segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Marcus André Melo* - Ditadura do Judiciário?

Folha de S. Paulo

A hipérbole de abuso judicial sistêmico é ideia fora de lugar

Atribuída à Rui Barbosa, a afirmação de que a pior forma de ditadura é aquela exercida pelo poder Judiciário é repetida sem que, aparentemente, ele a tenha proferido. E mais: sem que ela seja consistente com sua visão das instituições. A expressão não faz sentido histórica ou conceitualmente; salvo como hipérbole para algum ativismo judicial e desacertos.

O agente do abuso do poder nos sistemas políticos modernos é o ocupante do Executivo, e em algumas raras situações, os corpos legislativos. Nos sistemas políticos pré-modernos —regimes sultanísticos e autocracias dinásticas— há uma indiferenciação de poderes; neles “ditadura togada” sequer faria sentido. Nas democracias, o abuso —quando ocorreu e produziu degeneração— deveu-se invariavelmente à usurpação pelo Executivo de funções judiciárias e legislativas.

Celso Rocha de Barros - Temer pode minar o impeachment

Folha de S. Paulo

Se acordão prosperar, não teremos de volta democracia saudável

Max Weber diria que “instituições são coisas que mandam Bolsonaro pra cadeia quando ele é pego em flagrante tentando golpe de Estado”. Ainda segundo o autor de “Economia e Sociedade”, “o resto são aqueles velhos puteiros de Copacabana em que policial corrupto negociava suborno com o tráfico”.

Douglass North, fundador do paradigma institucionalista na economia, celebremente teria dito, em seu discurso de aceitação do Nobel de 1993, que “se não prender o Jair em flagrante não é instituição, é coisa de corno”.

No final da noite de terça-feira, o Brasil inteiro tinha visto Bolsonaro tentando o golpe. Ninguém na imprensa se referiu ao golpismo como qualquer outra coisa. A esquerda, o centro e a direita, o mercado financeiro e o PSTU, a maioria que torcia contra e a minoria que torcia a favor, todos reconheceram facilmente o que viam com seus próprios olhos. Os caminhoneiros desolados diziam abertamente que foram chamados ali para dar um golpe e o golpe não veio.

Gaudêncio Torquato* - Como andará o humor do homem das ruas em 2022?

Folha de S. Paulo

Prevalecerão os melancólicos, cuja inibição se sobrepõe à excitação?

Uma simples interpretação sobre o comportamento dos instintos básicos do ser humano no campo da política induz à conclusão: a reeleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República dependerá do sucesso do eleitor em sua luta pela sobrevivência.

Implica, portanto, considerar os dois fatores básicos responsáveis pela conservação do indivíduo; o impulso combativo, que leva a pessoa a batalhar pela vida, enfrentando ameaças e buscando os meios mais adequados para resistir às intempéries, e o impulso nutritivo.

Este último responde pelas necessidades fisiológicas de alimentação, sem a qual o ser humano é condenado à inanição. Pois bem, postas as duas alavancas de sobrevivência, puxemos as duas frentes que balizam a situação do governo Bolsonaro: a pandemia, que exibe um rastro da má gestão, com quase 600 mil pessoas mortas no país e mais de 20 milhões de contaminados pelo coronavírus; e a economia, cuja fraqueza envolve o eleitor na seguinte equação: “bo+ba+co+ca” —ou seja, “bolso cheio”, “barriga satisfeita”, “coração agradecido” e “cabeça” propensa a votar em quem proporcionou a equação. A recíproca, barriga roncando de fome, levará ao desastre político do protagonista.

Denis Lerrer Rosenfield* - Temer e Bolsonaro

O Estado de S. Paulo

Qual será a lealdade do atual presidente: ao País ou aos seus seguidores mais empedernidos?

O surpreendente convite do presidente Bolsonaro ao ex-presidente Michel Temer para uma reunião no Palácio do Planalto, da qual resultou um documento da maior importância, pode tanto configurar uma inflexão do atual governo como uma trégua momentânea para reduzir os perigos de uma crise institucional. Inflexão no caso de o presidente Bolsonaro optar por governar, afastando o fantasma, cada vez mais presente, do impeachment, ou trégua visando a agrupar as suas forças para um novo assalto.

