pode ser condenado sem provas materiais, mas por ter coordenado a execução do crime. Afinal, chefes de esquemas de corrupção em altas esferas costumam não deixar rastros.

As inúmeras intervenções dos ministros nos debates profundos que travaram provam que vários deles entenderam muito bem do que se tratava o mensalão. Não foi um caso comum de corrupção. O presidente da Corte, ministro Ayres Britto, em uma das sessões, qualificou: tratava-se de "(...) um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto".

Como não qualificar como "golpe" o desvio de dinheiro público - e que fosse privado - para cooptar pecuniariamente legendas menores, a fim de dar sustentação perene ao grupo no poder? Celso de Mello, decano da Corte, um dos que aceitaram a denúncia de "formação de quadrilha", considerou o grupo do mensalão uma "sociedade de delinquentes", formada para mudar, por baixo do pano, o sentido do voto dos eleitores, adulterar a representação política, num projeto de eternização no poder. O mensalão visou a abalar, nas palavras de Joaquim Barbosa, "as bases do sistema democrático".

O Supremo, ao condenar mensaleiros, estabeleceu forte linha de defesa do estado democrático de direito. Não será por falta de balizamento jurídico que os homens públicos em geral deixarão de exercitar a política como deve ser.

O fim de um tabu – O Estado de S. Paulo / Editorial

A decisão da maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) de condenar 10 réus do mensalão também por formação de quadrilha não foi apenas coerente com o caminho percorrido pelos juízes, que ao longo de 39 sessões impuseram 70 sentenças condenatórias a 25 dos acusados de participar do escândalo, na linha da denúncia do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, endossada pelo relator do processo, ministro Joaquim Barbosa. Os 6 votos que prevaleceram em plenário na segunda-feira, entre os 10 ministros da Corte, quebraram um tabu e abriram a perspectiva de se transformar de forma substancial o combate à corrupção no País. O crime compensará menos, muito menos, e a chance de seus autores ficarem impunes, ou quase isso, finalmente começará a diminuir.

Variando de 1 a 3 anos de prisão, a pena por formação de quadrilha não se destaca pela severidade. No caso do delito de corrupção ativa, para comparar, o castigo começa com 2 anos e pode chegar a 12. Mas, somando-se à punição por esse e outros ilícitos, poderá fazer a diferença entre o seu cumprimento em regime semiaberto ou fechado. Além disso, e principalmente, o veredicto do STF priva os culpados do velho estratagema de alegar mera coautoria dos crimes cometidos, quando os seus protestos de inocência já tiverem sido desmontados pela força dos fatos conhecidos. Os principais mensaleiros, julgou o Supremo Tribunal, fizeram mais do que se acumpliciar para desviar recursos públicos - R$ 153 milhões, nos cálculos do presidente Carlos Ayres Britto - para favorecer o governo Lula na Câmara dos Deputados.

Assim como Britto, cinco de seus pares entenderam que os acusados formaram o que em direito se chama societas sceleris, uma organização delinquente estruturada e duradoura - no caso, sob inspiração, certamente, de Lula e efetivo comando do ministro José Dirceu - concebida para cometer crimes que podem ser sempre os mesmos, ou não. "Em mais de 44 anos de atuação na área jurídica", avaliou o decano da Corte, Celso de Mello, "nunca presenciei caso em que o delito de quadrilha se apresentasse tão nitidamente caracterizado." De seu lado, o ministro Luiz Fux ressaltou o "elo associativo", durando mais de dois anos, para a prática de crimes variados. "O conluio entre os réus não era transitório." Apenas se poderia especular sobre a sua longevidade e seus novos atentados à ordem republicana, se o esquema não tivesse sido denunciado em 2005.

Se a quadrilha continuasse apta a agir como vinha fazendo, por que à compra de votos de políticos não se seguiriam outras operações que golpeariam o Estado Democrático de Direito para o PT deitar raízes no poder? Não seria o presidente Lula quem iria impedi-la. Foi contundente, nesse sentido, o pronunciamento do ministro Marco Aurélio Mello. Ele lembrou apropriadamente o que dissera ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2006, quando criticou Lula por "enterrar a cabeça para deixar o vendaval (do mensalão) passar". Sem rebuços, notou que "mostraram-se os integrantes afinados, em número sintomático de 13", numa referência direta ao RG eleitoral do PT. "O entendimento se mostrou perfeito. A sintonia estaria a lembrar a máfia italiana."

