sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Vinicius Torres Freire – Bolsonaro e o nojo dos pobres

Folha de S. Paulo

Bolsa Família mais gordo é uma batalha política final para Bolsonaro

O aumento do Bolsa Família deve ser a grande batalha da contraofensiva de Jair Bolsonaro. Grande e talvez última, no universo das providências racionais, pois se sabe que o tipo pode muito bem apelar para a explosão de alguma bomba no país.

Não se tem dado a devida atenção ao confronto, pois os “formadores de opinião” ou “influencers” não ligam muito para pobres e talvez porque, no caso, a conversa envolva uma solução para os precatórios que não derrube o teto de gastos ou o avacalhe em excesso. Só de ouvir as palavras “precatório” e “teto” as pessoas comuns caem no torpor único do enfado. No entanto, essa decisão deve definir o ambiente socioeconômico e político em que Bolsonaro e seus apaniguados no Congresso devem dar as próximas tacadas.

O prestígio de Bolsonaro foi talhado porque perdeu o apoio dos mais pobres, como é meio óbvio em um país de pobreza bem piorada pela desigualdade, como o Brasil. A diferença maior é que quase qualquer outro governante, pelo menos um com características parecidas com a da humanidade média, poderia ter algum outro recurso de convencimento e simpatia: esperança, caridade, uma tentativa mínima de governar.

O pico da popularidade de Bolsonaro foi em dezembro de 2020, segundo as pesquisas do Datafolha. Tinha 37% de nota “ótimo ou bom” e 32% de “ruim ou péssimo”. Entre os mais pobres, pessoas de famílias com renda de dois salários mínimos ou menos, era mais ou menos a mesma coisa: 37% de aprovação, 27% de desaprovação. No Datafolha desta semana, 17% dos pobres aprovavam o governo; 52% desaprovavam. Entre os mais “ricos” (renda familiar igual ou maior do que dez salários mínimos), ficou na mesma.

Bruno Boghossian – A conta da inflação chegou

Folha de S. Paulo

Aprovação ao presidente entre os mais pobres vai a 17%, menor índice desde o início do governo

A alta de preços de alimentos, combustíveis, energia e outros produtos começou a cair na conta de Jair Bolsonaro. Os novos números do Datafolha mostram que a popularidade do presidente teve uma inclinação leve para baixo, mas sofreu um solavanco maior entre os brasileiros de baixa renda, que são aqueles que mais sentem o peso da inflação.

A aprovação a Bolsonaro na faixa mais pobre da população caiu de 21% em julho para 17% agora. Esta é a menor marca no segmento desde o início do governo e representa uma queda de 20 pontos de popularidade desde o fim do ano passado, quando foi paga a última parcela de R$ 300 do auxílio emergencial.

Os números indicam que os principais fatores de pressão sobre a popularidade de Bolsonaro atualmente são os efeitos da crise econômica no bolso dos brasileiros. Ainda que o governo projete um crescimento forte para este ano, não há sensação de bem-estar à vista com desemprego, comida cara, tarifas extras de energia e gasolina a R$ 7 por litro.

Reinaldo Azevedo - Guedes quer o STF contra as oposições

Folha de S. Paulo

Nos precatórios, ministro apela ao tribunal para que seja seu parceiro no calote a estados governados por oposicionistas

Paulo Guedes pode ser tão virulento como Jair Bolsonaro. Eventualmente mais, já que os patógenos políticos e ideológicos que vão em sua mente têm um pouco mais de bibliografia. Menos, é certo, do que ele dá a entender. Não importam, como se sabe, os volumes que se leram, mas o que se reteve do que foi lido. A metáfora é óbvia: traças também devoram livros e não viram Schopenhauer.

Na fábula do infantilismo político que se tentou construir no Brasil, o ministro dito liberal conferiria uma face de eficácia e modernidade ao discurso atrasado do chefe, um reacionário delirante. O enlace desses seres ditos distintos e complementares era mera “fanfic” da direita xucra.

