segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Demétrio Magnoli: Ideias fora de lugar

- O Globo

O Santo Guerreiro precisa do Dragão da Maldade: a ausência de Lula tende a esvaziar o discurso de Jair Bolsonaro

As ideias já estavam fora de lugar antes da condenação de Lula pelo TRF-4 e sua consequente inelegibilidade. O voto unânime dos três magistrados mudou radicalmente o panorama político-eleitoral. As ideias moveram-se junto com os votos, girando 180 graus — e continuaram fora de lugar. Não era verdade, antes, que as eleições presidenciais necessariamente ficariam reféns da polarização entre populistas de esquerda e de direita. Não é verdade, agora, que o espectro dos populismos simétricos tenha sido conjurado. Agora, como antes, o enigma situa-se em outro lugar: a crise do centro político no Brasil.

Antes da sentença do TRF-4, as sondagens atribuíam a Lula algo em torno de 35% das intenções de voto, enquanto Jair Bolsonaro atingia cerca de 15%. O número relevante, que passava quase imperceptível, era 50% — não a soma dos potenciais eleitores de ambos, mas a metade do eleitorado avesso às duas alternativas populistas. Num cenário em que a massa menos informada dos cidadãos só sabia da existência daquelas duas candidaturas, 50% declaravam rejeitá-los. O espaço para uma candidatura vitoriosa de centro ampliou-se, obviamente, com a virtual destruição da postulação de Lula. Mas o centro não triunfará se persistir na sua crônica incapacidade de formular um discurso político popular.

O outono do lulismo reflete-se na fragmentação do campo do populismo de esquerda. Ciro Gomes (PDT), Manuela D’Ávila (PCdoB) e Guilherme Boulos, presumível candidato pelo PSOL, já disputam seu espólio eleitoral, enquanto o PSB tenta atrair o interesse de Joaquim Barbosa. Tudo indica, porém, que o PT erguerá uma candidatura própria. Nutrido a partir da campanha fantasmagórica de Lula, que promete a restauração de uma mítica “idade de ouro” e exibe-se como vítima da “perseguição das elites”, mister X, o candidato do PT, tem chances apreciáveis de ultrapassar a barreira do primeiro turno. Nessa hipótese, uma imagem holográfica de Lula reunificaria, no segundo turno, o bloco do capitalismo de compadrio, do corporativismo e do paternalismo estatal.

Marcus André Melo: Procurando o centro

- Folha de S. Paulo


O centro é um lugar imaginário, mas todos se voltam para ele

É célebre a afirmação de Maurice Duverger, em "Os Partidos Políticos" (1951): "O centro não existe em política". Ele explicou: "Pode haver um partido de centro, mas não uma tendência de centro, uma doutrina de centro... Chamamos centro ao lugar geométrico donde se reúnem os moderados de tendências opostas: os moderados de direita e os moderados de esquerda".

É do mesmo autor a intuição fundamental que os países que adotam regras eleitorais majoritárias (conhecida popularmente por voto distrital) tendem ao bipartidarismo. Isso, argumentava, era produto do "voto útil" (que chamou de "efeito psicológico") e da ação das regras de conversão de voto em cadeiras : ao fim e ao cabo apenas os dois mais votados sobrevivem (o "efeito mecânico").

Uma vasta literatura de ciência política confirmou, por meio de modelos formais e testes empíricos, o acerto das intuições de Duverger.

A regra majoritária confere uma vantagem estrutural aos partidos mais centristas: um candidato de centro-esquerda terá os votos da esquerda em disputa com um adversário de centro-direita.

Vinicius Mota: Os bárbaros esperam

- Folha de S. Paulo

Ecos de energias selvagens estarão presentes na eleição brasileira de outubro

Tempos interessantes, na acepção cínica do termo, vive o establishment político ocidental. A empáfia da liderança conservadora no Reino Unido, que dava como certa a anuência bovina nas urnas para continuar tocando os negócios como sempre, foi castigada com o pesadelo do Brexit.

Nos EUA, um empresário gabola desceu da Trump Tower para subjugar oligarquias acomodadas na máquina centenária do Partido Republicano. Depois arrematou a façanha ao colocar de joelhos a linhagem dourada do progressismo de nariz empinado, encabeçada por Hillary Clinton.

