segunda-feira, 12 de julho de 2021

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

“A coalizão responsável pela vitória eleitoral de Bolsonaro, embora não disfarce seu mal-estar com o estilo truculento e grosseiro na presidência da República, segue perfilada a ele em razão de encontrar nele as possibilidades de realização do seu antigo projeto de submeter a sociedade à lógica de um capitalismo sem freios sociais e políticos. No caso, é preciso corrigir a postura dos que concebem o Centrão como um setor inarticulado de políticos à deriva, disponíveis a quem os agraciar com benesses e prebendas. Na verdade, bem mais que isso, esse bizarro agrupamento político é constituído por setores retardatários do capitalismo brasileiro que visam sua conversão, pelas vias do Estado, em potentes players do mundo dos negócios, como ilustra, entre tantos outros, a trajetória de Ricardo Barros, expoente do Centrão, líder do governo na Câmara dos Deputados que descobriu o filão da indústria de medicamentos quando esteve à testa do Ministério da Saúde”

*Luiz Werneck Vianna, Sociólogo, PUC-Rio. “A pergunta que não quer calar”, Blog Democracia Política e novo Reformismo, 10/7/2021

Fernando Gabeira - Sem medo de militares

O Globo

São tempos duros, talvez os mais difíceis, porque conjugam o devastador governo Bolsonaro com uma terrível pandemia.

Consegui sobreviver, trabalhando diariamente. Por volta das 20h, quando cessam minhas tarefas, como um sanduíche e vou-me embora do Brasil. Através dos livros e documentários, percorri outros países e épocas. Acompanhei a crise dos anos 20 na Europa e a efervescência intelectual do continente. Vi conferências, como a de Max Weber, em Munique, sobre a ciência. Aprendi a respeitá-la, mas também a reconhecer seus limites, definidos por Tolstói: “Quem somos nós, o que devemos fazer?”. Uma pergunta que nem a ciência nem a política respondem. Nada nos alivia da decisão de como viver nossa vida.

No entanto, em tempos de pandemia, a ciência pode evitar nossa morte. Por isso tornou-se o farol em tempos de obscurantismo sanitário.

Percorri de novo os horrores do nazismo, da colonização europeia na África, as histórias de mutilações que os belgas levaram ao Congo, o coração das trevas, descrito por Conrad.

Acompanhei, dentro dos detalhes possíveis, o romance de um intelectual seduzido pelo nazismo e uma judia. Ele, acreditando que a morte é a realidade que faz o humano; ela, afirmando que é o fluxo de renascimento que nos define.

Carlos Pereira* - Quem ‘merece’ um impeachment?

O Estado de S. Paulo

Gravidade das irregularidades tem importância menor que a falta de apoio político no Congresso e na sociedade

Alguns argumentam que o fato de o Brasil, em pouco mais de 30 anos, já ter abreviado, por meio de impeachments, o mandato de dois presidentes legitimamente eleitos e existir o potencial risco de um terceiro nos próximos meses seria um sinal de que algo não vai bem na democracia brasileira.

Alega-se que um impeachment acentuaria a polarização política... aumentaria o conflito entre partidos... desenvolveria a sensação de crise política permanente e generalizada... chegaria a criar desconfiança nas próprias regras do jogo democrático.

Diferentemente de regimes parlamentaristas, que dispõem de mecanismos flexíveis de término antecipado de governos, como o voto de não-confiança ou mesmo a perda de maioria parlamentar pela saída de parceiros da coalizão governista, presidencialismos não possuem outros mecanismos capazes de quebrar a rigidez de mandato presidencial além do impeachment.

Sem contar os 130 pedidos de impeachment já submetidos a Câmara dos Deputados contra Bolsonaro, já ocorreram 193 pedidos durante o período de 1990 e 2018 no Brasil. Ou seja, somente um pouco mais de 1% dos pedidos foram de fato efetivados.

Como demonstra Mariana Llanos e Anibal Perez-Linán no artigo Oversight or representation? Public Opinion and Impeachment Resolutions in Argentina and Brazil, esta marca é muito inferior às democracias parlamentaristas avançadas onde 5% dos votos de não-confiança iniciados levaram de fato a queda antecipada de seus governos.

Antonio Claudio Mariz de Oliveira* - Decisão necessária versus omissão criminosa

O Estado de S. Paulo

Sr. presidente da Câmara, não passe à História como cúmplice do pior governo

O homem, quando se vê diante de uma situação que o obrigue a tomar uma decisão, ou a toma ou simplesmente se omite. É evidente que se optar por agir sua ação trará consequências. No entanto, também a omissão provocará repercussões, que vão variar de acordo com a motivação de sua inércia. Aliás, há momentos em que a inércia é mais marcante e traz um maior estigma do que a decisão mesmo que errada. No caso, ela constitui crime de lesa-pátria.

