quinta-feira, 27 de setembro de 2018

William Waack: Apelos ao ‘razoável’

- O Estado de S.Paulo

Talvez seja o momento de lamentar nossa evidente falta de verdadeiras lideranças

Não acho que as opções mais prováveis que se colocam diante do eleitor após o primeiro turno – a julgar pelo cenário trazido pelas pesquisas mais recentes, seria o confronto Fernando Haddad versus Jair Bolsonaro – sejam uma escolha de Sofia ou possam ser descritas como dilema do prisioneiro.

A primeira é a horrível situação, descrita no filme com Meryl Streep sobre a rampa de seleção em Auschwitz, em que qualquer escolha implica uma tragédia. O segundo é uma adaptação da Teoria dos Jogos, segundo a qual escolhas individuais visando exclusivamente a interesse próprio (nesse contexto, o voto anti-Bolsonaro ou o voto anti-PT) acabam produzindo um resultado coletivo pior para cada indivíduo.

Acho que a questão essencial neste momento é tentar entender a natureza do fenômeno que enfrentamos na próxima votação – duas posturas radicalmente opostas, antagônicas e, a julgar pelo palavreado em curso, irreconciliáveis. Trata-se de ocorrência efêmera, típica de polarização em disputa eleitoral, ou, ao contrário, de uma profunda transformação da política brasileira caracterizada, antes de mais nada, pelo “esfarelamento” do que se poderia descrever como “centro”, “moderação” ou “equilíbrio”?

Tendo pela segunda hipótese. Em primeiro lugar, não é nada novo o fenômeno da resistência ao lulopetismo, que é a expressão do que há de retrógrado e atrasado na política brasileira, resistência que levou ao impeachment de Dilma Rousseff e a resultados de eleições como as municipais de São Paulo de 2016. Em segundo lugar, em oposição à ferocidade como o lulopetismo se dedicou (em parte com dinheiro público desviado, como hoje sabemos) a destruir seus adversários políticos, encarados sempre como “inimigos do povo”, cresceu um vigoroso movimento pendular contrário, com capilaridade, abrangência e características próprias de uma “guerra cultural” (ou seja, de afirmação ou negação de valores).

No meio desse movimento foram apanhadas elites pensantes que, à falta de um projeto de País razoavelmente desenhado, e em dúvida sobre as próprias ideias, parecem pregar a um deserto de ouvintes – e que se sentem “órfãos” de representação – os valores democráticos, harmonia, estabilidade, coesão de princípios e o que mais pareça bonito, socialmente responsável e capaz de arrancar aplausos de gente “razoável”.

Merval Pereira: Evitando o caos

- O Globo

Barroso disse que não constatou indício de que o cadastramento biométrico tenha prejudicado candidato ou partido específico

O que se viu ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) foi mais uma manobra de partidos políticos, desta vez PT e PCdoB da coligação de Fernando Haddad, e o PSB, tentando transmitir a impressão de que o pleito de 7 de outubro pode estar viciado devido à decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de cancelar 3,4 milhões de títulos de eleitores que não fizeram o cadastramento biométrico obrigatório.

Os advogados do PT e do PCdoB alegaram que a falta desses eleitores nas urnas pode comprometer a eleição, pois pode ser uma diferença que influencie no resultado final. Atitude semelhante tomou o candidato Jair Bolsonaro, alegando irresponsavelmente que a urna eletrônica não é confiável, atribuindo a possibilidade de fraude ao PT.

A irresponsabilidade petista só foi diferente porque utilizou os meios legais para tentar recuperar esses eleitores que, supostamente, seriam petistas, pois os locais do recadastramento são no interior do país. Mas a ideia de que há uma orquestração para prejudicar o candidato petista ficou no ar.

De fato, a última eleição presidencial foi decidida por uma diferença de votos válidos de 3,28%, e a reclamação indica que o PT está aguardando uma decisão no photochart. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, que teve apoio da maioria, disse que não constatou indício de que o cadastramento biométrico tenha prejudicado candidato ou partido específico. “O direcionamento da revisão [eleitoral] para prejudicar eleitores específicos é hipótese remota”, disse ele, para encerrar afirmando que a ação cautelar deveria ser indeferida “sob o risco de se inviabilizar as eleições e lançar o país num caos”.

Esse caos foi explicitado no voto do ministro Edson Fachin, que disse que, para aceitar a ação, teria que ser adiada a eleição. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também se pronunciou contra lembrando que “não há voto livre e igualitário sem alistamento confiável de eleitores aptos a votar. A Constituição concede direitos políticos a quem tenha cidadania, o que exige o alistamento eleitoral”.

Ascânio Seleme: Para que servem as pesquisas

- O Globo

No caso das pesquisas eleitorais, a informação, além de atrapalhar, estraga a surpresa

Pesquisas ajudam o eleitor a decidir corretamente como votar? Duvido. Na verdade, acho que mais atrapalham e confundem. Faz muito tempo que eleições convivem com os institutos de pesquisa. Desde 1989, data da primeira eleição presidencial direta depois da ditadura, o Brasil acompanha os humores do eleitor através de pesquisas. Os grandes institutos, Ibope e Datafolha, tiveram filhotes ao longo dos anos e hoje são diversas as empresas que aferem a intenção dos brasileiros diante das urnas.

Eles nasceram com objetivo comercial. Inspirado no americano George Gallup, o Ibope, o mais antigo, foi criado na década de 1940 para entender os hábitos de consumo dos brasileiros e então orientar campanhas de publicidade ou sugerir mudanças em produtos. O Datafolha nasceu em 1983 como um departamento de pesquisas e informática do jornal “Folha de S.Paulo”, cresceu, virou uma empresa independente e hoje atende clientes corporativos da mesma forma que produz pesquisas eleitorais.

Embora muitas vezes errem, e errem feio, esta não é a questão que se quer discutir aqui. O que se quer debater é a utilidade dos resultados das intenções de votos para o eleitor. A pergunta crucial seria “o que eu ganho sabendo como os demais brasileiros querem votar?”. São diversas as respostas. Desde, nada, que seria a mais correta, até uma das muitas que comprovam que o meu voto será, sim, influenciado pelas pesquisas eleitorais.

Bernardo Mello Franco: Na reta final, união contra Haddad

- O Globo

Com Bolsonaro no hospital, o PT virou saco de pancadas no debate de ontem. A pancadaria só foi interrompida pelo romantismo do Cabo Daciolo

Na ausência do líder das pesquisas, sobrou para o segundo colocado. Fernando Haddad foi o saco de pancadas do debate de ontem no SBT. O petista apanhou de todos os lados — até de candidatos que não têm mais esperanças de ultrapassá-lo.

“Você chegou como representante do preso que está em Curitiba”, provocou Alvaro Dias. O senador tentou se apresentar como o campeão do antipetismo. Agressivo, chegou a chamar o partido do ex-presidente Lula de “organização criminosa”.