O ministro é o maior produtor de teses “ad hoc” do país. Em questão de horas, aquele que se diz pronto para uma interlocução madura entre os Poderes pode partir para a vulgaridade conspiratória e tratar negócios de Estado com a sofisticação de um bêbado inflamado de boteco.

Hélio Schwartsman - O Brasil vai sucumbir à variante delta do vírus?

Folha de S. Paulo

Imunização adulta completa ainda é baixa no país -apenas 45% da população

O Sars-CoV-2 já mostrou que é bom em frustrar previsões. O vírus, que, em setembro de 2020, ainda aparecia em artigos científicos como apresentando notável “estabilidade genômica”, acabou se revelando um mutante competente, que já rendeu meio alfabeto grego de variantes de interesse/preocupação. Quatro delas, alfa, beta, gama e delta, foram relacionadas a novas ondas epidêmicas em países em que se tornaram dominantes.

Repiques e quedas inesperados, aliás, foram uma constante ao longo do último ano e meio. Países que chegaram a sentir o gostinho de vitória sobre a Covid-19, como EUA e Israel, tiveram de retroceder. Outros, que já haviam se acostumado a colecionar derrotas, caso do Brasil, podem estar na iminência de um triunfo. É preciso aqui frisar o “podem”. Se há algo que o vírus já deveria ter nos ensinado é a humildade preditiva.

Luiz Carlos Azedo - Muito barulho por nada

Correio Braziliense

A reprovação ao governo Bolsonaro oscilou dois pontos para baixo em relação ao levantamento de julho: 53% consideram o governo ruim ou péssimo”

Graças às redes sociais, a participação da sociedade na política se ampliou muito, com certas características da forma como as pessoas se articulam na internet, ou seja, as chamadas de “tribos” — quando se agrupam por interesses permanentes — ou “bolhas”, no caso das correntes de opinião política encapsuladas em grupos de pressão. Tanto as mudanças econômicas, financeiras e tecnológicas aceleradas pela globalização, como a revolução nos costumes, por exemplo, são fatores de maior diversidade social e pluralismo político.

A expressão “maioria silenciosa” se refere às pessoas politicamente acomodadas que, de um modo geral, têm posições conservadoras, mas não manifestam opinião publicamente. Esse conceito surgiu nos Estados Unidos, como muitos outros, durante o governo de Richard Nixon, quando, em 1969, ele pediu à população americana mais apoio ao envio de tropas para lutar no Vietnã. Havia, com razão, muita resistência à intervenção norte-americana no Sudeste Asiático, mas Nixon conseguiu o apoio da maioria da sociedade. Desde então, conquistar o apoio dessa parcela da sociedade passou a ser uma das principais preocupações dos políticos.

César Felício - Rota de fuga

Valor Econômico

PSL e DEM estudam fusão para poderem sobreviver

O PSL e o DEM caminham para a fusão entre as duas siglas. Não as unirá o amor, mas sim o espanto, como no verso de Jorge Luis Borges Trata-se da primeira consequência de grande porte da reforma política de 2017, ora sob ameaça no Senado.

A reforma de 2017 acabou com a coligação proporcional e reforçou a cláusula de barreira. Isso perturba a vida de vários partidos que viviam no ecossistema das grandes frentes. Os mais ameaçados são os que têm existência sobretudo parlamentar. Aqueles que só percebemos que existem acompanhando o noticiário da Câmara e do Senado.

Cada um apostou em uma estratégia para contornar o problema. Diversas siglas patrocinaram uma emenda constitucional, aprovada na Câmara, que restaura a coligação proporcional. Todos os sinais são de que o Senado irá vetar o retrocesso. A saída do PSL e do DEM é a fusão.

“A regra é indutora das fusões. Este é um caminho natural com o fim das coligações proporcionais, porque a construção das chapas para deputados ficou muito complexa”, reconhece o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM), o presidenciável mais empenhado no projeto de unir os pretendentes a serem terceira via na eleição presidencial. Segundo ele, a fusão tende a tornar mais fácil a construção de um projeto presidencial. Pela depuração que a fusão pode proporcionar nos quadros de ambas as siglas e pelo fundo partidário na casa da centena dos milhões que o PSL dispõe.

