quarta-feira, 5 de maio de 2021

Vera Magalhães - CPI não pode ser placebo

- O Globo

Não foi à toa que senadores até respiraram aliviados com o atestado que Eduardo Pazuello apresentou para fugir da raia e não depor hoje. A CPI da Covid, se ouvisse o ministro da Saúde responsável pelo maior número de mortes que tivemos até aqui sem nenhum preparo, como se viu nesta terça-feira, ajudaria a narrativa do governo de que não há crime, omissão nem sequer erro na condução dos protocolos de saúde.

Para que não seja um placebo de açúcar, esta CPI precisa urgentemente entender que, sem um corpo técnico consistente, não irá a lugar algum.

Na CPI dos Correios, a última de fato robusta que tivemos no Congresso, e lá já se vão 11 longos anos, a “batcaverna”, como chamávamos a assessoria técnica que carregava o piano, era a área mais frequentada por jornalistas que publicavam as informações exclusivas resultantes de quebras de sigilos, cruzamentos de saques no famoso Banco Rural etc.

Numa investigação sobre pandemia, os técnicos necessários para que os senadores não paguem mico com perguntas sem pé nem cabeça não são os mesmos de CPIs anteriores. Mais que auditores da Receita ou delegados da Polícia Federal, é preciso que presidente, vice e relator requisitem infectologistas, sanitaristas e especialistas em saúde pública e no funcionamento do SUS para auxiliá-los.

Bernardo Mello Franco - Aposta na morte

- O Globo

No primeiro depoimento à CPI, Luiz Henrique Mandetta resumiu a atitude de Jair Bolsonaro na pandemia. Em vez de se guiar pela ciência, o presidente escolheu o caminho do negacionismo. Sabotou as medidas de distanciamento, receitou remédios milagrosos e tapou os ouvidos para as más notícias.

Mandetta evitou o embate direto, mas reforçou a principal suspeita da oposição. No lugar de combater o vírus, o capitão apostou na tese da imunidade de rebanho. Distribuiu cloroquina e mandou a população voltar às ruas antes da chegada da vacina. Foi uma aposta na morte, que ajuda a explicar as mais de 410 mil vidas perdidas até aqui.

Zeina Latif - Haverá apoio para aventuras?

- O Globo

A eleição presidencial está distante, mas contamina o cenário econômico

A eleição presidencial está distante, mas contamina o cenário econômico. Mostra disso é que não cessam as pressões por mais gastos na novela do orçamento, em meio à crescente fragilidade do governo.

Difícil é distinguir o que é fruto da intenção de alavancar Bolsonaro e o que são os interesses paroquiais de parlamentares que reconhecem o risco político de ser aliado do presidente.

Os presidentes que buscam a reeleição costumam ser os favoritos nas corridas eleitorais. Contam com o poder de usar a máquina pública em seu benefício e têm maior potencial de apoio, que se traduz em arrecadação de recursos de campanha e tempo de TV.

Bolsonaro, que ainda procura um partido para chamar de seu, provavelmente não contará com as mesmas vantagens, a depender do cenário de baixa aprovação em 2022. O cacife de um político decorre de sua perspectiva de poder.

Seu ponto de partida é bem menos favorável. A avaliação positiva do governo estava em 30% em meados de março (Datafolha), inferior aos cerca de 42% dos ex-presidentes em período equivalente.

Em termos líquidos, o degrau é maior: -14% (30% menos 44% de ruim/péssimo) ante cerca de +25% dos antecessores. E a aprovação seguiu em queda, segundo a pesquisa Exame-Ideia: 23% para avaliação bom/ótimo no dia 22 de abril ante 27% em 25 de março.

Malu Gaspar - Comandante do Exército trabalha para descolar imagem de Pazuello de militares na CPI da Covid

- O Globo

O Exército vem trabalhando nos últimos dias para impedir que o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello na CPI da Covid prejudique  a reputação da força. O comandante do Exército, general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, conversou sobre o assunto na segunda-feira à noite com o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz.

Nos últimos dias, também fez chegar a Pazuello recados para que o ex-ministro não associasse sua atuação no ministério aos papéis que desempenhou no Exército. Temia-se, inclusive, que Pazuello pudesse comparecer de farda à CPI – o que foi desencorajado nas mensagens enviadas ao ex-ministro.