Dissolveu-se na Alemanha a antinomia entre social-democratas e democratas-cristãos, que marcou o pós-guerra naquele país. Juntaram-se ambos num bloco para resistir ao assalto extremista, mas a fortaleza não dá garantias com prazo longo.

Na França, onde a união de socialistas e gaullistas seria impraticável e a ameaça da direita radical era mais concreta, o edifício das forças tradicionais veio abaixo numa implosão. Uma nova liderança, Emmanuel Macron, com um novo partido arrebatou o poder nacional num chofre.

Cida Damasco: Depois da dispersão

- O Estado de S. Paulo

Huck entra na disputa? Reforma sai? Respostas depois do carnaval

Uma leve passada pelas redes sociais nos últimos dias é suficiente para se identificar um estridente bloco de críticos do carnaval. O mote é sempre o mesmo: se todo mundo que ocupa as ruas para brincar fizesse o mesmo para reivindicar seus direitos, o Brasil estaria muito melhor. Por esse raciocínio, os brasileiros não teriam direito de se jogar no carnaval porque a corrupção continua viva, porque os políticos só cuidam de seus próprios interesses, porque o Judiciário não se preocupa mais em esconder seus desvios de comportamento e assim por diante. É mais ou menos igual ao que se diz do futebol, ou seja, que teria o poder de encobrir o que realmente importa.

Polêmicas de internet à parte, o fato é que foi sempre assim e será sempre assim, com o carnaval e com o futebol, independentemente dos momentos que o País atravessa, dos altos e baixos na economia, da estabilidade e dos solavancos na política. Mais ainda nesses tempos em que os ânimos inflamados das manifestações antes do impeachment de Dilma cederam lugar a uma combinação de exaustão e indiferença das ruas em relação aos desmandos na política.

Ninguém tem ilusões de que é possível “esquecer” os problemas. É só uma pausa. Mais dois dias de festa e a realidade se impõe. “Quarta-feira sempre baixa o pano”, como diz a velha canção de Chico Buarque. O que não falta é obstáculo a ser derrubado, dúvida a ser desfeita e decisão a ser tomada neste ano que, contrariando a tradição, “começou” bem antes do carnaval, como continuidade de um longo período de incertezas, que vem se arrastando desde as eleições de 2014. Política e economia se enroscam, numa campanha presidencial que domina o cenário há bom tempo, antes mesmo de se desenhar o painel completo das candidaturas.

Celso Rocha de Barros: Candidatura de Marina fica entre Lula e Macron

- Folha de S. Paulo

A pré-candidata apoiou o impeachment, o que, do ponto de vista do programa da Rede, foi erro histórico

Marina Silva parece indecisa se vai para a eleição como o Lula de saias ou como o Macron brasileiro.

O maior erro de Marina Silva foi não ter sido capaz de entender o que aconteceu com ela na campanha de 2014. Naquele ano, quando Marina decolou nas pesquisas, o PT lançou contra sua candidatura uma campanha publicitária muito agressiva, como nunca havia feito contra os tucanos. Marina acabou ficando fora do segundo turno.

A lição que deveria ter tirado era: opa, apavorei os petistas como os tucanos nunca apavoraram. Alguma coisa eu devo ter feito certo, vou investir nisso.

Não era difícil descobrir o que apavorou os petistas: Marina poderia ter sido o que, reza a lenda, José Dirceu teria chamado de "Lula de saias": infância pobre, história de militância com Chico Mendes, trajetória de sucesso no PT, ministra de Lula; mas sem qualquer acusação de corrupção contra si. Concorrendo em 2014 com um programa econômico mais liberal, era a opção "Ganhe o Lula de volta sem os escândalos e sem perder o direito de dizer 'presidenta'". Foi isso que apavorou os petistas e os fez perder o controle.

