sábado, 24 de dezembro de 2016

Opinião do dia – Antonio Gramsci

Um partido terá maior ou menor significado e peso precisamente na medida em que sua atividade particular tiver maior ou menor peso na determinação da história de um país.

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Antonio Gramsci (1891-1937). ‘Cadernos do Cárcere, p. 87, V. 3. Editora Civilização Brasileira, 2007.

Odebrecht na mira de 5 países

Após o acordo de leniência da Odebrecht com os EUA, que resultou na divulgação de documentos do Departamento de Justiça americano, México, Colômbia, Peru, Argentina e Equador anunciaram abertura de investigações contra a empresa.
Investigações em série

• Após acordo de leniência com EUA, Odebrecht será alvo de apurações na Colômbia e no México

Mariana Timóteo da Costa e Tiago Dantas - O Globo

-SÃO PAULO- A divulgação dos documentos do Departamento de Justiça dos EUA (DoJ), após os acordos de leniência da Odebrecht e da Braskem, gerou um efeito cascata na América Latina, com países como México, Colômbia, Peru, Argentina e Equador prometendo investigar o caso. Acentuou ainda antigas disputas políticas. A Secretaria de Transparência, órgão ligado à Presidência da Colômbia, admitiu ontem conhecer o alto funcionário do governo que recebeu, sozinho, US$ 6,5 milhões (R$ 21,2 milhões) em propinas da Odebrecht, durante o governo Álvaro Uribe (2002-2010). Uribe é antigo aliado e rival do atual líder colombiano, o prêmio Nobel da Paz Juan Manuel Santos.

Braskem doou a político após acordo tributário

• Acerto aconteceu no mesmo ano em que ex-governadora gaúcha beneficiou a empresa

André de Souza - O Globo

-BRASÍLIA- Entre os documentos do Departamento de Justiça dos Estados Unidos que tratam do acordo firmado pela Odebrecht e pela Braskem para devolver R$ 6,9 bilhões desviados em 12 países, há citação a um político brasileiro que ocupava um alto cargo estadual. Não há nomes, mas o texto diz que que, em 2008, a Braskem tinha muitos créditos tributários acumulados nos estados brasileiros, fazendo com que os governos locais ameaçassem aumentar outros impostos para elevar suas receitas. Em determinado estado, a empresa e o político, identificado apenas como “agente público brasileiro 9”, firmaram um acordo para investimentos de mais de R$ 1 bilhão, resolvendo os problemas relacionados aos créditos tributários. Além disso, o político teria recebido doação eleitoral de R$ 200 mil da Braskem em 2006, e de R$ 600 mil na sua campanha à reeleição em 2010.

Receita Federal autuou Instituto Lula

• Órgão alega ‘desvio de finalidade’ ; instituição contesta decisão e divulgação

- O Globo

O Instituto Lula foi multado pela Receita Federal por “desvio de finalidade”, por ter feito gastos vedados a entidades sem fins lucrativos. -SÃO PAULO- A Receita Federal autuou o Instituto Lula por “desvio de finalidade”, pela organização ter feito gastos que não poderia sendo uma entidade sem fins lucrativos e isenta de impostos. A decisão da Receita é de 11 de novembro de 2016, e a cobrança do fisco leva em consideração multas e impostos não recolhidos relativos ao ano de 2011. Procurada, a Receita Federal não divulgou o valor da multa nem a infração, mas o GLOBO confirmou a existência dessa infração em consulta dos processos que correm na Receita Federal.

PT lança Lula candidato à Presidência no início de 2017

• Estratégia do partido é aproveitar baixa popularidade de Temer e reforçar a defesa jurídica do ex-presidente, que é réu em cinco ações penais e pode ficar inelegível

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

O PT pretende lançar a pré-candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República ainda no primeiro semestre do ano que vem, entre fevereiro e abril. A estratégia tem dois objetivos. O primeiro é aproveitar politicamente a baixa popularidade do governo Michel Temer. O segundo é reforçar a defesa jurídica de Lula, réu em cinco processos penais, quatro deles provenientes da Operação Lava Jato e seus desdobramentos.

A informação foi confirmada reservadamente por integrantes da direção petista e também do Instituto Lula.

