terça-feira, 23 de outubro de 2018

Opinião do dia: Luiz Sérgio Henriques*

Este vazio que acompanha toda incursão populista contra sistemas políticos em crise também aqui se busca recobrir com o apelo ao antimoderno no plano das crenças, dos costumes e orientações de valor. O motivado interesse por tudo o que define o perfil de uma sociedade tolerante - direitos humanos, pluralidade de estilos de vida, respeito aos valores de crentes e não crentes - se vê abafado pelo fragor de uma “guerra cultural” inédita entre nós, mas já testada, e aprovada, em outras latitudes. A sensatez parece bater em retirada diante de ideólogos que simulam viver ou, o que é mais grave, acreditam viver nos tempos sombrios da contraposição mortal entre capitalismo e comunismo.

Se quiser ir além do petismo, a esquerda terá pela frente uma longa temporada de autorreforma - na verdade, um verdadeiro processo constituinte, que ela irresponsavelmente andou receitando para o País. Com métodos, categorias e linguagem renovada, poderá então contribuir para um diálogo vivo entre culturas e tradições, e até para a mútua “contaminação” entre elas, como convém às sociedades da diversidade. De resto, a persistência das divisões atuais só nos garantirá uma continuada decadência para a qual - até hoje - nosso país não parece ter sido talhado.
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*Tradutor e ensaísta, Luiz Sérgio Henriques é um dos organizadores das obras de Gramsci. ‘Além das culturas que dividem’, O Estado de S. Paulo, 21/10/2018.

Entrevista especial com Luiz Werneck Vianna

Depois do “teatro de sombras”, Brasil precisará se reinventar e sair do caminho da prancheta. 

Entrevista especial com Luiz Werneck Vianna

“A tarefa que se impõe para nós é de recomeço”, propõe o sociólogo Luiz Werneck Vianna na entrevista a seguir, ao avaliar o resultado do primeiro turno das eleições presidenciais. O que “importa” neste momento da conjuntura política do país, enfatiza, “é que a reflexividade seja um instrumento crucial”. Além disso, constata, “está faltando estimular a confiança, e o que estimula a confiança é a esperança. A esperança é um tema de fundo que sempre bate na nossa história de maneira forte”. Embora existam “motivos para preocupação” acerca de como será o futuro do país, ao mesmo tempo “há motivos que nos conduzam a atitudes, pensamentos e ações que sejam capazes de impedir impasses, equívocos, decisões desastradas. Há saúde na nossa sociedade também”, pondera.

Na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-Line, o sociólogo critica o “abandono do Centro” nas eleições deste ano e afirma que esse foi um dos fatores que “tornou viável essa onda, esse tsunami que invadiu o país”. Mas, no segundo turno, menciona, o Centro “está vivo e os próprios candidatos reconhecem isso ao fazerem esse movimento desabalado em direção ao Centro. Eles estão tentando capturar o Centro sem entendê-lo, sem valorizá-lo, sem compreender qual foi o papel dele na história do país. Eu diria que é uma fantasia: o Centro não vai ceder a esses acenos de boa vontade que os extremos estão lhe fazendo agora”.

Werneck Vianna também lamenta a condução do debate eleitoral e a não discussão de temas fundamentais para “tirar o país do caminho da prancheta”. “O tema da desigualdade é que deveria ter sido dominante nessa sucessão presidencial; essa é a nossa questão de fundo. (...) Nesta eleição praticamente não se discutiu economia. Discutiram-se valores. Agora, qual é a economia? (...) Não se discutiu a forma de inscrição do Brasil no capitalismo mundial. Não se discutiu o processo da globalização; aliás, recusa-se esta que é a maior evidência do nosso tempo, a mundialização da economia, a globalização. (...) É um teatro de sombras, porque as coisas verdadeiras não aparecem.”

Apesar do espetáculo eleitoral, avalia, o Brasil não está perdido, mas “vai ter que se repensar e os intelectuais vão ter que se posicionar de uma forma autônoma no debate público, como deixaram de fazer há tempo, seduzidos por posições do Estado, por crenças mágicas e mitológicas de que um homem dotado de poderes sobrenaturais seria capaz de mudar o país. Não foi; está na cadeia”. Aliás, acrescenta, “não foi uma coisa de menos importância o que aconteceu e o que está acontecendo”. Diante da crise que se estende pelo país nos últimos anos, declara, “sou obrigado – e acho que todos são, quando se defrontam com um fato político - a reconhecer o valor de face do que é dito". E adverte: “Não posso me deixar embair por especulações que afirmam que estamos vivendo o fim da nossa democracia”. O próximo presidente, conclui, terá a tarefa de “tirar o país do caminho da prancheta, de ficar projetando um futuro de prancheta no papel e se defrontar com as coisas reais”.

Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador na Pontifícia Universidade Católica - PUC-Rio. Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo - USP, é autor de, entre outras obras, A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1997); A judicialização da política e das relações sociais no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1999); e Democracia e os três poderes no Brasil (Belo Horizonte: UFMG, 2002). Sobre seu pensamento, leia a obra Uma sociologia indignada. Diálogos com Luiz Werneck Vianna, organizada por Rubem Barboza Filho e Fernando Perlatto (Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2012). Destacamos também seu novo livro intitulado Diálogos gramscianos sobre o Brasil atual (FAP e Verbena Editora, 2018), que é composto de uma coletânea de entrevistas concedidas que analisam a conjuntura brasileira nos últimos anos, entre elas, algumas concedidas à IHU On-Line.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Qual é a sua avaliação geral do resultado das eleições? Que reflexões o senhor tem feito a partir do resultado das eleições?

José Antonio Segatto: Devagar com o andor

- O Estado de S.Paulo

É quase consenso a necessidade de atualizar a Carta, o problema é conjuntura adversa

“Faça como um velho marinheiro/
que durante o nevoeiro/
leva o barco devagar”
Paulinho da Viola, em Argumento

No momento em que a Constituição completa três décadas de sua promulgação, ela tem sido motivo de crítica ou mesmo depreciação por vertentes políticas as mais variadas. De um lado, uma reação conservadora, por considerá-la demasiado democrática e comportar direitos desmedidos, chegou a propor a elaboração de outra Constituição, concebida por uma comissão de notáveis nomeada pelo presidente da República, desde que afinada com suas convicções e referendada por plebiscito; de outro, a esquerda preponderante e seus satélites - que, diga-se, votou não por acaso contra sua aprovação e, posteriormente, desafiou muitas de suas normas - prometeram refazer a Constituição por vias não muito transparentes, como, por exemplo, consultas populares, claro, sob sua condução. Verificou-se ainda uma terceira posição, congregando intelectuais e juristas, liberais de boa cepa, seduzidos pelo canto de sereia do revisionismo constitucional: uns indicando a necessidade de uma “lipoaspiração” para eliminar excessos e outros, completa reformulação para suprimir ambivalências.