Karl Jaspers analisa responsabilidade do povo alemão pelo nazismo

Em livro escrito no calor dos acontecimentos, o filósofo examina a culpa alemã sem se deixar tomar pelo lado emocional

Caio Sarack*, O Estado de S.Paulo/Aliás

Se o leitor estivesse sob a pressão dos acontecimentos e conseguisse ainda sentir o ar espesso pela fuligem da guerra, daria conta de acalmar as paixões diante das pilhagens, dos escombros e dos mortos? Karl Jaspers, em seu A Questão da Culpa – A Alemanha e o Nazismo, publicado pela editora Todavia, trata no calor dos meses que seguiram o final da 2.ª Guerra Mundial sobre uma das heranças do Terceiro Reich: a culpa do povo alemão. O nazi-fascismo deixava espalhados pelo mundo intelectuais judeus e não judeus; tentavam expor o absurdo da destruição arquitetada pelo regime totalitário. Karl Jaspers, junto de Hannah Arendt, Theodor Adorno, Wilhelm Reich e tantos outros, buscavam descrever o caso alemão como desdobramento que ultrapassava as noções de nação, língua ou território; como, portanto, um sinal do alcance implosivo das crises econômicas internacionais e processos de esfacelamento da autonomia de pensamento dos homens e mulheres.

Quando enunciamos a palavra “culpa”, vários matizes cobrem nossos pensamentos: indireta, direta, moral, objetiva, subjetiva... Os adjetivos são muitos, mas a sensação de embrulho no estômago num só gesto enche de significado o verbete. Em suas palestras, Jaspers tenta acalmar as emoções e os ressentimentos; ao buscar na tão evidente culpa que sobrevoava o céu alemão do pós-guerra, o filósofo perguntava-se como poderíamos esclarecer o limite intuitivo (ainda que complexo) que separava todos os alemães dos condenados de Nuremberg: mesmo que não confundamos o criminoso da SS com o alemão médio das décadas de 1930 e 40, persiste sobre todos uma responsabilidade pelos crimes que foram cometidos. E agora, Jaspers? A guerra acabou. As paixões enrijeceram o coração do homem e da mulher, o Mal radical já foi descoberto. Ajuizar já não pode? Ajuizar não é inevitável?

Zygmunt Bauman sustenta que a nostalgia é incurável na modernidade

'Retrotopia', inédito no Brasil e lançado postumamente, fala sobre o desejo atual de voltar ao passado

Dirce Waltrick do Amarante*, Especial para o Estado / Aliás

Retrotopia, livro póstumo do sociólogo e pensador polonês Zygmunt Bauman (1925-2017), discute o desejo da volta ao passado – a um passado idealizado, que não é o passado “como ele genuinamente era” –, visto como solução para um mundo melhor, pois, como afirma Rutger Bregman, no livro Utopia para Realistas, citado por Bauman, “não logramos imaginar um mundo melhor do que aquele que alcançamos” e, de fato, as pesquisas têm demonstrado que esta geração vislumbra para a geração posterior uma situação pior do que a sua.

Diante desse cenário sombrio, a nostalgia se torna a “condição moderna incurável” deste século, mas seu perigo está em revivificar desejos nacionais e nacionalistas que se empenham “na fabricação de mitos antimodernos de história, por meio de um retorno a símbolos e mitos nacionais e, ocasionalmente, com teorias intercambiáveis da conspiração”.

A retrotopia é o desejo do passado estável e não de um futuro incerto, ou seja, ela não busca a terra bem-aventurada, a Utopia, quer, isso sim, o retorno a uma terra que já se conhece. Ela é também a negação do progresso, que pressagia a ameaça de perdas e a degradação social. Sem a esperança do progresso, “a herança que nos consola é a tradição”, diz David Lowenthal, citado por Bauman. Não sem razão, atualmente têm ganhado destaque os discursos políticos que defendem a volta aos valores do passado.

Nesse retorno ao túnel do tempo, afirma o sociólogo polonês, ressuscitamos o Leviatã, de Thomas Hobbes, que acreditamos não ter cumprido sua função de “subjugar a crueldade inata dos homens, tornando assim a vida humana entre humanos suportável”. Em seu livro, Bauman cita o historiador Timothy Snyder, o qual sugere, reavaliando a experiência terrível e perniciosa do Holocausto, que se os Estados fossem destruídos e as instituições locais corrompidas, “poucos dentre nós se comportariam bem. Há poucas razões para pensar que somos do ponto de vista ético superiores aos europeus dos anos 1930 e 1940 ou menos vulneráveis ao tipo de ideia que Hitler tão auspiciosamente promulgou e pôs em prática”.