O PT defende formalmente a antecipação da eleição presidencial em caso de cassação da chapa Dilma Rousseff-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Parte dos líderes petistas defende que Lula seja lançado candidato logo no começo do ano, em fevereiro, para se antecipar a possíveis condenações na Justiça que possam barrar sua candidatura ou até levar o ex-presidente à prisão em 2017.

PSDB vai à Justiça contra PT e acusa o partido de agir com 'má-fé'

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O PSDB afirmou nesta sexta-feira (23) que entrará na Justiça contra o PT em razão do que chamou de "prática de litigância de má-fé".

Segundo a direção nacional tucana, o PT "acusa deliberadamente o PSDB por fatos que, sabe, são inverídicos". "Com o intuito de desviar o foco das graves acusações que pesam sobre o PT, a legenda tem repetidas vezes utilizado a Justiça Eleitoral para registrar falsas acusações ao invés de prestar esclarecimentos sobre, por exemplo, escândalos como as gráficas fantasmas que atuaram na campanha presidencial de Dilma Rousseff", declara a nota do PSDB.

A ação tucana foi motivada pelo intuito petista de pedir ao TSE investigação sobre o depoimento que Otávio de Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, prestou em ação de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, na eleição de 2014. A informação foi divulgada pela Folha nesta sexta (23).

TSE contesta defesa de Dilma em relatório

• Peritos do tribunal dizem que advogado de petista usou fotos de 2010 para comprovar serviços de 2014

Manoel Ventura - O Globo

-BRASÍLIA- A defesa da ex-presidente Dilma Rousseff usou fotos das eleições de 2010 como prova de que uma gráfica prestou serviços para a campanha presidencial de 2014. A acusação é de peritos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que atuam na força-tarefa montada pela Corte no processo que pede a cassação da chapa composta por Dilma e pelo atual presidente Michel Temer. O grupo analisou documentos apresentados pelas empresas Focal, Gráfica VTPB e Red Seg.

Os técnicos concluíram que os controles contábeis e administrativos das empresas “não foram capazes de comprovar a execução e a entrega, em sua integralidade, dos produtos e serviços contratados”. Em setembro, a defesa de Dilma contestou essas conclusões e apresentou parecer técnico divergente, com mais de 8 mil folhas, afirmando que as gráficas existem e que elas produziram material para a campanha eleitoral. Os peritos do TSE, agora, contestaram os argumentos de Dilma e afirmam que o laudo apresentado pela ex-presidente usa fotos das eleições de quatro anos antes para comprovar os serviços da gráfica Focal em 2014.

Favorito à presidência do Senado, Eunício tenta se descolar de Renan

• Líder do PMDB, senador do Ceará é o favorito para assumir a presidência da Casa no próximo ano e procura, agora, se distanciar da imagem do atual titular do posto

Julia Lindner O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Favorito para assumir a presidência do Senado no próximo ano, o líder do PMDB na Casa, Eunício Oliveira (CE), procura agora se distanciar da imagem do atual presidente Renan Calheiros (PMDB-AL). Para buscar apoio dos partidos, Eunício tem afirmado em conversas reservadas que não é “da turma do Renan”.

Eunício declarou a parlamentares e ao presidente Michel Temer que pretende, se eleito, fazer uma gestão diferente, com foco na conciliação entre os três Poderes. Para evitar o enfrentamento com o Judiciário, ele considera apoiar votações com apelo popular, como a proposta que acaba com o foro privilegiado, tema preterido neste ano por Renan. O texto é de autoria do senador Álvaro Dias (PV-PR) e teve parecer favorável do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), mas a votação emperrou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Governo precisa repactuar relação com Congresso, diz Moreira Franco

Marina Dias – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dos principais auxiliares do presidente Michel Temer, o secretário do Programa de Parcerias de Investimentos, Moreira Franco, afirma que o país começou a viver uma "democracia parlamentar", na qual os desejos do Executivo não terão necessariamente aval do Legislativo.

Na avaliação de Moreira, repactuar a relação com o Congresso e sinalizar melhora na economia serão os dois alicerces do governo para 2017, principalmente diante da crise agravada com a delação da Odebrecht e com a proximidade do julgamento da ação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que pode cassar a chapa Dilma-Temer.