As duas primeiras, entende-se, são coerentes com suas práticas e cultura políticas, visto que nunca tiveram apreço ou compromisso efetivo com os valores e os procedimentos democráticos e as instituições republicanas. Já a terceira passa a impressão de aspirar a uma Carta liberal sem impurezas, impoluta. Mas, a despeito das diferenças de concepções ideológicas, ao que parece, todas elas conjecturam que o regime político-institucional inaugurado em 1988 se esgotou.

Rubens Barbosa: As eleições e a crise

- O Estado de S.Paulo

O futuro presidente terá de seguir a trilha da moderação, evitar que se agrave o ‘nós contra eles’

A sociedade brasileira ainda não se deu conta da gravidade e da profundidade da crise em que o País se encontra e dos desafios que o novo governo deverá enfrentar. As demandas internas são semelhantes às que tiveram influência decisiva nas eleições americanas, na Argentina, na Colômbia e no México: descontentamento generalizado com a corrupção em todos os níveis, com a crescente violência, a pobreza e desigualdade entre as pessoas e regiões.

A percepção da injustiça (enquanto muitos trabalham, outros continuam a roubar), da falência do Estado (que cresceu muito, aumenta impostos e oferece serviços ineficientes), da desordem pública (com a desobediência às leis), do custo e do tempo perdido com a burocracia crescente, entre outros fatores, gerou o clima que, como em outros países, fez com que os eleitores “ficassem contra tudo que está aí”. As preocupações se concentraram sobretudo na necessidade de estabilidade econômica, austeridade fiscal e governança da administração pública. A nossa carga tributária é uma das maiores do mundo, a economia permanece fechada e a desindustrialização afeta todos os setores. O País dividido entre “nós e eles”, a classe política, o Congresso e mesmo o Judiciário com baixo nível de aceitação pela opinião pública expuseram as flagrantes deficiências do governo.

Hamilton Garcia: Os perigos que se avizinham e o antídoto

Fala-se muito na campanha em fascismo e bolivarianismo, mas se o segundo expressa um objetivo explícito da política petista (vide “#EleNão! ou #ElesNão!”) – não obstante sua eludição tática por Haddad neste segundo turno –, o primeiro diz algo de potencial sobre o candidato mais bem cotado ou como ele pode vir a se tornar realidade a depender da marcha dos acontecimentos, se vitorioso for.

Olhando-se para a frente de direita que se formou em torno de Bolsonaro no rastro da crise do impeachment, vê-se um amálgama de convicções conservadoras cristãs e liberistas associadas ao antipetismo, ao par de um desenvolvimentismo lastreado no positivismo, ideologia basilar do Exército Brasileiro. Em condições normais de temperatura e pressão, não obstante o currículo e a vontade do Capitão, o novo governo teria, para ter sucesso, que se desenrolar dentro da normalidade democrática, e, para tal, contaria com grande respaldo social, popular e empresarial, e perspectiva de governabilidade no Congresso, não obstante a sombra neopatrimonialista da bancada do Centrão.

Ocorre, porém, que a falência do sistema político e a crise estrutural do modelo liberal-rentista de democratização, a par da elevada temperatura política bafejada pelo PT como tática de sobrevivência ao Petrolão, conspiram contra essa normalidade, junto com a falta de concatenação programática da frente bolsonarista e a perspectiva bolivariana da “resistência ao fascismo” – ambas podendo suscitar movimentos violentos na sociedade.^

Para tornar mais sombrio o quadro, enquanto na fase lulopetista foi possível “distribuir" os ganhos econômicos com a exuberância comercial do protagonismo chinês e da bolha ocidental – desperdiçando as chances de um “salto à frente”, em termos produtivos, com uma inclusão social pelo trabalho/aprendizado –, na fase bolsonarista o Brasil estará obrigado a enfrentar seus velhos e novos problemas e dificuldades, o que exigirá sacrifícios até aqui não admitidos pelos grupos dominantes – inclusive os aninhados nas altas esferas do Estado e nas corporações financeiras.

É certo, por outro lado, que algo se pode fazer na frente econômica com resultados positivos no curto-prazo para o governo – dois anos talvez –, seja simplificando os procedimentos normativos arrecadatórios, abrindo novas possibilidades de comércio com os países ricos, sustentando um câmbio de maiores possibilidades comerciais para a indústria e mesmo surfar na esperada onda da retomada econômica adiada pelo naufrágio precoce do Governo Temer. Ocorre que tal agenda, sem tocar nos problemas estruturais de longo-prazo da economia, pode propiciar apenas um fôlego, um novo vôo de galinha dentre tantos já vistos desde a recessão dos anos 1980.

Eliane Cantanhêde: ‘Meu garoto!’

- O Estado de S.Paulo

Nem arroubo juvenil nem mau gosto, deboche de Eduardo Bolsonaro contra STF é grave

É inacreditável a capacidade da campanha de Jair Bolsonaro (PSL) de criar solavancos e constrangimentos absolutamente dispensáveis para o candidato. Depois de mandar o vice Hamilton Mourão e o Posto Ipiranga Paulo Guedes calarem a boca, agora é a vez de Bolsonaro dar uma bronca e dizer para “o garoto” ficar mudo. Se é que não vai despachá-lo para um psiquiatra.

E quem vem a ser “o garoto”? Eduardo Bolsonaro, um dos três filhos do candidato que vivem da política e estão em alta, graças à onda Bolsonaro em todo o País. Eduardo, de 34 anos, não só foi reeleito por São Paulo como é o deputado federal mais votado em toda a história do Brasil, com 1,8 milhão de votos. Flávio, de 37, ficou em primeiro lugar para o Senado no Rio. Carlos, de 35, está licenciado do quinto mandato de vereador também no Rio.

Numa aula no Paraná, em julho, o “garoto” Eduardo disse que “não precisa nem mandar jeep, cara, é só mandar um soldado e um cabo para fechar o Supremo Tribunal Federal”. E acrescentou que, se um ministro do STF for preso, não acontece nada.

Poderia ser só uma brincadeira de mau gosto ou um “arroubo juvenil” como dizem na campanha. Mas não é só isso. Eduardo não é nenhum adolescente, sabe bem o que fala e, mais do que representante do povo e recordista de votos, é filho de quem é: o favorito absoluto para a Presidência da República, num momento de grande tensão e de acusações, dentro e fora do País, de que o pacote Bolsonaro tende ao autoritarismo e ameaça a democracia.

