quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Obstáculo ao pacote

• Alerj decide devolver ao governo projeto que criava alíquota extra, a principal medida anticrise

Renan França - O Globo

A recusa da Alerj a votar o projeto que cria alíquotas extraordinárias para a previdência no Estado do Rio compromete todo o pacote anticrise, alerta o economista Raul Velloso. Com o projeto, o estado arrecadaria mais R$ 6,8 bi em 2017. 

Enquanto servidores protestavam ontem em frente à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) contra o pacote de ajustes do estado, o presidente da Casa, deputado Jorge Picciani, anunciava a decisão de devolver ao governo o projeto de lei que prevê a criação de alíquotas de contribuições previdenciárias extraordinárias de 16% e 30%. 

Segundo o parlamentar, os 16 deputados do PMDB (partido do governo) apoiaram a devolução e, em contrapartida, comprometeram-se a discutir as demais 21 propostas do Executivo. Parlamentares de outros partidos também estariam de acordo com a posição do PMDB. A recusa da Alerj em votar a cota extra causa um problema para o estado, pois a medida representaria um aumento na arrecadação de R$ 6,8 bilhões em 2017, metade do ganho previsto se todo o pacote fosse aprovado.

— Entendemos que esse projeto de lei compromete demasiadamente a renda dos servidores, que ainda ficarão sem reajustes. Por isso, vamos devolvê-lo ao governo — disse Picciani. — Já avisei ao secretário de Governo (Affonso Monnerat) que não vamos discutir a cota extra. O governo é livre para mandar a proposta que quiser, mas eu tenho sensibilidade para entender que não podemos comprometer a vida das pessoas.

O economista Raul Velloso disse que, sem a alíquota extra, todo o pacote anticrise fica comprometido:

— Essa medida está no coração do pacote. O grande mérito dessa proposta do Rio é chamar a atenção para o descalabro da previdência pública e buscar solução que viabilize o pagamento das aposentadorias. Se não tirar um pedaço, não tem dinheiro para pagar (aos aposentados) — afirma ele. — Se esse ponto nem puder ser examinado (na Alerj), estarão jogando o pacote no lixo. E isso é absurdo. As autoridades não entenderam ainda a gravidade da situação.

Para ele, o governo não pode recuar, inclusive em relação às outras medidas de ajuste:

— É complicado o governador agora retirar as outras medidas. Vai ficar parecendo balão de ensaio. Ele tem que seguir adiante e buscar aprovar isso por outro caminho, outra forma.
Nos bastidores da Alerj, deputados estaduais já davam como certa a derrubada das alíquotas extraordinárias desde o início da semana. Picciani, no entanto, garante que o projeto que aumenta a contribuição previdenciária dos servidores públicos de 11% para 14% seguirá na pauta. Ele sugeriu ainda uma alternativa para o governo: um novo projeto estabelecendo a alíquota de 14% para aposentados e pensionistas que ganham até R$ 5.189 e que hoje são isentos. A proposta do governo era que o desconto para esse grupo fosse de 30%.

— O estado vai ter que pensar quais serão as alternativas — disse Picciani.

Mas nem mesmo as outras medidas estão garantidas. O deputado André Lazaroni, líder do PMDB na Alerj, disse que os projetos entrarão na pauta, mas a aprovação deles será discutida.

— O PMDB vai votar unido, mas o partido sozinho não aprova. Pelo número de medidas, certamente algumas delas vão passar. Precisamos mostrar à sociedade a dificuldade pela qual estamos passando — disse Lazaroni. — O governo agora terá que achar outra solução.
No nosso entendimento, a medida que reprovamos gerava distorção e injustiça. Não nos sentimos confortáveis em votar essa matéria.

O deputado Paulo Melo (PMDB) foi outro que se manifestou sobre a decisão. Ele classificou a alíquota extra como “um ponto fora da curva”:

— Não seria viável aprovar uma medida que exige um sacrifício além do que a pessoa possa fazer.

Logo após o anúncio da devolução da medida, o governador Luiz Fernando Pezão, que estava em Brasília, informou, por meio de nota, que respeita a decisão da Alerj. “Estou aberto a sugestões dos deputados para, juntos, buscarmos soluções para o enfrentamento da crise no estado”, dizia o texto. Pezão acrescentou ainda que vai procurar os parlamentares para continuar a discutir as medidas.

Antes de saber da decisão de seu partido, Pezão chegou a anunciar que recorreria da liminar do Tribunal de Justiça do Rio que suspendera, na noite de terça-feira, justamente o projeto da alíquota adicional. O governador chegou a mostrar indignação em relação à decisão judicial. Porém, com a postura da Alerj, o governo informou que o recurso não seria mais impetrado.

O secretário estadual da Fazenda, Gustavo Barbosa, afirmou que a medida rejeitada é fundamental para o reequilíbrio fiscal e que, se nada for criado para substituir esse impacto, o caixa do estado só sairá do vermelho daqui a uma década.

— Essa medida precisará ser compensada. Algo precisa entrar no lugar para conseguimos restabelecer o reequilíbrio fiscal do estado. Ainda não fizemos a projeção, mas, sem a arrecadação que teríamos como esse projeto, a situação de melhora do estado seria postergada para 2027.

GOVERNO JÁ TRABALHA EM ALTERNATIVA
Ainda de acordo com o secretário, o problema do Rioprevidência — que este ano terá um rombo de cerca de R$ 12 bilhões — precisa ser enfrentado porque é o principal ponto de desequilíbrio das contas públicas.

— A culpa não é do servidor público, mas o preço do sistema previdenciário é muito alto. A cada R$ 100 que o estado arrecada, cerca de R$ 30 são para pagar inativos — disse Barbosa. — Hoje (ontem) mesmo começamos a nos debruçar sobre planilhas para buscar uma solução. Não há um outro plano, mas vamos construir um.
Colaborou Ludmilla de Lima

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