Tentando tapar o sol com peneira, os petistas acusam o STF de "criminalizar a política", como se os arranjos entre os seus dirigentes e os de outras agremiações configurassem negociações legítimas para o fechamento de acordos de mútua conveniência, rotineiros nas relações entre os partidos e os governos de turno. Na realidade, mais de um ministro fez questão de apartar a política do lamaçal. "Não se está a incriminar a atividade política, mas a punir aqueles que não a exerceram com dignidade, preferindo transgredir as leis penais do País com o objetivo espúrio de controlar o próprio funcionamento do aparelho de Estado", ressalvou, por exemplo, Celso de Mello. "Não estamos a condenar políticos, mas autores de crimes." E o relator Joaquim Barbosa foi exemplar ao indicar o alcance da inculpação dos quadrilheiros de terno e gravata, cujos atos abalam a ordem social. "Ou só indivíduo que mora no morro e sai atirando loucamente é que abala?"

É um processo - Fernando Rodrigues


Há um clima de "o Brasil mudou" no ar. Tem sido comum ouvir e ler que foi "histórica" a decisão do Supremo Tribunal Federal de condenar réus do mensalão.

São inegáveis os avanços institucionais nos últimos anos. O STF trilha o mesmo caminho. Mas, como sou treinado para ser cético, tendo a achar exagerada a euforia geral sobre o julgamento do mensalão. Vejo tudo como parte de um processo civilizatório lento e irregular, embora com saldo positivo.

O mensalão e crimes correlatos têm como gênese duas razões principais. Primeiro, a certeza quase certa (que existia) de impunidade. Segundo, e mais importante, o caldo de cultura em vigor dentro do Congresso e dos meios políticos para que muita gente corrompa e seja corrompida.

Absolutamente nada foi feito para atacar a segunda razão do surgimento do mensalão. Ao contrário. A miríade de partidos políticos só faz aumentar. Basta lembrar que no início do governo Lula, em 2003, existiam apenas 25 das atuais 30 legendas. Muitas dessas agremiações vivem penduradas nas tetas do dinheiro público. Não têm votos, só que aparecem na TV e no rádio (tudo pago com verbas estatais) e ganham um naco generoso do Fundo Partidário.

Na área dos costumes políticos há poucas boas notícias. Na semana passada, enquanto o STF castigava os mensaleiros, a Câmara oficializava a "semana de deputado": agora o trabalho é obrigatório só às terças, quartas e quintas. Nos outros dias, as Excelências folgam e recebem do mesmo jeito. De quebra, engavetaram a proposta que eliminaria o 14º e o 15º salários para os congressistas.

É bom que o STF esteja condenando mensaleiros. Mas o Brasil continua basicamente igual. É tudo parte de um processo que levará décadas para amadurecer. Vai depender muito de como votarão os eleitores. Aliás, os brasileiros nas urnas têm dado um recado ambíguo: a maioria não está nem aí para o mensalão.

Fonte: Folha de S. Paulo

STF se perde - Merval Pereira


Mais uma vez os ministros do Supremo bateram cabeça ao vivo e em cores, dando uma demonstração evidente de que não têm uma organização que lhes permita ordenar minimamente uma sessão na qual o fundamental é ter critérios claros para basear as condenações dos réus.

Houve momentos em que a situação chegou a ser caricata, como quando o relator Joaquim Barbosa perguntou se ele e o revisor Ricardo Lewandowski não estariam tratando de questões distintas (e não estavam) ou quando o relator travou o seguinte diálogo com o revisor:

Joaquim Barbosa: Eu gostaria de perguntar, a análise de Vossa Excelência diz respeito a qual réu?

Ricardo Lewandowski : Valério, em outro peculato. Eu inocentei Valério em relação aos peculatos que dizem respeito à Câmara.

Joaquim Barbosa: Vossa Excelência não tem voto neste caso.

Não tinha mesmo, mas para não ficar vencido na discussão de outros peculatos, com uma decisão da qual não participou por ter absolvido Marcos Valério naquele caso específico, Lewandowski antecipou seu voto, provocando mais confusão no plenário, a ponto de o presidente Ayres Britto ter suspendido a sessão para tentar organizar a discussão, que àquela altura estava caótica.

Barbosa em diversas ocasiões demonstrou que não se preparou adequadamente para a sessão de ontem. Deu uma pena para Marcos Valério por formação de quadrilha e ainda por cima aplicou uma multa: "Eu torno definitiva a pena de dois anos e 11 meses, e 291dias de multas, para Valério, com valor de dez salários mínimos por dia, levando em conta a situação financeira do réu. É o que consta dos autos. Essa é a pena para Valério em relação ao crime de quadrilha", proclamou.