Tudo distingue o atual presidente do anterior. O atual é uma pessoa belicosa à procura incessante de conflitos. É como se fosse uma criança que, ao se levantar, se pergunta com quem vai brigar naquele dia. Seus dois anos e meio de governo foram caracterizados por embates sucessivos, sempre procurando criar um problema e potencializar um conflito. O anterior é uma pessoa calma, fidalgal, que se caracteriza pelo diálogo e pelo espírito de conciliação. Em seu governo, se via um problema, sempre procurava equacioná-lo num clima de pacificação. Nada os aproxima em termos de caráter, porém é aqui significativo que o presidente Bolsonaro tenha procurado o diálogo precisamente com ele. Foi uma atitude corajosa.

Carlos Melo* - Manifestações ficam aquém do potencial

O Estado de S. Paulo

A manifestação marca o descontentamento de boa parte da população, mas ficou aquém do potencial do antibolsonarismo. Sem ser gigante, não se configurou num marco na direção do impeachment. Vetos múltiplos, e a incompreensão de que se luta uma luta por vez, normalmente, somam zero.

A ausência de lideranças capazes de fechar feridas comprometeu o potencial do protesto e gerou desconfortos com o resultado. O grito retumbante do antibolsonarismo, hoje maior força política do País, ainda não foi dado.

Marcelo de Moraes - Palanque plural é boa notícia, mas faltou povo na rua

O Estado de S. Paulo

Abaixa mobilização popular nas manifestações feitas ontem pela oposição é um motivo de preocupação para seus participantes. Mesmo com as divergências amplamente conhecidas que afastaram partidos de esquerda, como PT e PSOL, do protesto, havia uma expectativa que os palanques da oposição pudessem estar bem mais cheios. Na prática, somente a manifestação de São Paulo teve presença razoável de apoiadores e, mesmo assim, ficou aquém do que se esperava.

Mas, na política, muitas vezes dá para se enxergar o meio copo vazio ou o meio copo cheio. E a boa notícia para a oposição neste fim de semana é o fato de terem reunido no mesmo palanque políticos tão diferentes – e importantes eleitoralmente – quanto Ciro Gomes, João Doria, Luiz Henrique Mandetta, Simone Tebet, Alessandro Vieira e João Amoêdo, entre outros. O palanque plural é um importante ponto de partida para que as forças que convergem na oposição ao presidente comecem a alinhar suas diferenças e afinar no que pode ser até uma candidatura presidencial única em 2022.

Mirtes Cordeiro* - Meia volta, volver!

 

Falou & Disse

Muitos apoiadores acham que o STF deve ser fechado porque querem prender os filhos do presidente; outros pensam que devem combater o comunismo, mas sequer sabem o significado da palavra.

“Insulto não é argumento. Ofensa não é Coragem. A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo”, ressaltou Luís Roberto  Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“É crime de responsabilidade”, bradou o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, contra o que poderia parecer mais uma arruaça.

Deu errado! Amanheceu o dia seguinte (08 de setembro) e Bolsonaro pediu novamente socorro ao ex-presidente Temer, que lá chegando – em Brasília – ‘arrolhou’, como diria o matuto. Com sua retórica de jurista e constitucionalista, Temer enquadrou Bolsonaro, que acabou assinando uma carta por muitos vista como de rendição, de recuo, como forma de tentar afastar a ameaça de impeachment que ganhou ainda mais força com os acontecimentos de 7 de Setembro.

Conta a história que em 1999 Bolsonaro já havia se socorrido da ajuda de Temer, então presidente da Câmara, para evitar sua cassação quando defendeu publicamente o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso, o que revela a existência de um documento com retratação anterior a este, também escrito pelo próprio Temer.

“Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar”, assinou Bolsonaro em sua Declaração à Nação.

Ninguém acreditou. Nem seus apoiadores, nem a maioria da população já cansada dos insultos diários. Pareceu mais uma crise de pânico… medo do impeachment…

Estamos na semana da ressaca… uma coisa parecida com o que deveria ser o que restou do juízo final. Afinal de contas, vivenciamos um mês de ameaças e convocação, pelo presidente da República, para o que seria o ajuste de contas com o STF e com o comunismo, mas são várias as interpretações diferentes, expressadas pelos convocados.

