terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Com pressão menor, IPCA ensaia convergência para meta em 2017

Por Arícia Martins | Valor Econômico

SÃO PAULO - Sem grandes choques de custos e com a demanda bastante enfraquecida, economistas avaliam que o caminho está aberto para que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) se aproxime do centro da meta, de 4,5%, em 2017. Os protagonistas da desaceleração devem ser os serviços - setor que mais pressionou a inflação nos últimos anos e, agora, sofre com a queda da renda e o aumento do desemprego - e os alimentos, que podem subir menos de 7% pela primeira vez desde 2009. Este também foi o último ano em que o índice oficial de inflação chegou perto do centro.

Como riscos à convergência, analistas apontam a nova política de preços de combustíveis da Petrobras. Há, ainda, dúvidas sobre reajustes da tarifa de energia elétrica e possíveis impactos do ajuste fiscal, devido a eventuais altas de impostos. Esses fatores, porém, não ameaçam o processo de desinflação em curso e, portanto, não impedem que o BC acelere o ritmo de redução dos juros, mesmo para economistas que preveem alta de cerca de 5% para o IPCA.

Na ponta mais otimista, Angelo Polydoro, do banco Brasil Plural, afirma que a moderação dos preços de alimentação e a fraqueza da atividade econômica vão permitir que o IPCA recue a 4,7% ao fim de 2017. Em alguns períodos, o acumulado em 12 meses deve chegar a 4,5%, destaca Polydoro, mas vai voltar a subir nos meses finais do ano em função da sazonalidade mais pressionada e, também, dos números atipicamente baixos observados no fim de 2016.

A melhora da trajetória inflacionária nos últimos meses é atribuída à queda dos alimentos, que passaram a devolver as fortes altas ocorridas ao longo do ano, mas boa parte dessa correção para baixo de preços vai ficar para 2017, diz. Os principais vetores da descompressão prevista para o grupo alimentação e bebidas entre um ano e outro, de 8,3% para 7%, serão o feijão e o leite, afirma. "Os preços tendem a voltar para os níveis anteriores aos choques, o que vai aparecer no IPCA como uma deflação grande."

Ajudados por maiores safras agrícolas nos principais produtores globais, como reflexo de condições climáticas melhores, os preços de alimentação no domicílio vão aumentar apenas 4% no próximo ano, estima o Itaú. De janeiro a novembro, esse subgrupo já avançou 9,42%.

Para o banco, que estima alta de 4,8% para o IPCA em 2017, a elevada ociosidade na economia também vai contribuir com a menor inflação. O hiato do produto (distância entre o PIB potencial e o PIB efetivo) em terreno negativo pode abrir espaço para uma desinflação mais rápida dos preços livres nos próximos meses, especialmente de itens industriais e serviços, avalia o Itaú.

Leandro Câmara Negrão, do Bradesco, projeta perda de fôlego relevante do conjunto que reúne preços como aluguel, empregada doméstica e cabeleireiro no ano que vem. Os serviços devem desacelerar para 5,2% em 2017, depois de terem subido 6,8% este ano, calcula. Se confirmada a projeção, o próximo ano terá a menor inflação de serviços desde 2007, quando a variação também foi de 5,2%. "Essa desaceleração é um dos vetores que fará com que o IPCA desacelere para o centro da meta no próximo ano", diz o economista.

Além da demanda em queda livre, não há pressões de custos sobre os serviços, acrescenta Polydoro, do Plural. Como exemplo, ele menciona o setor de educação, pressionado nos dois últimos anos por correções de tarifas como energia elétrica, água, além da alta da própria inflação, que indexa mensalidades. Em 2017, não há nenhum choque no radar, diz. Assim, os cursos regulares devem aumentar 7% no acumulado do ano, redução de mais de dois pontos ante 2016.

Mesmo sem grandes choques de tarifas, Fabio Romão, da LCA Consultores, avalia que os preços administrados são um dos fatores que impedem que o IPCA se aproxime mais de 4,5% em 2017. A consultoria projeta que o indicador oficial de inflação ficará em 5,3% no período, com aumento de 6,1% dos itens monitorados, número com viés de alta.

Segundo Romão, o efeito líquido da recomposição dos preços do petróleo e de alguma depreciação adicional do câmbio, ainda que leve, será de novos reajustes na gasolina, que respondem com mais rapidez agora às oscilações no mercado internacional. Para a LCA, o combustível terá alta de 4,5% dentro do IPCA em 2017, ante 3,6% em 2015. "A nova política de preços da Petrobras é bem vinda porque acompanha o movimento do mercado, mas a incerteza em relação aos reajustes aumentou", disse.

Ainda dentro do conjunto de itens administrados, a tarifa de eletricidade residencial deve acelerar na comparação com 2016, mesmo com a manutenção da bandeira verde, que não implica cobranças adicionais sobre as contas de luz. As projeções para este preço, porém, estão dispersas. Thiago Curado, sócio da 4E Consultoria, estima aumento de apenas 1,6% para essa tarifa, sem piora das condições hidrológicas. Já Romão espera alta de 8,1% para o mesmo item, considerando oscilações de bandeira ao longo do ano e, também, reajustes na energia gerada por Itaipu.

Mais do que os preços administrados, tanto Curado quanto Romão apontam a resistência dos serviços, sujeitos à inércia, como explicação para as estimativas acima de 5% para a alta do IPCA em 2017. Outro possível fator de pressão, embora de difícil projeção, segundo o economista da 4E, é o eventual impacto sobre a inflação de medidas de ajuste fiscal que impliquem em elevações de tributos.

"No âmbito fiscal, maiores dificuldades no processo de avanço das reformas e ajustes necessários também podem gerar pressões adicionais sobre os prêmios de risco e a taxa de câmbio. Além disso, essa situação também pode provocar uma busca por medidas fiscais alternativas, como aumento de impostos e reversão de desonerações", diz o Itaú.

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