Merval Pereira: Retórica de guerra

- O Globo

Retórica política leviana e agressiva constrói um ambiente perigoso, que deve ser rechaçado por todos

A declaração do deputado Eduardo Bolsonaro sobre fechar o Supremo Tribunal Federal (STF) é absurda e irresponsável, e se torna muito mais grave por se tratar do deputado federal mais votado da história do país, com 1.814.443 votos, e filho do provável eleito à Presidência da República, Jair Bolsonaro.

Estamos vivendo “tempos sombrios”, como adverte o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello. Tempos de retórica política leviana e agressiva. Tudo isso constrói um ambiente perigoso, que deve ser rechaçado por todos.

O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, disse em nota que “atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia”. É justamente esse o conceito que deve prevalecer, independentemente de quem faça o ataque, e da maneira que for. Mas essa agressividade antidemocrática na retórica da nossa política não começou agora.

O ex-presidente Lula, atualmente preso em Curitiba por corrupção e lavagem de dinheiro, há muitos anos investe na retórica do “nós contra eles”, e estimula uma luta política que não respeita os adversários nem as instituições do país. Encontrou agora pela frente um populista de direita sem papas na língua, como ele, e o ambiente político do país ficou perigoso.

José Casado: Divisão no Judiciário

- O Globo

A eleição presidencial cristalizou uma divisão política e ideológica na cúpula do Judiciário.

Parte dos juízes entende ser necessário agir de imediato contra qualquer iniciativa do Executivo ou do Legislativo que contenha laivos de uma visão autoritária, com potencial ameaça à ordem democrática.

É nesse contexto que ocorreram as duras reações dos ministros do Supremo Celso de Mello e Alexandre de Moraes, ontem, sobre a “fórmula” para fechar o STF, apresentada pelo ex-policial e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

Moraes abandonou a habitual discrição e pediu em público um inquérito contra o deputado, filho do candidato presidencial líder nas pesquisas. Levantou a suspeita de crime de incitação a golpe de Estado, previsto na Lei de Segurança Nacional.

Outros integrantes do comando do Judiciário seguem por trilha distinta. Ofereceram ao candidato Bolsonaro uma ponte para o futuro. Ela lhe permitiria irradiar as ideias sobre a regressão nos direitos civis nos tribunais federais e superiores.

Bernardo Mello Franco: O cheiro do fascismo

- O Globo

Há um esforço na praça para atenuar os riscos de um governo Bolsonaro. Suas ameaças à democracia, à imprensa e aos adversários seriam só arroubos retóricos

A ameaça foi explícita. “Se quiser fechar o STF, você sabe o que faz? Você não manda nem um jipe. Você manda um soldado e um cabo”, disse o deputado Eduardo Bolsonaro. “Se você prender um ministro do STF, você acha que vai ter uma manifestação popular a favor dos ministros?”, acrescentou.

O ministro Celso de Mello, integrante mais antigo do tribunal, classificou a fala como “inconsequente e golpista”. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que as declarações de Bolsonaro, o filho, “cruzaram a linha” e “merecem repúdio dos democratas”. “Cheiram a fascismo”, concluiu.

Quando foi que o bolsonarismo cruzou a linha? Em três décadas na política, o patriarca do clã nunca exibiu qualquer apreço pela democracia. Bem ao contrário. Sua carreira pode ser resumida como um persistente esforço para descreditá-la.

Míriam Leitão: Risco Venezuela não tem ideologia

- O Globo

O risco Venezuela não é de esquerda nem de direita, é do autoritarismo que desrespeita as instituições. PT já desmereceu o STF. Filho de Bolsonaro fala em fechá-lo

A reação à declaração do deputado Eduardo Bolsonaro foi forte, pela grande probabilidade de eleição do seu pai, mas também porque o candidato sempre foi associado ao pouco apreço pelas instituições democráticas. O temor é de que a ida do seu grupo ao poder signifique o início de um processo de cerco à democracia, que na Venezuela do coronel Hugo Chávez começou pelo enfraquecimento do Judiciário. O risco Venezuela sempre esteve associado ao PT, e o partido fez por merecer, mas na verdade o perigo não é de direita nem de esquerda. É do autoritarismo.

A ameaça sobre a democracia atualmente não é a de um assalto. É a de ver seus pilares minados por atos de um governante populista e autoritário como foi Chávez. O ataque se dá por aproximações sucessivas e não mais como vimos nos anos 1960 no Brasil. Hugo Chávez tentou um golpe no estilo clássico, em fevereiro de 1992. Alegava ser contra a corrupção. Conseguiu o apoio de uma parte das Forças Armadas, mas fracassou. E esse Chávez é que recebeu elogios de Jair Bolsonaro. O coronel foi preso, indultado, mas, em 1998, chegou ao Miraflores pelo voto, dizendo que faria uma revolução socialista. E foi esse Chávez que recebeu o apoio do PT.

Gilmar Mendes: Constituição de 1988 cresce na adversidade

- O Globo

A Constituição de 1988 completou 30 anos de vigência no último dia 5 de outubro. De início, quero salientar que é, sim, motivo de orgulho e comemoração para todos nós brasileiros. É o maior período de estabilidade institucional na República. Afirmo isso porque, em tempos de renovação política e nos quais tanto se ouve acerca de propostas de mudanças de todo jaez, penso ser um dever cidadão defender, clara e publicamente, a nossa Carta Magna.

No início dos anos 80, quando o processo de abertura do regime militar se intensificou, o debate sobre uma nova Constituição se fez presente. Uma sociedade em efervescência, ávida por crescimento, igualdade social e, sobretudo, liberdade, tanto no sentido negativo quanto no sentido positivo, procurava apressar o ritmo dos acontecimentos.

A liberdade no sentido negativo é a que busca proteger os indivíduos de intervenções estatais descabidas, cujo anseio se fazia sentir, mais nitidamente, na luta contra a censura à produção artística e cultural imposta pelo regime militar. A liberdade no sentido positivo, por sua vez, é a que almeja dar, aos cidadãos, a capacidade efetiva de participar das decisões políticas que guiarão a vida da sociedade.

A Constituinte de 1987/88 representou, exemplarmente, o prestígio da liberdade positiva, a valorização da participação da sociedade no processo de elaboração do novo texto constitucional e, talvez, seja exatamente esse o valor que tenha levado à derrocada do chamado “Projeto dos Notáveis”.