“Se puder governar sem o PT, eu prefiro”, desdenhou Ciro Gomes. Emparedado pelo crescimento de Haddad, ele acusou a sigla do rival de ter montado uma “estrutura de poder odienta”. Também culpou o PT pela ascensão do líder Jair Bolsonaro, que classificou como “uma aberração”.

Mais distantes do segundo turno, Geraldo Alckmin e Marina Silva tentaram jogar no colo dos petistas a impopularidade do governo atual. “O Temer é do PT”, exagerou o tucano. “O Temer foi colocado onde está pelo Partido dos Trabalhadores, junto com a Dilma”, emendou a ex-senadora.

“Me desculpe, mas quem botou o Temer lá foram vocês. Ele traiu a Dilma e não conseguiria chegar à Presidência se não fosse a oposição. Você participou do movimento pelo impeachment para botar o Temer lá”, devolveu Haddad.

“Foram vocês sim, do PT, que se juntaram ao Temer para afundar o Brasil”, insistiu Marina. Os dois só concordaram em atacar o presidente em fim de mandato. Ontem a reprovação do governo chegou a 82%, segundo a pesquisa CNI-Ibope.

De volta do retiro nas montanhas, Cabo Daciolo providenciou um alívio para a pancadaria. Em clima de “Namoro na TV”, o nanico se declarou para a mãe e a mulher, que estavam na plateia do debate. “Mãe, eu te amo! Varoa, eu te amo! Mulheres brasileiras, eu amo todas vocês!”, galanteou.

O charme do bombeiro derreteu até o coração radical de Guilherme Boulos. “Daciolo, a gente já estava com saudade”, desmanchou-se o líder dos sem-teto.

Carlos Alberto Sardenberg: Um voto impossível

- O Globo

Lulistas e bolsonaristas falam de duas imagens falsas. Mídia não pode ser ao mesmo tempo elitista e comunista

Vamos falar francamente: eleger Fernando Haddad é absolver Lula e condenar a Lava-Jato; eleger Bolsonaro é absolver o capitão da direita radical e populista e condenar a tolerância política e moral.

Um candidato é a soma do que fala, do que falou e de seu comportamento pessoal e político. Mas é também a imagem que os seguidores fazem de seu líder.

No caso do PT, claro, o líder é Lula, e não Haddad. Sua vitória seria a revanche não apenas contra os promotores e juízes da Lava-Jato, mas contra uma operação legal e institucional que flagrou o maior escândalo corporativo do mundo. Não é exagero. Não se encontra por aí um modelo de corrupção tão organizado, envolvendo praticamente todos os órgãos do governo.

Com Haddad/Lula eleito, tudo isso seria um não acontecimento ou, como dizem, uma invenção das elites reunidas no Judiciário, na mídia, nas empresas e nos bancos — tudo para massacrar os pobres.

No caso de Bolsonaro, sua vitória, como dizem o candidato e seus seguidores, seria o triunfo sobre os canalhas, que é como se referem aos adversários. E sobre uma grande conspiração.

Bolsonaro e seus seguidores veem em toda parte uma armação de comunistas, ateus, infiéis, amigos dos bandidos e corrompidos moralmente, todos contra o homem comum. Desconfiam da urna eletrônica, das pesquisas eleitorais, da mídia. Gostam das Forças Armadas e das polícias, mas desconfiam da Polícia Federal se esta não demonstrar que o atentado contra Bolsonaro também foi parte de uma grande conspiração.

Não é por acaso que os dois extremos — lulistas e bolsonaristas — têm um mesmo alvo. Para os petistas, a mídia é golpista e dominada pelas elites reacionárias. Para os bolsonaristas, é dominada por uma esquerda imoral.

É claro que não podem estar falando da mesma coisa. Estão falando da imagem que cada lado tem da imprensa, formando-se duas imagens necessariamente falsas. A mesma mídia não pode ser ao mesmo tempo elitista e comunista.

Vai daí que a opinião dos outros não tem a menor importância para esses dois extremos. Muito menos a prática democrática da controvérsia e da diversidade.

A esta altura, perguntarão os leitores: mas os eleitores de Bolsonaro e Lula/ Haddad são todos assim?

Há muitos que são. Sim, há extremistas e intolerantes entre nós. Mas isso não explica tudo.

No lado do PT, muitos eleitores votam pela lembrança de bons anos do governo Lula. De fato, emprego, salários e crédito cresceram de modo expressivo. Não foi uma obra do lulismo, mas uma combinação clássica de estabilidade econômica (neoliberal!) e uma onda externa favorável. Todos os países emergentes se deram bem —e até melhor que o Brasil. Nenhum emergente, por exemplo, passou pela dura recessão gestada aqui pelos governos Lula e Dilma. O lulismo, ao final, entregou desemprego.

Nesse aspecto, o impeachment de Dilma foi até uma sorte. Livrou Lula do peso do governo, permitiu que sua intensa propaganda passasse para a oposição e convencesse muita gente de que foi tudo culpa dos golpistas. Mentir foi a tática. Como essa agora de dizer que a ONU considerou legítima a candidatura de Lula, quando há apenas um parecer dado por dois membros (alinhados à esquerda) de um comitê acessório formado por não diplomatas.

Mais uma vez, o lulismo contou com a incompetência e as hesitações do centro político e liberal.

Daniela Lima: Diga-me com quem andas

- Folha de S. Paulo

Ataque à imprensa alcançou escala e organização inéditas com eleitores de Bolsonaro

No já célebre “Como as Democracias Morrem”, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt mostram como a intimidação à mídia está conectada à falência do Estado de Direito. O ataque sistemático à imprensa, que passa a ser apresentada como inimiga de políticos e regimes, está fartamente descrito no livro como parte do processo de fragilização das democracias pelo mundo.

O fenômeno não é, portanto, criação do Brasil. Nem novo é por aqui. Ganhou, porém, escala e organização inéditas na disputa eleitoral deste ano, protagonizado —sem exclusividade, é verdade, mas com destaque— por apoiadores de Jair Bolsonaro (PSL).

Qualquer reportagem que incomode o candidato ou seus simpatizantes é descrita como fake. O Judiciário, o Congresso, os partidos e os adversários são alvos de tratamento semelhante. Até a Polícia Federal, exaltada por muitos dos que são “contra tudo o que está aí”, recebeu pedradas. Nenhuma instituição parece merecer voto de confiança.

Mas aqui vou me ater a ofensas contra jornalistas. Ah, não vai falar sobre a esquerda? Vou. Em 2013, fui cobrir pela Folha o ato de dez anos do PT no governo. Houve tumulto na entrada. Fui checar. Militantes viram meu crachá. Tomei um chute pelas costas e fui chamada de coisas como “cadela do PIG” —termo usado por detratores quando a imprensa era chamada de golpista, e não de esquerdista como agora.

Bruno Boghossian: Temer de carona

- Folha de S. Paulo

Emedebista tenta usar transição para preencher embalagem vazia do ajuste fiscal

Sem gasolina há meses, Michel Temer quer pegar uma carona com o próximo presidente. O passageiro já ousa dar orientações para o sucessor e chega a sentenciar que “dificilmente” o novo governo conseguirá seguir uma rota diferente da atual. “Quem poderá fazê-lo?”, perguntou, na semana passada.

