quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Malu Gaspar - Quem quer de verdade o impeachment de Bolsonaro?

O Globo

Fazia tempo que a palavra impeachment não aparecia com tanta frequência no noticiário. Depois do discurso golpista de Jair Bolsonaro na Avenida Paulista, virou assunto não só nos jornais, nas TVs e nas redes sociais, mas também nas conversas dos líderes políticos do Congresso, do Judiciário e do próprio governo. PSDB, PSD e DEM anunciaram a abertura de discussões internas sobre o impeachment, e o PDT apresentou uma notícia-crime contra o presidente por crime de responsabilidade. É a primeira vez que o tema ganha tal força, apesar do histórico de crises e de motivos para um impedimento desde o início do governo Bolsonaro.

A questão, portanto, não é se há razões para tirar Bolsonaro do poder. Fernando Collor perdeu o cargo por causa de um Fiat Elba, e Dilma Rousseff por pedaladas fiscais que a maior parte dos brasileiros não é capaz de entender até hoje. Já Lula passou incólume pelo mensalão, e Michel Temer pelo Joesley Gate. O que interessa saber, no fundo, é: quem quer de verdade Bolsonaro fora do Palácio do Planalto e o que está disposto a fazer para isso?

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), definitivamente não está entre essas pessoas. Com seu pronunciamento ensaboado de ontem, Lira deixou claro que ainda não está disposto a comprar uma briga com o bolsonarismo e abrir mão de seu largo quinhão na divisão de poder hoje em funcionamento.

Também não dá para incluir nesse rol o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que ontem criticou “arroubos autoritários” e defendeu a democracia, mas também sugeriu uma reunião de pacificação entre os Poderes. Depois da invasão da Esplanada por manifestantes, ele cancelou as sessões do Senado até a semana que vem, em nome da segurança. É um motivo válido, mas também tira da oposição a tribuna para aproveitar o momento e reforçar o discurso pró-impedimento. Joga água na fervura, como se diz lá nas Minas Gerais de Pacheco.

A reação mais enfática ao show golpista do presidente da República veio de Luiz Fux, para quem, se Bolsonaro cumprir a ameaça de não mais obedecer a ordens judiciais vindas do STF, estará cometendo “crime de responsabilidade, a ser analisado pelo Congresso Nacional”. Foi um discurso forte, mas desagradou aos mais indignados no próprio tribunal, para quem Fux deveria ter aberto logo de cara uma investigação contra o presidente da República.

Toda essa hesitação na Praça dos Três Poderes se explica pela constatação de que, apesar de estar cada vez mais isolado, Bolsonaro ainda tem o apoio entusiasmado de uma parcela da população. Não é forte o suficiente para superar a crise, nem fraco o bastante para cair.

E então chegamos aos oposicionistas. Por mais que digam publicamente que o 7 de Setembro de Bolsonaro flopou, nos bastidores muitos deles admitem que os atos foram grandes e que, para o impeachment decolar, é preciso pôr na rua contra o presidente mais gente do que foi se manifestar a favor.

A ocasião se oferece no próximo dia 12, para quando está marcado um protesto pelo Fora Bolsonaro, convocado pelo Movimento Brasil Livre, o MBL. A data foi anunciada em julho, logo depois da entrevista coletiva que anunciou um superpedido de impeachment, que reuniu de Joice Hasselmann (PSL) a Guilherme Boulos (PSOL), de Gleisi Hoffmann (PT) a Kim Kataguiri (DEM).

“Eu fico muito feliz de ver aqui que nós temos pessoas que estão acima de qualquer questão ideológica, mas que pensam no Brasil e que pensam na nação”, disse Joice, resumindo o teor das falas de vários outros. “Eu não titubeei em um único momento em assinar esse superpedido de impeachment. Marcelo Freixo [ex-PSOL, hoje PSB] chegou e falou para mim: ‘Joice, será que você assina?’ Eu falei: ‘agora, agora’.”

Hoje parece que a união ficou só na foto. Em vez de estar mobilizada para encher as ruas de gente, a oposição está rachada. Luiz Henrique Mandetta (DEM) e Simone Tebet (MDB) confirmaram presença nos atos, mas Boulos, Freixo e Ciro Gomes (PDT) ainda estão avaliando, e os petistas dizem que não participarão de uma passeata da direita convocada por um movimento anti-Lula que defendeu o impeachment de Dilma.

Enquanto Kataguiri, fundador do MBL, se esfalfa para atrair mais gente para os atos, uma facção do movimento se recusa a abrir mão da ideia de inflar um enorme Pixuleco na Paulista. Nas redes sociais, petistas e direitistas anti-Bolsonaro se atacam, numa discussão estéril sobre de quem é a culpa pelo resultado da eleição de 2018 e qual seria a manifestação mais legítima contra o presidente da República.

A sensação que dá é que não aprenderam nada com três anos de bolsonarismo. Ou que talvez não queiram tanto assim ver Bolsonaro fora do Palácio do Planalto.

 

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