Luiz Carlos Azedo: O direito ao dissenso

- Correio Braziliense

Bolsonaro adotou um tom ameaçador, num discurso duro, que não condiz com as responsabilidades de um candidato a presidente da República de um país democrático

Assim como a alternância de poder, o direito ao dissenso é um dos pilares da democracia. Devido a isso, os ex-presidentes Collor de Mello e Dilma Rousseff foram afastados do poder — um renunciou antes de ser julgado, outra teve o impeachment aprovado pelo Congresso. E é graças ao direito ao dissenso que o deputado Jair Bolsonaro, a seis dias da eleição, é o franco favorito no segundo turno da disputa pela Presidência da República. Sua eleição, porém, caso ocorra, não será um cheque em branco. Nem o seria se houvesse vencido logo no primeiro turno.

Num ambiente empesteado pelas fake news e pelo ódio ideológico, o discurso de Jair Bolsonaro (via celular) aos manifestantes que o apoiavam na Avenida Paulista, no centro de São Paulo, e em outras cidades do país, corroborou as preocupações quanto à possível vocação autoritária de seu governo e os riscos que isso poderia oferecer à democracia no Brasil. Embora conhecida, a retórica radical do candidato vinha sendo suavizada, mas no domingo recrudesceu.

Bolsonaro adotou um tom ameaçador, num discurso duro, com o objetivo de agradar aos manifestantes, que não condiz com as responsabilidades de um candidato a presidente da República de um país democrático. Ameaçou os seus adversários com a prisão e o exílio, uma atribuição que lhe foge completamente, um dia depois de virem a público declarações infelizes de seu filho Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), dizendo que é possível fechar o Supremo Tribunal Federal (STF) com a mobilização apenas de um cabo e um soldado.

Por muito pouco, o capitão reformado não exumou o velho bordão do regime militar após o Ato Institucional nº 5: “Brasil, ame ou deixe-o!”. Disse: “Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”. Há duas interpretações para essa frase. A primeira: os adversários que respondem a processos ou cumprem pena na Lava Jato, como ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como qualquer cidadão brasileiro, têm direito ao devido processo legal, mesmo com os direitos políticos cassados. A segunda é mais preocupante: a esquerda brasileira é tratada como inimiga do Estado, o que representa uma ameaça às liberdades democráticas.

Hélio Schwartsman: O pai, o filho, o cabo e o soldado

- Folha de S. Paulo

Jair Bolsonaro tem um período de longo aprendizado pela frente

Em mais uma demonstração do grande despreparo do núcleo bolsonarista para governar o país, Eduardo Bolsonaro, filho do capitão e deputado federal reeleito, declarou que bastavam um soldado e um cabo para fechar o STF.

É verdade que o desatino verbal é de julho, de modo que não configura uma resposta direta à investigação sobre financiamento ilegal na campanha bolsonarista aberta na semana passada pelo Judiciário, mas é revelador do desprezo do filho pelas instituições basais da democracia liberal. Não tenho provas, mas arriscaria afirmar que foi em casa que o jovem Bolsonaro aprendeu essas coisas.

Tudo indica que Jair Bolsonaro vencerá a corrida presidencial no próximo domingo, o que significa que precisará encontrar um modus vivendi com Judiciário, Legislativo e outras instituições. Ele, afinal, será eleito presidente e não ditador plenipotenciário, e, diferentemente do que pensa Eduardo Bolsonaro, acórdãos do Supremo podem muito mesmo contra presidentes.

Joel Pinheiro da Fonseca: O risco de Bolsonaro presidente

- Folha de S. Paulo

Teremos que ficar vigilantes e prontos para defender a lei contra a força bruta

Num momento de sentimentos radicalizados, em que um candidato tem a faixa presidencial praticamente na mão, a conduta esperada de alguém com um mínimo de apreço pela República seria adotar o discurso da conciliação. O governo é para todos, o opositor não é inimigo, as instituições vêm antes do projeto de poder. A família Bolsonaro fez o exato oposto: reforçou o radicalismo, desmoralizou as instituições, atacou a imprensa e insuflou o ódio político. Para uma multidão em êxtase, gritou pelo banimento dos "vermelhos" e ameaçou prender Fernando Haddad.

Isso casa bem com as declarações de Eduardo Bolsonaro feitas antes do primeiro turno, mas que vieram à tona só agora: se por algum motivo a Justiça cassar a chapa (ato que ele não considera improvável), tomariam o poder pela força. Disse inclusive que mandaria prender ministros do Supremo. O que pode a pena de um ministro contra a força da população e do Exército? Nada.

Ele está certo. É a força que determina a ordem social, não importa o que digam as leis, os costumes ou os cargos. O Estado democrático de Direito não altera essa realidade elementar: ele busca uma engenharia que consiga contrabalancear diferentes forças e regrar a alternância de poder, de forma a permitir algum nível de liberdade individual e participação dos cidadãos na política.

Nada disso, contudo, é natural ou automático. Se um número suficientemente grande de pessoas --e mais, pessoas armadas-- decidir não seguir o que diz a lei, ela deixa de valer. O equilíbrio é sempre precário, e por isso a cultura e o senso de decoro das autoridades --que a família joga no lixo --são tão importantes.

A campanha de Bolsonaro, tanto por seus meios oficiais quanto por agregados e apoiadores, fomenta uma atmosfera de fanatismo e paranoia. Em seu discurso, as instituições conspiram contra eles. As pesquisas mentem, as urnas estão fraudadas, a mídia é vendida e veicula fake news e a Justiça está em busca dos menores pretextos para condená-los.

Todos estariam sob a influência do Foro de São Paulo a serviço do comunismo e, de forma mais ampla, do globalismo e do marxismo cultural. PT, petismo, comunismo, corrupção e crime viraram conceitos intercambiáveis, contra os quais não há mentira ou barbaridade que não seja tolerável.

Bruno Boghossian: Cores de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Ataque direcionado indica interesse em usar o poder para punir opositores

Perto do poder, Jair Bolsonaro recita com desenvoltura a cartilha de líderes autoritários. Além dos frequentes sinais de desapreço pelas instituições do país, o candidato agora indica que pretende perseguir opositores e penalizar quem contraria seus interesses políticos.

No domingo (21), em discurso exibido nas manifestações a seu favor, o candidato fez um novo ataque ao PT e prometeu uma “faxina”, “uma limpeza nunca vista na história”.

“Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora, ou para a cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”, disse.

A aplicação firme das leis está na ordem do dia, mas não se ouviu o mesmo sobre marginais azuis, laranjas, brancos ou verdes. Para Bolsonaro, a autoridade pode ser usada para expulsar ou prender opositores.

Na mesma fala, o presidenciável disse que Fernando Haddad e outros petistas “vão apodrecer na cadeia”. E ameaçou: “Vocês, petralhada, verão uma Polícia Civil e Militar com retaguarda jurídica para fazer valer a lei no lombo de vocês”.