"O governo vai definir sua posição no projeto ou sugestão que enviar ao Congresso e ali, no Legislativo, pode mudar a posição inicial do governo, com debates e desejos da sociedade que podem demandar outras coisas", afirmou Moreira à Folha.

Base aliada teme futuro do governo

Aliados do presidente Michel Temer no Congresso estão preocupados com o futuro, mas veem as medidas econômicas como saída para superar as denúncias que tiraram o ânimo inicial da base.

Inquietos, aliados apostam na economia

• Base aliada passou da euforia com novo governo à preocupação com o futuro da gestão peemedebista

Leticia Fernandes e Simone Iglesias O Globo

-BRASÍLIA- A base aliada do presidente Michel Temer no Congresso vive um dilema e vê com inquietude o futuro da administração peemedebista, apesar de enxergar no lançamento de medidas de estímulo econômico dos últimos dias uma saída para a série de denúncias que já derrubou seis ministros até agora.

Os aliados estavam entusiasmados pela formação de uma gestão sob novas bases após o impeachment da expresidente Dilma Rousseff, mas agora fazem reclamações públicas e privadas de Temer e do governo. Alguns já traçam até planos para abandonar a base aliada pensando na disputa presidencial de 2018.

Além do desconforto em três dos principais partidos que sustentam Temer no Congresso — PSDB, PSB e DEM —, o PR, um dos aliados do centrão, engrossou o coro daqueles que cogitam um desembarque.

A legenda vem costurando a filiação do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e admite deixar a base de do governo quando isso acontecer. Bolsonaro é pré-candidato à presidência em 2018, o que, segundo interlocutores da cúpula do partido, faria o PR sair da base imediatamente.

— Se tivermos um candidato a presidente da República, como vamos ser base do governo? Se a gente traz o Bolsonaro muda tudo — disse um dirigente do partido.

O ano novo de que necessitamos - Marco Aurélio Nogueira*

- O Estado de S. Paulo

• O País precisa de uma trilha que lhe permita encontrar um eixo razoável. Não será fácil

Lamento, mas não será 2017. Talvez seja 2018, se por acaso algumas precondições forem cumpridas. O País está sem fôlego para dar saltos audaciosos e a cada momento se vê diante do risco de só alcançar mais do mesmo. O mundo também não ajuda, há problemas e mal-estar por onde quer que se olhe.

É impossível ter ano novo se o quadro atual se prolongar. Se liberais e parte da esquerda continuarem a culpar o PT e se os petistas e outra parte da esquerda continuarem a detonar Temer, o PMDB e os tucanos. Que futuro poderá haver com deputados e senadores hostilizando o Supremo Tribunal Federal (STF) e com ministros do Supremo fazendo carreira-solo e pressionando o Congresso como mal maior da Nação? Com diversos brasileiros entronizando juízes, promotores e procuradores como se fossem anjos redentores, justiceiros de políticos acanalhados, purificadores da sociedade, e outros tantos brasileiros vendo-os como arbitrários e parciais, personagens de um romance noir repleto de perseguições políticas seletivas?

Tentemos em 2017 - Cristovam Buarque

- O Globo

• Por falta de coesão, usamos inflação e endividamento público para atender interesses divergentes

Há décadas, intelectuais e políticos alertam para a necessidade de reformas estruturais, sem as quais a nação brasileira continuaria carecendo de forças de coesão e de dinamismo. Fomos forjados sob o signo da escravidão e da exclusão, da concentração de renda e da segregação educacional, usando políticas fisiológicas e patrimonialistas de uma aristocracia que sobrevive ao Império. Não somos ainda uma República com coesão nacional. Por falta de coesão, usamos inflação e endividamento público para atender interesses divergentes. Quando isso se esgotava, usamos ditaduras, para impor coesão forçada.

O instante político - José Arthur Gianotti*

- O Estado de S. Paulo

• Salta aos olhos a crise de representação, mas mal se consegue descrevê-la, muito menos pensá-la

Instituições e atores políticos se dissolvem no ar; não vejo como observar esta situação a não ser fotografando o momento. E, se o faço, é em vista dos deveres de minha profissão de professor, que se espanta diante de uma crise que nunca vi igual. Antigamente, antes de chegar o caos, os militares intervinham, forçavam na marra o País a tomar uma direção sempre antidemocrática e tudo se passava como se tivéssemos entrado nos eixos.