Pazuello tranquilizou os interlocutores e prometeu ir ao Senado à paisana. Mas o comportamento do ex-ministro nos treinamentos prévios à CPI, no final de semana, deixou os militares preocupados.

Ricardo Noblat - PSD de Kassab terá candidato a presidente na eleição de 2022

- Metrópoles

Ex-prefeito de São Paulo, Kassab quer ver o PSD distante de Bolsonaro e Lula, mas nada que o impeça de conversar com qualquer um dos dois

Poucos metros separam os hotéis onde estão hospedados em Brasília o ex-presidente Lula e o ex-prefeito de São Paulo e presidente do Partido Social Democrático (PSD) Gilberto Kassab.

Nos corredores do Senado, enquanto o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta depunha na CPI da Covid-19, espalhou-se a notícia de que Lula e Kassab tomariam café juntos.

Fake news. Até o início da noite, Lula não havia convidado Kassab para uma conversa ao pé do ouvido. Os dois ficarão em Brasília até amanhã. Mas se convidar, Kassab irá.

“Sou uma pessoa educada e não recusaria o convite de um ex-presidente da República”, disse Kassab a este blog. O que não quer dizer que Kassab admite apoiar Lula na eleição do ano que vem.

Rosângela Bittar - Podem me chamar de ‘05’

- O Estado de S. Paulo

O ministro da Justiça, Anderson Torres, mimetiza a família presidencial

Antes que se pudesse decorar seu nome, o novo ministro da Justiça estreou, no fim de semana, com duas entrevistas recheadas de pérolas do estilo bolsonarista de comunicação confusa. O chamado padrão “00”.

Legítimo exemplar do time em que se notabilizaram Abraham Weintraub e Ernesto Araújo, já substituídos, e os ainda atuantes Ricardo SallesDamares Alves e Milton Ribeiro, o ministro Anderson Torres mimetiza a família presidencial. E escolheu a CPI da Covid para se apresentar.

Como fizera antes dele, com palavras iguais, o senador Flávio “01”, o ministro Torres honrou o espírito negativista do governo. Primeiro, deixou claro que, se Bolsonaro contaminar alguém porque aglomerou sem máscara, a culpa é do contaminado que se aproximou muito dele. Depois, proclamou a inoportunidade da CPI, indiferente ao fato de que ela já está funcionando e começou a ouvir, ontem, os depoimentos de ex-ministros da Saúde. Seria a hora oportuna quando não houvesse crime a apurar e culpados a punir?

Fernando Exman - A CPI entre o eleitor na ponta e o poder central

- Valor Econômico

Relatório deve citar culpados e virar registro histórico

Disse certa vez um experiente parlamentar a seu herdeiro político: “Brasília é um perigo porque é uma bolha. É um equívoco as pessoas acharem que Brasília é real. Em Brasília, nós estamos sempre de passagem. A pessoa não pode achar que é senador e Brasília é eterna. Ela tem que passar aqui três ou quatro dias e voltar para o mundo real toda semana, porque é de lá que a vida real a alimenta. A bolha acaba te retratando uma realidade que difere do que acontece na ponta”.

Esse ensinamento de pai para filho ocorreu num passado longínquo - bem antes de o novo coronavírus surgir, espalhar-se pelo mundo, provocar uma tragédia humanitária e o Senado instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar responsabilidades pela péssima condução do enfrentamento da pandemia no Brasil. E vale ponderar que a capital federal mudou desde então: o aumento da pobreza é perceptível para aqueles que se propõem a observar o que vem ocorrendo nas ruas, mesmo que através dos vidros fumês dos carros oficiais. O Distrito Federal também enfrenta desafios para vacinar seus habitantes.

Ruy Castro - Baratas em pânico

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro tratou os brasileiros como se fôssemos baratas; agora a barata assustada é ele

Certa vez escrevi que a vida de uma barata não valia nada no Brasil. Em pânico, sem ter para onde fugir, elas estavam morrendo em massa por uma campanha de dedetização então em curso por algum governo. De Jair Bolsonaro em diante, a frase precisa ser outra: o que não vale nada é a vida do brasileiro.