Luiz Fux tentou acudir, comentando baixinho: "Eu tenho a impressão de que não há previsão de multas". Barbosa insistiu, chamando a atenção para seu próprio erro: "A previsão de multa é genérica." Não era, não, e Celso de Mello e Ayres Britto, consultando o Código, alertaram que naquele artigo não havia previsão de multa. O relator não se fez de rogado: "Nesse caso eu mudo meu voto, eliminando a imposição de multa." Ele cometeria outro erro ao tratar do caso de corrupção ativa de Marcos Valério em relação ao diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Barbosa baseou sua condenação em legislação de novembro de 2003, que aumentou a pena para esse tipo de crime, mas Lewandowski chamou atenção para o fato de que o crime acontecera antes, sob a vigência de uma lei mais branda.

Barbosa ainda argumentou que a propina recebida por Pizzolato fora paga em janeiro de 2004, mas vários ministros lembraram-lhe que, pela legislação, o crime acontece quando se promete vantagem indevida a funcionários ou se oferece, e não quando a propina é entregue.

Ainda tentando manter a pena mais dura, argumentando que pelo Código Penal a pena é aumentada de um terço se, em razão de vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou pratica um ato infringindo o dever funcional, Joaquim Barbosa alegou: "Eu não contemplei." O presidente do STF perguntou: "Então Vossa Excelência vai aumentar?" Barbosa disse que não, tentando convencer os colegas de que uma coisa contrabalançava a outra.

Quando o item foi colocado em votação, a primeira ministra a votar foi Rosa Weber, que acompanhou o revisor justamente por ele ter dado a pena com base na legislação adequada. Barbosa, que já dissera que Lewandowski estava "barateando" o crime com uma pena mais leve, tentou retomar a discussão, lembrando que o montante desviado "é extremamente considerável".

Propôs aplicar a cláusula de aumento da pena, mas foi aparteado por Ayres Britto: "Partindo da legislação penal vigente no momento". Como a situação estava novamente confusa, Britto suspendeu definitivamente a sessão de ontem e pediu que a ministra Rosa Weber retirasse seu voto, para que o relator pudesse refazer o seu e reapresentá-lo na sessão de hoje.

Se os ministros não se reunirem antes da sessão de hoje para tentar um entendimento mínimo sobre os critérios a serem adotados, a definição da dosimetria não apenas não terminará amanhã, como estava previsto, como os advogados de defesa terão base para muitos embargos infringentes e de declaração.

Fonte: O Globo

Urna não é lavanderia - Dora Kramer


A última sessão de votação sobre o mérito da denúncia do mensalão proporcionou um desfecho de precisão magistral contida na constatação do ministro Celso de Mello: "Estamos a condenar não atores ou agentes políticos, mas agentes de crimes".

Não foi um mero resultado de 6 a 4 pela condenação dos réus nem só a confirmação de que uma quadrilha tomou de assalto o aparelho de Estado atuando por dois anos e meio sob as vistas do então presidente Luiz Inácio da Silva.

Foi bem mais que isso: deu-se a indispensável separação entre a atividade política e o exercício da ilegalidade continuada. Por ora uma dissociação teórica, mas que servirá à melhoria das práticas pelo que encerra de exemplar.

O decano da corte expressou-se mais uma vez didático. Deu às coisas os nomes que elas realmente têm. O processo que agora se encerra tratou de delinquência pura e simples, não julgou o exercício da política.

Se esta foi contaminada por aquela, mais que depressa é preciso sanear o ambiente. Em primeiro lugar não confundindo as duas, muito menos se justificando uma (a política) com a outra (a ilegalidade) como se houvesse aí uma relação de indissociável dependência.

Em outras palavras, não precisa ser assim, não deve ser assim e, se houver quem ainda insista que assim seja está consignado pelo Supremo Tribunal Federal: seus autores não esperem ser tratados como políticos, pois serão vistos como os meliantes que efetivamente são.

Criminosos comuns, passíveis de cumprir pena de prisão, comparados a mafiosos e a bandidos de facções que infestam as grandes cidades.

Pessoas que, daqui em diante, não terão como recorrer ao discurso de que as urnas os absolvem, pois, como disse o ministro Celso de Mello, "votações expressivas, embora significativas, não constituem causas para a extinção da punibilidade".

Na sessão do "fecho" do processo, destacaram-se também os ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Ayres Britto na exposição detalhada do caráter social e legalmente pernicioso da atuação desse tipo de quadrilha.