A inércia adotada no caso do impeachment do atual presidente da República está sendo colocada como uma prerrogativa do presidente da Câmara dos Deputados. Ele se apoia no Regimento Interno da Casa, que lhe dá, sem consignar prazo, a possibilidade de dar seguimento ou engavetar pedidos de impedimento, como vem fazendo.

Diz ele que o regimento não o obriga a submeter os requerimentos à apreciação da Câmara, pois não há prazo para a apreciação da respectiva postulação. Realmente, não há nas normas regimentais a consignação de prazo para as providências decorrentes de um pedido. Mas a inexistência de um lapso temporal não o autoriza a engavetar os pedidos.

A norma regimental omissa cede ao civismo e ao compromisso que assumiu com a Nação quando recebeu um mandato parlamentar, outorgado por quem o elegeu.

Demétrio Magnoli - Duas estratégias diante do vírus

O Globo

O governo de Boris Johnson anunciou o “Dia da Liberdade”, 19 de julho, quando caem as restrições sanitárias internas. O Reino Unido tem elevadas taxas de óbitos acumulados (188 por 100 mil habitantes) e de imunização completa (superior a 50%). Simultaneamente, a Austrália estendeu mais um lockdown na Grande Sydney, e a Nova Zelândia suspendeu a bolha de viagens que conecta os dois países. As duas nações da Oceania têm baixas taxas de óbitos acumulados (menos de 4 por 100 mil) e de imunização (inferiores a 11%). “Conviver com o vírus”, como escolheram os britânicos, ou “Covid Zero”, como pregam australianos e kiwis?

“Países diferentes fazem escolhas diferentes”, declarou a primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern. Seu compatriota, o epidemiologista Michael Baker, falou em outro tom: “Sempre temos de ser céticos sobre aprender lições de países que fracassaram rotundamente”. Segundo os arautos da estratégia “Covid Zero”, os países da Europa “fracassaram rotundamente”, pois não evitaram a disseminação do coronavírus. O julgamento, porém, é menos óbvio do que sugerem as taxas de óbitos.

Ricardo Noblat - Bolsonaro ouve conselhos, mas não garante segui-los

Blog do Noblat / Metrópoles

Você acredita que o presidente conseguirá se reinventar? Ou continuará o que é até o fim do seu mandato?

Quantas vezes você não ouviu ou leu que o presidente Jair Bolsonaro, depois de mais uma diarreia verborrágica, agora refluiria para nunca mais atacar adversários e instituições da República como o Congresso e a Justiça? Devem ter sido muitas.

Pois auxiliares de Bolsonaro afirmam ter ouvido que ele assim procederá doravante. Bolsonaro admite que se excedeu ao chamar senadores da CPI da Covid-19 de bandidos, atacar ministros do Supremo Tribunal Federal e usar a expressão “caguei”.

Sua situação vai de mal a pior a estarem certas todas as pesquisas de intenção de voto aplicadas de janeiro para cá. Ela só se agrava desde que a CPI foi instalada e, quanto a isso, não haverá muito que fazer. O prazo para que a CPI chegue ao fim será prorrogado.

A batalha da opinião pública já foi perdida. Por larga maioria, os brasileiros acreditam que houve corrupção na compra de vacinas para combater o coronavírus, e que Bolsonaro sabia disso. Mais provas por vir deverão incriminá-lo. Fazer o quê?

Marcus André Melo* - Pandemia e popularidade

Folha de S. Paulo

Três explicações sobre o impacto da pandemia sobre os governos

Há três explicações rivais sobre o impacto da pandemia sobre a política. Na primeira, a expectativa é que os governantes se beneficiem; na segunda, que tenham perdas; na terceira, o resultado seria condicional.

A primeira das explicações é corolário da tese de que situações excepcionais —guerras, terremotos— produzem incentivos à cooperação, com os governantes visando um bem coletivo maior. Esse resultado, conhecido na literatura como "rally round the flag" (todos em volta da bandeira), no entanto, apresenta pouco poder explicativo para a longa pandemia da Covid. O efeito previsto tende a ser de curto prazo, o que já foi detectado em várias pesquisas. Bolsonaro foi um dos poucos que não se beneficiaram no curto prazo.

A segunda explicação é que calamidades impactam negativamente a avaliação de governantes mesmo quando não seja razoável lhes atribuir responsabilidades por elas. A análise clássica da literatura é o efeito dos ataques de tubarões nas eleições presidenciais de 2016 em Nova Jersey, nos EUA. O eleitorado parecia punir os seus representantes em um movimento de "responsabilização cega".