Fernando Exman: Prefeito Bolsonaro

- Valor Econômico

Slogan "Mais Brasil, Menos Brasília" tende a ganhar peso

Jair Bolsonaro, confirmado presidente da República, seguirá cortando intermediários. É a sua forma de fazer política, asseguram seus colaboradores. Ele adotou esse estilo muito antes de dada a largada oficial da campanha, percorrendo o país todo até ser alvo de um atentado. Inovou na comunicação, desprezando marqueteiros e falando diretamente ao eleitor por meio de redes sociais e aplicativos de mensagens. A partir de janeiro, se de fato subir a rampa do Palácio, sua estratégia será aproximar o Planalto de prefeitos de todo o Brasil.

Auxiliares de Bolsonaro contam que o deputado tem a redução da burocracia como uma de suas metas, chegando a colocar como objetivo ideal até mesmo o fim dos cartórios no país. No âmbito do governo federal, isso não se traduziria na extinção de políticas atualmente sob responsabilidade do Ministério das Cidades, mas na redução de amarras para a sua execução.

Bolsonaro não seria o primeiro chefe de governo a empunhar a bandeira municipalista. Todos que ocuparam recentemente o Palácio do Planalto já fizeram promessas mil para prefeitos, vereadores e entidades do setor. Mais dia ou menos dia, porém, encararam críticas - às vezes transformadas em vaias - nas marchas realizadas anualmente em Brasília por gestores municipais de todo o Brasil. Mas, agora, a expectativa entre eles é maior.

Representantes dos prefeitos têm se reunido com as equipes dos presidenciáveis desde o primeiro semestre. Bolsonaro participou de um desses encontros e seus auxiliares realizaram outros quatro. Do lado da campanha de Fernando Haddad, uma reunião foi feita com integrantes de sua equipe liderados pelo ex-ministro Ricardo Berzoini, experiente articulador político do PT e responsável pelos contatos entre o Palácio do Planalto e demais entes federativos no governo Dilma Rousseff.

'Democracia é uma máquina de moderar posições', diz cientista político

Fernando Schüler avalia que eleição de 2018 é diferente por envolver 'guerra cultural'

Bernardo Mello | O Globo

RIO — Doutor em filosofia, o cientista político e professor do Insper Fernando Schüler vê revolução digital e guerra cultural nas eleições brasileiras . Ele acredita que o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, se eleito, será limitado pelas instituições.

• A democracia corre risco?

O Brasil é de fato um país com instituições maduras, independentes. Não é uma república de bananas. Vejo intelectuais do exterior dizendo que estamos à mercê de um líder fascista, populista, autoritário. É uma incompreensão da capacidade de moderação que as nossas instituições têm.

• A campanha de Bolsonaro tem recuado em várias declarações consideradas antidemocráticas. É só maquiagem de campanha?

Minha impressão é que esse último episódio do (deputado federal) Eduardo Bolsonaro é um exemplo significativo do poder regulador da democracia. Há uma declaração como essa, que contém um elemento antidemocrático, e imediatamente você tem uma reação da sociedade civil, da imprensa. Depois, uma negação do próprio candidato e um recuo por parte do Eduardo Bolsonaro. Não me refiro apenas à força das instituições formais. A força de uma democracia também se dá na cultura política, nas redes sociais, na opinião pública difusa dos cidadãos, em um conjunto de crenças arraigadas que servem como contrapeso a autoritarismos.

• A resposta dos ministros do STF foi adequada?

Acho que a ministra Rosa Weber deu uma resposta suficiente, no tom adequado. A soberania das instituições muitas vezes se mostra no silêncio. Temos que parar de botar lenha na fogueira. Tem muita gente gostando de brincar disso no Brasil.

Atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia, diz Toffoli

Além do presidente do STF, os ministros Celso de Mello e Alexandre de Moraes se manifestaram sobre o assunto

Letícia Casado, Gustavo Uribe | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, reagiu nesta segunda-feira (22) às declarações do deputado federal eleito Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidenciável Jair Bolsonaro, sobre fechar a corte.

"O Supremo Tribunal Federal é uma instituição centenária e essencial ao Estado Democrático de Direito. Não há democracia sem um Poder Judiciário independente e autônomo", diz o ministro em nota enviada por sua assessoria de imprensa.

"O país conta com instituições sólidas e todas as autoridades devem respeitar a Constituição. Atacar o Poder Judiciário é atacar à democracia", acrescenta o magistrado.

Além de Toffoli, os ministros Celso de Mello e Alexandre de Moraes se manifestaram sobre o assunto.

Magistrado mais antigo da corte, ele classificou a afirmação do, de que bastam um soldado e um cabo para fechar a Corte, de “inconsequente e golpista”.

Disse ainda que o fato de Eduardo Bolsonaro ter tido uma votação expressiva nas eleições —ele recebeu quase 2 milhões de votos— não legitima “investidas contra a ordem político-jurídica”.

Já Alexandre de Moraes afirmou nesta segunda que nada justifica a defesa do fechamento da Suprema Corte.

Em seminário, na capital paulista, ele afirmou que é uma contradição o país viver o maior período de estabilidade democrática desde a Constituição de 1988 e um parlamentar fazer uma declaração de "maneira irresponsável".

"As declarações demonstram a atualidade da famosa frase de Thomas Jefferson: 'O preço da liberdade é a eterna vigilância'. Nada justifica a defesa do fechamento do STF", disse.

O ministro disse ainda que nem o desconhecimento dos pilares da democracia nem a "total ignorância" do princípio da separação dos poderes justificam "o absurdo atentado verbal à autonomia e independência do Poder Judiciário".

Marina Silva declara apoio crítico a Fernando Haddad

Para a ex-senadora, a campanha de Bolsonaro é um perigo à democracia

Patrícia Pasquini, Marina Dias | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A candidata derrotada à Presidência Marina Silva (Rede) declarou apoio crítico ao petista Fernando Haddad nos últimos dias da corrida presidencial.

Uma pesquisa Datafolha divulgada no dia 10 de outubro mostrou que os eleitores de Marina eram mais favoráveis a um apoio dela a Haddad —37% escolheram o petista e 18%, o capitão reformado. Outros 33% votariam branco ou nulo e 11% não souberam dizer.

"Sei que, com apenas 1% de votação no primeiro turno, a importância de minha manifestação, numa lógica eleitoral restrita, é puramente simbólica. Mas é meu dever ético e político fazê-la", diz.

Marina Silva ficou em oitavo lugar na corrida presidencial. Foi a pior derrota nos três pleitos que disputou.

No discurso de apoio ao petista, ela afirmou que a campanha do candidato Jair Bolsonaro (PSL) é um perigo à democracia, ao meio ambiente, ao respeito à diversidade e aos direitos civis.