Agora simplesmente nosso espaço econômico e político perdeu seu senso. Os agentes não conseguem agir antes de tudo como representantes das funções que lhes competem. A crise de representação salta aos olhos. No entanto, mal se consegue descrevê-la, muito menos pensá-la. Costuma-se dizer que os políticos voltaram suas costas para o povo, tratando apenas de seus interesses pessoais. Mas esse diagnóstico confunde a sociedade com o povo, cuja identidade é costurada pelo próprio exercício da política.

Traumas e sinais preocupantes – Leandro Colon

-Folha de S. Paulo

Fica um saldo de feridas políticas e econômicas do ano que termina daqui a uma semana. É impossível esquecer 2016, mesmo que se queira. Os traumas vão perdurar.

A presidente da República sofreu um impeachment com menos de dois anos de mandato sob acusação de crime de responsabilidade por meio de manobras fiscais. O presidente da Câmara caiu na Lava Jato, renunciou, foi cassado pelos pares e passará o Natal em um presídio.

O presidente do Senado vai encerrar sua gestão na condição de réu pelo crime de peculato, denunciado em outro caso por lavagem e corrupção, e investigado em inquéritos que tramitam no Supremo Tribunal Federal.

Controle de Nações - João Domingos

- O Estado de S. Paulo

Por trás da revelação feita pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, com base em investigações da Operação Lava Jato, de que a Odebrecht pagou mais de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 3,4 bilhões) em propinas em 12 países desde 2001, está muito mais do que um esquema internacional de corrupção.

Tal prática é uma ameaça concreta à estabilidade democrática dos países. Pelo que foi levantado até agora pela força-tarefa da Lava Jato, a empresa teria bancado o pagamento de marqueteiros das campanhas de candidatos vitoriosos a presidente da República em alguns dos países onde tinha interesses comerciais, via caixa 2 ou dinheiro de propina.

Desse modo, passou a empresa a ter – ou a planejar ter – o controle sobre governos, programas de governos, cronogramas de obras.

Boa vontade e coincidência - Ana Maria Machado

- O Globo

• Seria bom substituir a cultura do confronto pela prática da conversa e a busca do entendimento

Sempre me impressionou a mensagem de Natal que os anjos trouxeram ao presépio. Além de glorificar Deus nas alturas, desejavam paz na terra aos homens de boa vontade. Uma clara restrição — os de má vontade ficavam de fora, que se guerreassem à vontade. Nesta data festiva, podemos nos lembrar disso e ter um pouquinho de boa vontade geral. Faz bem ao país. Pode ajudar na paz e na harmonia. Até mesmo porque, como lembrou a ministra Cármen Lúcia, a sociedade não pode correr o risco de descrer do Estado: “Ou a democracia ou a guerra”.

Seria bom substituir a cultura do confronto pela prática da conversa e a busca do entendimento. Buscar fatos e dados, tanto na memória histórica quanto na experiência alheia. Como são as coisas em outros países democráticos? Por que são diferentes? Com que efeito? Reflexões assim despertadas podem ajudar a entender melhor a reforma da Previdência, a do ensino, a flexibilização de leis trabalhistas e tanto mais. Disposição para aprender pode levar a saídas. Neste ano que se encerra, tivemos a oportunidade de aprender lições importantes. Como constatar que pressão pode funcionar. Ou que a irresponsabilidade tem consequências — seja no campo fiscal, seja na estupidez de querer voar com pouco combustível.

Amém ao populismo - Adriana Fernandes

- O Estado de S. Paulo

• Deputados escolheram o pior momento para fazer uma queda de braço com o governo

Quando abriu a sessão da Câmara de votação do projeto de renegociação da dívida dos Estados, o presidente Rodrigo Maia recorreu à retórica ao defender que a Casa não precisava dizer amém ao Ministério da Fazenda.