Temer fala como se a escolha do próximo presidente e sua participação na transição pudessem ajudá-lo a recuperar algum poder. Foi sua impopularidade, no entanto, que contaminou as pautas elaboradas durante seu mandato —e não o contrário.

Em viagem a Nova York, Temer decidiu “anunciar” (e não “sugerir”) que faria uma reforma da Previdência logo depois da eleição. “Procurarei o presidente eleito, seja ele quem for, e tenho certeza de que ele atentará para o fato de que a medida é indispensável”, afirmou.

A intenção pode ser nobre, dada a situação precária das contas do país, mas Temer deixa de levar em consideração que o grupo eleito em outubro terá muito mais força do que ele para apresentar uma agenda ao Congresso, mesmo antes de subir a rampa do Planalto.

Maria Cristina Fernandes: O que ainda pode virar na eleição da omelete

- Valor Econômico

O voto entre o movimento de sábado e os porões

A dez dias do primeiro turno, as eleições presidenciais estão entre duas balizas, um movimento de massas e outro dos porões. O provável mata-mata entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad ainda depende do resultado dessas duas mobilizações.

A primeira pretende arregimentar neste sábado o maior e mais indefinido contingente eleitoral contra o líder das pesquisas. A segunda, ainda sem data, ameaça trazer revelações sobre a facada que hospitalizou o candidato do PSL.

As três vices do mercado, Manuela d'Ávila, Kátia Abreu e Ana Amélia são assediadas pelo movimento mas é a adesão das duas últimas que daria ao #EleNão um potencial mais desestabilizador do cenário definitivo das pesquisas.


Esta é a vidraça mais fina de Jair Bolsonaro. Tanto pelo conjunto de sua obra (Maria do Rosário não merece ser estuprada, filha é fruto de uma fraquejada, salário desigual é problema do mercado e ameaça à ex-mulher) e da contribuição aportada pelo vice Hamilton Mourão (lares conduzidos por mães e avós produzem desajustes), quanto pela conjuntura econômica em que se desenrola na sucessão.

É a primeira eleição presidencial da era do ovo neste século. Depois do iogurte e do frango terem virado símbolos do aumento do consumo de eras tucana e petista, o ovo tornou-se o signo da recessão de Michel Temer. Nunca se comeu tanto ovo, a proteína animal mais barata do mercado. O consumo, que vinha mais ou menos estável até 2014, disparou, a ponto de hoje o mercado ser disputado por aplicativos de entregadores do produto.

Luiz Carlos Azedo: Dez dias decisivos

- Correio Braziliense

“Para quem acreditou na narrativa do golpe, nada como a teimosia dos fatos para demonstrar que vivemos numa democracia robusta”

O norte-americano John Reed (1887-1920) é um grande mito do jornalismo político. Filho de um milionário de Portland, formou-se em Havard e se tornou repórter. Após aderir às ideias socialistas, resolveu escrever reportagens sobre os movimentos sociais da sua época, o que lhe valeu algumas prisões e o levou ao México, em 1914, para fazer a cobertura da revolução liderada por Pancho Vila, de quem se tornou próximo. Depois, virou correspondente nos campos de batalhas da Primeira Guerra Mundial, nos Países Baixos, na Alemanha, na França, na Romênia, na Bulgária, na Turquia e na Grécia, até chegar à Rússia, o que lhe possibilitou escrever a sua obra mais famosa: Dez dias que abalaram o mundo.

O pequeno livro, narrado no calor dos acontecimentos em forma de crônicas, é a obra seminal da reportagem moderna, considerado pela Universidade de Nova York como um dos 10 melhores trabalhos jornalísticos do século XX. Reed acompanhou de perto a atuação dos principais líderes da Revolução de Outubro, entre os quais Lênin e Trotsky, no curto período de tempo da insurreição que levou os bolcheviques ao poder. Reed chegou a Petrogrado (São Petersburgo) em agosto de 1917 e permaneceu na Rússia até morrer, em 17 de outubro de 1920, em Moscou. Sua narrativa da Revolução Russa lhe valeu um enterro com honras junto às muralhas do Kremlin, onde seu túmulo é visitado, diariamente, por milhares de turistas.

“Jack” Reed, como era chamado, até hoje inspira jovens repórteres. Seus livros renderam dois clássicos do cinema: Outubro (1927) e Viva México! (1931), de Sergei Eisenstein. Em 1981, Warren Beatty dirigiu Reds, no qual conta a vida do jornalista romântico e revolucionário, cujo papel interpretou no filme. Dez dias que abalaram o mundo encheu de esperanças e frustrou gerações ao longo de um século; sua releitura mostra a essência de tudo o que viria a acontecer depois da tomada do poder, inclusive os “vícios de origem” que levaram o modelo socialista ao colapso.

Vivemos num mundo muito diferente daquele que Reed nos relatou em seus livros. Sem dúvida, muito mais conectado do que aquele no qual os acontecimentos eram descritos por meio de cartas e telegramas, fotos e filmes em preto e branco. O que vai acontecer nos próximos dias ninguém sabe. O que se anuncia é um formidável choque de concepções e interesses, num processo eleitoral radicalizado, de desfecho imprevisível quanto ao vencedor. Não é algo que emergiu no processo eleitoral, muito pelo contrário, vem se anunciando desde 2013, quando ficou patente o descolamento entre a sociedade e sua representação política. Até agora, os mecanismos constitucionais existentes foram capazes de absorver essas tensões, inclusive as do impeachment da presidente Dilma Rousseff e as da Operação Lava-Jato.

Transição
O que acontece no Brasil desperta amplo interesse na imprensa internacional. Não é fácil entender muito bem a trama da política brasileira, com seus pontos fortes e fracos. Na abertura da Assembleia Geral da ONU, na terça-feira, chefes de Estado de todo o mundo ouviram o presidente Michel Temer anunciar que passará o poder ao futuro presidente eleito com o país em ordem e a economia funcionando. Para quem acreditou na narrativa do golpe, nada como a teimosia dos fatos para demonstrar que vivemos numa democracia robusta.

Zeina Latif*: Quando faltam palavras

- O Estado de S.Paulo

A moderação do discurso é esperada na descida do palanque, mas é preciso mais

FHC nos ensinou a importância do diálogo institucional e da conversa com a classe política e com grupos representativos da sociedade, para governar, construir consensos e avançar com reformas. Não à toa ele foi o mais reformista dos presidentes.

Temer resgatou o diálogo entre Executivo e Legislativo, e reformas foram aprovadas. Pecou na falta de comunicação com a sociedade. Para começar, não expôs a grave herança do governo anterior, principalmente nas contas públicas. O governo de transição e com baixa credibilidade optou pelo recolhimento. Essa decisão cobrou seu preço: a maioria da sociedade não reconhece o desastre de Dilma e a contribuição do governo Temer para a estabilidade econômica.