Celso Rocha de Barros – O golpe é para roubar

Folha de S. Paulo

Ao atacar presidente da CPI, Forças sinalizam que protegerão seus corruptos

Jair Bolsonaro disse que ou a eleição de 2022 vai ter voto impresso ou ela não vai acontecer. As Forças Armadas e todas as outras instituições da República deveriam ter publicado uma nota conjunta dizendo: “Jair, se der golpe, vai morrer. Abs.” Não publicaram.

Ao invés disso, na semana passada comandantes militares ameaçaram dar um golpe de Estado caso a CPI continue a investigar oficiais bolsonaristas que roubaram dinheiro de vacina.

Pelo menos a turma de 64 tinha a decência de mentir que o golpe deles era para combater a corrupção. Era uma época em que o vício ainda prestava homenagem à virtude.

A CPI da pandemia já achou indícios fortes de que existem militares e ex-militares bolsonaristas enrolados no escândalo do roubo de dinheiro de vacina.

Ruy Castro - Espirro em público

Folha de S. Paulo

Cuidado! De repente, na padaria, sem esperar e sem querer, você se torna uma ameaça sanitária

Bivacinado e de máscara dupla, dei-me outro dia o prêmio de um pulo a uma padaria do Leblon em busca de alguns frios e queijos. De repente, na fila do caixa, veio-me a vontade de espirrar. E, se você já espirrou na vida, sabe como é. Nenhum espirro é um simples espirro. Começa por uma comichão no nariz, anunciando algo que emana das profundas e vai irromper queira você ou não. É algo que não leva mais que três segundos, mas, como nos parece vir em câmera lenta, achamos que dura muito mais. E, deflagrado o processo, exatamente como numa ejaculação, não há nada a fazer a não ser relaxar e deixá-lo vir. Dá-se então, saindo de você, um rugido de Stromboli, Vesúvio, Krakatoa.

O problema é que é quase impossível espirrar em segredo. Por perto há sempre alguém que, ao nos ver aflitos e levando as mãos ao rosto, sabe o que vai acontecer. E, mesmo que o espirro respeite os protocolos da pandemia, o fulano se prepara para se proteger. Mas outros são apanhados de surpresa. Para piorar, um espirro abafado por uma máscara emite um som que, mesmo lembrando um ronco produzido por uma tuba, muda apenas de atchim para atchê ou coisa assim.

Bruno Carazza* - Por que escolhemos os piores?

Valor Econômico

Reforma eleitoral merece maior atenção

Em 2008 a prefeitura de Belo Horizonte realizou uma licitação para a concessão dos serviços de transporte coletivo para os próximos 20 anos. Entre as regras da disputa, havia uma série de requisitos técnicos definidos para, supostamente, filtrar apenas as empresas que possuíssem capacidade financeira e operacional para exercer a atividade com qualidade e segurança. Mas o diabo mora nos detalhes, como diz o chiste comumente atribuída ao arquiteto Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969).

O inciso VI do item 8.3.5.1 do edital estabelecia que, para participar do leilão, os interessados deveriam comprovar a disponibilidade de imóveis para abrigarem as garagens dos ônibus a serem utilizados durante a vigência do contrato. O prazo para o atendimento dessa condição era exíguo (a licitação seria realizada em 60 dias), e dada a escassez de terrenos numa cidade do porte de Belo Horizonte, poucas empresas apareceram para o certame. Não por acaso, apenas as concessionárias que já prestavam o serviço apresentaram propostas - as mesmas que, há três gerações, controlam o transporte coletivo na capital mineira.

Seja nas licitações públicas ou nos processos seletivos de empresas, os critérios condicionam as escolhas. E na política não é diferente.

Assis Moreira - Taxação verde e as boas intenções

Valor Econômico

Europa quer dar o tom da descarbonização

Em Veneza, cidade-monumento ameaçada de ser tragada pela progressiva elevação nos níveis do mar, em consequência do aquecimento do planeta, os ministros de finanças das maiores economias desenvolvidas e emergentes, que formam o G20, falaram - e muito mesmo - de mudança climática e taxação.

Pela primeira vez na história desse grupo central na governança econômica global, os ministros mencionaram em comunicado final, no sábado, o preço do carbono como um instrumento possível na luta contra a mudança climática e perda de biodiversidade e para proteção do meio-ambiente.

