Cientista político afirma que prisão do ex-presidente é resultado de processo legítimo
Marco Rodrigo Almeida | Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - A despeito da mobilização política gerada, a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é decorrência natural de uma série de graves irregularidades constatadas, avalia Bolívar Lamounier.
Para o cientista político, falar em perseguição da Justiça contra PT e Lula não passa de uma ilusão.
“Muita gente se recusa a reconhecer que houve corrupção em larga escala nos governos petistas”, diz.
Um dos fundadores do PSDB, Lamounier crê que a instabilidade política pode permanecer mesmo após a eleição, uma vez que o cenário de muitos candidatos e alta fragmentação partidária no Congresso favorece a formação de um governo debilitado.
A saída, defende, está na adoção do parlamentarismo.
• Folha - Como o senhor avalia a prisão de Lula?
Bolívar Lamounier - É uma decorrência inevitável de tudo o que se apurou até aqui. É claro que o fato de ele ter sido um presidente de muita popularidade introduz um fator político muito forte. Mas, no essencial, foram constatadas irregularidades gravíssimas.
• Muitos alegam que há uma perseguição contra Lula e PT.
Mas temos políticos de outros partidos também condenados. Um ministro do STJ acaba de confirmar a condenação a 20 anos de prisão do ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB).
• Mas a denúncia da Procuradoria-Geral da República sobre o mensalão mineiro foi feita há dez anos e Azeredo ainda recorre em liberdade. Isso não dá base ao argumento de que os processos correm mais rápidos contra o PT?
É uma ilusão acreditar nisso, não passa de uma falácia. Se Lula ficasse solto por alguns anos, com a capacidade de mobilização que ele tem, é evidente que criaria obstáculos para nunca ser preso.
É claro que o Azeredo não representa risco nenhum para a sociedade, para o processo. É uma figura tranquila, serena, não sobe em palanque em dia sim e outro também.
• Houve também o caso de Geraldo Alckmin nesta semana. O STJ encaminhou o inquérito sobre ele para a Justiça Eleitoral de São Paulo, tirando-o do alcance da Lava Jato.
Os casos me parecem bem diferentes. Azeredo estava condenado. Contra Alckmin há uma suspeita, uma denúncia. São pesos totalmente diferentes.
• Quais são as perspectivas do PT após a prisão de Lula?
O caso reforçou uma tendência do PT: abraçar as piores causas que você pode imaginar. Agora o partido está contra a prisão após condenação em segunda instância.
Só prender o condenado após o fim do processo é uma jabuticaba brasileira, uma jabuticaba podre.
Para defender esse absurdo e privilegiar Lula, o PT se agarrou ao Gilmar Mendes e ao Marco Aurélio, duas das figuras mais discutíveis do STF, para ser ameno.
• Houve uma forte mobilização em defesa de Lula. A prisão do ex-presidente vai fortalecer essa militância?
Sim, num primeiro momento isso irá ocorrer. Criou-se uma fantasia de que Lula é um super-homem que veio do Nordeste. Isso é quase indestrutível em certos grupos.
Muita gente se recusa a reconhecer que houve corrupção em larga escala nos governos do PT. A militância tem uma atitude muito ambígua a respeito da democracia. Tem um pé dentro e um pé fora. Usa o pé conveniente dependendo da hora. Agora pisa com o pé antidemocrático, questionado as instituições.