Folha de S. Paulo
Livre-arbítrio não explica o mal resultante
de desastres naturais
O problema da teodiceia tem mais de 2.000
anos, de modo que não achei que causaria tanta polêmica ao evocá-lo em relação
à pandemia, como fiz na coluna "Deus e a Covid". Mas, como estou até
agora recebendo contestações, acho que vale a pena tentar esclarecer alguns
pontos.
Conciliar o sofrimento presente no mundo com a existência de um Deus onipotente e benevolente é um problema real, que desafia filósofos e teólogos das mais diversas tradições. E nem é algo que os religiosos procurem esconder. É o tema mesmo do "Livro de Jó", incluído na Bíblia.
Em termos lógicos, a análise é simples. Se
há um Deus onisciente, onipotente e benevolente, então não existe mal. Ora, há
mal no mundo. Portanto, um Deus onisciente, onipotente e benevolente não
existe. A forma do raciocínio, "modus tollens", é impecável. Se as
premissas são verdadeiras, a conclusão também o é. Daí que, para esboçar uma
resposta, é preciso negar ou relativizar a onipotência/onisciência de Deus, sua
benevolência ou a existência do mal.
Uma saída popular entre cristãos é recorrer
ao livre-arbítrio. Existe mal no mundo porque Deus deu aos homens o poder de
fazer escolhas. Ao concedê-lo, a possibilidade do mal tornou-se uma necessidade
(ou o homem não teria escolha). Engenhoso, mas por que introduzir o
livre-arbítrio? Dá para imaginar razões teológicas para isso, mas não lógicas.
Um mundo onde os homens só pudessem fazer o bem não violaria nenhum princípio
lógico. Vários bichos vivem muito bem sem livre-arbítrio, que, segundo muitos
neurocientistas, não passa mesmo de uma ilusão.
De todo modo, o argumento do livre-arbítrio
explicaria no máximo o mal provocado por ações humanas, não o resultante de
desastres naturais.
Não vejo problema em alguém ser religioso.
Há estudos sugestivos de que sê-lo faz bem à saúde. O preço a pagar, porém, é
conviver com algumas contradições. Nada que já não façamos todos os dias.
Deus não é benevolente,o criador é apenas justo,plantou,colheu.Planta-se numa encarnação,colhe-se na outra - Sim,Deus poderia ter feito todo mundo bom,mas não teríamos mérito nenhum,nossa essência espiritual evolui pelo próprio esforço.Não há contradição nenhuma no meu pensamento.
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