Um cálculo feito em 2020 pelo ex-deputado Saulo Queiroz dá a dimensão do problema. Sem coligações, o DEM em 2018 teria eleito apenas 16 deputados, e não 29, como obteve com suas alianças.

Para o PSL o panorama também é preocupante. Ele inflou com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, que se retirou da sigla. Na sua ausência, o PSL virou um absurdo em forma de partido: um nanico gigante.

Claudia Safatle - O baixo impacto das reformas no crescimento

Valor Econômico

Sachsida vê governo mais reformista dos últimos 20 anos

As críticas ao desempenho do ministro da Economia, Paulo Guedes, se avolumam. O economista Eduardo Gianetti declarou, em recente entrevista ao “Estado de S. Paulo”, que “Paulo Guedes já se desmoralizou por completo e vai se desmoralizar ainda mais se continuar”. Ele disse que não há nenhuma perspectiva de crescimento econômico robusto no ano que vem, pois as reformas prometidas por Guedes não foram feitas e o clima de incerteza política patrocinado por Bolsonaro afasta o investidor. O gestor de estratégia multimercado e previdência da Verde Asset, Luiz Parreiras também se mostrou decepcionado com a atuação do ministro. “O discurso de Guedes é muito bom, mas a execução tem deixado muito a desejar”, disse ele em evento recente. Isso sem considerar os que preferem tecer críticas, dentro e fora do governo, mantendo o anonimato.

Na lista de fracassos do ministro costuma-se citar o programa de privatizações que ele chegou a estimar que renderia cerca de R$ 1 trilhão, a promessa não cumprida de zerar o déficit primário e a frustração no crescimento da economia, que patina. Mas uma olhada na lista de medidas aprovadas pelo Congresso de 2019 para cá torna forçoso reconhecer que constam inúmeros projetos centrados na consolidação fiscal e nas reformas pró-mercado destinadas ao aumento da produtividade.

José de Souza Martins* - Se houver amanhã

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Se houver amanhã no horizonte do Brasil que está sendo semeado hoje, a pátria que sobrar não terá como não erguer, ainda que às gargalhadas, um monumento de gratidão a quem a governou de 2018 até quase 2022.

Despistado, infiltrado no movimento autoritário e direitista chamado bolsonarismo, ninguém percebeu, nem eu, que Jair Messias, na ação demolidora das instituições democráticas, foi demolindo a si mesmo e suas criaturas. Nas irracionalidades politicamente destrutivas de seus atos, Bolsonaro é consequência e avesso do bolsonarismo. De outro modo, seus próprios cúmplices disseram isso após seus atos do dia seguinte ao do dia da pátria.

Nesse avesso, seu perfil revelou não caber na política de seu tempo. Versão tropical e invertida de Procusto, foi cortando as pernas alheias para não cortar as próprias, a fim de que coubessem no desconforto do corpo redutivo do Estado pessoal e condominial, imaginário, de suas limitações autoritárias.

Fernando Abrucio* - O caminho até a eleição será longo

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O acordão de Bolsonaro com o sistema político só nos distancia de um futuro melhor para além de 2022

Três desfechos foram previstos para as manifestações do dia 7 de Setembro: golpe, impeachment ou acordão de Bolsonaro com o sistema político. Os dois primeiros não têm chances de ocorrer no curto prazo. O terceiro tipo de desenlace já havia ocorrido em 18 de junho de 2020, quando Fabrício Queiroz, acusado de corrupção e envolvido com a família presidencial, fora preso. Naquele momento, o bolsonarismo iniciou seu namoro com o Centrão, salvando a pele do presidente da República. Muitos acreditam que essa saída prevalecerá e que nos levará a um porto seguro. Sinto informar que há muitas incertezas pela frente, pelo menos até o dia da eleição presidencial em 2022. Esse período promete ser o principal teste para a democracia brasileira desde o fim do regime militar.