Muitos apoiadores acham que o STF deve ser fechado porque querem prender os filhos do presidente; outros pensam que devem combater o comunismo, mas sequer sabem o significado da palavra.

Bruno Carazza* - Dinheiro, política e democracia

Valor Econômico

Pesquisa revela o que o brasileiro pensa sobre o lobby

Existem diversas hipóteses para explicar a instabilidade política e o baixo crescimento econômico, fenômenos crônicos de nossa história, uma delas é nossa incrível capacidade de não extrair lições a cada crise que abala o país. Enquanto dissipamos nossa energia cívica em disputas ideológicas e eleitorais perdemos oportunidades de aperfeiçoar nossas instituições, até que um outro escândalo nos engolfa novamente.

Na última sexta-feira (10/09), o ministro da Justiça, Anderson Torres, reuniu-se em São Paulo com a diretoria da Federação Nacional dos Bancos, a Febraban. A justificativa oficial dada pela instituição foi que o objetivo era “iniciar tratativas para criação da Estratégia Nacional de Combate ao Crime Cibernético”. Difícil acreditar.

Anunciado poucas horas antes, o encontro se deu no dia seguinte às manobras de Michel Temer para acalmar o presidente (e o mercado) - e é bom lembrar que a Febraban havia rachado a respeito dos atos de Sete de Setembro insuflados por Bolsonaro. Contudo, provavelmente nunca saberemos o que exatamente foi tratado entre o ministro e os banqueiros, pois a reunião foi realizada a portas fechadas, sem a presença da imprensa.

Alex Ribeiro - A taxa Selic vai voltar para os dois dígitos?

Valor Econômico

Projeção de inflação do Copom vai dar parâmetro para juro

Os dois últimos índices mensais de inflação, mais salgados do que o esperado, provocaram uma boa puxada nos juros negociados no mercado financeiro. Alguns analistas econômicos já mencionam a hipótese de a taxa Selic voltar aos dois dígitos, algo que não acontece desde 2017. Seria um exagero?

Esse movimento foi alimentado pelo próprio Banco Central, para recompor o pedaço de sua credibilidade que havia perdido no começo do ciclo de aperto, quando sinalizou que iria retirar apenas parte dos estímulos monetários. O discurso do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC é que vai levar a taxa básica para o campo restritivo e que vai fazer o que for preciso para cumprir as metas de inflação.

Fernando Gabeira - Pintando o sete

O Globo

Escrevo com antecedência habitual num hotel da Bahia. É perigoso escrever com alguma antecedência no Brasil. Segunda-feira nunca se sabe o que será.

Bolsonaro sequestrou o 7 de Setembro, transformando uma data nacional num evento partidário. Confesso que hesitei sobre o tema da semana passada. Pensei em escrever algo sobre como escapar dos primeiros efeitos do golpe de Estado.

Infelizmente, é essa a minha experiência. Gostaria de transmitir algo sobre reaproveitamento de alimentos ou como fazer móveis em casa. Mas o que retive foi como escapar nos primeiros e confusos momentos de um golpe.

Optei por uma outra análise e escrevi que tudo acabaria na quarta-feira. Esqueci que, no carnaval, alguns blocos resilientes saem às ruas mesmo com as cinzas.

Foi assim que vi os caminhoneiros nos 20 bloqueios pelos quais passei até chegar aqui. Eles não sabiam que tudo acabou. No Sul da Bahia, vi dois deles sentados no para-choque e pensei naquele soldado japonês que passou anos sem saber que a guerra acabara.

De fato, não acabou totalmente. Mas era evidente que Bolsonaro não tinha nada de durável a propor. Quando anunciou que reuniria o Conselho da República para mostrar a foto da multidão, era evidente que estava perdido.

Miguel de Almeida - Bozo, o pé-frio

O Globo

A foto mais impressionante do 7 de Setembro golpista não foi a da mirrada multidão na Paulista — os 125 mil tiozinhos são um dízimo perto dos 3 milhões da Parada Gay de 2019. Longe dali, na Praia de Copacabana, o mais chocante registro trazia o inefável Fabrício Queiroz tirando selfies com fãs.