Celso de Mello, porém, foi ao ponto que ainda não havia sido esmiuçado ao dizer que urna não é lavanderia de ilícitos, voto não é indulto e eleição não torna ninguém imune às exigências do devido processo legal.

Prestação de contas. Sem pretender discutir o mérito da convicção de cada um, é de se registrar uma acentuada diferença entre os votos que absolveram e os que condenaram os réus por formação de quadrilha.

As absolvições foram rápidas – à velocidade de um relâmpago no caso do ministro Dias Toffoli – sem grandes argumentações, enquanto as condenações se escoraram em longas fundamentações doutrinárias, jurídicas, sociais e morais.

Tiveram, assim, maior peso no tocante à explicação ao público sobre os motivos que levaram à formação do voto.

Nem me fale. O ministro Marco Aurélio Mello contou no voto final do processo um "bastidor" de 2006, quando avisou ao presidente do Senado que seria melhor o presidente Lula não ir à posse dele na presidência do Tribunal Superior Eleitoral porque no discurso daria um forte "recado".

A mensagem ficou inscrita entre peças memoráveis e falava da "rotina de desfaçatez" que havia tomado conta da República. Marco Aurélio dava ali a indicação de que o clima preponderante no STF era de tolerância zero e pela primeira vez desmascarava as entranhas do escândalo.

Pois bem. Mesmo sem saber do conteúdo do discurso, Lula – que voltava de uma viagem ao Chile e já havia posto a posse de Marco Aurélio na agenda – achou melhor não ouvir e desistiu de ir.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Nada de confundir alhos com bugalhos - José Nêumanne


Quando veio a lume a compra de votos para obter maioria no Congresso Nacional para o primeiro governo petista de Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira reação do ex-presidente foi dizer-se traído e apunhalado pelas costas por maus companheiros. E assumiu, como de hábito em sua vida, a postura do macaquinho que não ouve, não vê e não fala. Hoje se sabe que chegou a cogitar de renunciar e que teria sido dissuadido por seu lugar-tenente, o factótum José Dirceu, então chefe da Casa Civil, logo transformado em principal alvo do delator Roberto Jefferson. Este, especialista em salas, salões e corredores palacianos, preferiu evitar o confronto com o chefão. A oposição imaginou que, em vez de lutar por um improvável impeachment do presidente com maioria no Congresso, deveria deixá-lo sangrar até a eleição, quando lhe seria dado o golpe de misericórdia. Dirceu estava certo: Lula deu a volta por cima, venceu o tucano Geraldo Alckmin e, reforçado pela mística de invencível nas urnas, adotou a filustria do caixa 2.

Depois de oito anos no poder, na crista de uma onda de quase 80% de aprovação popular, o padim Ciço de Caetés deu-se ao luxo de impor uma candidata egressa do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Dilma Rousseff, que entrara no lugar de Dirceu no posto de "capitão do time". E, mais uma vez, consagrou-se nas urnas. Com sua empáfia característica, Lula, então, apostou seu cacife político na falácia de que o escândalo, apelidado de mensalão, foi uma fantasia da oposição despeitada, divulgada pelo Partido da Imprensa Golpista (PIG, porco em inglês), fantasma que na internet assombra o País nas mensagens dos "blogueiros progressistas". A explicação para o que havia sido revelado pelos fatos notórios seria um "crime menor", o caixa 2 de campanha. Para evitar que a realidade fosse revelada antes das eleições municipais, o próprio ex-presidente empreendeu uma cruzada tentando convencer ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) da necessidade de adiarem o julgamento, para não interferir na decisão do eleitor.

A ignorância inflou a empáfia e o ex-dirigente sindical viu a realidade desautorizar seu otimismo, baseado na evidência de que 8 dos 11 julgadores máximos foram alçados ao topo de sua carreira por presidentes correligionários dos réus mais importantes do processo, ele próprio e sua afilhada Dilma. Só que, ao contrário da Petrobrás e do Banco do Brasil, o STF não foi aparelhado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no poder. Nem poderia sê-lo, de vez que o Poder Judiciário é autônomo e entre os deveres dos membros de sua cúpula não consta a obediência ou a gratidão para amparar os interesses e a impunidade de um partido ou político que os haja nomeado para o lugar.