As incertezas começam pelo fato de que o golpe e o impeachment não podem ser completamente descartados. O espírito autoritário do presidente e do seu grupo mais fiel apareceu claramente nas manifestações do Sete de Setembro. Bolsonaro xingou - o verbo é este mesmo - dois ministros do STF, chamando um deles de canalha. Mais: o presidente ameaçou não cumprir ordens judiciais que não o agradem - ou que ultrapassem as quatro linhas da Constituição que ele inventou para si mesmo. Isso é um golpe contra a democracia. Mas o bolsonarismo não tem no momento capacidade de quebrar a ordem democrática sem ir junto para o ralo.

Embora exista uma pequena probabilidade de quebra democrática no futuro próximo, até porque a loucura do bolsonarismo não tem paralelo com outros movimentos golpistas da história do país, as maiores chances são de deterioração gradativa da estrutura institucional e de padrões de políticas públicas construídos nos últimos 30 anos, tal como tem ocorrido desde o início do mandato. Claro que alguém poderá gritar, a cada crise, que fomos salvos pelas instituições. Mas o ambiente democrático não é saudável quando impera a chantagem institucional, como nos casos do presidente da Câmara ou do procurador-geral da República, que negam os fatos em nome da pura manutenção do poder.

Fernando Gabeira* - Armadilhas da trégua

O Estado de S. Paulo

Algumas forças parecem satisfeitas, como se não houvesse uma política real inspirada pela morte

Um momento de trégua pode ser interessante quando as forças se reorganizam para o inevitável combate que virá adiante. Mas pode ser fatal, quando elas se distendem e acham que o processo chegou ao fim e que o presidente Bolsonaro desistiu de seu projeto autoritário.

A oposição foi às ruas muito rapidamente depois do 7 de Setembro. O ato bolsonarista foi organizado durante dois meses, com trabalho intenso e um empenho do governo federal.

Além da rapidez, as forças de oposição que foram às ruas cometeram o erro de excluir outras, não souberam contornar as dificuldades que surgem numa frente ampla. É ingenuidade supor que o PT e seus aliados iriam às ruas sabendo que Lula seria criticado. A expressão nem Lula nem Bolsonaro é uma afirmação eleitoral, voltada para 2022. Ignora as circunstâncias do momento.

Além do mais, uma dupla negação não basta para mobilizar. Entre Lula e Bolsonaro existe uma miríade de alternativas. Qual delas estava em jogo, o que propõe para o Brasil?

Tanto o recuo de Bolsonaro como a escassez de gente nas ruas deu aos deputados o argumento de que precisam para continuar sentados em cima dos pedidos de impeachment. O governo, para eles, torna-se uma vítima atraente da qual ainda se pode arrancar muito, em verbas e cargos.

Eliane Cantanhêde - Fotos x fatos

O Estado de S. Paulo

No Dia da Democracia, Bolsonaro é alvo de juristas, STF, CPI, ONG e partidos

O presidente Jair Bolsonaro prefere as fotos das manifestações de apoio a ele no Sete de Setembro, realmente impressionantes (por diferentes motivos), mas os fatos que se sucederam contra ele, aglutinando poderosos agentes políticos de dentro e de fora do País, são igualmente impressionantes (neste caso, por motivos óbvios). E mais perigosos.

Vejamos a quarta-feira, 15 de setembro, justamente o dia internacional da velha, boa e tão atacada democracia: Bolsonaro sofreu uma enxurrada de más notícias, confirmando que há várias frentes políticas, econômicas, jurídicas e internacionais fechando o cerco não apenas contra o que ele diz e faz, mas ao que representa.

A notícia de maior alcance partiu da comissão de juristas que entregou à CPI da Covid 200 páginas tipificando os crimes que teriam sido praticados pelo presidente da República durante a pandemia. Todas aquelas coisas que a gente sabe, viu e ouviu, mas sempre chocam, irritam e, agora, vêm acompanhadas dos respectivos artigos de códigos, leis e da Constituição.

O parecer, como o próprio relatório final da CPI, que está no forno, pode ter efeitos drásticos para Bolsonaro, porque será usado para pedido de impeachment na Câmara, de abertura de processos de crime comum na PGR e de crime contra a humanidade no Tribunal de Haia. Uma das juristas, aliás, é Sylvia Steiner, ex-juíza dessa corte.