Diante de uma pandemia que acabara de surgir e já assombrava o mundo, Bolsonaro classificou-a como uma "gripezinha", que pouparia quem tivesse "histórico de atleta" e só mataria os velhos, o que, segundo ele, não era nada demais. Nos meses seguintes, à medida que a peste se espalhava e o Brasil enterrava pais e avós, Bolsonaro continuou a fomentá-la, exibindo-se sem máscara, promovendo aglomerações e debochando dos mortos e de suas famílias.

Hélio Schwartsman - Suborno vacinal

- Folha de S. Paulo

É ético pagar um indivíduo para fazer o que é melhor

Enquanto a maior parte dos países ainda se esforça para conseguir doses de vacinas contra a Covid-19 para cidadãos ávidos por tomá-las, os EUA já começam a ter de lidar com o problema das pessoas que resistem a imunizar-se. Não é uma questão trivial.

Pelo que leio na imprensa americana, especialistas agora estão dizendo que, diante da resistência vacinal, das variantes, das reinfecções e da porosidade das fronteiras, o mais provável é que jamais antinjamos a famosa imunidade de rebanho —o limiar de indivíduos vacinados ou recuperados a partir do qual o vírus já não conseguiria circular numa dada população.

Isso significa que a doença deve continuar entre nós, causando hospitalizações e mortes —mais ou menos como ocorre com a gripe. O que se espera é que, com a vacinação e revacinações periódicas, consigamos diminuir drasticamente a ocorrência de quadros mais graves, de modo que possamos retomar a normalidade (ainda que com modificações).

Carol Pires - Bolsonaro contra as mulheres

- Folha de S. Paulo

Progressistas precisam se posicionar, pois a linha de ataque do outro lado está formada

Bolsonaro já tem esboçado um projeto de lei que institui o 8 de outubro como Dia Nacional do Nascituro e de Conscientização sobre os Riscos do Aborto. É o prenúncio de uma ofensiva contra direitos arduamente conquistados. E também um aceno aos seus idólatras.

Nos últimos dois anos, foram apresentados 43 projetos de lei no Congresso sobre interrupção voluntária da gravidez —praticamente a mesma quantidade oferecida entre 1995 e 2018. Dos atuais, 11 são de autoria da deputada fluminense Chris Tonietto, do PSL, que dedica seu mandato a cercear o direito das mulheres.

Cristovam Buarque* - O erro é mais profundo

- Correio Braziliense

A partir da década de 1940, o processo histórico brasileiro passou a ser pensado e orientado por economistas. Graças ao pensamento e à influência deles, a mente brasileira adquiriu paixão pelo crescimento econômico. O resultado é uma transformação radical da vida e da paisagem da sociedade brasileira, decorrente da modernidade-técnica. Mas não conseguimos implantar uma modernidade-ética: a pobreza persistiu, apesar do crescimento; o PIB per capita continuou perto do 80º lugar, porque a produtividade não cresceu; cidades se tornaram “monstrópoles”; a renda continuou concentrada; o crescimento econômico esbarrou.

Nos anos 1960, ao perceber as dificuldades para seguir adiante naquela marcha, o país optou por uma ditadura que impôs o caminho, mesmo ao custo de concentrar renda para vender produtos caros, destruir florestas, jogar resíduos em rios, fazer grandes represas que desequilibraram o meio ambiente, substituir as hidrovias e ferrovias por rodovias. Embora por razões morais, alguns economistas se opuseram ao rumo imposto pelos economistas da ditadura, mas o modelo econômico seguia basicamente o rumo definido anteriormente. Não demorou para que a modernidade apressada voltasse a estancar.

Vinicius Torres Freire - Reforma tributária como distração

- Folha de S. Paulo

Governismo relança plano de mudança menor, também para tentar tirar a atenção sobre CPI

Em uma reforma tributária que preste, alguns tipos de empresas vão pagar mais imposto, outras menos, assim como os consumidores de bens e serviços afetados. O objetivo é uniformizar o quanto possível o custo dos tributos. A uniformização de carga tributária por setor ou empresa e a simplificação de normas será tanto maior se incluir impostos centrais para estados (ICMS) e municípios (ISS). Quanto menos uniformizar e simplificar, menos a reforma vai prestar.

As contas dessas perdas e ganhos nem foram detalhadas, embora se estime que serviços como saúde, educação, telecomunicações e serviços profissionais (como advocacia e consultorias, a depender do regime: se não estão no Simples) devam pagar mais, seja na mudança parcial proposta pelo governo seja na mudança geral que vinha sendo analisada pela Comissão Mista do Congresso.