Marcus Pestana: O aprendizado permanente nas políticas de saúde

- O Tempo (MG)

Em boa hora, a Câmara dos Deputados firmou acordo de cooperação técnica com os governos espanhol e português para troca de experiências sobre a gestão de seus sistemas de saúde. Resultado disso foi o envio de uma delegação a Madri e Lisboa para estudar os impactos da recente crise europeia na saúde pública.

Digo em boa hora porque a política brasileira tem andado mais perto dos constantes casos de corrupção e mais distante daquilo que interessa a todos: a melhoria da qualidade de vida a partir de políticas públicas consistentes.

Vamos às semelhanças entre Brasil e Espanha. Os dois países ergueram sistemas de saúde gratuitos baseados no Estado de bem-estar social, lançando os dois pilares da organização da atenção à saúde: a universalidade (o acesso é para todos, sem restrições) e a integralidade (a carteira de serviços deveria cobrir integralmente as necessidades da população). A configuração dos dois foi expressão da transição para a democracia após ditaduras. A Espanha em 1978, já o Brasil com a Constituição de 1988.

Avanço essencial: Editorial/O Globo

A reforma foi uma solução inteligente para remover o entulho getulista de inspiração fascista

Coube ao vice-presidente Michel Temer receber uma herança de fato maldita da presidente Dilma Rousseff — a maior recessão já registrada (8% em dois anos, 2015/16), 14 milhões de desempregados e inflação de dois dígitos. Com uma competente equipe econômica e a experiência de longa quilometragem no Congresso, em especial na Câmara, o novo presidente conseguiu avanços inesperados. Até que o método de Temer e de seu grupo de fazer política, de forma patrimonialista e fisiológica, permitiu que o presidente mantivesse uma conversa nada republicana com Joesley Batista, nos porões do Palácio do Jaburu, gravada pelo empresário, em fase de acerto com a procuradoria-geral da República (PGR) de uma delação premiada.

Esta gravação, divulgada pelo GLOBO, dificultou as ações do governo, e duas acusações da PGR o levaram a gastar tempo e capital político para barrar na Câmara o pedido para que as denúncias fossem aceitas e encaminhadas ao Supremo. Restou a tentativa da aprovação crucial da minirreforma da Previdência no Congresso. Mas outros avanços essenciais foram conseguidos, entre eles uma importante modernização trabalhista.

Devido a razões históricas, políticas e ideológicas, o movimento sindical e grupos de esquerda foram hipnotizados por Getúlio Vargas, ditador (1937-45) dos mais ferozes e depois presidente eleito (1951-54), canonizado por ter aprovado a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), em 1943, ainda na ditadura do Estado Novo.

O importante e o fundamental: Editorial/O Estado de S. Paulo

Para a maioria dos brasileiros, conforme atestaram diversas pesquisas de opinião nos últimos anos, a corrupção está entre os principais problemas do País. O tema já levou milhões de pessoas às ruas em protestos os mais diversos e mobiliza a opinião pública toda vez que as autoridades envolvidas na luta contra a corrupção denunciam complôs para prejudicar seu trabalho.

Da mesma maneira, causa profunda indignação popular a exposição dos privilégios de parte do funcionalismo público, em especial quando comparados à situação difícil por que passam milhões de brasileiros desempregados ou em atividades de baixíssima remuneração e escassa proteção legal.

Todo esse dispêndio de energia cívica é plenamente compreensível, pois é inegável que tanto a corrupção como as benesses concedidas a servidores públicos são extremamente prejudiciais ao País. No entanto, diante dos imensos desafios que o País enfrenta há décadas para mudar de patamar de desenvolvimento - a começar pelo fato, inaceitável, de que metade da população ainda não tem acesso a esgoto tratado -, é o caso de questionar se o País não está dedicando esforço excessivo ao que está apenas na superfície dos problemas, deixando para depois o enfrentamento de suas causas primárias.