A campanha eleitoral está repleta de falas tortas que atrapalham o amadurecimento da sociedade, com ameaças às instituições, promessas inexequíveis e agenda econômica descabida. Os discursos das candidaturas mais competitivas poderão custar caro.

A retórica petista é exemplo de dor de cabeça contratada para o futuro.

A agenda econômica do PT produziu uma crise sem precedentes e enorme desestruturação de setores importantes, como o de energia, por conta de intervenção equivocada. O quadro só não foi mais grave por conta do legado de Lula I, que renegou a política econômica do PT, e porque houve o impeachment de Dilma interrompendo a agenda petista. Os erros não só são negados, como o programa petista insiste na mesma fórmula.

Vinicius Torres Freire: O Brasil que não vai tão mal

- Folha de S. Paulo

Apesar de incerteza e crescimento lerdo da renda, crédito se recupera

Quem olha uma plantação queimada e se anima com alguns brotos verdes ou sobras de pés de milho pode passar por amalucado. No entanto, nem mesmo na economia brasileira tudo é cinza ou brasa dormida.

Apesar da eleição desvairada, não houve até agora debandada de capital para o exterior, ao contrário. Há também o caso do crédito nos bancos, por exemplo.

Primeiro, considere-se o que despiorou, o que resiste, o que melhora —por enquanto sem as adversativas, sem os "mas" inevitáveis.

1) A concessão de empréstimos, o dinheiro novo, cresce em relação ao ano passado;

2) A média das taxas de juros voltou a níveis de 2014 ou de 2012;

3) A inadimplência continua a cair, como se nota desde meados de 2016;

4) A despesa mensal das famílias com suas dívidas é a menor desde o início de 2011.

Sim, a situação geral do crédito ainda é deprimida. Os empréstimos novos ainda estão em nível quase 20% inferiores aos de 2012 a 2014. O estoque de crédito, o total de dinheiro emprestado, ainda cai, embora o grosso disso se deva à retração do BNDES.

As taxas de juros, na média, pararam de cair desde maio. A combinação de inadimplência controlada com spreads menores talvez pudesse ter feito com que o custo do dinheiro fosse menor. Ainda assim, o spread está no nível registrado no final do ano de 2011, o primeiro de Dilma 1.

O peso da dívida na renda das famílias baixou bem das alturas em que esteve praticamente de 2012 a 2016, mas ainda está no nível de saturação que aparentemente precedeu o desânimo que levaria a economia a crescer menos, a partir de 2012 ou 2013.

Ribamar Oliveira: Duas coisas que mostram como funciona o Brasil

- Valor Econômico

Custo total do "trem da alegria" ainda não é conhecido

O governo ainda não sabe quanto vai custar a emenda constitucional 98/2017, que facilitou a incorporação aos quadros de servidores da União de pessoas que tiveram relação ou vínculo empregatício, por no mínimo 90 dias, com o governo federal e com prefeituras localizadas nos ex-territórios do Amapá e de Roraima. A proposta orçamentária para 2019 estima um aumento de R$ 1,5 bilhão na despesa com a reintegração de servidores de ex-territórios, na comparação com a prevista para este ano. Mas não há projeção oficial para esta despesa nos próximos anos.

São milhares de pessoas que estão ingressando no serviço público pela porta dos fundos e tornando-se servidores estáveis, com todas as vantagens e benefícios, sem prestar concurso. O mais impressionante é que a emenda 98/2017 permite que mesmo as pessoas que já estão aposentadas por outros regimes previdenciários, e os pensionistas, possam ser transferidas para o regime previdenciário dos servidores da União, com todas as vantagens e benefícios.

A emenda também ampliou vantagens a servidores do ex-território de Rondônia. O caso traz de volta uma expressão, muito usada em passado não muito distante, para se referir ao ingresso nos quadros da União sem concurso: "trem da alegria".

Até o dia 21 de setembro deste ano, 11.094 pedidos de reintegração aos quadros da União feitos por servidores de ex-territórios tinham sido deferidos pelo governo, de acordo com dados do Ministério do Planejamento. Do total, 7.305 servidores incorporados foram do ex-território de Rondônia, 2.665, do Amapá, e 1.124, de Roraima.

A emenda 98, proposta pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), na época líder do governo no Senado, foi aprovada quando já estava em vigor o chamado teto de gasto para a União. Uma das novidades deste novo regime fiscal, instituído pela emenda constitucional 95/2016, foi estabelecer que toda proposição legislativa, criando ou alterando despesa obrigatória ou renúncia de receita, deveria ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro (artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).

*José Serra: Genéricos hepáticos

- O Estado de S.Paulo

É fundamental manter a elogiável decisão judicial que quebrou a patente do Sofosbuvir

No final dos anos 1990 fizemos uma grande mudança no mercado de remédios no País, com a regulamentação dos medicamentos genéricos – muito mais baratos do que os produtos patenteados. Os genéricos foram fundamentais para garantir qualidade e preços acessíveis para a população brasileira, cujos gastos com a compra de remédios equivaliam, em média, a cerca de metade do orçamento das famílias com despesas de saúde.

Foram introduzidas também regras mais rigorosas para o pedido de patentes. A criação mesma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) obedeceu a esse propósito. A Anvisa passou a se manifestar previamente sobre as questões de saúde pública nos pedidos de registros de patentes feitos ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi). Quando a agência nega um pedido, por entender que há riscos para a saúde dos usuários potenciais, o processo é necessariamente arquivado.

Entendamos bem: o registro da patente de um medicamento confere ao seu proprietário o monopólio da respectiva produção, diretamente ou mediante venda do direito de fabricação a outros produtores. Esse monopólio lhe garante a possibilidade de fixar preços mais elevados.

Um argumento contrário seria o de que a negativa do registro de patente implicaria desestímulo à pesquisa, mas só se aplicado aos países desenvolvidos, onde se concentram cerca de 90% das inovações farmacêuticas e cujos mercados consumidores dispõem de renda média individual bem superior à que prevalece nos países em desenvolvimento. Mesmo assim, não faltam argumentos aos defensores de genéricos nesses países mais avançados: as pesquisas para produzir novos medicamentos são, em boa medida, financiadas por recursos públicos.

Voltando ao Brasil, é importante lembrar que a implantação dos genéricos entre nós – há cerca de 20 anos – esteve ligada à evolução do tratamento da aids, que crescera rapidamente entre as décadas de 80 e 90. A redução do custo dos medicamentos era essencial para manter o atendimento crescente. O número de pessoas atendidas já era de 55 mil em 1998, mais que dobrando entre aquele ano e 2002 e chegando ao triplo em 2005.

Míriam Leitão: O ajuste adiado da Argentina

- O Globo

Agravamento da crise na Argentina mostra que o novo governo brasileiro não terá tempo para implementar ajustes graduais

A agência de risco Moody's disse que a Argentina terá, com o socorro do FMI, grande parte dos dólares necessários para fazer frente às necessidades de financiamento no ano que vem. Mas o país continua no córner, mesmo coma ajudado Fundo. O erro do presidente Maurício Macri foi acharque teria tempo. Ao ser recebido com alívio pelo mercado financeiro, depois do desastroso governo Cristina Kirchner, ele optou pelo gradualismo. Só que a situação internacional mudou.