A vaga no STF é vitalícia e presidente nenhum de partido nenhum, com a maioria com que contar no Congresso, tem o poder de demitir um ministro do Supremo, ainda mais a pretexto de assegurar a absolvição de delinquentes. A condenação, por formação de quadrilha, do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, do ex-presidente nacional petista José Genoino e do tesoureiro Delúbio Soares, que sempre gozou de acesso privilegiado ao gabinete e ao coração do chefão, deixou claro que o Estado Democrático de Direito funciona no Brasil. E quem o conquistou na base de sangue, suor e lágrimas não se dispõe a liquidá-lo só para agradar a um líder adorado pelas massas e bajulado pelos parasitas que se refestelam à sombra e água fresca do poder.

Imune à condenação do STF, Lula agora sai a campo para usar o sufrágio popular como uma espécie de instância máxima, acima e além da Justiça, dando aos resultados nas urnas poderes, que não tem, de julgar o julgamento... e os julgadores. O raciocínio, de um simplismo absurdo, resulta da mistura de ignorância e esperteza que levou o Macunaíma da política brasileira ao auge da fortuna e da glória, mas que não absolveu nenhum réu nem ajudará nossa democracia a amadurecer.

Ao dizer a Cristina Kirchner que foi julgado pela população ao se reeleger, o Pedro Malasartes da gestão pública nacional deu seu poderoso aval à conclamação do principal réu do mensalão ao reagir ao resultado da eleição municipal em São Paulo, pregando: "A prioridade agora é ganhar o segundo turno". A cúpula do PT tentou adiar o julgamento e passou a campanha eleitoral inteira insistindo na tecla óbvia de que seu resultado não influiria na decisão do eleitor. O presidente nacional, Rui Falcão, disse que o povo estava ligado mesmo no novelão das 9, Avenida Brasil. Lula aproveitou para tirar um sarro dos palmeirenses, inimigos figadais de seu Corinthians e agora candidatos ao rebaixamento no Brasileirão. Gilberto Carvalho, homem de confiança do ex no gabinete da atual, disse que recorrer ao mensalão é dar um tiro no pé.

Hoje, com a visão utilitária de sindicalista cuidando do cofre da viúva, a cúpula petista tenta convencer a Nação a interpretar o veredicto das urnas em São Paulo como a vingança do mensalão. Mas qual o dispositivo constitucional que dá esse poder ao paulistano? Por que não adotar o mesmo critério em relação ao cidadão que votou no Recife, em Porto Alegre ou Belo Horizonte e derrotou os queridinhos de Lula e Dilma ainda no primeiro turno? O absurdo do raciocínio é tal que negá-lo parece desnecessário. Mas não é. Pois a democracia é imperfeita, como toda obra humana, mas essa imperfeição se reduz pelo equilíbrio de Poderes autônomos. O cidadão elege seus representantes para legislarem no Congresso e governantes para escolherem prioridades do interesse geral na gestão do dinheiro público arrecadado pelo Estado. Cabe ao Judiciário zelar pelo cumprimento da ordem jurídica e punir quem delinquir.

Essa democracia petista do venha a nós, ao vosso reino nada, não convém ao povo brasileiro, pois, ao confundir Jesus Cristo com Zé Buchudo (alhos com bugalhos) e tirar de sob o martelo do juiz a sardinha da punição, queima a mão de quem vota para beijar a mão de quem furta.

Fonte: O Estado de S. Paulo

As três fatias do bolo eleitoral - Elio Gaspari


O PT sabe avançar na agenda alheia, mas, desde 2006, a oposição, petrificada, prega para os convertidos

Faltam poucos dias para o desfecho da eleição municipal e são fortes os sinais de que o PT terá o que comemorar. Qual a explicação para o desempenho dos companheiros se a economia vai devagar, quase parando, e a cúpula do partido de 2005 está a caminho do cárcere?

Aqui vai uma tentativa: desde 2002, quando Lula assinou a Carta aos Brasileiros e venceu a eleição incorporando pilares da política econômica de Fernando Henrique Cardoso, o PT move-se livremente sobre o campo adversário (quem quiser, pode dizer que ele vai à direita, mas essa imagem é insuficiente).

Já a oposição, petrificada, não consegue sair do lugar. Em alguns momentos, radicaliza-se, incorporando clarinadas do conservadorismo europeu e americano.

O tema do aborto, do "kit gay" e a mobilização do cardeal de São Paulo ao estilo da Liga Eleitoral Católica dos anos 30, exemplificam essa tendência. (Registre-se aqui a falta que faz Ruth Cardoso. Com ela, não haveria hipótese de isso acontecer.)