Outras reformas: Editorial/Folha de S. Paulo

Fazenda defende medidas destinadas a conferir maior solidez a contratos privados

Com a perspectiva palpável de derrota na reforma da Previdência e o início da campanha eleitoral, os principais líderes do governismo se prontificam a prometer o que chamam de agenda positiva.

De olho no próprio capital político, o presidente Michel Temer (MDB), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), procuram atenuar o eventual fracasso com a defesa explícita ou velada de algum programa substituto para 2018.

Boa parte das medidas aventadas trata de melhorias na área econômica, de fato meritórias e, em alguns casos, urgentes. Será enganoso, contudo, apresentá-las como alternativa às mudanças essenciais no sistema de aposentadorias e pensões —as iniciativas deveriam caminhar lado a lado.

Da parte de Meirelles, indica-se prioridade ao que se chama de pauta microeconômica —ou, vale dizer, de normas voltadas para as relações entre os agentes privados, caso de empresas e consumidores.

Entre as mais importantes estão uma nova lei de recuperação judicial e falências, o aperfeiçoamento do cadastro positivo de devedores e regras mais claras para a entrega de garantias na tomada de empréstimos bancários.

Agência edita texto e diz que Segovia ‘indicou’ arquivamento de inquérito

Camila Turtelli e Thiago Faria / O Estado de S. Paulo.

A agência Reuters reeditou a entrevista com o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia. O texto original, publicado na noite de sexta-feira, dizia que Segovia tinha afirmado que a tendência era de arquivamento da investigação sobre o chamado Decreto dos Portos, que envolve o presidente Michel Temer.

Na alteração do conteúdo, a Reuters trocou o verbo “afirmar” por “indicar” ao qualificar as declarações de Segovia. A agência faz a seguinte ressalva aos leitores: “Esclarece que Segovia disse que até o momento não há indício de crime no caso, indicando, em vez de afirmando, que a tendência é que a PF arquive o caso”.

A entrevista teve grande repercussão e levou o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso a intimar Segovia para prestar esclarecimentos. Entidades representativas da PF criticaram as declarações. Em nota divulgada anteontem, Segovia negou ter dito que iria arquivar o inquérito.

O ministro da Secretaria de verno, Carlos Marun, divulgou vídeo ontem no qual faz uma defesa do diretor-geral da Polícia Federal. Segundo o ministro, Segovia tem o “dever de observar inquéritos de grande repercussão, até para que a PF não seja utilizada como instrumento de guerra política”. “Estranho essa celeuma que se estabelece no momento em que o diretor-geral da Polícia Federal verbaliza o óbvio: que num inquérito aonde não existem provas, não existem indícios, que não existe sequer a materialização do ato ilícito, tenha a tendência de ser arquivado.”

Inquérito sobre portos poupa sigilos bancário e fiscal de Temer

Em investigação, PGR e PF não pediram acesso à movimentação do presidente

Rubens Valente / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Passados quatro meses da abertura do inquérito sobre um decreto do setor portuário, os sigilos bancário, telefônico e fiscal do presidente Michel Temer, de amigos e empresários foram preservados pelos investigadores no caso, a Procuradoria-Geral da República e a PF (Polícia Federal).

Na última sexta-feira (9), em entrevista à agência Reuters, o diretor-geral da PF, Fernando Segovia, criticou a qualidade das provas obtidas e indicou que o inquérito poderá ser arquivado.

A consulta aos autos, porém, revela que uma série de medidas não foram tomadas pela PGR e pela PF.

A investigação, que procura saber se Temer recebeu vantagem indevida das empresas da área, se concentrou até agora em aspectos formais, como depoimentos de dez investigados incluindo Temer que negam qualquer irregularidade na edição do decreto.

O inquérito foi aberto a partir da delação da JBS. Em telefonemas, o ex-assessor presidencial Rodrigo Loures conversou com membros do governo e parlamentares sobre o decreto. Ele queria incluir no texto um grupo de portos que tinham recebido concessões e arrendamentos antes de uma lei de 1993.