O economista Alexandre Póvoa, da Canepa Asset, disse que os problemas de Macri começaram quando o Fed deu sinais, no ano passado, de que elevaria a taxa de juros mais rapidamente. E continua elevando os juros, como fez ontem. Com isso, países com fragilidade cambial ficam expostos, como a Turquia e também a Argentina.

“O maior erro de Macri foi não reconhecer a urgência das reformas profundas, em uma economia deprimida e com inflação alta. A Argentina carrega a combinação explosiva de, por um lado, uma alta relação dívida/PIB, de 54%, e de outro o déficit primário e de conta corrente de 3,5% e 5,1% do PIB”, escreveu o esconomista em relatório a clientes.

Teste institucional: Editorial | O Estado de S. Paulo

Há no ar uma grande inquietação sobre o futuro da democracia no Brasil em razão das perspectivas nada alvissareiras da eleição presidencial, especialmente a hipótese de vitória de um dos populistas que hoje aparecem nas primeiras colocações da disputa. A cada declaração insensata desses candidatos, a cada manifestação estridente de seus respectivos movimentos políticos, soam alarmes a respeito de graves riscos institucionais.

O grupo do candidato Jair Bolsonaro (PSL) diz que, se os petistas voltarem ao poder com o preposto do presidiário Lula da Silva, Fernando Haddad, o Brasil vai se tornar “uma Venezuela” – onde, como se sabe, não há democracia; já os petistas afirmam que, se Bolsonaro vencer, o ex-capitão vai liderar um golpe de Estado como o de 1964, para governar pela força.

Esses imaginados desfechos, malgrado sua plausibilidade, pressupõem uma grande fragilidade das instituições democráticas do País. Parte-se do princípio de que os Poderes nacionais não estão prontos para enfrentar um eventual repto com vista à instalação de um regime de exceção, à esquerda ou à direita.

A conturbada história recente do País, contudo, mostra que as instituições democráticas, se não são capazes de prover estabilidade e de evitar crises, vêm se saindo razoavelmente bem dos vários testes de estresse a que foram submetidas, e nada indica que não estejam prontas para continuar a resistir à ação final dos que pretendam exercer o poder pela força ou pela corrupção.

Tempo escasso: Editorial | Folha de S. Paulo

Ideia de parar intervenção para votar a reforma da Previdência teria de enfrentar obstáculos

Desde que foi abatido pela gravação de um diálogo indefensável com o empresário Joesley Batista, o presidente Michel Temer (MDB) oscila entre esforços para preservar seu mandato —e o foro especial— e empreitadas de parco sucesso na tentativa de mostrar que não perdeu de todo a relevância.

É na segunda categoria que se enquadra a ideia, agora reapresentada, de suspender a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro para que os parlamentares possam, após as eleições, aprovar a reforma da Previdência.

A suspensão se faria necessária, a princípio, porque a Constituição proíbe que emendas a seu texto sejam promulgadas na vigência de uma intervenção. Acredite-se ou não nas chances da manobra, as duas propostas têm méritos.

Em tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto que altera as regras da aposentadoria é passo indispensável para equacionar o gravíssimo problema orçamentário.

Sem que se contenha o avanço contínuo das despesas previdenciárias, o próximo presidente verá encolher de modo dramático os recursos disponíveis para educação, saúde e infraestrutura.

Guardadas as proporções, o fim da atuação federal na segurança fluminense também é medida desejável.

Folha salarial dos servidores é outra ameaça à espreita: Editorial | O Globo

Superados apenas pelos gastos da Previdência, salários do serviço público precisam de novas regras

É certo que, se a reforma da Previdência for feita pelo próximo governo no seu início, aproveitando o tradicional período em que a autoridade recém-empossada ainda tem reservas integrais de poder, o país e a nova administração ganharão um horizonte positivo de previsibilidade. Cairão as tensões, melhorarão as expectativas, ajudando as engrenagens da economia a girarem em velocidade mais alta.

Esta reforma é chave, porém não se trata de alguma bala de prata, de solução instantânea. É imprescindível para dar sustentação à economia a longo prazo. Mas há também outros problemas sérios no campo fiscal a serem tratados com urgência. Caso do plano de cargos e salários do funcionalismo, cuja folha de pagamento, R$ 300 bilhões este ano, só é superada no Orçamento pela Previdência e seus R$ 593 bilhões.

As duas despesas têm a mesma característica: aumentam sem parar. No caso dos salários, muito em função da incúria de governantes, que se submetem a pressões de corporações do funcionalismo e aceitam conceder reajustes fora da realidade do país e das próprias carreiras do milhão de servidores ativos.

Fed aumenta juros e sinaliza uma nova alta no fim do ano: Editorial | Valor Econômico

O Federal Reserve americano sacramentou terceira elevação da taxa de juros no ano, para a faixa de 2% a 2,25%, e as perspectivas dos membros do Comitê de Mercado Aberto sinalizaram, por grande maioria, nova alta no fim do ano. Pela primeira vez desde 2015, quando o banco começou a normalizar sua política monetária, foi retirado do comunicado de suas reuniões a palavra "acomodativa" para descrever o estado corrente do ciclo de ajuste.

Com oito altas, a taxa de juros encontra-se agora no mesmo nível de outubro de 2008, há dez anos. O quadro prospectivo montado pelo Fed indica que, se tudo ocorrer conforme o planejado, o banco já cumpriu mais da metade de seu percurso. Em princípio, serão mais três aumentos em 2019 e um final em 2020, culminando com a taxa entre 3,25% a 3,5%, um pouco acima dos juros de longo prazo, de 3%.

O ritmo da economia americana, deve crescer 3,1% (0,3 ponto acima da projeção anterior), segundo o Fed, foi considerado "particularmente brilhante" por Jerome Powell, presidente do banco. O Fed manteve as portas abertas sobre o futuro, de qualquer forma. Há boa margem para que algo aconteça fora do figurino esboçado. O crescimento, que segue "ritmo forte", segundo o comunicado, é bem maior do que o previsto há um ano, na reunião de setembro de 2017, de 2,1%. E o hiato entre a expansão corrente e a de longo prazo, que já existia, alcançará este ano 1,3 ponto percentual. A economia desacelerará progressivamente, mas só em 2021 atingirá seu ritmo normal.