"Vejo no projeto político defendido pelo candidato Bolsonaro risco imediato para três princípios fundamentais da minha prática política: primeiro, promete desmontar a estrutura de proteção ambiental conquistada ao longo de décadas. Chega ao absurdo de anunciar a incorporação do Ministério do Meio Ambiente ao Ministério da Agricultura. Segundo, é um projeto que minimiza a importância de direitos e da diversidade existente na sociedade, promovendo a incitação sistemática ao ódio, à violência, à discriminação. Por fim, em terceiro lugar, é um projeto que mostra pouco apreço às regras democráticas, acumula manifestações irresponsáveis e levianas a respeito das instituições públicas e põe em xeque as conquistas históricas desde a Constituinte de 1988", diz Marina.

Haddad telefona a FHC e diz que ataques de Bolsonaro colocam 'democracia em jogo'

Candidato do PT afirma que o ex-presidente manifestou preocupação com o país

Marina Dias | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O candidato do PT ao Planalto, Fernando Haddad, telefonou na tarde desta segunda-feira (22) ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e debateu o que chama de escalada de ataques de seu adversário, Jair Bolsonaro (PSL), a diversas instituições do país.

Haddad relatou à Folha que o tucano está muito preocupado com os rumos do Brasil e que, assim como ele, avalia que a democracia "está em jogo" na disputa presidencial deste ano. Ainda de acordo com o petista, nenhum pedido de apoio público foi firmado.

"Não era o objetivo do telefonema", declarou. "Disse a ele [FHC] que nosso solo comum, a democracia, está em jogo, e ele concordou. Ele está realmente preocupado", afirmou Haddad.

O candidato do PT havia dito pela manhã que telefonaria a FHC ainda nesta segunda, depois que o ex-presidente condenou as declarações de um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, que disse que "bastam um soldado e um cabo" para fechar o STF (Supremo Tribunal Federal).

O tucano disse que a fala do filho do candidato do PSL "merece repúdio dos democratas" e "cheira a fascismo". Haddad comemorou o discurso do ex-presidente, uma pessoa que ele classificou como "insuspeita".

Desde o início do segundo turno, Haddad tenta atrair FHC para uma frente democrática contra a candidatura de Bolsonaro, mas não conseguiu o apoio explícito do tucano.

Haddad telefona para FHC e fala de riscos trazidos por retórica de Bolsonaro

Candidato do PT diz que democracia está em risco extremo e ex-presidente tucano manifesta preocupação com perspectiva das últimas manifestações do candidato do PSL

Ricardo Galhardo | O Estado de S.Paulo

O candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, telefonou para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), na tarde desta segunda-feira, 22. Segundo relatos, FHC disse estar "muito preocupado com as perspectivas" diante das últimas manifestações de Jair Bolsonaro (PSL) sobre banir a oposição, ativistas, veículos de imprensa e, principalmente, declarações do deputado eleito Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) sobre a possibilidade de fechar o Supremo Tribunal Federal (STF), já desautorizadas pelo candidato.

Na conversa, Haddad e FHC não combinaram ações conjuntas nem se falou sobre apoio eleitoral. O ex-presidente vem sendo cortejado pelo petista desde o fim do primeiro turno, mas decidiu não se envolver diretamente na disputa presidencial. FHC, no entanto, se manifestou de forma dura em suas redes sociais sobre a fala de Eduardo Bolsonaro. Segundo o ex-presidente, a declaração do deputado eleito "cheira a fascismo".

Haddad, ao telefone, teria dito que a democracia está em "risco extremo". De manhã, em ato com catadores de papel, Haddad disse que as instituições precisam reagir às ameaças de Bolsonaro, condenou ataques de aliados do candidato do PSL a jornalistas e a fala do próprio capitão da reserva, domingo, sobre veículos de imprensa.

Ainda de acordo com Haddad, as instituições estão sendo intimidadas pelo setor linha dura das Forças Armadas.

Com duras críticas ao PT, Marina Silva declara voto em Haddad

Segundo ex-senadora, Bolsonaro demonstra 'pouco apreço por regras democráticas'

Tiago Aguiar* | O Globo

SÃO PAULO — Duas semanas após dizer que seria oposição qualquer que fosse o próximo presidente eleito, a ex-senadora Marina Silva (Rede) declarou nesta segunda-feira apoio ao candidato Fernando Haddad(PT) no segundo turno das eleições. Apesar do apoio, a ex-ministra fez duras críticas aos dirigentes do PT.

Em nota pública, Marina escreveu que vê no projeto político de Jair Bolsonaro (PSL) "risco imediato" contra a "estrutura de proteção ambiental", "os direitos e a diversidade existente na sociedade" e "as regras democráticas".

Em texto duro, Marina também faz críticas a dirigentes petistas que, segundo ela, "construíram um projeto de poder pelo poder, pouco afeito à alternância democrática", que infla realizações e não reconhece erros. E termina dizendo que a candidatura petista "pelo menos" "não prega a extinção dos direitos dos índios, a discriminação das minorias, a repressão aos movimentos, o aviltamento ainda maior das mulheres, negros e pobres". A nota termina declarando voto crítico e reafirma que seu partido será oposição em qualquer resultado.

Haddad liga para FH e diz ter tratado de 'questões institucionais'

Conversa durou cerca de 10 minutos e não teria havido formalização de apoio

Sérgio Roxo | O Globo

SÃO PAULO - O candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, telefonou nesta segunda-feira para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Segundo o presidenciável, os dois conversaram sobre questões "institucionais".

Ainda de acordo com o candidato do PT, eles não teriam conversado sobre um eventual apoio do tucano ao petista. A ligação durou cerca de dez minutos.

Haddad confirmou o telefonema em mensagens enviadas ao GLOBO no fim da tarde desta segunda-feira. O ex-presidente havia condenado, horas antes, as declarações de um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, dizendo que que "bastam um soldado e um cabo" para fechar o STF".

Nesta segunda, o petista afirmou que as instituições estão se sentindo ameaçadas pela linha dura das Forças Armadas e que, por isso, têm demorado para reagir aos ataques da campanha de Bolsonaro.

— As instituições estão se sentindo ameaçadas, inclusive pela linha dura de parte das Forças Armadas”, declarou — declarou Haddad.

Na semana passada, o ex-presidente declarou em entrevista que entre ele e Haddad havia uma "porta", enquanto entre ele e Bolsonaro havia "um muro" . Dias depois, no entanto, ele falou que a porta estava enferrujada:

- E eu acho que a fechadura enguiçou.