No decreto, de maio de 2017, o grupo acabou excluído um dos pontos usados pela defesa de Temer para pedir arquivamento do caso.

Tanto a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, quanto o delegado da PF que preside o inquérito, Cleyber Malta Lopes, não demonstraram interesse em pedir ao ministro relator no STF, Luís Roberto Barroso, acesso à movimentação bancária do presidente para ver se há ou houve alguma relação com empresas do setor portuário.

Declaração de Segovia contradiz relatório da PF sobre Temer

Investigação aponta necessidade de quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico do presidente

Jailton de Carvalho / O Globo

-BRASÍLIA- O mais recente relatório do inquérito sobre supostas irregularidades cometidas pelo presidente Michel Temer na edição do decreto dos portos entra em choque com as declarações do diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, sobre a inexistência de indícios de crimes e a conclusão das investigações em pouco tempo. Num balanço, concluído em 15 de dezembro passado, dois analistas informaram ao delegado Cleyber Malta Lopes, responsável pela investigação, que, para o aprofundamento da apuração, seriam necessárias algumas decisões importantes, entre elas a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de Temer e outros investigados. O relatório foi revelado pelo GLOBO no mês passado. Lopes retorna essa semana de viagem internacional para se debruçar sobre o caso.

Se as medidas recomendas pelos analistas forem acolhidas, o inquérito poderia ganhar novos desdobramentos e se prolongar por vários meses. Em entrevista publicada na última sexta-feira pela agência Reuters, Segovia afirmou que os indícios encontrados até agora “são muito frágeis”. O chefe da PF também ressaltou que “não apareceu absolutamente nada que desse base” para qualquer acusação por corrupção.

Agência corrige entrevista de Segóvia e confirma versão do diretor da PF

Reuters corrige fala do diretor da PF sobre inquérito de Temer

Redação / Diário do Poder

A agência de notícias Reuters reeditou a matéria da entrevista exclusiva com o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia. O texto original, publicado na noite de sexta-feira (9), dizia que Segovia tinha afirmado que a tendência era de arquivamento pela PF da investigação envolvendo o presidente Michel Temer sobre o Decreto dos Portos.

Na alteração do conteúdo, a Reuters trocou o verbo “afirmar” por “indicar” ao qualificar as declarações de Segovia. No início do texto reeditado, a agência faz a seguinte ressalva aos leitores: “Esclarece que Segovia disse que até o momento não há indício de crime no caso, indicando, em vez de afirmando, que a tendência é que a PF arquive o caso”.

A matéria teve grande repercussão e levou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso a intimar Segovia, na manhã de sábado, para prestar esclarecimentos. “Tendo em vista que tal conduta, se confirmada, é manifestamente imprópria e pode, em tese, caracterizar infração administrativa e até mesmo penal, determino a intimação do Senhor Diretor da Polícia Federal, delegado Fernando Segovia, para que confirme as declarações que foram publicadas, preste os esclarecimentos que lhe pareçam próprios e se abstenha de novas manifestações a respeito”, diz o despacho de Barroso.

Também ontem, entidades de classe se manifestaram, por meio de nota à imprensa, sobre as declarações de Segovia. A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) disse que nenhum dirigente deve se manifestar sobre investigações em andamento. A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) afirmou que é “sempre temerário que a direção-geral emita opiniões pessoais sobre investigações nas quais não está diretamente envolvida”. Já o presidente da OAB Nacional, Claudio Lamachia, afirmou não ser “apropriado” que o diretor-geral da PF “dê opiniões a respeito de investigações em curso”.

Em nota divulgada ontem, Segovia negou ter dito que iria arquivar o inquérito. “Afirmo que em momento algum disse à imprensa que o inquérito será arquivado. Afirmei inclusive que o inquérito é conduzido pela equipe de policiais do GInqE com toda autonomia e isenção, sem interferência da Direção Geral”, afirmou o diretor-geral da PF, por meio de nota, informando que só irá responder aos questionamentos do ministro Barroso, do STF, na quarta-feira, 14.