Milton Hatoum* - Sair das trevas, derrotar a barbárie

O Estado de S. Paulo

Não foi um péssimo sonho, e sim a noite mais longa e pavorosa desde o fim da ditadura civil-militar

Os últimos meses do ansiado 2022 serão ainda mais trágicos? Não sabemos se os manifestantes antidemocráticos do dia 7 de setembro vão sair às ruas com uma arma nas mãos e uma ideia criminosa na cabeça; tampouco sabemos como vão se comportar as instituições, principalmente as Forças Armadas, que, numa democracia, têm o dever constitucional de garantir a posse do próximo presidente. 

Jair Messias Bolsonaro atribuiu sua fala golpista no Dia da Pátria ao “calor do momento”. Esse calor causa calafrios e não é nada momentâneo, pois os discursos autoritários de Jair datam de seus verdes anos. Será que algum dia essas falas infames terão fim? Ou o “calor do momento” seria uma tradução muito livre, quase metafórica da frase latina memento mori? Um lembrete: não me refiro à morte física, e sim à morte política do chefe e de seus filhos, igualmente antidemocráticos e fãs ardorosos de fake news. 

Suposições à parte, tudo indica que falta pouco mais de um ano para o fim do pesadelo. Não foi um péssimo sonho, e sim a noite mais longa e pavorosa desde o fim da ditadura civil-militar, fonte inspiradora do atual governo, capitaneado por um sujeito totalmente desqualificado para qualquer cargo, e não apenas público. 

Adriana Fernandes - Bolsonaro sobe imposto pela 2ª vez

O Estado de S. Paulo

Num cenário de alta de juros e encarecimento do crédito, o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para bancar o novo Bolsa Família (nos últimos meses do ano), não é bom sinal.

Os financiamentos para empresas e pessoas físicas, que já estavam pressionados com a subida da taxa básica de juros, a Selic, pelo Banco Central, vão ficar mais caros entre 20 de setembro e 31 de dezembro deste ano num momento de esfriamento da atividade econômica e com endividamento recorde da população.

Do lado fiscal, porém, a decisão de aumentar o imposto representa um forte indício de que a equipe econômica conseguiu barrar a pressão pela renovação do auxílio emergencial por meio de crédito extraordinário para o combate do impacto da pandemia da covid-19.

Vera Magalhães - Queiroga cria tripla cortina de fumaça

O Globo

O médico Marcelo Queiroga completou seis meses à frente do Ministério da Saúde, no qual substituiu o general Eduardo Pazuello. Em meio ano, aceitou de bom grado a missão de converter-se num negacionista a serviço do pior do bolsonarismo, em vez de tentar consertar os erros do antecessor.

Nesta quarta-feira, usou os adolescentes como bucha de canhão para promover uma tripla cortina de fumaça para tentar esconder os persistentes e cada vez mais graves erros do governo no manejo da pandemia.

O anúncio intempestivo em que recomendou a interrupção da vacinação de adolescentes entre 12 e 17 anos que não tenham comorbidades pegou técnicos, especialistas, governadores, prefeitos e pais de todo o país desprevenidos. Levou mais caos e desinformação ao programa de imunização.

A vacinação dessas faixas etárias já começou em diversos estados. Tem a aprovação da Anvisa, a agência sanitária brasileira, que a manteve mesmo diante do recuo de Queiroga.

Bernardo Mello Franco - O bolsonarismo e as cobaias humanas

O Globo

O governo Bolsonaro já produziu um imitador de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda do nazismo. Agora faz lembrar Josef Mengele, o médico que fazia experimentos macabros em Auschwitz.

O doutor ficou conhecido por usar prisioneiros como cobaias. Tratava seres humanos como ratos de laboratório, sob inspiração de uma ideologia que pregava a “higiene racial”.

Associada à barbárie nazista, a expressão “cobaias humanas” é citada no relatório da comissão de juristas que aconselha a CPI da Covid. O documento defende que o presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro Eduardo Pazuello sejam denunciados ao Tribunal Penal Internacional pela prática de crimes contra a humanidade.