Partidos barrados por cláusula de barreira negociam migração

Regra asfixiou 14 das 35 siglas, e parlamentares se articulam por sobrevivência política; PSL espera atrair maior número

Daniel Carvalho, Angela Boldrini | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante da cláusula de barreira que asfixiou 14 dos 35 partidosdo país, seus integrantes buscam negociar não apenas migrações para outras siglas, mas também a criação de novas legendas.

Pela regra aplicada na eleição de 2018, cada partido tinha que ter obtido ao menos 1,5% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, nove unidades da federação, com pelo menos 1% dos votos válidos em cada uma delas.

Outra opção era eleger pelo menos 9 deputados, distribuídos em, no mínimo, nove estados do país.

Quem não ultrapassa a barreira fica sem recursos de fundo partidário e tempo de propaganda no rádio e na TV, o que, na prática, impede a sobrevivência do partido.

No início de outubro, Patriota, PHS, PC do B, PRP, Rede, PRTB, PMN, PTC, PPL, DC, PMB, PCB, PSTU e PCO não conseguiram alcançar os critérios estabelecidos na reforma política aprovada pelo Congresso em 2017.

Por isso, parlamentares e lideranças de parte desses partidos já se movimentam para assegurar sua sobrevivência política. Do outro lado, siglas maiores buscam atrair para si o maior número de órfãos.

O PSL, partido do líder nas pesquisas da eleição presidencial, deputado Jair Bolsonaro, espera atrair o maior número dos que ficarem sem sigla.

A legenda elegeu 52 deputados, a segunda maior bancada, e alguns de seus representantes, como a deputada eleita Joice Hasselmann (SP), esperam receber cerca de 15 novos nomes.

Contra polarização, Senado pode ter 3ª via

Por Marcelo Ribeiro e Fabio Murakawa | Valor Econômico

BRASÍLIA - Preocupados com a provável polarização entre nomes do PSL e o senador Renan Calheiros (MDB-AL) na disputa pela presidência do Senado, parlamentares de PSDB, PPS, PDT, PSB e Rede já começaram as articulações e sondagens para viabilizar uma candidatura competitiva que represente a terceira via na corrida pela principal cadeira do Senado. Os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Jarbas Vasconcelos (MDB-PE) seriam os mais cotados para representar o grupo na disputa, mas Simone Tebet (MDB-MS) corre por fora.

Representantes dos cinco partidos já se reuniram e voltarão a se encontrar para entrar em consenso sobre o nome a ser escolhido para fazer frente ao senador alagoano e a um possível indicado pelo hoje candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, favorito na corrida presidencial. As conversas ganharam importância com a derrota do atual presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que não conseguiu se reeleger. Embora negue, Renan tem feito telefonemas aos colegas em busca de apoio para retornar ao comando do Senado.

Na avaliação do grupo, o sucessor de Eunício deve ser um político experiente e sem envolvimento em escândalos de corrupção. Outro critério considerado é que o candidato não seja alguém alinhado ao Palácio do Planalto. Ou seja, caso a vitória de Bolsonaro se confirme no domingo, o nome indicado não poderá ser alguém com proximidade com o presidente, já que o escolhido precisará ser um nome forte para "bater de frente" com o próximo presidente da República quando for necessário.

Uma das responsáveis pela derrota do clã Sarney no Maranhão, a senadora eleita Eliziane Gama (PPS-MA) disse que a união dos partidos é necessária, em meio às incertezas do que pode ocorrer caso Bolsonaro seja vitorioso nas urnas. "Estamos procurando conversar com partidos e lideranças para formar uma frente e lançar um nome que fuja do radicalismo que impera hoje no país. Vamos buscar alguém que tenha equilíbrio para enfrentar os desafios que se aproximam e que não serão fáceis", disse. "A união destes partidos permitirá devolver a altivez ao Congresso Nacional nos próximos anos. Buscamos uma terceira via, que tenha experiência, honestidade e não esteja disposto a baixar a cabeça para o Palácio do Planalto".

Na economia, discórdia entre Bolsonaro e o PT é recente

Rixa de Bolsonaro e PT é recente na economia

Em dez decisões econômicas no Congresso, deputado e partido votaram igual em seis

Faltando poucos dias para o segundo turno das eleições presidenciais, os candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) subiram o tom das críticas mútuas, buscando demarcar as inúmeras divergências.

Uma análise histórica mostra, contudo, que as diferenças não são tão grandes num tema vital: a economia.

A Folha selecionou dez votações que mudaram o rumo da política econômica brasileira e comparou o voto de Bolsonaro, que foi deputado federal durante 27 anos, e a orientação do PT à sua bancada no Congresso. Não foi possível contrapor dois partidos porque Bolsonaro mudou de agremiação nove vezes.

Nessa dezena de temas pesquisados —que compreende do Plano Real até a apreciação do cadastro positivo, no ano passado—, Bolsonaro e PT estiveram do mesmo lado seis vezes e ficaram em trincheiras separadas outras quatro.

"O mercado financeiro não fez esse trabalho de comparação e, se fez, prefere se apegar no que diz o Paulo Guedes", diz Alessandra Ribeiro, sócio e diretora da Tendências Consultoria, em referência ao guru econômico do candidato do PSL.

Em 1994, PT e Bolsonaro fizeram oposição ao presidente Itamar Franco, que tentava estabilizar a moeda e controlar a inflação com o Plano Real.

O deputado votou contra o plano de estabilização da moeda, e o PT instruiu sua bancada a tentar obstruir a votação, pois sabia que não teria número suficiente para derrotar a proposta.

Bolsonaro também votou com o PT e com a esquerda em sua cruzada contra as privatizações do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 1995, ambos disseram não ao fim do monopólio da exploração do petróleo pela Petrobras e à venda da estatal de telefonia, a Telebras.

Em 1998, o deputado e o partido que hoje ele demoniza também se opuseram à reforma da Previdência de FHC.

O tucano tentou introduzir uma idade mínima de aposentadoria no país, não conseguiu por um único voto e acabou criando o fator previdenciário —um método de cálculo do benefício que desestimula a aposentadoria precoce.

Durante a década de 1990 e o início dos anos 2000, Bolsonaro e o PT só discordaram em uma ocasião em temas econômicos relevantes: na votação da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), em 2000, que estabeleceu que o Estado não pode gastar mais do que arrecada. O deputado votou a favor, enquanto o PT foi contra.

"A coincidência nos votos do PT e de Bolsonaro não causa surpresa. A extrema direita, personificada por Bolsonaro, e a esquerda desenvolvimentista, corrente que o PT sempre defendeu, são parecidas na economia. Defendem o Estado forte e interventor", diz Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos.