Admita-se que o eleitorado se divide em três fatias. Uma detesta o PT e tem horror a Lula. Outra, no meio, pode ir para qualquer lado. O terceiro bloco gosta de Nosso Guia e não se incomoda quando ele pede que vote em seus postes. Se um bloco se move e o outro fica parado, sempre que houver eleição, o PT prevalecerá.

Some-se à paralisia da oposição uma ilusão retórica. Desde 2010 suas campanhas eleitorais estruturam-se como pregações aos convertidos. O sujeito tem horror a Lula, ouve os candidatos que o combatem e fica duas vezes com mais raiva. Tudo bem, mas continua tendo apenas um voto. Já o PT segue uma estratégia oposta. Sabe que os votos de esquerda vêm por gravidade e vai buscar apoios alhures.

A crença de que o julgamento do mensalão seria uma bala de prata para a oposição revelou-se falsa. Já as crendices petistas segundo as quais o Supremo se tornou um tribunal de exceção ou que o impacto de suas sentenças seria irrelevante são um sonho maligno.

As condenações podem ter sido eleitoralmente insuficientes para derrotar os companheiros, mas não foram irrelevantes. O PT deve prestar atenção à voz do Supremo, pois a corte não é uma mesa-redonda de comentaristas esportivos. Ela é o cume de um Poder da República.

Eleição não absolve réu, assim como o Supremo não elege prefeito. Se Lula e o PT acreditarem que o eleitorado respondeu ao Supremo, estarão repetindo o erro dos generais que viam nos resultados dos pleitos da década de 70 uma legitimação indireta do que se fazia, com seu pleno conhecimento, nos DOI-Codi.

O comissariado deveria ter a honestidade de admitir que acreditou na impunidade dos mensaleiros. Resta-lhe agora o vexame de reformar o estatuto do partido, que determina a expulsão dos companheiros condenados em última instância.

A oposição tem dois anos para articular uma agenda que lhe permita avançar sobre a plataforma petista. Ela não precisa se preocupar com a turma que detesta Lula, essa virá por gravidade, assim como os adoradores de Nosso Guia continuarão seguindo-o.

Fazendo cara feia para os programas sociais do governo, para as políticas de ação afirmativa nas universidades e para a expansão do crédito popular, ela organizará magníficos seminários. Eleição? É coisa de pobre.

Fonte: O Globo

A sorte do PSDB começa a ser traçada - Rosângela Bittar


Encerrada a campanha municipal, a hora é de assumir e construir a candidatura presidencial do PSDB. Assim pensam a maioria da direção e seu provável candidato, o ex-governador, ex-presidente da Câmara, atual senador e líder da oposição Aécio Neves. As eleições de 2012 foram o evento, dos últimos anos, de melhor efeito político para Aécio. Nunca antes havia desenvolvido, com o atual traquejo, por pensamentos, palavras e obras, sua veia oposicionista. Apesar de ter êxito como cabo-chefe da campanha eleitoral de um prefeito aliado ao governo federal, Marcio Lacerda (PSB), de Belo Horizonte, numa disputa ali vitoriosa no primeiro turno, pela primeira vez, o PT facilitou sua mágica ao romper com o PSB e lançar candidatura concorrente.

Do discurso ao enfrentamento, das iniciais de um projeto à obsessão pelas alianças, inclusive abrindo mão da sua própria legenda para favorecer aliados melhor situados, Aécio praticou oposição, desta vez. Andou país afora, foi ao Sul, ao Nordeste, ao Norte, chamou para a briga a presidente Dilma e o ex-presidente Lula. Revidou ironias, acusou-a de ter subtraído a Minas Gerais (Estado natal da presidente) R$ 400 milhões por ano com o veto ao aumento dos royalties do minério, apontou equívocos em sua atuação política e administrativa. O senador criticou-a por ter colocado o governo a serviço do partido e por haver contestado interpretação do Supremo Tribunal Federal no julgamento do mensalão. Nenhum tema considerou delicado ou proibido, como considerava antes.

Para Lula, sobrou o epíteto de "líder de facção". "O lulismo, da forma como existia, não existe mais", decretou. Aécio considerou Dilma uma "estrangeira" em Minas, e quando se apresentou como mineira, ironizou no palanque perguntando onde mesmo ela tinha domicílio eleitoral, no momento em que já viajava ao Rio Grande do Sul para votar.

Aécio Neves estreou na oposição na campanha municipal

Em artigos na "Folha de S. Paulo", Aécio fustigou o governo e desprezou o que foi avaliado como sucesso da presidente. Em um dos últimos tratou da questão ética a partir da renúncia do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, o mineiro Sepúlveda Pertence, à presidência da Comissão de Ética Pública, por insatisfação com a falta de apoio da presidente: Dilma puniu com a não renovação do mandato os conselheiros que recomendaram afastamento de ministros por suspeita de corrupção.