Os juristas classificam a gestão da pandemia como um ataque à população civil. O governo sabotou medidas sanitárias, negou assistência a indígenas, retardou a compra de vacinas e apostou na tese da imunidade de rebanho, que acelerou a circulação do vírus.

Rogério F. Werneck - Em busca da nova ‘folga fiscal’

O Globo / O Estado de S. Paulo

A difícil viabilização do pacote de bondades com que o Planalto contava para 2022

Alarmado com o 7 de Setembro, o país respirou aliviado ao se inteirar da súbita e inesperada distensão política que talvez venha a ser conhecida, no futuro, como a “Trégua de Temer”. Sem tentar disfarçar sua apreensão com as dificuldades que a crise institucional vinha impondo à condução da política econômica, o ministro da Economia apressou-se a assegurar que “a iniciativa do presidente Jair Bolsonaro” colocara “tudo de volta aos trilhos”.

Não foi bem assim. E nem promete ser tão fácil. De fato, quem foi recolocado nos trilhos foi o próprio presidente. E o problema é que Bolsonaro não é propriamente um político que se desloca sobre trilhos. Tem uma propensão incorrigível a saltar dos trilhos e seguir seus instintos incontroláveis de um político “fora-de-estrada”, que não respeita caminhos demarcados ou qualquer tipo de balizamento institucional.

Não há, pois, como ter ilusões. Seu impulso visceral de confrontação das instituições está fadado a se mostrar recorrente, com maior ou menor gravidade, ao longo dos mais de 15 meses que ainda tem de mandato.

Esse comportamento desestabilizador de Bolsonaro vem sendo exacerbado por sua crescente apreensão com a viabilidade da reeleição. O presidente vem, aos poucos, dando-se conta de que seu quarto ano de mandato será bem mais difícil do que imaginava. E não é por outra razão que se agarra ao discurso da contestação antecipada do desfecho da disputa presidencial do ano que vem.

Flávia Oliveira - Aos responsáveis, punição

O Globo

À medida que a CPI da Covid se aproxima do fim, aumenta a inquietação sobre resultados práticos dos seis meses de depoimentos, recolhimento de provas, elaboração do relatório final. Não é desconfiança imotivada, dado o número de comissões parlamentares que deram em rigorosamente nada no país. Mas os quase 600 mil brasileiros mortos pelo coronavírus exigem articulações políticas e jurídicas, bem como mobilização da sociedade civil, para responsabilizar e punir os culpados pelo enfrentamento criminoso à pandemia.

Por encomenda do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), juristas liderados por Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça e professor de Direito Penal na USP, apontaram crimes do presidente da República e de integrantes do governo, incluindo Eduardo Pazuello e Elcio Franco, ex-titular e ex-secretário executivo do Ministério da Saúde. Para o grupo, Jair Bolsonaro cometeu crimes contra a humanidade e contra saúde, administração e paz pública, infringiu medidas sanitárias, praticou charlatanismo, incitação ao crime e prevaricação. Há violações comuns, previstas no Código Penal, e crime de responsabilidade, que levaria ao impeachment. O mandatário brasileiro também poderá ser levado ao Tribunal Penal Internacional, em Haia (Holanda). Denúncia contra ele já foi encaminhada por representantes dos povos indígenas.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) avisou que usará o parecer no relatório final da CPI. A previsão é apresentá-lo no fim deste mês, se novas linhas de investigação não exigirem que os trabalhos invadam outubro. A partir daí, a responsabilização de Bolsonaro dependerá do procurador-geral da República e do presidente da Câmara dos Deputados. Como Augusto Aras e Arthur Lira são aliados do mandatário, o relator pretende recomendar que ambos tenham prazo para decidir sobre as acusações.

Pedro Doria - O Facebook sabia

O Globo / O Estado de S. Paulo

O Wall Street Journal está publicando nesta semana aquilo que talvez seja uma das mais importantes séries de reportagens sobre o impacto da tecnologia na sociedade — e na política — deste ano. Os repórteres do jornal puseram as mãos numa imensa quantidade de documentos internos do Facebook que mostram quanto a companhia compreende os resultados negativos de suas ações. Pois é: compreende, e muito.