Voto útil não decola; Ciro e Marina atacam Haddad

Enquanto as mais recentes pesquisas de intenção de voto não indicam a adoção do chamado voto útil pelos eleitores e diante da dificuldade de unir as candidaturas de centro, os presidenciáveis do bloco intermediário decidiram centrar seus ataques em Fernando Haddad (PT), segundo colocado nas sondagens, atrás de Jair Bolsonaro (PSL), de acordo com levantamento CNI/Ibope divulgado ontem. Em busca de uma vaga no segundo turno pelo viés da centro-esquerda, Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) partiram para o confronto com Haddad no debate promovido ontem por SBT, UOL e Folha de S. Paulo. “Se puder governar sem o PT, eu prefiro”, disse Ciro. “Neste momento, o PT representa uma coisa muito grave porque se transformou numa estrutura de poder odienta que acabou criando o Bolsonaro, essa aberração.” Geraldo Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos) também criticaram o PT.

Pesquisas indicam cenário estagnado, e candidatos da centro-esquerda travam duelos com petista em debate

Marianna Holanda, Ricardo Galhardo, Daniel Bramatti e Daniel Wetermann | O Estado de S. Paulo

A expectativa de que o chamado voto útil beneficiasse candidatos à Presidência localizados no pelotão abaixo dos dois primeiros colocados – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) – não se confirmou, segundo as mais recentes pesquisas de intenção de voto. O petista e o capitão da reserva são os que possuem os maiores porcentuais de voto convicto, de acordo com levantamento da CNI/Ibope divulgado ontem.

Reflexo dessa situação de estabilidade no topo da corrida presidencial, representantes da centro-esquerda, Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede), fizeram embates diretos e partiram para o confronto com Haddad no debate promovido pelo SBT, UOL e Folha de S.Paulo.

A pesquisa Ibope contratada pela Confederação Nacional da Indústria mostrou Bolsonaro com 27% das intenções de votos e Haddad com 21%. No pelotão de baixo, Ciro tem 12%, Geraldo Alckmin (PSDB), 8%, e Marina, 6%. Os principais candidatos oscilaram dentro da margem de erro em relação aos números do mesmo instituto divulgados na segunda-feira em pesquisa encomendada pelo Estado e pela TV Globo.

Enquanto Bolsonaro permanece internado se recuperando de uma facada que levou no dia 6 deste mês – e foi citado poucas vezes no debate –, Haddad participou de seu segundo encontro com os presidenciáveis. Desta vez, foi alvo até de adversários do seu campo ideológico.

‘Sem o PT’. Logo no primeiro bloco, Haddad travou embate com Marina, sua colega de Esplanada na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – condenado e preso na Lava Jato. Um tentou “responsabilizar” o outro pelo governo do presidente Michel Temer. A candidata lembrou que Haddad foi nesta eleição “pedir bênção” do senador Renan Calheiros (MDB-AL), que apoiou o impeachment. “Quem botou o Temer lá foram vocês. Ele traiu a Dilma e não teria conseguido chegar à Presidência se não fosse a oposição”, rebateu o candidato do PT.

Marina disse ainda que num possível segundo turno entre o petista e Bolsonaro, como indicam as pesquisas, ela não apoiaria nenhum dos dois. Em 2014, a candidata apoiou Aécio Neves (PSDB) no segundo turno contra Dilma Rousseff (PT).

Divergências barram união do centro, dizem candidatos

M.H. e D.W. | O Estado de S. Paulo

Um dia depois de frustrarem uma tentativa de reunião das candidaturas de centro em torno de um só nome, os principais candidatos convidados para o encontro – Geraldo Alckmin (PSDB) Marina Silva (Rede) e Alvaro Dias (Podemos) – disseram ontem que a convergência não foi possível por causa da discordância entre as propostas.

O encontro foi idealizado pelo jurista Miguel Reale Jr. e por integrantes do movimento “Não aos extremos”. Marina recusou o convite ao ser informada de que Alckmin e Henrique Meirelles (MDB) também participariam. Inicialmente, somente Dias e João Amoêdo (Novo) compareceriam à reunião.

Ao chegar para o debate entre presidenciáveis no SBT, Marina disse que o diálogo está sempre aberto com quem não foi pego no “dopping da corrupção”, mas integrantes de sua equipe afirmaram que a união só seria possível em torno o nome da presidenciável da Rede, já que ela não pretende retirar a candidatura.

Alvaro Dias ponderou que aceitaria a união se houvesse concordância com seu programa de governo. “Como propostas divergentes não se unem, não houve convergência.”

Já Meirelles rejeitou qualquer tentativa de união antes do primeiro turno da disputa eleitoral. “O Brasil já ultrapassou esta fase de decisão de bastidores, quem decide é o eleitor.”

Questionado durante o debate se retiraria a candidatura em prol de uma união, Alckmin disse apenas ser “preciso evitar a marcha da insensatez”.

Adversários sobem o tom contra Haddad em debate

Em debate de presidenciáveis na TV, Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (Rede) e Alvaro Dias (Podemos) centraram ataques no candidato Fernando Haddad (PT), para se colocarem como opção ao antipetismo. Jair Bolsonaro (PSL), internado, não compareceu.

ALVO ÚNICO

Com Bolsonaro internado, rivais concentram ataques em Haddad

Dimitrius Dantas | O Globo

SÃO PAULO - A11 dias do primeiro turno, o petista Fernando Haddad foi o principal alvo dos adversários em debate realizado ontem, em São Paulo. Enquanto o líder das pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL), segue internado em recuperação do atentado sofrido, o ex-prefeito de São Paulo, isolado na segunda colocação, recebeu os mais fortes ataques, justamente de adversários com quem seu partido já teve boas relações, como Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede).

No embate direto com Haddad, Ciro e Marina se distanciaram do antigo aliado e apontaram o PT como responsável pelo crescimento de Bolsonaro e pela chegada do presidente Michel Temer à Presidência. Sem Bolsonaro, oito candidatos participaram do encontro organizado pelo “SBT” em parceria com o jornal “Folha de S.Paulo” e o “UOL”: Álvaro Dias (Podemos), Cabo Daciolo (Patriota), Geraldo Alckmin (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB), além de Haddad, Ciro e Marina.

Bolsonaro pouco foi citado no debate mas esteve na cabeça dos adversários durante todo o confronto. Ao atacarem o PT, Alckmin, Ciro, Dias e Marina procuraram, na verdade, conquistar eleitores de perfil antipetista, e que estão hoje com o candidato do PSL. As campanhas têm avaliado que grande parte do eleitor de Haddad, herdeiro eleitoral do ex-presidente Lula, está consolidado e dificilmente trocará de candidato.

Terceira via tenta um sprint final

Robson Bonin | O Globo

Com a polarização entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) consolidada nas pesquisas eleitorais, o debate promovido ontem marcou o início do sprint final do pelotão intermediário, que ainda tenta demonstrar fôlego para ameaçar o segundo turno entre o antipetismo bolsonarista e o lulismo que rejeita o ex-capitão. Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) entregaram-se à pancadaria já no primeiro bloco do debate dispostos a desconstruir a polarização e seduzir o eleitorado desiludido com uma possível terceira via.