Selfies com Queiroz!

A degradação dos militantes forjados nas redes sociais aos poucos constitui seu panteão agônico, numa galeria com Sara Giromini, Roberto Jefferson e Daniel Silveira. E, agora, o acovardado Zé Trovão.

Em comum entre eles, as grades e as tornozeleiras. Com exceção do Queiroz, todos covardemente abandonados pelo Bozo no campo de batalha. Um general não deixa seus soldados ao léu. Para a turma alimentada via Pix (até Alexandre de Moraes interromper o fluxo), não ocorreu que acendem vela para um prosaico capitão reformado — antes um tenente que planejou ato terrorista.

Obnubilados pelos tuítes, assombrados pela sintaxe bozofrênica, mesmo sendo abatidos como moscas, ainda não se deram conta de ter amarrado seus burros a um tremendo pé-frio. Soubesse distinguir o dedo mindinho do polegar, ou mesmo altura de comprimento, uma dedicada militante como a zureta da Carla Zambelli logo identificaria o Capitão Urucubaca.

Irapuã Santana - Dois protestos, um país

O Globo

Como se já não tivesse muita coisa com que lidar no seu dia a dia, o brasileiro se vê no meio de um turbilhão político.

No dia 7 de setembro, muita gente saiu às ruas em apoio ao presidente Jair Bolsonaro e às suas pautas contra o STF e a esquerda.

De outro lado, foi organizada uma manifestação pedindo o impeachment do nosso chefe de Estado. Mano Ferreira, diretor de comunicação da associação Livres, afirma que Bolsonaro gabaritou a lei de crime de responsabilidade e que precisa sair do cargo para o bem do país.

É preciso deixar claro, neste primeiro momento, que os fundamentos sobre os quais foram construídos os dois movimentos estão cobertos pela liberdade de expressão. O próprio STF já se posicionou a esse respeito, quando do julgamento da Marcha da Maconha.

Antônio Gois - Estresse institucional

O Globo

A política do confronto permanente praticada pelo governo Bolsonaro vem testando nossas instituições democráticas à exaustão. Enquanto problemas reais se acumulam – desemprego, inflação, crise energética... -, nossas energias foram sugadas na semana passada para agendas que em nada dialogam com as prioridades urgentes do país. Esse modus operandi não se restringe apenas à política. Em maior ou menor grau, está em todas as áreas, inclusive na educação.

Um pequeno exemplo do desgaste que essa postura traz pôde ser visto no debate a respeito da isenção de taxa no Enem para candidatos que haviam faltado ao exame de 2020, ocorrido ainda em período intenso da pandemia. Apesar do pleito de secretários, parlamentares, estudantes e movimentos da sociedade civil, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, vetou a possibilidade de gratuidade aos alunos que, segundo ele, “deram de ombro” ao Enem passado.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Senado tem de tirar excrescências do Código Eleitoral

O Globo

Não há como deixar de reconhecer os danos trazidos pela aprovação na Câmara do Novo Código Eleitoral. Na versão que passou pelo plenário, o projeto tem 898 artigos misturando dúzias de temas distintos. Passou por uma tramitação a jato, impedindo a discussão aprofundada que cada um mereceria. O motivo para a correria é a necessidade de aprovar tudo até outubro, para que as mudanças passem a valer já nas eleições de 2022.

Nas votações de destaques que ainda restam na Câmara e no trâmite pelo Senado será fundamental conter os danos, evitando que passem mudanças que resultem na piora evidente da qualidade da nossa democracia. As principais que os senadores deveriam barrar são: restrição a pesquisas, enfraquecimento da Lei da Ficha Limpa, limitações impostas à ação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), critérios mais frouxos para gastos com o fundo partidário, para a aprovação das contas de campanha e multas reduzidas em caso de reprovação.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - A Palavra

Já não quero dicionários
consultados em vão.
Quero só a palavra
que nunca estará neles
nem se pode inventar.
Que resumiria o mundo
e o substituiria.
Mais sol do que o sol,
dentro da qual vivêssemos
todos em comunhão,
mudos,
saboreando-a.