No início de 2018, o Face tocou uma profunda mudança de seu algoritmo que afetou diretamente o newsfeed. É aquela coluna central onde aparecem postagens, fotografias e vídeos logo que entramos na rede social. Eles vinham sofrendo críticas por causa da interferência de notícias falsas e publicidade financiada pela Rússia nas eleições presidenciais americanas em 2016. Insatisfeito com o que lhe parecia excessivo conteúdo noticioso, também preocupado com uma série de indicadores de uso na plataforma, o CEO Mark Zuckerberg encomendou estudos sobre como mudar.

Ruth de Aquino - Armas, mentiras e videoteipe

O Globo

Ele era só pré-candidato à Presidência. Em cima de um carro de som em Goiânia, Jair Bolsonaro ensinou uma criança a fazer com a mão o gesto de uma arma. Uma cena asquerosa. A menininha com vestido rodado apontava uma arminha para as pessoas, no colo do aspirante ao Planalto, em julho de 2018. Vale a pena ver de novo.

Deu no que deu. De 2019 até agora, Bolsonaro tem feito de tudo para despejar armas pesadas nas ruas e nos lares, facilitar importação de fuzis e munição, reduzir o controle e a fiscalização do Exército, incentivar adolescentes a atirar e liberar armas de uso pessoal entre policiais. Quer alvejar de morte o Estatuto do Desarmamento de 2003.

Opinião do dia – Gramsci* (Preconceito)

“É preciso destruir o preconceito, muito difundido, de que a filosofia é algo muito difícil pelo fato de ser a atividade intelectual própria de uma determinada categoria de cientistas especializados ou de filósofos profissionais e sistemáticos. É preciso, portanto, demonstrar preliminarmente que todos os homens são “filósofos”, definindo os limites e as características desta “filosofia espontânea”, peculiar a “todo o mundo”, isto e, da filosofia que está contida: 1) na própria linguagem, que é um conjunto de noções e de conceitos determinados e não, simplesmente, de palavras gramaticalmente vazias de conteúdo; 2) no senso comum e no bom senso; 3) na religião popular e, consequentemente, em todo o sistema de crenças, superstições, opiniões, modos de ver e de agir que se manifestam naquilo que geralmente se conhece por “folclore”.”

*Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere, 4ª Edição, v.1, p.93. Civilização Brasileira, 2006

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Sólida reprovação

Folha de S. Paulo

Fragilidade de Bolsonaro, medida pelo Datafolha, afigura-se de difícil reversão

A popularidade de Jair Bolsonaro continua a diminuir, em ritmo menor, mas significativo, indicam os números da pesquisa Datafolha realizada nesta semana.

O governo é considerado ruim ou péssimo por 53% dos brasileiros aptos a votar e ótimo ou bom por 22%. Em julho, as taxas eram de 51% e 24%, respectivamente. A diferença, portanto, passou de 27 pontos negativos para 31. Em dezembro de 2020, auge do prestígio presidencial, apurou-se um saldo positivo de 5 pontos.

As taxas de aprovação de Bolsonaro jamais foram muito expressivas. Ele teve 37%, sua melhor avaliação, apenas entre agosto e dezembro do ano passado —período em que o governo pagava um auxílio emergencial maior e uma complementação de salário.

Como de hábito, a avaliação do governo é pior entre mulheres, mais pobres, moradores do Nordeste e mais jovens. Mesmo na região Sul, em que o mandatário colhe resultados menos ruins, a taxa de reprovação é de 44%.

Se a retomada da economia parecia a melhor aposta para uma mudança de humores do eleitorado, a situação de Bolsonaro nessa frente vai se tornando dramática.

Mesmo com manobras orçamentárias, reduz-se o espaço para a prometida ampliação do Bolsa Família. As projeções para o crescimento econômico no próximo ano recuam para o patamar de 1%; as perspectivas de escassez de água e energia elétrica agravam o quadro.