Na mais recente pesquisa Ibope, divulgada ontem, Bolsonaro segue líder, com 27% das intenções de voto, enquanto Haddad tem 21%. Eles são seguidos à distância por Ciro (12%), Alckmin (8%) e Marina (6%). O levantamento mostra que três em cada dez eleitores admitem deixar de votar no candidato de preferência para votar em outro que tenha condições de evitar que o candidato rejeitado vença a eleição. Foi com esse grupo de eleitores que o trio de presidenciáveis tentou se conectar no debate.

Ciro falou diretamente ao antilulismo, que vota em Bolsonaro para não permitir a volta do PT. Falou também aos antibolsonaristas, que tendem a votar no projeto de poder encarnado por Haddad. O pedetista atacou a “estrutura odienta” de fazer política, criada pelo petismo, que teria gerado a “aberração” Bolsonaro.

Em alta nas pesquisas, Haddad vira alvo de Ciro e Marina em debate

Petista foi criticado por proximidade anterior do partido com Temer e por antagonismo com Bolsonaro

Catia Seabra , Thais Bilenky , Joelmir Tavares , Isabel Fleck , Marina Dias e Guilherme Seto | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO E BRASÍLIA - Em crescimento nas últimas pesquisas de intenção de voto, o candidato petista Fernando Haddad tornou-se o principal alvo de debate promovido por Folha, UOL e SBT nesta quarta-feira (26). Seus concorrentes Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) investiram incisivamente contra ele.

Em pesquisa CNI-Ibope divulgada nesta quarta-feira (26), Jair Bolsonaro (PSL) segue como líder nas intenções de voto, com 27%, seguido do petista, com 21%.

Além deles, compareceram Geraldo Alckmin (PSDB), Cabo Daciolo (Patriota), Henrique Meirelles (MDB), Alvaro Dias (Podemos) e Guilherme Boulos (PSOL). Bolsonaro recupera-se no hospital Albert Einstein, em São Paulo, após ter recebido facada em ato de campanha no início do mês.

No primeiro bloco do debate, em que os candidatos fizeram perguntas entre si, a interação entre Haddad e Marina gerou o grande ponto de tensão.

Ao questionar Marina sobre a revogação ou não da PEC do teto de gastos e a reforma trabalhista promovidas pelo presidente Michel Temer (MDB), Haddad ouviu que o Brasil está no "fundo do poço" em função da "corrupção de PT, MDB e PSDB".

Em debate mais politizado, inconstância marca ataques a Bolsonaro

Bloqueado em pesquisas, Ciro conseguiu articular melhor um discurso contra o candidato e o PT

Igor Gielow | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Naquele que provavelmente foi o mais politizado debate dos presidenciáveis até aqui, o chamado centro demonstrou as dificuldades que enfrenta numa corrida crescentemente polarizada entre o ausente Jair Bolsonaro (PSL) e o PT de Luiz Inácio Lula da Silva e seu preposto, Fernando Haddad.

A inconstância marcou as referências ao deputado fluminense, que não participou por ainda estar internado devido ao atentado a faca do dia 6. Ele foi ignorado no primeiro bloco, ganhou proeminência no segundo, quando Ciro Gomes (PDT) o chamou de "aberração" e só apareceu de forma mais clara no discurso de Geraldo Alckmin (PSDB) nas considerações finais.

Ao fim, foi o pedetista quem conseguiu uma linha mais coerente para tentar atingir o eleitorado indeciso, único alvo factível a essa altura da corrida eleitoral para ele. Articulou o discurso "nem Bolsonaro, nem o PT" ao longo de suas intervenções e na pregação final. O problema para Ciro é que ele está bloqueado nas pesquisas pelo deputado e por Haddad no seu reduto mais forte, o Nordeste.

Pleito muda eixo de poder no PSDB

Por Vandson Lima | Valor Econômico

BRASÍLIA - O resultado das eleições de 2018 pode promover um deslocamento do eixo de poder no PSDB. Perdem força a representação paulista, responsável por sete das oito candidaturas presidenciais tucanas, e o Centro-Oeste, onde a sigla detém o comando de três dos quatro Estados e, segundo as pesquisas, deve ficar com apenas um. Emergem Antonio Anastasia em Minas Gerais, agora sem a sombra de Aécio Neves, e Eduardo Leite, de apenas 33 anos, que surpreende na disputa pelo governo do Rio Grande do Sul.

Realizada a rodada completa de pesquisas do Ibope para candidatos ao governo, o PSDB, que lançou candidaturas próprias em 12 Estados, lidera em quatro: Minas, Rondônia, Roraima e Mato Grosso do Sul. Este último é o único caso em que o atual governador é tucano, concorre à reeleição e lidera a disputa.

Eixo de poder do PSDB deve se mover para RS e Minas
O resultado das eleições de 2018 pode trazer um deslocamento no eixo de poder do PSDB. Perdem força a representação paulista, responsável por sete das oito candidaturas presidenciais tucanas, e o Centro-Oeste, onde a sigla detém o comando de três dos quatro Estados e, indicam as pesquisas, deve permanecer em apenas um. Emergem Antonio Anastasia em Minas Gerais, agora sem estar à sombra de Aécio Neves, e Eduardo Leite, de apenas 33 anos e que surpreende na disputa pelo governo do Rio Grande do Sul.

Realizada a rodada completa de pesquisas do Ibope para candidatos ao governo, o PSDB, que lançou candidaturas próprias em 12 Estados, lidera neste momento em quatro: Minas, Rondônia, Roraima e Mato Grosso do Sul. Neste último, é o único caso em que o atual governador é tucano, concorre à reeleição e lidera. Reinaldo Azambuja alcança 40% das intenções, contra 29% do candidato Juiz Odilon (PDT). Um eventual segundo turno, contudo, pode ser perigoso ao tucano: ele venceria hoje com uma diferença de apenas 5 pontos percentuais, 44% a 39%. Há duas semanas, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca na casa e no gabinete de Azambuja, em investigação relativa a suposto pagamento de propina a representantes da cúpula do governo. Um dos filhos do governador foi preso.

Governadores em Goiás e Mato Grosso e candidatos à reeleição, José Eliton e Pedro Taques se encontram na segunda colocação nas respectivas disputas, perdendo por larga margem. Uma derrota em Goiás atingiria ainda as pretensões de protagonismo no tucanato de Marconi Perillo, quatro vezes governador do Estado. Sua eleição para uma das duas vagas ao Senado não é garantida. Ele aparece com 29%, empatado tecnicamente com Jorge Kajuru (PRP) e Vanderlan Cardoso (PP), ambos com 28%, e Lúcia Vânia (PSB), com 26%.

Em São Paulo, João Doria está no momento mais delicado desde que deixou a prefeitura da capital para se candidatar ao governo. No primeiro turno, Doria aparece tecnicamente empatado com Paulo Skaf (MDB), 22% a 24%. No segundo turno, o emedebista abre vantagem, com 39% a 31%. Pesa contra Doria o maior índice de rejeição da disputa paulista, de 33%, em muito influenciada por sua saída antecipada da gestão municipal, apenas 15 meses após tomar posse.