Atacar o STF e a imprensa é agredir a democracia: Editorial | O Globo

Atitude de Jair Bolsonaro e do filho Eduardo cria mais tensões quando é preciso começar a pacificação

Não atenua a gravidade do ataque de Eduardo Bolsonaro ao Supremo o fato de ter ocorrido há quatro meses e colocado em circulação apenas agora. Deputado federal reeleito pelo PSL paulista, filho do candidato a presidente Jair Bolsonaro, cabia a ele, como político, assim como cabe a todo cidadão, respeitar a Constituição e suas instituições.

A inominável ameaça foi gravada em vídeo, em um curso na cidade paranaense de Cascavel, ao responder a uma pergunta sobre hipotética ação do Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a posse do pai, caso vencesse no primeiro turno. “Será que eles vão ter essa força mesmo? O pessoal até brinca lá: se quiser fechar o STF, você sabe o que faz? Você não manda nem um jipe. Manda um soldado e um cabo”. O grave tornou-se absurdo.

As repercussões não demoraram. O presidente da Corte, ministro Antonio Dias Toffoli, resumiu: “atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia”. Em nota, o ministro Celso de Mello, por sua vez, tachou a declaração de “inconsequente e golpista”, enquanto o colega Alexandre de Moraes até propôs que a Procuradoria-Geral da República instaure inquérito para enquadrar o deputado na Lei de Segurança Nacional.

Quartelada retórica: Editorial | Folha de S. Paulo

Filho de Bolsonaro especula sobre fechar o STF; presidenciável defende a democracia, mas insufla a ira militante para se esquivar de crítica e debate

Apenas três meses antes de conquistar um novo mandato na Câmara dos Deputados com a maior votação do país, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) se metia a formular hipóteses acerca do fechamento do Supremo Tribunal Federal —foi o que se soube nos últimos dias.

"Você não manda nem um jipe. Manda um soldado e um cabo", confabulava o parlamentar, numa palestra a alunos de um curso preparatório para a disputa de vagas na Polícia Federal, em Cascavel (PR).

Em circunstância tão prosaica, ele respondia a uma questão sobre eventual obstáculo no STF para a posse de seu pai, Jair Bolsonaro, em caso de vitória no primeiro turno da eleição presidencial.

O palestrante duvida que a corte poderia barrar a candidatura vitoriosa se julgasse, no exemplo citado, ter havido doação ilegal de campanha. O clamor das ruas, depreende-se de sua fala, seria fator decisivo. "Se prender um ministro do STF, você acha que vai haver uma manifestação popular?", questiona.

Não tivesse partido do filho do presidenciável que lidera com folga as pesquisas, a quartelada imaginária provavelmente passaria como mera fanfarrice de congressista do baixo clero —e decerto se encontrarão asneiras do mesmo naipe, lamentavelmente, no falatório de outros nomes e siglas.

Vindo de quem veio, o desatino provocou imediata reação de ministros do Supremo, instados a dizer o óbvio sobre as instituições democráticas, o Estado de Direito e a independência entre os Poderes republicanos.

Jair Bolsonaro relatou ter repreendido "o garoto" —de 34 anos— e afirmou ter respeito integral pelo Judiciário. Essa e outras manifestações recentes de sensatez do presidenciável do PSL, entretanto, ainda contrastam com boa parte de sua retórica palanqueira.

Tome-se o discurso exibido em vídeo durante ato no domingo (21), na capital paulista. Na peça, mistura-se a declaração de amor à paz, à liberdade e à democracia com promessas raivosas de prisão de adversários petistas e banimento de "marginais vermelhos".

Problemas fiscais em série aguardam novos governadores: Editorial | Valor Econômico

Não só a União, mas também os Estados enfrentam problemas fiscais muito graves. O crescimento dos gastos em ritmo superior à expansão das receitas é o principal pesadelo. A recessão econômica refreou o aumento da arrecadação ao mesmo tempo em que ampliou a demanda por serviços públicos, especialmente de saúde e educação, porque a população também viu sua renda cair com o desemprego e a informalidade. Contribuiu para gravar o quadro o explosivo aumento dos empréstimos entre 2011 e 2014, muitos estimulados irresponsavelmente pelo governo federal e garantidos pelo Tesouro, por conta dos preparativos para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. Em 2015, já com a recessão instalada, a crise fiscal ficou evidente, em especial no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

Não há dúvidas de que os atuais governadores entregarão a seus sucessores um quadro financeiro muito pior do que encontraram ao assumir. Desde dezembro de 2014, a despesa total do governo com pessoal cresceu mais do que as receitas em 15 dos 26 Estados, e ameaça romper as barreiras regulatórias. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o limite prudencial é de 46,55% de despesa de pessoal em relação à Receita Corrente Líquida (RCL) e o teto é de 49%. Já ultrapassaram o limite prudencial 16 Estados, mais do que o dobro dos sete nessa situação em 2014, e dois estouraram o teto. Uma conta especialmente explosiva é a das previdências estaduais, que passou de 17,1% para 22% da RCL entre 2015 e 2017. Em Minas Gerais chegou a 38,3%.

Acordo comercial com o Chile: Editorial | O Estado de S. Paulo

Com a conclusão, na sexta-feira passada, das negociações do acordo de livre-comércio com o Chile, o Brasil avança na direção de maior integração ao mercado internacional. O Chile é o país sul-americano mais aberto ao comércio externo. Com o acordo, o Brasil consolida o processo de abandono da política que prevaleceu durante o longo domínio lulopetista e que levou o País a isolar-se das principais transformações pelas quais passou o comércio mundial nos últimos anos. Trata-se, por isso, de medida indispensável para assegurar a expansão das exportações, estimular a modernização mais rápida do parque produtivo nacional, assegurar o abastecimento do mercado doméstico de bens importados a preços mais acessíveis e impulsionar o crescimento.

No ano passado, o intercâmbio comercial entre Brasil e Chile alcançou US$ 8,5 bilhões, com aumento de 22% em relação ao ano anterior. De janeiro a setembro deste ano, o intercâmbio chegou a US$ 7,21 bilhões, 13% mais do que nos nove primeiros meses de 2017. O Chile é o segundo maior parceiro comercial do Brasil na América do Sul (o primeiro é a Argentina), mas o Brasil é o principal destino dos investimentos chilenos no exterior (o estoque desses investimentos é de US$ 31 bilhões).

Fernando Pessoa: Ah, onde estou

Ah, onde estou onde passo, ou onde não estou nem passo,
A banalidade devorante das caras de toda a gente!
Ah, a angústia insuportável de gente!
O cansaço inconvertível de ver e ouvir!
(Murmúrio outrora de regatos próprios, de arvoredo meu.)

Queria vomitar o que vi, só da náusea de o ter visto,
Estômago da alma alvorotado de eu ser...