A votação resultou numa grande derrota para o governo Michel Temer (provavelmente a maior delas), numa demonstração de força do presidente da Câmara, justamente no momento em que busca a reeleição para o cargo, na volta do recesso parlamentar em fevereiro.

O estrago provocado pela derrota ainda não está totalmente dimensionado. Mas é muito maior do que o peso político da bravata que Maia disparou na direção do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

O risco do Nordeste - Míriam Leitão

- O Globo

Cientistas do governo alertam que o Nordeste pode ter em 2017 o sexto ano consecutivo de seca, o que é um comportamento inédito do clima na região. Para que o problema climático não se transforme em uma crise social, o climatologista Carlos Nobre acha que será preciso o governo manter os vários programas sociais que mitigaram o drama regional nos últimos anos.

O Nordeste tem sido castigado de forma dolorosa. Houve três secas fortes em cinco anos de estiagem. Os cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) reuniram-se para analisar as previsões climáticas com outros órgãos do governo e fecharam o cenário de que há alto risco de um novo ano seco no Nordeste.

O aparelho do Estado – Editorial | O Estado de S. Paulo

O desastre fiscal legado ao País pela irresponsabilidade das políticas econômicas da era lulopetista tornou inadiável o desmonte dos excessos de um aparelho estatal pesado, ineficiente e, sobretudo, caro demais para a capacidade financeira dos contribuintes. Além de terem gerado um brutal desequilíbrio nas finanças públicas, cujo combate imporá grandes sacrifícios a todos, as práticas petistas no poder resultaram na expansão de um Estado já inchado e na sua utilização com objetivos político-eleitorais, o que corroeu sua capacidade de iniciativa e ação. O resultado dessa aventura é a crise cujas dimensões mais dramáticas estão no desemprego de mais de 12 milhões de pessoas, na perda de renda das famílias e na recessão que não dá sinais de trégua.

Ao mesmo tempo que precisa combater o imenso rombo nas contas públicas deixado pela administração anterior, para isso impondo um teto para os gastos públicos e adotando outras medidas de austeridade para conter o crescimento vertiginoso da dívida pública, o governo de Michel Temer tem de reorganizar um aparelho estatal cujo peso sobre o setor produtivo se tornou insustentável. A criação de 43 empresas estatais foi a contribuição dos governos Lula e Dilma para aumentar o gigantismo do Estado, como mostrou reportagem publicada pelo Estado na série A Reconstrução do Brasil.

Improviso e seu efeito – Editorial | Folha de S. Paulo

A primeira impressão que fica do assim chamado pacote de Natal é que o governo de Michel Temer (PMDB) agiu de afogadilho. O improviso parece ter decorrido do desejo do presidente de atenuar os abalos de quase um bimestre de más notícias políticas e de recessão econômica resistente.

Nem por isso as medidas deixam de ter valor, embora algumas dependam de definições mais precisas ou de aprovação do Congresso.

É inevitável neste ponto recordar anúncios anteriores; iniciativas mais importantes há muito não são notícia -e há pouca esperança de que tão cedo sejam levadas à prática. Trata-se, principalmente, do programa de concessões de obras e serviços de infraestrutura, crucial para dar vida à produção.

Explosão mais que anunciada – Editorial | O Globo

Não houve qualquer surpresa. Faz mais de duas décadas, pelo menos, que especialistas alertam os governantes de turno que o sistema previdenciário padece de doença terminal: assentado no modelo de repartição — os contribuintes mais jovens pagam, com suas contribuições, as aposentadorias dos que se retiram do mercado de trabalho —, as bases do INSS estavam sendo corroídas à medida que a população envelhecia. E continua a envelhecer.

Ainda na gestão de Fernando Henrique (19952002), foi proposto o óbvio: exigência de idade mínima para a habilitação à aposentadoria, com o fim da possibilidade de obtenção do benefício por tempo de contribuição. Perdeu por um voto na Câmara.