No Rio Grande do Sul, Eduardo Leite fez trajetória oposta a Doria. Cumpriu o mandato como prefeito de Pelotas entre 2013 e 2016 e recusou concorrer à reeleição. À época, Leite deixou claro que ia se preparar para ser candidato ao governo gaúcho dois anos depois. Leite agora aparece na segunda colocação, com 26% das intenções, contra 31% do governador, José Ivo Sartori (MDB). No segundo turno, empate técnico com vantagem para o tucano, de 40% a 37%.

A princípio resistente em disputar novamente o governo de Minas, Anastasia pode sair do pleito como um novo grande nome do tucanato, desbancando o PT no segundo maior colégio eleitoral do país. Em ascensão, Anastasia lidera com 33%, contra 22% do atual governador, Fernando Pimentel (PT).

Adversários atacam Haddad para tentar alcançar vaga no 2º turno

Por Malu Delgado, Fabio Murakawa e Fernando Taquari | Valor Econômico

SÃO PAULO - Com Jair Bolsonaro (PSL), líder nas pesquisas, ausente do debate entre os presidenciáveis promovido pelo SBT, jornal "Folha de S. Paulo" e portal UOL, Fernando Haddad (PT), o segundo colocado, tornou-se o alvo preferencial dos adversários da "terceira via" que ainda almejam uma vaga no segundo turno contra o ex-capitão do Exército.

Os ataques mais ácidos contra Haddad vieram justamente da ex-petista Marina Silva (Rede) e de Ciro Gomes (PDT), que saiu direto para o evento de uma internação para uma cirurgia na próstata no Hospital Sírio-Libanês. Os dois se colocam como possíveis receptores de votos de eleitores de esquerda desiludidos com o PT e daqueles que querem fugir de radicalismos.

"Francamente, se puder governar sem o PT, eu prefiro. Porque neste momento o PT representa uma coisa muito grave no país. Porque ele gerou essa confrontação odienta no país, que gerou o Bolsonaro", afirmou Ciro.

Haddad, ao responder a pergunta de um jornalista sobre alianças, lembrou que Ciro "há pouco tempo" o convidou para ser vice em sua chapa e que o pedetista classificou a união entre eles como "dream team". À saída do evento, o petista minimizou o entrevero: "Essas coisas mudam".

Mas foi Marina Silva que, na avaliação dos próprios petistas, fez a crítica mais incômoda ao ressaltar a parceria de Haddad com nomes do MDB, como o senador Renan Calheiros, que apoiou o impeachment de Dilma Rousseff.

Ao contrário do primeiro debate, em que Haddad fez uma deferência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o candidato do PT foi bem menos enfático em relação a seu padrinho político.

Cobrado pela dependência política do padrinho, Haddad adotou a estratégia de enfatizar a necessidade de gerar empregos em seus discursos. E tentou destacar feitos de sua passagem como ministro da Educação.

Ao responder a Haddad sobre a emenda constitucional que limita o gasto público, Marina Silva foi dura com o candidato petista. "O governo Temer foi colocado onde está pelo PT, no governo Dilma [Rousseff]. Marina afirmou, ainda, que a primeira medida para aumentar a geração de empregos é "recuperar a credibilidade do país" após uma onda de corrupção dos governos de PT, MDB e PSDB.

Plano de Geraldo Alckmin é construir 3 milhões de moradias populares e gerar 5 milhões de empregos

- Com informações da assessoria do candidato/Adriana Vasconcelos

Em debate promovido nesta quarta-feira (26) pelo SBT, em parceria com o jornal Folha de S. Paulo e o site Uol, o candidato à Presidência Geraldo Alckmin (PSDB) destacou seu plano de construir três milhões de moradias para população de baixa renda no País e, assim, viabilizar a criação de pelo menos cinco milhões de empregos só na área da construção civil.

“Uma das maneiras de gerar emprego é através da construção civil. Vamos construir três milhões de moradias para famílias de menor renda. Fizemos em São Paulo a primeira PPP (Parceria Público-Privada) do País para levar as pessoas para mais perto ao centro. Complementamos o Minha Casa Minha Vida e fizemos um programa do estado. Serão três milhões de moradias e cinco milhões de empregos na construção civil”, afirmou o tucano (veja aqui o programa de governo do candidato).

O PPS integra a coligação “Para Unir o Brasil” (PSDB, PTB, PP, PR, DEM, SOLIDARIEDADE, PPS, PRB e PSD) que apoia à candidatura do ex-governador de São Paulo.

Educação
Indagado sobre seu programa para a área educacional, Geraldo Alckmin lembrou o que fez em São Paulo como governador.

“Temos a melhor rede de ensino técnico da América Latina e as melhores universidades do país. Não fechamos nenhuma escola, temos 3,8 milhões de alunos. Construímos escolas em grande quantidade e não fechamos nenhuma. Algumas escolas têm muitos alunos e outras têm poucos. Precisamos aproveitar os prédios sem alunos para pré-escola e Emei [Escola Municipal de Educação Infantil]”, defendeu o candidato.

Transporte
O candidato tucano também exaltou as conquistas na área de transporte, garantidas durante sua gestão como governador de São Paulo.

“Pegamos o metrô com 69 km e vamos terminar com 100 km. Nos próximos dias, vamos inaugurar três estações da linha 5 do metrô. Levamos o trem até Cumbica, teremos monotrilho até Congonhas. Tenho um grande projeto para infraestrutura. Emprego na veia. É um escândalo a BR-163. Carretas ficam atoladas. Vamos concluí-la e melhorar o chamado Arco Norte”, destacou.

Reviravolta
Sobre o apelo feito pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para conter o que ele classificou como “a marcha da insensatez”, o candidato tucano disse acreditar numa reviravolta nesta reta final da campanha eleitoral que impeça retrocessos no País, seja com o PT que levou 13 milhões de brasileiros ao desemprego ou com a intolerância e radicalismo pregado pela candidatura de Jair Bolsonaro (PSL).

“Nos próximos 10 dias, o eleitor vai fazer uma reflexão e estamos otimistas”, previu

Carlos Drummond de Andrade: A Bruxa

A Emil Farhat

Nesta cidade do Rio,
de dois milhões de habitantes,
estou sozinho no quarto,
estou sozinho na América.

Estarei mesmo sozinho?
Ainda há pouco um ruído
anunciou vida a meu lado.
Certo não é vida humana,
mas é vida. E sinto a bruxa
presa na zona de luz.

De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?

E nem precisava tanto.
Precisava de mulher
que entrasse nesse minuto,
recebesse este carinho,
salvasse do aniquilamento
um minuto e um carinho loucos
que tenho para oferecer.

Em dois milhões de habitantes,
quantas mulheres prováveis
interrogam-se no espelho
medindo o tempo perdido
até que venha a manhã
trazer leite, jornal e calma.
Porém a essa hora vazia
como descobrir mulher?

Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos,
viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras.
Mas se tento comunicar-me,
o que há é apenas a noite
e uma espantosa solidão.

Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
querendo romper a noite
não é simplesmente a bruxa.
É antes a confidência
exalando-se de um homem.