Dissidentes do PSDB e PSB desistem de ir para o PSL

Igor Gadelha / O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - A ida do deputado Jair Bolsonaro (RJ) para o PSL para ser candidato à Presidência pelo partido fez um grupo de pelo menos outros 12 deputados federais desistir de se filiar à legenda. O grupo era formado principalmente por parlamentares jovens dissidentes do PSDB e PSB.

Capitaneados pelo deputado Daniel Coelho (PSDB-PE), esses parlamentares negociavam a filiação com a ala do PSL intitulada de Livres, que comandava 12 diretórios estaduais e era liderada por Sérgio Bivar, filho do deputado federal e ex-presidente da legenda Luciano Bivar (PE).

Nas conversas com os deputados, a promessa era que o PSL mudaria o nome para Livres e que o novo partido passaria a atuar como uma espécie de “movimento”, com viés liberal tanto na economia quanto na política. “Não ia ser um partido de caciques comandando e o resto sabendo depois”, disse Coelho ao Estadão/Broadcast.

Os deputados do PSDB que conversaram com o PSL fazem parte da ala conhecida como “cabeças-pretas”, tucanos mais jovens que demonstram descontentamento com o governo Michel Temer. Entre eles, estavam o próprio Coelho, Pedro Cunha Lima (PB), Mariana Carvalho (RO) e Pedro Vilela (AL).

Huck atrai segmentos lulistas e tem rejeição da elite

Mauro Paulino e Alessandro Janoni / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO- A inelegibilidade de Lula (PT) é um dos vetores para a possível candidatura de Luciano Huck à Presidência da República. O apresentador de TV tem potencial de crescimento sobreposto às intenções de voto do petista em segmentos do eleitorado onde outros partidos demonstram maior dificuldade de alcance.

Ao se combinarem os três cenários onde seu nome aparece como possível candidato, Huck é apontado pelo menos uma vez por 12% dos brasileiros. Entre as mulheres de menor escolaridade, nicho dominado pelo ex-presidente, o apresentador vai a 17%, por exemplo.

Em análise multivariada, para melhor identificar a relação direta dos eleitores com o apresentador, chega-se, além desse percentual de entusiastas, ao conjunto de possíveis detratores, que hoje se equivale ao seu índice de rejeição —25%.

Esse percentual de resistência é mais elevado entre homens de maior escolaridade e renda, perfil da população que nas últimas eleições optou por candidatos tucanos e que hoje nas pesquisas de intenção de voto tendem à candidatura de Jair Bolsonaro (PSC).

Fica fácil entender a movimentação do ex-presidente FHC e de parte do PSDB em torno de Huck --agregaria ao partido estratos lulistas e o partido, por sua vez, poderia anular em parte a reprovação da classe alta ao candidato.

Fernando Pessoa: Carnaval

A vida é uma tremenda bebedeira.
Eu nunca tiro dela outra impressão.
Passo nas ruas, tenho a sensação
De um carnaval cheio de cor e poeira…

A cada hora tenho a dolorosa
Sensação, agradável todavia,
De ir aos encontrões atrás da alegria
Duma plebe farsante e copiosa…

Cada momento é um carnaval imenso,
Em que ando misturado sem querer.
Se penso nisso maça-me viver
E eu, que amo a intensidade, acho isto intenso

De mais… Balbúrdia que entra pela cabeça
Dentro a quem quer parar um só momento
Em ver onde é que tem o pensamento
Antes que o ser e a lucidez lhe esqueça…

Automóveis, veículos,
As ruas cheias,
Fitas de cinema correndo sempre
E nunca tendo um sentido preciso.

Julgo-me bêbado, sinto-me confuso,
Cambaleio nas minhas sensações,
Sinto uma súbita falta de corrimões
No pleno dia da cidade…

Uma pândega esta existência toda…
Que embrulhada se mete por mim dentro
E sempre em mim desloca o crente centro
Do meu psiquismo, que anda sempre à roda…

E contudo eu estou como ninguém
De amoroso acordo com isto tudo…
Não encontro em mim, quando me estudo,
Diferença entre mim e isto que tem

Esta balbúrdia de carnaval tolo,
Esta mistura de europeu e zulu
Este batuque tremendo e chulo
E elegantemente em desconsolo…