Consolidou-se, então, uma condição básica para haver, no futuro, a inviabilidade fiscal do INSS — que ficou evidente agora. FH, Lula e Dilma avançaram na reforma da previdência do funcionalismo da União. Com muito menos aposentados, este sistema gera um déficit proporcionalmente muito maior que o INSS. Ao menos, foi enfim aprovado que o servidor público admitido a partir de 2013 não mais se retiraria da função com direito a receber como aposentadoria o último salário. Passou a também ficar limitado ao teto do INSS (hoje, R$ 5.147,38) e, se quiser complementar a aposentadoria, precisará contribuir para um fundo de pensão. Dá a certeza de que em cerca de 20 anos o sistema se equilibra. Ganhou-se previsibilidade.

Meu Natal de 1978

Hoje é véspera de Natal. Como poderia esquecer? Há trinta e oito anos atrás atrapalhei o jantar de muita gente. Apostei na abertura política e voltei ao país antes da anistia. O STM já havia anulado minha condenação da 7ª Auditoria Militar de Recife. A 2ª Auditoria da Marinha do Rio de Janeiro, um mês antes, havia absolvido todos do processo encabeçado por Luiz Carlos Prestes e seus companheiros do Comitê Central do PCB. Meu nome constava lá também, sem nunca ter pertencido a tal organismo dirigente. Mesmo sem passaporte, sempre negado pelas embaixadas brasileiras, no exterior, resolvi regressar. 

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman tem um enunciado para os dias da sociedade do espetáculo. 

Diz: o pensador: 'Descartes afirmava 'penso logo existo'. Hoje se poderia ler: 'apareço logo existo'.

Para lembrar a data abaixo o recorte do Jornal Brasil de 26 de dezembro de 1978.

Desejo um Feliz Natal!




Organiza o Natal - Carlos Drummond de Andrade

Alguém observou que cada vez mais o ano se compõe de 10 meses; imperfeitamente embora, o resto é Natal. É possível que, com o tempo, essa divisão se inverta: 10 meses de Natal e 2 meses de ano vulgarmente dito. E não parece absurdo imaginar que, pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem, o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom.

Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon — sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade. Os objetos se impregnarão de espírito natalino, e veremos o desenho animado, reino da crueldade, transposto para o reino do amor: a máquina de lavar roupa abraçada ao flamboyant, núpcias da flauta e do ovo, a betoneira com o sagüi ou com o vestido de baile. E o supra-realismo, justificado espiritualmente, será uma chave para o mundo.

Completado o ciclo histórico, os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, isto é, com todos os viventes e elementos da terra, água, ar e alma. Não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura nem de suicídio. O correio só transportará correspondência gentil, de preferência postais de Chagall, em que noivos e burrinhos circulam na atmosfera, pastando flores; toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso. A crítica de arte se dissolverá jovialmente, a menos que prefira tomar a forma de um sininho cristalino, a badalar sem erudição nem pretensão, celebrando o Advento.

A poesia escrita se identificará com o perfume das moitas antes do amanhecer, despojando-se do uso do som. Para que livros? perguntará um anjo e, sorrindo, mostrará a terra impressa com as tintas do sol e das galáxias, aberta à maneira de um livro.

A música permanecerá a mesma, tal qual Palestrina e Mozart a deixaram; equívocos e divertimentos musicais serão arquivados, sem humilhação para ninguém.

Com economia para os povos desaparecerão suavemente classes armadas e semi-armadas, repartições arrecadadoras, polícia e fiscais de toda espécie. Uma palavra será descoberta no dicionário: paz.

O trabalho deixará de ser imposição para constituir o sentido natural da vida, sob a jurisdição desses incansáveis trabalhadores, que são os lírios do campo. Salário de cada um: a alegria que tiver merecido. Nem juntas de conciliação nem tribunais de justiça, pois tudo estará conciliado na ordem do amor.

Todo mundo se rirá do dinheiro e das arcas que o guardavam, e que passarão a depósito de doces, para visitas. Haverá dois jardins para cada habitante, um exterior, outro interior, comunicando-se por um atalho invisível.

A morte não será procurada nem esquivada, e o homem compreenderá a existência da noite, como já compreendera a da manhã.

O mundo será administrado exclusivamente pelas crianças, e elas farão o que bem entenderem das restantes instituições caducas, a Universidade inclusive.

E será Natal para sempre.

Ah! Seria ótimo se os sonhos do poeta se transformassem em realidade.

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Texto extraído do livro "Cadeira de Balanço", Livraria José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1972, pág. 52.