"Alguns pretensos avanços propagados pelo governo Dilma Rousseff não se concretizaram. A faxina ética é uma delas. Não se conhece providência efetiva para as graves denúncias que derrubaram um número recorde de ministros. Os problemas continuam - obras e projetos inacabados, orçamentos multiplicados a esmo, benevolências de toda ordem para alguns grandes grupos econômicos", escreveu.

A mistura entre o público e o partidário e a prevalência das causas de um partido - o PT - sobre os interesses de Estado, são outros destaques do novo discurso de Aécio Neves.

Para o PSDB não há mais dúvidas de que o senador é o candidato do partido à Presidência da República, com ação e discurso testados na atual campanha. O ano de 2013 será dedicado à formulação das teses, projetos e estratégias. O critério de prioridade absoluta às alianças é o primeiro na lista de cláusulas desde já pétreas.

Os balanços que o presidente do PSDB mineiro, o deputado federal Marcus Pestana, tem feito sobre o desempenho do partido na campanha municipal deste ano já considera como vitória de Aécio tudo o que não for o PT, o PCdoB e uma parcela minoritária do PMDB de Minas. Todos os demais estavam de alguma forma associados a ele. O PSDB até reduziu o número de prefeitos eleitos do partido porque Aécio abriu mão a favor de aliados. É o que chamam por lá de "cultura aliancista" de Aécio.

O projeto nacional contará com isso em primeiro lugar. Em segundo lugar está a formulação do discurso e programa. No Senado foram feitos alguns ensaios, embora ainda tímidos. Aécio se manifestou, por exemplo, contra o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) e fez a defesa de uma privatização transparente. O senador vem sublinhando, para definir-se contra, algumas características que considera marcantes do governo do PT, como o aparelhamento do Estado.

Deixou de restringir iniciativas de auxiliares sempre mais aflitos com a demora em praticar uma oposição mais firme e assumir a candidatura. Aécio alegava, e já não alega, que na escola de seu avô Tancredo Neves não se fica muito tempo exposto para não ser o único alvo. As equipes já se sentem liberadas para iniciar o trabalho de construção de uma agenda. Aécio já esteve em uma reunião, convocada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com Armínio Fraga, Pedro Malan, Edmar Bacha, André Lara Resende, para dar início ao debate interno. Saiu de lá satisfeito.

O presidente do PSDB de Minas, Marcus Pestana, começará a reunir ideias que vem colhendo no partido e entre intelectuais e estudiosos para apresentar ao presidente do PSDB, Sérgio Guerra, ao próprio Aécio e ao presidente do Instituto Tancredo Neves, Tasso Jereissati, o que vem chamando de "readequação programática". A partir disso, na melhor tradição dos partidos social-democratas europeus, o PSDB faria a mobilização municipal, estadual e nacional para a elaboração de um regimento orientador do congresso nacional do partido, a ser convocado, e nele ungir o candidato.

O PSDB quer elaborar um programa para "empolgar a sociedade", é a intenção. O passo seguinte será enfrentar o maior problema do Aécio, que é tornar-se conhecido no Brasil. Para isso, o congresso partidário definiria uma estratégia de comunicação e mobilização. Essa, provavelmente, é a questão fundamental entre todas, porque embute solução para um dos problemas mais visíveis das campanhas hoje: o da linguagem, pior que o de financiamento, muitas vezes. As campanhas perderam a espontaneidade, a fronteira ideológica, o concurso de intelectuais e pensadores e enfrentam, desde as últimas, uma questão insolúvel considerada grave, a dos evangélicos.

Nenhum partido político resolveu o que fazer com a Igreja que virou grupo eleitoral, tem bancadas fortes e numerosas no Congresso, tempo de televisão e templo para orientar votação. Um problema-fenômeno que se impõe.

Fonte: Valor Econômico

Lula diz que apoiará reeleição de Dilma


Ex-presidente manda recado a governador de Pernambuco durante comício realizado em Fortaleza, onde adversário de petista é do PSB

Eugênia Lopes

FORTALEZA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou comício ontem do PT, em Fortaleza, para avisar o governador de Pernambuco e presidente nacional do PSB, Eduardo Campos, que fará campanha para a reeleição de Dilma Rousseff, em 2014. O PSB foi um dos partidos que mais cresceram no 1.º turno das eleições, alimentando as pretensões de Campos de disputar a sucessão de Dilma daqui a dois anos. Fortaleza é uma das cidades em que o PT e o PSB se enfrentam no 2.º turno, no domingo.