Aplicar um preço nas emissões de CO2 é considerado por especialistas como um dos mecanismos fortes para fazer os poluidores pagarem pelos estragos que causam, e incitar produtores e consumidores a mudar de comportamento. À medida em que o preço do carbono aumenta, as tecnologias verdes serão mais e mais utilizadas.

Uma drástica redução das emissões de gases de efeito estufa requer preço do carbono de pelo menos US$ 75 por tonelada - e o preço médio, onde isso existe, é de US$ 3 hoje, segundo dados apresentados em evento do G20.

Luiz Carlos Mendonça de Barros* - O FMI veio ao socorro do Brasil mais uma vez

Valor Econômico

Projeção do FMI de déficit fiscal de 1,7% do PIB neste ano é um resultado exitoso

Assisti durante minha vida profissional várias vezes o Fundo Monetário Internacional - o terrível FMI da minha adolescência - ser chamado a ajudar o Brasil a sair de uma crise financeira grave. Em uma delas fiz parte da equipe que foi a Nova York revelar ao sistema bancário internacional que iríamos parar de pagar nossa dívida externa. Era a então eufórica moratória externa do presidente José Sarney.

Mas agora é a primeira vez que vejo o FMI voluntariamente vir ajudar o Brasil a enfrentar a crise de confiança em nossas contas fiscais sob pesadas acusações dos segmentos mais liberais de nossa ”intelligentsia” econômica.

Na última quinta-feira, o jornal Valor Econômico trouxe a seguinte manchete “FMI projeta déficit primário de 1,7% do PIB em 2021 e a volta de superávit em 2024”. Em meio ao intenso debate que vem ocorrendo no mercado financeiro, a manchete do Valor representa um verdadeiro resgate de confiança da nossa situação fiscal. Em outras palavras, suas declarações mostram que estamos muito longe da situação de catástrofe - cujo título mais sofisticado é Dominância Fiscal - que um grande número de economistas do mercado diz já existir.

Mirtes Cordeiro* - O “brado” do medo e da covardia

Falou & Disse

Que chegue logo o amanhecer!

Numa atitude de desespero mais nefasta do que outras já praticadas, o presidente bradou: “Caguei”.

O dicionário da língua portuguesa é vasto quando se refere ao vocábulo “Caguei”, arremessado pelo presidente da República contra a CPI da Covid, instrumento do Congresso Nacional encarregado de investigar a responsabilidade pelas irregularidades cometidas durante a pandemia, culminando até agora com mais de 530 mil mortos.

O vocábulo tem vários significados, mas prefiro citar os mais sugestivos para a ocasião: 1 – sujar-se com as próprias fezes e, 2 – ter medo. Um está relacionado ao outro, quando o governo nada tem a expor sobre as promessas mirabolantes que apresentou em campanha eleitoral e agora se dá conta que o mar não está para peixe, ou seja, a situação pela qual passa o país já não permite que o lixo seja jogado para debaixo do tapete e que as tentativas de manipulação das instituições democráticas prevaleçam.

É o que aparece na mídia com os trabalhos da Comissão Paramentar de Inquérito, evidenciando que a rede de pescaria movida pela corrupção foi jogada no Ministério da Saúde. É também o que anunciam os resultados das pesquisas realizadas a cada semana, com a manifestação da opinião pública sobre os transtornos provocados pelo governo.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Muito mais do que apenas desgoverno

O Estado de S. Paulo

A CPI da Pandemia convidou um grupo de juristas para estudar quais crimes podem ser imputados ao presidente Jair Bolsonaro por suas ações e omissões na condução do País durante a emergência sanitária. A rigor, o principal trabalho deste grupo de notáveis será dar um enquadramento jurídico-penal ao sobejamente conhecido comportamento de Bolsonaro como chefe de Estado e de governo no curso da maior tragédia que se abateu sobre a Nação em mais de um século.

É evidente que o Brasil não seria o único país do mundo a ser poupado dos efeitos devastadores de uma pandemia como a que ora aflige todos, mas tampouco mais de meio milhão de mortos representam o que seria o “curso natural” da peste entre nós. Houve esforços para que se chegasse a este funesto resultado.

“Precisamos de uma avaliação jurídica mais aprofundada sobre o enquadramento típico da conduta do presidente da República”, afirmou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), autor do requerimento de formação do grupo. “Até tenho minha opinião sobre os tipos legais que se aplicam, mas é oportuno buscar um respaldo maior.”

O grupo de juristas, coordenado por Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça e professor titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), é composto pelos advogados Helena Lobo da Costa e Alexandre Wunderlich, além da juíza Sylvia Steiner, que integrou o Tribunal Penal Internacional. Os advogados Salo de Carvalho e Davi Tangerino deixaram o grupo por “conflito de interesses”.