Com dinheiro na mesa, a discussão engrossa. Se houver rolo político anterior mesmo ao debate de quem paga a conta e quanto, o caldo engrossa e entorna. Voltou a entornar nas últimas três semanas e nesta terça-feira (4) escorreu pelo chão.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-SE), que entre outras coisas quer ser o líder-mor do governo no Parlamento, por ora deu fim à Comissão Mista que unificava projetos (de Câmara e Senado) de uma reforma ampla, geral, que trata de todos os impostos relevantes e inclui estados e municípios na mudança. Lira quer tocar a reforma de Paulo Guedes ou do governo, embora Jair Bolsonaro não tenha ideia do que se trata e tende a fazer alguma besteira assim que começar a ouvir queixas de setores afetados. Ainda mais se for relembrado de que, no fim do caminho da reforma de Guedes tem uma espécie de CPMF.

Cristiano Romero - Celso Pinto

- Valor Econômico

Jornalista foi crítico implacável do populismo cambal

Quando os grupos Globo e Folha anunciaram em 1999 parceria para criar um jornal de economia, o Brasil começava a sair do pesadelo que atormentava a todos desde o início daquele ano. Entre nós, jornalistas, havia apenas uma certeza quanto ao matutino, batizado mais tarde de "Valor Econômico" e lançado em 2 de maio do ano 2000: o projeto editorial seria concebido e comandado por Celso Pinto..

O Valor começou a circular num desses momentos de otimismo da economia. Mas, não foi sempre assim. Primeiro plano a realmente suceder no combate à inflação crônica que nos assolava desde o fim da década de 1970, o Real viveu sua primeira grande crise no começo de 1999, após acentuada e desorganizada desvalorização da moeda nacional, lançada havia apenas cinco anos, em relação ao dólar.

Fracassos seguidos dos planos de estabilização de preços forjaram nos brasileiros a sensação de que jamais teríamos inflação baixa. Cidadãos com menos de 40 anos não sabem o que é viver num país onde a inflação de apenas um mês chegou a 82,39% (IPCA em março de 1990) e, num ano, a 2.477,15% (1993). Depois dos reveses dos planos Cruzado I e II (1986), Bresser (1987), Verão (1989) e Collor I e II (1990 e 1991), o Real, lançado em 1º de julho de 1994, quando começou a circular a nova moeda, tornou-se um sopro de esperança.]

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Ventos sopram contra Bolsonaro no Senado

O Globo

O depoimento do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, primeiro na CPI da Covid, foi um prenúncio do que tende a ser um bombardeio contra o governo. Mandetta, que deixou a pasta em 16 de abril de 2020, não tergiversou sobre erros e omissões do presidente Jair Bolsonaro. Disse que, sob seu comando, o ministério seguia numa direção, Bolsonaro noutra. Questionado sobre se esse descompasso contribuíra para que o país superasse os 410 mil mortos, foi direto: “Tem, sim, impacto. O Brasil podia mais, o SUS podia mais, poderíamos estar vacinando desde novembro”.

Mandetta deixou Bolsonaro em maus lençóis em vários momentos. Relatou que o governo tentou mudar a bula da cloroquina para incluir a indicação em casos de Covid-19, uma aberração médica, científica e ética. Inúmeros estudos comprovam que a droga é ineficaz contra o novo coronavírus e pode causar efeitos colaterais graves. Felizmente, a sandice não prosperou. Chamou de “kit ilusão” as drogas sem eficácia distribuídas pelo governo, entre elas a cloroquina, obsessão particular de Bolsonaro.

Mandetta disse ainda que alertara Bolsonaro para a gravidade da pandemia, apresentando três cenários traçados para dezembro de 2020, com entre 30 mil e 180 mil mortos. Entregou à CPI a carta que endereçou a Bolsonaro em 28 de março de 2020, quando o país somava 114 mortos: “Recomendamos, expressamente, que a Presidência da República reveja o posicionamento adotado, acompanhando as recomendações do Ministério da Saúde, uma vez que a adoção de medidas em sentido contrário poderá gerar colapso no sistema de saúde e gravíssimas consequências à saúde da população”. Três dias depois, Bolsonaro ignorou o alerta e, sem máscara, participou de uma das várias aglomerações que provocaria.

Poesia | Fernando Pessoa – O amor

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...