"Tenho que falar pouco e tomar muita água para que eu possa estar curado e, em 2014, fazer campanha para a Dilma se reeleger presidente", disse Lula, assim que iniciou seu discurso para uma multidão que lotou ontem à tarde a Praça do Ferreira, no centro de Fortaleza.

Além de mandar o recado para Campos, Lula alfinetou os irmãos Ferreira Gomes, padrinhos políticos do candidato do PSB, Roberto Cláudio. Já o petista Elmano de Freitas é aliado da prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins (PT).

Na reta final da campanha, o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), e a prefeita não param de bater boca e trocar acusações. Cid chamou a petista de "vaidosa, arrogante, personalista", além de afirmar que ela "não gosta de trabalhar". Por sua vez, Luizianne criticou Cid por ter tirado licença do cargo para fazer campanha num momento em que o Ceará passa por uma grande seca.

No comício, a prefeita partiu para o ataque: "Fortaleza não vai suportar coronel nem filhote de coronel produzido dentro dos gabinetes". Sem citar nomes, Luizianne acusou seus detratores de machismo. "Machismo vindo daqueles que acham que Fortaleza suporta uma oligarquia familiar arrogante e prepotente. Fortaleza é uma cidade livre, insurgente e vermelha", discursou.

Também tomando o cuidado de não citar nomes, o ex-presidente Lula defendeu o governo de Luizianne ao longo dos últimos oito anos. "Tem uma parte da elite dessa cidade que critica tanto vossa excelência, e eu fico pensando por que as pessoas criticam tanto o Lula. Os empresários desse país têm que acender todo dia uma vela para Deus porque nunca ganharam tanto dinheiro no meu governo", disse Lula. "Eles não gostam de nós pelo que nós temos de ruim, mas pelo que temos de bom", concluiu.

Durante os 15 minutos de discurso, diante de uma multidão de cerca de 30 mil pessoas, segundo dados da Guarda Municipal, o ex-presidente Lula aproveitou ainda para dar uma estocada em Ciro Gomes, seu aliado, que foi prefeito e governador de Fortaleza na década de 1990.

"Fortaleza começa a aparecer como uma cidade altamente civilizada nos padrões das melhores cidades do mundo. Isso poderia ter sido feito há muito tempo. Mas os políticos não levavam em conta os pobres. Pobres só tinham valor nas eleições", afirmou o ex-presidente.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Na reta final, Pelegrino apela a ex-presidente

João Domingos

SALVADOR - Atrás na pesquisa do Ibope realizada entre os dias 17 e 19, com 39% das intenções de voto, ante 47% de Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM) na disputa pela prefeitura de Salvador, o petista Nelson Pelegrino usará o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva hoje numa carreata e num ato público para reverter a situação. É a segunda visita de Lula à capital baiana na campanha. A primeira ocorreu no 1.º turno e, na semana passada, a presidente Dilma Rousseff também compareceu.

A campanha tem se pautado em dois eixos: nas acusações de um candidato contra o outro e na exibição de apoios na área federal. Pelegrino, que inundou a cidade com fotografias dele com Lula, Dilma e o governador Jaques Wagner (PT), diz ser o deputado federal que mais dinheiro de emendas parlamentares trouxe para a capital baiana e que tem o apoio em Brasília de 332 federais, 50 senadores e 16 ministros. Tudo para dizer que é preciso estar alinhado com o governo federal para governar Salvador.

ACM Neto respondeu imediatamente quando viu os números exibidos por Pelegrino. Recorreu à aliança que fechou com o PMDB, comandado na Bahia pelos irmãos Geddel e Lúcio Vieira Lima: 6 ministros, 79 deputados, 18 senadores e o vice-presidente da República, Michel Temer. Diante disso, assegura ACM Neto, não faltará apoio para correr atrás de verbas federais.

Apesar de liderar pesquisas, ACM Neto perde em apoiadores. Só conseguiu levar para a TV o ex-ministro Geddel Vieira Lima. Já Pelegrino exibe o discurso de Dilma em Salvador, na sexta-feira, com ênfase em provocações ao adversário. Num dado momento, Dilma afirma: "Aqui não pode ter um governinho, não pode ter um governo pequenininho. Aqui temos de ter um grande governo", referindo-se ao fato de ACM Neto ter em torno de 1,65 metro.

Fonte: O Estado de S. Paulo