domingo, 7 de abril de 2013

Seca histórica destrói economia rural e barra ascensão de famílias no Nordeste

Sina do sertão. Estiagem prolongada põe à prova rede de proteção aos mais pobres disseminada nos governos Lula e Dilma; fome é amenizada por repasses assistenciais, mas investimento da população na tentativa de se emancipar é interrompido por falta de estrutura

A rede de proteção social que inclui programas de transferência de renda dos governos federal e estaduais tornou menos dramáticos os impactos da seca no cotidiano da população do Nordeste, mas ainda é incapaz de impedir que a economia local entre em verdadeiro colapso durante períodos de longa estiagem.

A avaliação é de pesquisadores e autoridades ouvidas pelo Estado, que identificou em Pernambuco, Bahia e Alagoas uma realidade atenuada, mas ainda bastante difícil para o sertanejo que enfrenta a maior seca das últimas décadas na região.

Na terça-feira passada, em visita a Fortaleza (CE), a presidente Dilma Rousseff afirmou que, graças às ações de seu governo e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, "a face da miséria nessa região não foi acentuada tão perversamente pela estiagem".

Para o professor João Policarpo Lima, do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a aposentadoria rural e projetos como o Bolsa Família e o Bolsa Estiagem dão às famílias do campo, de fato, uma alternativa à produção agrícola quando as condições climáticas ficam desfavoráveis, mas a quebra de safras e a morte de rebanhos provocam efeitos duradouros na economia local.

"A população pobre do semiárido fica menos vulnerável às secas, mas isso não significa que a população como um todo esteja imune, pois a economia entra em colapso e a população fora dessa cobertura fica desempregada ou perde suas outras fontes de renda", afirma Lima. "Essa situação de hoje é menos ruim do que era há 40 anos, quando não havia programas de transferência de renda e apenas as frentes de emergência eram acionadas, de forma clientelística."

Rebanho ameaçado. Nos últimos meses, Juvenal Lira Feitosa, de 53 anos, a mulher Iolanda e seus nove filhos dedicam seus esforços pela sobrevivência das 38 cabeças de gado mestiço, algumas cabras e galinhas e três porcos que criam no Sitio Poço Novo, na zona rural de Águas Belas (PE). Nos anos 1990, Feitosa tinha em sua propriedade apenas uma vaca. A partir do governo Lula, conseguiu crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), empréstimo bancário para arregimentar o pequeno rebanho. O sustento da família vinha sendo garantido pela aposentadoria rural - um salário mínimo - da mulher e o benefício do Bolsa Família pago a quatro dos nove filhos do casal. A seca, porém, ameaça a outra fonte de renda. "A gente compra o mínimo para nós e com o resto tenta dar de comer o gado", diz Juvenal, resignado.

A estimativa é que a estiagem provocou no Estado governado por Eduardo Campos (PSB), possível presidenciável em 2014, a redução de 710 mil cabeças de rebanho bovino - sendo que 150 mil morreram e o restante foi abatido precocemente. A bacia leiteira estadual sofreu queda de 72% na sua produção.

Êxodo na Bahia. Na Bahia do governador petista Jaques Wagner, a produção do sisal - usada na indústria têxtil - cai desde 2011. Os problemas no campo fizeram ressurgir mazelas sociais do passado. Mesmo com os benefícios sociais oferecidos pelos governos federal e estadual, o êxodo rural e migração a outros Estados, em especial aos do Sudeste, voltaram a ser registrados.

Na passagem por Fortaleza, Dilma anunciou pacote de R$ 9 bilhões para medidas emergenciais de enfrentamento da seca no Nordeste. Mas prefeitos de municípios do semiárido baiano e produtores agrícolas do Estado lamentaram o que chamaram de "superficialidade" das ações anunciadas pela presidente durante reunião da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Os administradores das cidades afetadas pela estiagem, liderados pela União dos Municípios da Bahia (UPB), resolveram criar um Movimento dos Sem-Água" e prometem marchar até Brasília para cobrar "medidas objetivas e duradouras" para enfrentar a crise.

"Quando acontece alguma catástrofe no Sudeste, o governo responde na mesma hora. Queremos tratamento igual", diz a presidente da UPB e prefeita de Cardeal da Silva, a 140 quilômetros de Salvador, Maria Quitéria Mendes (PSB). "Prometem recursos, ações, mas para conseguir um pouco do que é anunciado precisamos fazer grandes sacrifícios. É frustrante."

Em Alagoas, do governador tucano Teotônio Vilela Filho, um relatório recente da Diocese de Palmeira dos índios indicou que 33 mil famílias - cerca de 19% das 175 mil famílias que residem nos municípios em situação de emergência - estão completamente desassistidas pelos programas da União e do Estado. O governo estima que os prejuízos com a estiagem de parte das 22 usinas de cana-de-açúcar de Alagoas cheguem a R$ 800 milhões. Por isso, teme que as conseqüências trazidas pela seca se espalhem por outros municípios além do semiárido.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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